quinta-feira, 28 de julho de 2022

Machado de Assis (Viagem à roda de mim mesmo)

CAPÍTULO I

Quando abri os olhos, era perto de nove horas da manhã. Tinha sonhado que o sol, trajando calção e meia de seda, fazia-me grandes barretadas, bradando-me que era tempo, que me levantasse, que fosse ter com Henriqueta e lhe dissesse tudo o que trazia no coração. Já lá vão vinte e um anos! Era em 1864, fins de novembro. Contava eu então vinte e cinco anos de idade, menos dois que ela. Henriqueta enviuvara em 1862, e, segundo toda a gente afirmava, jurara a si mesma não passar a segundas núpcias. Eu, que chegara da província no meado de julho, bacharel em folha, vi-a poucas semanas depois, e fiquei logo ardendo por ela.

Tinha o plano feito de desposá-la, tão certo como três e dois serem cinco. Não se imagina a minha confiança no futuro. Viera recomendado a um dos ministros do gabinete Furtado, para algum lugar de magistrado no interior, e fui bem recebido por ele. Mas a água da Carioca embriagou-me logo aos primeiros goles, de tal maneira que resolvi não sair mais da capital. Encostei-me à janela da vida, com os olhos no rio que corria embaixo, o rio do tempo, não só para contemplar o curso perene das águas, como à espera de ver apontar do lado de cima ou de baixo a galera de ouro e sândalo e velas de seda, que devia levar-me a certa ilha encantada e eterna. Era o que me dizia o coração.

A galera veio, chamava-se Henriqueta, e no meio das opiniões que dividiam a capital, todos estavam de acordo em que era a senhora mais bonita daquele ano. Tinha o único defeito de não querer casar outra vez; mas isto mesmo era antes um pico, dava maior preço à vitória, que eu não deixaria de obter, custasse o que custasse, e não custaria nada.

Já por esse tempo abrira banca de advogado, com outro, e morava em uma casa de pensão. Durante a sessão legislativa, ia à Câmara dos Deputados, onde, enquanto me não davam uma pasta de ministro, coisa que sempre reputei certa, iam-me distribuindo notícias e apertos de mão. Ganhava pouco, mas não gastava muito; as minhas grandes despesas eram todas imaginativas. O reino dos sonhos era a minha casa da moeda.

Que Henriqueta estivesse disposta a romper comigo o juramento de viúva, não ouso afirmá-lo; mas creio que me tivesse certa inclinação, que achasse em mim alguma coisa diversa dos demais pretendentes, diluídos na mesma água de salão. Viu em mim o gênero singelo e estático. Para empregar uma figura, que serve a pintar a nossa situação respectiva, era uma estrela que se deu ao incômodo de descer até à beira do telhado. Bastava-me trepar ao telhado e trazê-la para dentro; mas era justamente o que não acabava de fazer, esperando que ela descesse por seu pé ao peitoril da minha janela. Orgulho? Não, não; acanhamento, acanhamento e apatia. Cheguei ao ponto de crer que era aquele o costume de todos os astros. Ao menos, o sol não hesitou em fazê-lo naquela célebre manhã. Depois de aparecer-me, como digo, de calção e meia, despiu a roupa, e entrou-me pelo quarto com os raios nus e crus, raios de novembro, transpirando a verão. Entrou por todas as frestas, cantando festivamente a mesma litania do sonho: "Eia, Plácido! acorda! abre-lhe o coração! levanta-te! levanta-te!"

Levantei-me resoluto, almocei e fui para o escritório. No escritório, seja dito em honra do amor, não minutei nada, arrazoado ou petição, minutei de cabeça um plano de vida nova e magnífica, e, como tivesse a pena na mão, parecia estar escrevendo, mas na realidade o que fazia eram narizes, cabeças de porco, frases latinas, jurídicas ou literárias. Pouco antes das três retirei-me e fui à casa de Henriqueta.

Henriqueta estava só. Pode ser que então pensasse em mim, e até que tivesse ideia de negar-se; mas neste caso foi o orgulho que deu passaporte ao desejo; recusar-me era ter medo, mandou-me entrar. Certo é que lhe achei uns olhos gelados; o sangue é que talvez não o estivesse tanto, porque vi sinal dele nas maçãs do rosto.

Entrei comovido. Não era a primeira vez que nos achávamos a sós, era a segunda; mas a resolução que levava, agravou as minhas condições. Quando havia gente — naquela ou noutra casa, — cabia-me o grande recurso, se não conversávamos, de ficar a olhar para ela, fixo, de longe, em lugar onde os seus olhos davam sempre comigo. Agora, porém, éramos sós. Henriqueta recebeu-me muito bem; disse-me estendendo a mão:

— Pensei que me deixasse ir para Petrópolis sem ver-me.

Balbuciei uma desculpa. Na verdade o calor estava apertando, e era tempo de subir. Quando subia? Respondeu-me que no dia 20 ou 21 de dezembro, e, a pedido meu, descreveu-me a cidade. Ouvi-a, disse-lhe também alguma coisa, perguntei se ia a certo baile do Engenho Velho; depois veio mais isto e mais aquilo. O que eu mais temia, eram as pausas; ficava sem saber onde poria os olhos, e se era eu que reatava a conversação, fazia-o sempre com estrépito, dando relevo a pequenas coisas estranhas e ridículas, como para fazer crer que não estivera pensando nela. Henriqueta às vezes tinha-me um ar enjoado; outras, falava com interesse. Eu, certo da vitória, pensava em ferir a batalha, principalmente quando ela parecia expansiva; mas, não me atrevia a marchar. Os minutos voavam; bateram quatro horas, depois quatro e meia.

"Vamos, disse comigo, agora ou nunca".

Olhei para ela, ela olhava para mim; logo depois, ou casualmente, ou porque receasse que eu lhe ia dizer alguma coisa e não quisesse escutar-me, falou-me de não sei que anedota do dia. Abençoada anedota! âncora dos anjos! Agarrei-me a ela, contente de escapar à minha própria vontade. Que era mesmo? Lá vai; não me recordo o que era; lembro-me que a contei com todas as variantes, que a analisei, que a corrigi pacientemente, até às cinco horas da tarde, que foi quando saí de lá, aborrecido, irritado, desconsolado...

CAPÍTULO II

Cranz, citado por Tylor, achou entre os groenlandeses a opinião de que há no homem duas pessoas iguais, que se separam às vezes, como acontece durante o sono, em que uma dorme e a outra sai a caçar e passear. Thompson e outros, apontados em Spencer, afirmam ter encontrado a mesma opinião entre vários povos e raças diversas. O testemunho egípcio (antigo), segundo Maspero, é mais complicado; criam os egípcios que há no homem, além de várias almas espirituais, uma totalmente física, reprodução das feições e dos contornos do corpo, um perfeito fac-símile.

Não quero vir aos testemunhos da nossa língua e tradições, notarei apenas dois: o milagre de Santo Antônio, que, estando a pregar, interrompeu o sermão, e, sem deixar o púlpito, foi a outra cidade salvar o pai da forca, e aqueles maviosos versos de Camões:

Entre mim mesmo e mim
Não sei que se levantou,
Que tão meu inimigo sou.

Que tais versos estejam aqui no sentido figurado, é possível; mas não há prova de não estarem no sentido natural, e que mim e mim mesmo não fossem realmente duas pessoas iguais, tangíveis, visíveis, uma encarando a outra.

 Pela minha parte, alucinação ou realidade, aconteceu-me em criança um caso desses. Tinha ido ao quintal de um vizinho tirar umas frutas; meu pai ralhou comigo, e, de noite, na cama, dormindo ou acordado — creio antes que acordado, — vi diante de mim a minha própria figura, que me censurava duramente. Durante alguns dias andei aterrado, e só muito tarde chegava a conciliar o sono; tudo eram medos. Medos de criança, é verdade, impressões vivas e passageiras. Dois meses depois, levado pelos mesmos rapazes, sócios na primeira aventura, senti a alma picada das mesmas esporas, e fui outra vez às mesmas frutas vizinhas.

Tudo isso acudia-me à memória, quando saí da casa de Henriqueta, descompondo-me, com um grande desejo de quebrar a minha própria cara. Senti-me dois, um que arguia, outro que se desculpava. Nomes que eu nem admito que andem na cabeça de outras pessoas a meu respeito, foram então ditos e ouvidos, sem maior indignação, na rua e ao jantar. De noite, para distrair-me, fui ao teatro; mas nos intervalos o duelo era o mesmo, um pouco menos furioso. No fim da noite, estava reconciliado comigo, mediante a obrigação que tomei de não deixar Henriqueta ir para Petrópolis, sem declarar-lhe tudo. Casar com ela ou voltar à província.

"Sim, disse a mim mesmo; ela há de pagar-me o que me fez fazer ao Veiga".

Veiga era um deputado que morava com outros três na casa de pensão, e de todos os da legislatura foi o que se me mostrou particularmente amigo. Estava na oposição, mas prometia que, tão depressa caísse o ministério, faria por mim alguma coisa. Um dia prestou-me generosamente um grande obséquio. Sabendo que eu andava atrapalhado com certa dívida, mandou-a pagar por portas travessas. Fui ter com ele, logo que descobri a origem do favor, agradeci-lho com lágrimas nos olhos, ele meteu o caso à bulha e acabou dizendo que não me afadigasse em arranjar-lhe o dinheiro; bastava pagar quando ele tivesse de voltar à província, fechadas as câmaras, ou em maio que fosse.

Pouco depois, vi Henriqueta e fiquei logo namorado. Encontramo-nos algumas vezes. Um dia recebi convite para um sarau, em casa de terceira pessoa propícia aos meus desejos, e resolvida a fazer o que pudesse, para ver-nos ligados. Chegou o dia do sarau; mas, de tarde, indo jantar, dei com uma novidade inesperada: Veiga, que na véspera à noite tivera alguma dor de cabeça e calafrios, amanheceu com febre, que se fez violenta para a tarde. Já era muito, mas aqui vai o pior. Os três deputados, amigos dele, tinham de ir a uma reunião política, e haviam combinado que eu ficasse com o doente, e mais um criado, até que eles voltassem, e não seria tarde.

— Você fica, disseram-me; antes da meia-noite estamos de volta.

Tentei balbuciar uma desculpa, mas nem a língua obedeceu à intenção, nem eles ouviriam nada; já me haviam dado as costas. Mandei-os ao diabo, eles e os parlamentos; depois de jantar, fui vestir-me para estar pronto, enfiei um chambre, em vez da casaca, e fui para o quarto do Veiga. Este ardia em febre; mas, chegando eu à cama, viu ele a gravata branca e o colete, e disse-me que não fizesse cerimônias, que não era preciso ficar.

— Não, não vou.

— Vá, doutor; o João fica; eles voltam cedo.

— Voltam às onze horas.

— Onze que sejam. Vá, vá.

Balancei entre ir e ficar. O dever atava-me os pés, o amor abria-me as asas. Olhei durante alguns instantes para o doente, que jazia na cama, com as pálpebras caídas, respirando a custo. Os outros deviam voltar à meia-noite — eu disse onze horas, mas foi meia-noite que eles mesmos declararam — e até lá entregue a um criado...

— Vá, doutor.

— Já tomou o remédio? perguntei.

— A segunda dose é às nove e meia.

Pus-lhe a mão na testa; era uma brasa. Tomei-lhe o pulso; era um galope. Enquanto hesitava ainda, concertei-lhe os lençóis; depois fui arranjar algumas coisas no quarto, e afinal tornei ao doente, para dizer que iria, mas estaria cedo de volta. Abriu apenas metade dos olhos, e respondeu com um gesto; eu apertei-lhe a mão.

— Não há de ser nada, amanhã está bom, disse-lhe saindo.

Corri a vestir a casaca, e fui para a casa onde devia achar a bela Henriqueta. Não a achei ainda, chegou quinze minutos depois.

A noite que passei, foi das melhores daquele tempo. Sensações, borboletas fugitivas que lá ides, pudesse eu recolher-vos todas, e pregar-vos aqui neste papel para recreio das pessoa que me leem! Veriam todas que não as houve nunca mais lindas, nem em tanta cópia, nem tão vivas e lépidas. Henriqueta contava mais de um pretendente, mas não sei se fazia com os outros o que fazia comigo, que era mandar-me um olhar de quando em quando. Amigas dela diziam que a máxima da viúva era que os olhares das mulheres, como as barretadas dos homens, são atos de cortesia, insignificantes; mas atribuí sempre este dito a intriga. Valseou uma só vez, e foi comigo. Pedi-lhe uma quadrilha, recusou-a, dizendo que preferia conversar. O que dissemos, não sei bem; lá se vão vinte e um anos; lembro-me só que falei menos que ela, que a maior parte do tempo deixei-me estar encostado, a ver cair-lhe da boca uma torrente de coisas divinas... Lembrei-me duas vezes do Veiga, mas, de propósito, não consultei o relógio, com medo.

— Você está completamente tonto, disse-me um amigo.

Creio que sorri, ou dei de ombros, fiz qualquer coisa, mas não disse nada, porque era verdade que estava tonto e tontíssimo. Só dei por mim, quando ouvi bater a portinhola do carro de Henriqueta. Os cavalos trotaram logo; eu, que estava à porta, puxei o relógio para ver as horas, eram duas. Tive um calafrio, ao pensar no doente. Corri a buscar a capa, e voei para casa, aflito, receando algum desastre. Andando, não evitava que o perfil de Henriqueta viesse interpor-se entre mim e ele, e uma ideia corrigia outra. Então, sem o sentir, afrouxava o passo, e dava por mim ao pé dela ou aos pés dela.

Cheguei à casa, corri ao quarto do Veiga; achei-o mal. Um dos três deputados velava, enquanto os outros tinham ido tomar algum repouso. Haviam regressado da reunião antes de uma hora, e acharam o enfermo delirante. O criado adormecera. Não sabiam quanto tempo ficara o doente abandonado; tinham mandado chamar o médico.

Ouvi calado e vexado. Fui despir-me para velar o resto da noite. No quarto, a sós comigo, chamei-me ingrato e tolo; deixara um amigo lutando com a doença, para correr atrás de uns belos olhos que podiam esperar. Caí na poltrona; não me dividi fisicamente, como me parecera em criança; mas moralmente desdobrei-me em dois, um que imprecava, outro que gemia. No fim de alguns minutos, fui despir-me e passei ao quarto do enfermo, onde fiquei até de manhã.

Pois bem; não foi ainda isto que me deixou um vinco de ressentimento contra Henriqueta; foi a repetição do caso. Quatro dias depois tive de ir a um jantar, a que ela ia também. Jantar não é baile, disse comigo; vou e volto cedo. Fui e voltei tarde, muito tarde. Um dos deputados disse-me, quando saí, que talvez achasse o colega morto: era a opinião do médico assistente. Redargui vivamente que não: era o sentimento de outros médicos consultados.

Voltei tarde, repito. Não foram os manjares, posto que preciosos, nem os vinhos, dignos de Horácio; foi ela, tão-só ela. Não senti as horas, não senti nada. Quando cheguei à casa era perto de meia-noite. Veiga não morrera, estava salvo de perigo; mas entrei tão envergonhado que simulei uma doença, e meti-me na cama. Dormi tarde, e mal, muito mal.

CAPÍTULO III
 
Agora não devia acontecer-me o mesmo. Vá que, em criança, corresse duas vezes às frutas do vizinho; mas a repetição do caso do Veiga era intolerável, e a deste outro seria ridícula.

Tive ideia de escrever uma carta, longa ou breve, pedindo-lhe a mão. Cheguei a pôr a pena no papel e a começar alguns rascunhos. Vi que era fraqueza e determinei ir em pessoa; pode ser também que esta resolução fosse um sofisma, para escapar às lacunas da carta. Era de noite; marquei o dia seguinte. Saí de casa e andei muito, pensando e imaginando, voltei com as pernas moídas e dormi como um ambicioso.

De manhã, pensei ainda no caso, compus de cabeça a cerimônia do casamento, pomposa e rara, chegando ao ponto de transformar tudo o que estava em volta de mim. Fiz do trivial e desbotado quarto de pensão um rico boudoir, com ela dentro, falando-me da eternidade.

