quarta-feira, 8 de julho de 2009

António Lobo Antunes (1942)



António Lobo Antunes (Lisboa, 1 de Setembro de 1942) é um escritor e psiquiatra português.

Proveniente de uma família da alta burguesia, licenciou-se em Medicina e especializou-se em Psiquiatria. Exerceu a profissão no Hospital Miguel Bombarda, em Lisboa, dedicando-se desde 1985 exclusivamente à escrita. A experiência em Angola na Guerra do Ultramar como Tenente e Médico do Exército Português durante vinte e sete meses (de 1971 a 1973) marcou fortemente os seus três primeiros romances.

Em termos temáticos, a sua obra prossegue com a tetralogia constituída por A Explicação dos Pássaros, Fado Alexandrino, Auto dos Danados e As Naus, onde o passado de Portugal, dos Descobrimentos ao processo revolucionário de Abril de 1974, é revisitado numa perspectiva de exposição disfórica dos tiques, taras e impotências de um povo que foram, ao longo dos séculos, ocultados em nome de uma versão heróica e epopeica da história. Segue-se a esta série a trilogia Tratado das Paixões da Alma, A Ordem Natural das Coisas e A Morte de Carlos Gardel – o chamado «ciclo de Benfica» –, revisitação de geografias da infância e adolescência do escritor (o bairro de Benfica, em Lisboa). Lugares nunca pacíficos, marcados pela perda e morte dos mitos e afetos do passado e pelos desencontros, incompatibilidades e divórcios nas relações do presente, numa espécie de deserto cercado de gente que se estende à volta das personagens.

Antunes começou por utilizar o material psíquico que tinha marcado toda uma geração: os enredos das crises conjugais, as contradições revolucionárias de uma burguesia empolgada ou agredida pelo 25 de Abril, os traumas profundos da guerra colonial e o regresso dos colonizadores à pátria primitiva. Isto permitiu-lhe, de imediato, obter um reconhecimento junto dos leitores, que, no entanto, não foi suficientemente acompanhado pelo lado da crítica. As desconfianças em relação a um estranho que se intrometia no meio literário, a pouca adesão a um estilo excessivo que rapidamente foi classificado de «gongórico» e o próprio sucesso de público, contribuíram para alguns desentendimentos persistentes que se começaram a desvanecer com a repercussão internacional (em particular em França) que a obra de António Lobo Antunes obteve.

Ultrapassado este jogo de equívocos, tornou-se um dos escritores portugueses mais lidos, vendidos e traduzidos em todo o mundo. Pouco a pouco, a sua escrita concentrou-se, adensou-se, ganhou espessura e eficácia narrativa. De um modo impiedoso e obstinado, esta obra traça um dos quadros mais exaustivos e sociologicamente pertinentes do Portugal do século XX.

A sua obra prosseguiu numa contínua renovação linguística, tendo os seus romances seguintes (Exortação aos Crocodilos, Não Entres Tão Depressa Nessa Noite Escura, Que Farei Quando Tudo Arde?, Boa Tarde às Coisas Aqui em Baixo), bem recebidos pela crítica, marcando definitivamente a ficção portuguesa dos últimos anos.

Em 2007 foi distinguido com o Prêmio Camões, o mais importante prêmio literário de língua portuguesa. Em 2008 foram-lhe atribuídas, pelo Ministério da Cultura francês, as insígnias de Comendador da Ordem das Artes e das Letras francesas.

Lobo Antunes foi militante da Aliança Povo Unido, por alguns meses, em 1980.

Muitos dos livros de Antunes referem ou reportam-se a todo o processo de passagem do fim do Estado Novo até à implantação da Democracia. O fim da Guerra Colonial, o fim de um mundo burguês marcado por valores conservadores e retrógrados. Os problemas de mudança social rápida no 25 de Abril de '74 e, consequentemente, a instabilidade política vivida em Portugal. Esse processo de passagem é espelhado nas relações familiares. Regra geral aparecem nos romances deste autor famílias disfuncionais em que o indivíduo está a perder os seus referentes, em que a comunicação é ou nula ou superficial entre os seus membros. Regra geral os anti-heróis dos seus romances são pessoas que exercem profissões liberais oriundos de «boas famílias».

Estilo

Densidade

Antunes tem uma escrita densa. O leitor tem algum esforço de leitura porque, por exemplo, não é raro haver mudanças de narrador e assim o leitor tem tendência a «perder o fio à meada». No entanto apesar de não ser um autor que opte por uma escrita fácil (ou facilitista) constitui um fenómeno de vendas e é muito lido internacionalmente, especialmente na Europa Continental.

Mudança de narrador

Na esteira de James Joyce ou de The Sound and the Fury de Faulkner, o narrador é por vezes trocado, como se o ponto de vista saltasse de personagem em personagem. Isto dá uma qualidade de caleidoscópio ao desenrolar da narrativa.

Obsessividade

Os livros de Antunes são muito obsessivos e labirínticos dando um tom geral de claustrofobia e paranóia às suas obras. Apesar disso as suas obras apresentam uma diversidade linguística notável.

Sintagmas nominais complexos

Ocorre muitas vezes numa descrição ou pensamento do que está a acontecer a um personagem aparecerem sobrepostos tanto o que está "realmente" a acontecer como uma realidade imaginária. Outros processos típicos são sintagmas nominais complexos como por exemplo "cachoeira dos pulmões". Aqui os substantivos (S1 de S2) não funcionam da maneira habitual em que S2 atribui propriedades sobre S1 ("copo de água"; água está a especificar o conteúdo do copo) mas funcionando este sintagma como uma metáfora ou como uma comparação. (assim esta imagem seria descrita num português mais habitual como "os pulmões fazendo barulho como uma cachoeira"). Em As Naus, um velho cego tem "olhos lisos de estátua"; em Manual dos Inquisidores, uma luneta é descrita como sendo "um tubo de inventar planetas".

Simultaneidade

Tipicamente ocorrem várias descrições simultâneas, tanto físicas como de pensamentos. É habitual uma realidade do passado estar misturada com uma realidade do presente. No meio de um diálogo serem inseridos diálogos imaginários ou do tempo passado. Estes processos são usados com maestria por este autor resultando efeitos de grande valor literário.

Prêmios literários

Prêmio Franco-Português, 1987 ("Cus de Judas") (Prêmio instituído pela embaixada de França em Lisboa, no valor de duzentos mil escudos e atribuído a obras traduzidas para a língua francesa nos últimos cinco anos.)
Grande Prêmio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores, 1985 ("Auto dos Danados")
Prêmio Melhor Livro Estrangeiro publicado em França, 1997 ("Manual dos Inquisidores ")
Prêmio Tradução Portugal/Frankfurt, 1997 ("Manual dos Inquisidores")
France-Culture ("A Morte de Carlos Gardel")
Prêmio de Literatura Europeia do Estado Austríaco, 2000
Prêmio União Latina , 2003
Prêmio Ovídio da União dos Escritores Romenos, 2003
Prêmio Fernando Namora, 2004
Prêmio Jerusalém, 2005
Prêmio Camões, 2007[1]
Prêmio José Donoso, 2008, atribuído pela Universidade de Talca, Chile

O autor não tinha pressa em ser publicado no Brasil e conclui: "Não sei, certa impressão de que meus livros seriam muito criticados... e eu venho do Brasil." O avô de Lobo Antunes, também António, era de Belém, onde o escritor começou a ler os clássicos brasileiros José de Alencar, Aluísio Azevedo, Machado de Assis, Monteiro Lobato.

Obras

De sua autoria
Memória de Elefante (1979)
Os Cus de Judas (1979)
A Explicação dos Pássaros (1981)
Conhecimento do Inferno (1981)
Fado Alexandrino (1983)
Auto dos Danados (1985)
As Naus (1988)
Tratado das Paixões da Alma (1990)
A Ordem Natural das Coisas (1992)
A Morte de Carlos Gardel (1994)
Crônicas (1995)
Manual dos Inquisidores (1996)
O Esplendor de Portugal (1997)
Livro de Crônicas (1998)
Olhares 1951-1998 (1999) (co autoria de Eduardo Gageiro)
Exortação aos Crocodilos (1999)
Não Entres Tão Depressa Nessa Noite Escura (2000)
Que farei quando tudo arde? (2001)
Segundo Livro de Crônicas (2002)
Letrinhas das Cantigas (edição limitada, 2002)
Boa Tarde às Coisas Aqui em Baixo (2003)
Eu Hei-de Amar Uma Pedra (2004)
História do Hidroavião (conto, reedição 2005)
D'este viver aqui neste papel descripto: cartas de guerra ("Cartas da Guerra", 2005)
Terceiro Livro de Crônicas (2006)
Ontem Não Te Vi Em Babilônia (2006)
O Meu Nome é Legião (2007)
O Arquipélago da Insônia (2008)
Que Cavalos São Aqueles Que Fazem Sombra no Mar? (a ser publicado em 2009)

Fonte:

Nenhum comentário: