sexta-feira, 23 de abril de 2010

Durval Mendonça (Trovas que eu Dou à Vida !) Parte II


O rio, com suas águas
correndo livres no leito,
parece zombar das mágoas
que trago presas no peito.

Eu rolo desde menino,
feito pedra sem parar...
Só Deus sabe que destino
meu destino há de me dar.

Vem, lua, pela vidraça
ver minhas noites vazias...
Um quarto frio, sem graça,
de um pobre joão sem marias.

Dás um jeito encantador
ao teu ciúme cruel;
misturas, no teu amor,
cicuta e favos de mel.

A rosa, com seus espinhos,
é bem feminina, quando
retribui nossos carinhos
envaidecida... e magoando.

Bebo, sim!... Quanto puder!
Pois vejo, ao fundo da taça,
tua graça de mulher
fazendo minha desgraça...

Felicidade fugaz...
Esperta como Saci ...
Por ela perdi a paz,
e sem paz eu me perdi.

Dos beijos, o mais terrível,
que assombrou povos inteiros,
por mais que pareça incrível,
custou só trinta dinheiros.

Sublimando a santidade
da mãe no doce mister,
o Verbo fêz-se Verdade
no ventre de uma Mulher.

Vejo-te sempre rolando,
indo e vindo... Que aflição!
Responde, mar, até quando
viverás na indecisão?

Minhas vitórias, empenhos
em lutas cheias de agravos,
são pesadas como lenhos,
dolorosas como cravos.

Pobre mãe, sem despedida,
por ironia do fado,
deixaste, acabada a vida,
um crochê inacabado.

Lágrimas que afloram, quando
minha angústia se renova,
eu as enxugo, cantando,
ao calor de minha trova.

Deixei meu Norte e, feridos,
os coqueirais de atalaia
ouvem meus tristes gemidos
nos búzios de nossa praia.

Se a Fé montanhas remove,
como costumam dizer,
vamos à prova dos nove:
Removam, que eu quero ver.

Dai, Senhor, à criatura
deste mundo, enquanto é cedo,
um pouco mais de ternura,
um pouco menos de medo!...

Pedra verde da ilusão,
de mentiroso matiz,
foste a piedosa emoção
de um Bandeirante feliz.

Coração descompassado,
vai bater assim no Inferno:
se vives desgovernado,
eu também me desgoverno.

Mostrando ser feminina,
a praia ouve os segredos
que o mar, por trás da neblina,
conta baixinho aos rochedos.

Para alcançar o perdão
das maldades que te fiz,
andei de rastros no chão
e o próprio chão não me quis.

Dos teus olhos eu me esquivo,
para vencer a inquietude;
são pedras de fogo vivo
no caminho da virtude.

Vai-se o trem.. - Deixa a estação.
O silvo agudo é o sinal...
E uma lágrima no chão,
marcando um ponto final...

lnvejarei os rochedos,
sempre que o mar lhes disser
os mais preciosos segredos
do teu corpo de mulher.

Como um sino em hora morta,
após tantos dissabores,
meu coração bate à porta
de um cemitério de amores.

Se as vitórias têm um preço,
meu destino é muito avaro,
pois até as que mereço
são cobradas muito caro.

Ruge o vento!... Folhas soltas
arrancadas sem piedade;
são como pedras revoltas
castigando a tempestade.

Gotas de cera descendo
no derradeiro transporte...
Lágrimas tristes correndo
dos olhos frios da morte.

Que coisa, incrível, estranha!
Cansada de fazer dó!
A solidão me acompanha
com medo de ficar só.

No meu Carnaval desfeito
deixaste apenas um traço:
Hoje, bate no meu peito
um guizo do teu "palhaço".

Pedra a pedra vou erguendo
meu castelo de esperança...
Pobre sonho vai morrendo
como um sonho de criança.

Após cruentas batalhas,
quantas lágrimas fluíram,
umedecendo medalhas
de bravos que nunca as viram.

Com teu jeito assim brejeiro
de sinfonia concreta,
és o melhor travesseiro
para os sonhos de um poeta.

Vejo, perdido de amores,
por entre incertos meandros,
encantos enganadores
em teus olhinhos malandros.

Sem amor, no torvelinho
de uma vida envolta em bruma,
de que me serve um caminho,
se não vou a parte alguma?

Quanto mais a vida passa,
mais rendo graças a Deus,
porque meus olhos sem graça
vivem da graça dos teus.

Não tenho lei nem vontade...
Discordarmos, para que?
Você é minha verdade...
Meu evangelho é você!

Espadachim, bossa nova,
com ares de trovador,
eu abro com minha trova
meu caminho ao teu amor.

Nesta incrível cabra-cega
não me adianta, ser ladino;
afinal sempre me pega
o chicote do destino.

Parte o navio... O apito
ecoa por todo o cais...
E na lágrima, que evito,
o medo de um "nunca mais".

Se as mulheres são tesouro
que os deuses deram à gente,
as que têm cabelos de ouro
valerão mais, certamente.

Rompe o sol pela janela
e meus olhos aturdidos
brindam à luz que revela
o teu corpo aos meus sentidos.

Na saudade que me arrasa,
como doridos harpejos,
ecoam na velha casa
acordes de antigos beijos...

Rosa negra, maculada,
por mãos estranhas colhida...
Sorris à beira da estrada,
chorando à beira da vida...

A vida... Que vale a vida?
Ela talvez nem me importe...
Pobre ampulheta invertida
nas mãos do Tempo e da Morte.

Para a incerteza do mar
a velha jangada avança...
E a esperança de voltar
fica, às vezes, na esperança...

Perdôa, mãe, porque sou
do teu desejo o contraste...
A vida não me ajudou
no sonho bom que sonhaste.
===============

Fonte:
UBT Juiz de Fora

Nenhum comentário: