terça-feira, 2 de agosto de 2016

Pedro Du Bois (Poemas Escolhidos)

Pedro é de Balneário Camboriú/SC
FORÇA E PODER

Na força
o desprezo
pelo arco em aliança

tenho no poder
a força que utilizo
em proveito

aproveito o esplendor
e me destaco perante
inimigos baratos e frágeis

no desprezo
a força do arco
sem aliança

a vista turva o alcance
do poder transferido em pedaços.

ABARCAR

         Abarco o todo
         em naufrágios
         menores de riachos
                             veios d'água
                             inundam imagens
                               (submersas)

- falamos sobre camisas, calças e roupas
  de baixo: que sustentam camisas
  e calças -

           a revista imagem
           sobre a pedra polida
           em acolhidos abraços.

NADA

O início
da temporada
     encerra
     a expectativa
     de que o ciclo
                 se renove
                  na permanência
                       da temporada
                       que conhecemos
                                           nova.

A novidade nos desconforta
em haveres desconhecidos

até
termos certeza
de que o início
continua o nada.

TEMPOS

Sufoco a vontade
afogada em prantos
disfarço a hora
                 partida

apátrida reconheço no espaço
a companheira: não me instalo.

afogo minha vontade
disfarçada no silêncio
sufocado da espera.
 
RECUAR

Recuo: a canção amadora
ressoa em vão

onde o som definido
na canção?

Canção da terra amarrada
em giros: a queda do anjo
sobre o prédio iluminado

receio não encontrar a terra prometida
ao profeta. Na insolação do corpo
revejo arestas ásperas
e do prédio menor
despenco lembranças.
 
AMANHÃS

Chamado não me apresento
ausente me faço distante
no amanhã repetido

inconsciente o preso se dirige
ao murmúrio inaudível:

escolho a pílula com que deito
e sonho silêncios
irrefletidos
dos amanhãs
nauseabundos
das canções: ofuscadas
clareiras dormentes
nos adormecimentos.

NATURAL

Na natureza decomposta
a dor exposta
em espécies
abatidas
cortadas
decepadas
depenadas
destocadas na força dos tratores
matrizes dos progressos: o homem
traz na aproximação a visão incolor do lucro
e a subsistência dos excluídos se defronta
com a terra ressecada após as passagens
a recomposição do solo exala
a acidez perpetrada
nos tempos desnecessários
das farturas: o homem
esquece o inconsentido passado
em projetos futuros inexequíveis
onde se debatem mortes
e avanços ao fim do mundo.

EFÊMEROS

A preocupação
decorre da memória
esmaecida no passar das horas
em que somos repostos
repetidos
recuperados
e apagados
nas lembranças

os que ficam para depois
devem se preocupar
com os deuses

retirantes iniciais
da efemeridade.

FOGO

Repetição do fogo: labareda e chama
                                ao encontro da terra.

Sobre a grama ressecada crepita:
decrépito senhor do fogo.

Queima o horizonte poente
e se desdobra em cores: repete o fogo
e derrete a terra. Calcina o corpo.

ESPERAR

o prédio inacabado, a estrada bloqueada,
o tempo encoberto: a espera reduz
                                     a vida
                                     ao mistério.

Ansiar o momento aventurado
e se realizar no átimo
da conquista.

Rever o terreno descoberto, o caminho
desbravado, o espaço brilhante das manhãs
de inverno. A luminosidade destaca
a contrariedade com que faz da espera
o toque de saudade.

CHAMAS

Candelabros acesos
janela aberta à noite: estranhos sentimentos
cruzando espaços. Na terra úmida a estrada
se desfaz em passos. A chama trêmula
se oferece ao vento. O ar se rarefaz
consumido pelo fogo. Fechada a janela
oferece a paisagem interior.

  AVISTAR
 

                  Avisto a terra
                             a mata
                             a tênue rede de fumaça

                                  longe o barulho
                                  multiplica a vida

(estou dentro do corpo,
tenso no desencontro. Estou
presente em mim mesmo).

QUEDAR

Assumo a responsabilidade
pela queda: os degraus
                       dobrados
                           aos pés
                              tropeçando.

O vento colocando o corpo
em descompasso

                           (dias concretados
                            em altares)

caio na leveza do traço
e invado a página; desço
os degraus e abaixo
reencontro o todo.

VISTAS

A estrada
   automóveis
   caminhões

morro recortado

no barulho da obra a nova
casa desconstruída no que contém
da paisagem

(Revisito os passos do homem
 na caminhada: não habitualidade).

DÚVIDAS

Dúvida anteposta em verdades.
O rumor do elevado momento
na concretização do nada: mal feito
                                           malfeitor.

Benefício e dúvida. A ordem artificializa
mundos inconstantes. Verdades ignoradas
em discursos. A mentira instila a dúvida
no descompasso.

PASSOS

Falo de passos cadenciados
na dança. Dos pares.
                 Digo do peso
                 das botas
                 desfilando
                 forças.

Evito a leveza em sapatilhas
de pés deformados na graça
entranhada em dores e saltos.

                  Conservo a imagem
                  singela da mulher
                  se fazendo eterna:
                              o descompasso
                              como tema.

Nenhum comentário: