AUSÊNCIA
Não. Não penso em homens.
Meu corpo esvaziou-se de sonhos.
As madrugadas insones lembram-me nomes.
Como quando se caminha de noite
e se distancia das luzes até que, antes da curva da estrada,
elas se tornem apenas vaga-lumes tontos no horizonte.
Não. Não há o que me console, lá atrás.
Não é possível, gritando nomes,
resgatar a alma que se desgarrou de mim.
E vaga-lumes fogem da alva.
INVERNO
as Sibipirunas choram
escorrem
folhas secas
nas calçadas
não compreendem suas dores
a nudez dos galhos
a mudez
da sombra rala
os meninos riem
sujos de barro
abrem caminho para as flores
A BOCA NUA
Tua boca lua cheia de polpa
Doce, gosto de cidreira melódica
escorrida de acordes Sabiá-laranjeira
Acorda, noite sempre é dia ávido de rir
lábios dançam sorrisos, vestem linho carmesim
e pérolas, estrelas, colares em mim.
Saliva, sal, cortinas de seda que se me abrem,
derramam-se meus seios nus em ti.
O POEMA
O Poema jorra pétalas brancas
Rosas brancas, pálidas de espanto
ao vento, asas arremessadas, livres
pelo ar.
O Poema surpreendente doçura
mistura mel e terra, fruta-do-conde
Laranja craveira, sorva gomo a gomo
O Poema brota morno, doido
aos borbotões as lágrimas de gozo
inundam as mãos, ávidas mãos.
SUPRA-SUMO
vejo-me pequena menina favelada
em eternas cavalgadas pelo mamonais
verdes madrigais, eu e eles, nativos
acho que brotei da terra...terra vermelha
tão vermelha quanto o nariz dos italianos
que também brotaram dali.
e meus ramos, ervas daninhas
subindo livres,alegremente livres
no rumo da galharia
em direção ao céu, tão meu
tão brejeiro, próximo
sobrenatural
lembro-me crescendo meio
meio empertigada
com raízes incrustadas nas montanhas de pós-de-serra
creio que vim da terra com seus trigais amarelos
tão amarelos quanto os dentes dos italianos
com seus fumos-de-corda que também se fixaram ali.
e os meus cachos lisos e frescos
ganharam espaço, alçaram vôo
soltos no céu tão italiano, surreal.
enxergo-me mulher
meio arteira, meio inteira
nas incansáveis caminhadas
pelo teu corpo nu – e marrom –
tão marrom – e nu – quanto os italianos
que mudaram de cor quando perderam o tempo
e misturaram-se à terra dali
e meus rumos, incertos, sem prumos
cavalgam trigais verde-amarelos
e intimido-os se fixo em mim o infinito
de resto:
para o teu grito
o meu urro
para o teu resumo
o meu supra-sumo!
SILÊNCIO
o poema do descanso
faz cafuné
e dá colo
e nina
e põe na cama
é leve e cândido
e breve
e nem tem rima
o poema do descanso
só abraça
e silencia
BORBOLETA
rasga a casca,
crisálida, abre-se
e, só asas,
abraça o céu...
DISTRAÇÃO
bem-te-vi
pensa que não te vi?
descuide-me
eu me distraí
e seduziste-me a bermuda amarela...
URBANA
a borboleta passeia
plana
planeja
pousa
e rouba a cena
FELICIDADE
Foco
Foca
Bola no nariz
Que felicidade
É coisa de criança
E palhaços
MARIA
– maria, desce daí
maria pequena
maria menina
você vai cair!
uma voz que grita
eita voz que clama!
uma voz que zanga
voz que quer ser gente
menina que não quer crescer!
e a primavera não chega
e o inverno não passa
e esta vida rápida
me arrasta
e balança minha maria
sou eu mesma, a maria
e morro a cada dia
essa vida
sacode minhas tranças
balança minhas redes
quebra-me os galhos
despedaça-me em retalhos
corta-me os atalhos
– suba não, maria.
que subida é risco
– também é riso –
é perigo
rio em topo de montanha
sou maria
sou estranha
perco os sentidos
não temo quedas
foram tantas
foram tamanhas
dói muito ser maria
quero ser promovida
a Clarice.
MENINO
- vive menino!
e o menino ri
samba no sapato
grandemaior que o pé...
- anda menino!
e o menino corre
voa vira bala
ladeira abaixo...
- ri menino!
e o menino deita-e-rola
e amolece
e gargalha
e o nariz escorre...
- fala menino!
e o menino cala
emudece
empaca
faz pirraça...
- come menino!
e o menino cospe
faz pouco
vomita no prato
raso de refeição...
- cresce menino!
e o menino chora
esbraveja
sapateia
esperneia...
mas obedece...
cresce
e... morre o menino!
Não. Não penso em homens.
Meu corpo esvaziou-se de sonhos.
As madrugadas insones lembram-me nomes.
Como quando se caminha de noite
e se distancia das luzes até que, antes da curva da estrada,
elas se tornem apenas vaga-lumes tontos no horizonte.
Não. Não há o que me console, lá atrás.
Não é possível, gritando nomes,
resgatar a alma que se desgarrou de mim.
E vaga-lumes fogem da alva.
INVERNO
as Sibipirunas choram
escorrem
folhas secas
nas calçadas
não compreendem suas dores
a nudez dos galhos
a mudez
da sombra rala
os meninos riem
sujos de barro
abrem caminho para as flores
A BOCA NUA
Tua boca lua cheia de polpa
Doce, gosto de cidreira melódica
escorrida de acordes Sabiá-laranjeira
Acorda, noite sempre é dia ávido de rir
lábios dançam sorrisos, vestem linho carmesim
e pérolas, estrelas, colares em mim.
Saliva, sal, cortinas de seda que se me abrem,
derramam-se meus seios nus em ti.
O POEMA
O Poema jorra pétalas brancas
Rosas brancas, pálidas de espanto
ao vento, asas arremessadas, livres
pelo ar.
O Poema surpreendente doçura
mistura mel e terra, fruta-do-conde
Laranja craveira, sorva gomo a gomo
O Poema brota morno, doido
aos borbotões as lágrimas de gozo
inundam as mãos, ávidas mãos.
SUPRA-SUMO
vejo-me pequena menina favelada
em eternas cavalgadas pelo mamonais
verdes madrigais, eu e eles, nativos
acho que brotei da terra...terra vermelha
tão vermelha quanto o nariz dos italianos
que também brotaram dali.
e meus ramos, ervas daninhas
subindo livres,alegremente livres
no rumo da galharia
em direção ao céu, tão meu
tão brejeiro, próximo
sobrenatural
lembro-me crescendo meio
meio empertigada
com raízes incrustadas nas montanhas de pós-de-serra
creio que vim da terra com seus trigais amarelos
tão amarelos quanto os dentes dos italianos
com seus fumos-de-corda que também se fixaram ali.
e os meus cachos lisos e frescos
ganharam espaço, alçaram vôo
soltos no céu tão italiano, surreal.
enxergo-me mulher
meio arteira, meio inteira
nas incansáveis caminhadas
pelo teu corpo nu – e marrom –
tão marrom – e nu – quanto os italianos
que mudaram de cor quando perderam o tempo
e misturaram-se à terra dali
e meus rumos, incertos, sem prumos
cavalgam trigais verde-amarelos
e intimido-os se fixo em mim o infinito
de resto:
para o teu grito
o meu urro
para o teu resumo
o meu supra-sumo!
SILÊNCIO
o poema do descanso
faz cafuné
e dá colo
e nina
e põe na cama
é leve e cândido
e breve
e nem tem rima
o poema do descanso
só abraça
e silencia
BORBOLETA
rasga a casca,
crisálida, abre-se
e, só asas,
abraça o céu...
DISTRAÇÃO
bem-te-vi
pensa que não te vi?
descuide-me
eu me distraí
e seduziste-me a bermuda amarela...
URBANA
a borboleta passeia
plana
planeja
pousa
e rouba a cena
FELICIDADE
Foco
Foca
Bola no nariz
Que felicidade
É coisa de criança
E palhaços
MARIA
– maria, desce daí
maria pequena
maria menina
você vai cair!
uma voz que grita
eita voz que clama!
uma voz que zanga
voz que quer ser gente
menina que não quer crescer!
e a primavera não chega
e o inverno não passa
e esta vida rápida
me arrasta
e balança minha maria
sou eu mesma, a maria
e morro a cada dia
essa vida
sacode minhas tranças
balança minhas redes
quebra-me os galhos
despedaça-me em retalhos
corta-me os atalhos
– suba não, maria.
que subida é risco
– também é riso –
é perigo
rio em topo de montanha
sou maria
sou estranha
perco os sentidos
não temo quedas
foram tantas
foram tamanhas
dói muito ser maria
quero ser promovida
a Clarice.
MENINO
- vive menino!
e o menino ri
samba no sapato
grandemaior que o pé...
- anda menino!
e o menino corre
voa vira bala
ladeira abaixo...
- ri menino!
e o menino deita-e-rola
e amolece
e gargalha
e o nariz escorre...
- fala menino!
e o menino cala
emudece
empaca
faz pirraça...
- come menino!
e o menino cospe
faz pouco
vomita no prato
raso de refeição...
- cresce menino!
e o menino chora
esbraveja
sapateia
esperneia...
mas obedece...
cresce
e... morre o menino!
Um comentário:
grata supresa, me achar, aqui, lugar de delícias!
obrigada pelo carinho.
Ivy Menon
Postar um comentário