— Plácido!

— Henriqueta!

De noite é que fui à casa dela. Não digo que as horas andaram vagarosíssimas, nesse dia, porque é a regra delas quando as nossas esperanças abotoam. Batalhei de cabeça contra Henriqueta; e assim como por esse tempo, à espera que me fizessem deputado, desempenhei mentalmente um grande papel político, assim também subjuguei a dama, que me entregou toda a sua vida e pessoa. Sobre o jantar, peguei casualmente nos Três Mosqueteiros, li cinco ou seis capítulos que me fizeram bem, e me abarrotaram de ideias petulantes, como outras tantas pedras preciosas em torno deste medalhão central: as mulheres pertencem ao mais atrevido. Respirei afoito, e marchei.

Henriqueta ia sair, mas mandou-me entrar, por alguns instantes. Vestida de preto, sem mantelete ou capa, com o simples busto liso e redondo, e o toucado especial dela, que era uma combinação da moda com a sua própria invenção, não tenho dúvida em dizer que me desvairou.

— Vou à casa de minhas primas, que chegaram de S. Paulo, disse-me ela. Sente-se um pouco. Não foi ontem ao teatro?

Disse-lhe que não, depois emendei que sim, porque era verdade. Agora que a coisa lá vai, penso que não sorriu, mas na ocasião pareceu-me o contrário, e fiquei vexado. Disse-me que não tinha ido ao teatro por estar de enxaqueca, terrível moléstia que me explicou compondo as pulseiras, e corrigindo a posição do relógio na cintura. Reclinada na poltrona, com um início de pé à mostra, parecia pedir alguém ajoelhado; foi a ideia que tive, e que varri da cabeça, por grotesca. Não; bastava-me o olhar e a palavra. Nem sempre o olhar seria bastante, acanhava-se às vezes, outras não sabia onde pousasse; mas a palavra romperia tudo.

Entretanto, Henriqueta ia falando e sorrindo. Umas vezes parecia-me compartir a minha crise moral, e a expressão dos olhos era boa. Outras via-lhe a ponta da orelha do desdém e do enfado. O coração batia-me; tremiam-me os dedos. Evocava as minhas ideias petulantes, e elas vinham todas, mas não desciam ao coração, deixavam-se estar no cérebro, paradas, cochilando...

De repente calamo-nos, não sei se por três, cinco ou dez minutos; lembro-me só, que Henriqueta consultou o relógio; compreendi que era tempo de sair, e pedi-lhe licença. Ela levantou-se logo e estendeu-me a mão. Recebi-a, olhei para ela com a intenção de dizer alguma coisa; mas achei-lhe os olhos tão irados ou tão aborrecidos, não sei bem, lá vão muitos anos...

Saí. Chegando ao saguão, dei com o chapéu um golpe no ar, e chamei-me um nome feio, tão feio que o não ponho aqui. A carruagem estava à porta; fui colocar-me à distância para vê-la entrar. Não esperei muito tempo. Desceu, parou à porta um instante, entrou, e o carro seguiu. Fiquei sem saber de mim, e pus-me a andar. Uma hora depois, ou pouco menos, encontrei um amigo, colega do foro, que ia para casa; fomos andando, mas ao cabo de dez minutos:

— Você está preocupado, disse ele. Que tem?

— Perdi uma causa.

— Não foi pior que a minha. Já lhe contei o inventário do Matos?

Contou-me o inventário do Matos, sem poupar nada, petições, avaliações, embargos, réplicas, tréplicas e a sentença final, uma sentença absurda e iníqua. Eu, enquanto ele falava, ia pensando na bela Henriqueta. Tinha-a perdido pela segunda vez; e então lembrei-me do caso do Veiga, em que os meus planos falharam de igual modo, e o das frutas, em pequeno. Ao pensar nas frutas, pensei também no misterioso desdobramento de mim mesmo, e tive uma alucinação.

Sim, senhor, é verdade; pareceu-me que o colega que ia comigo era a minha mesma pessoa, que me punha as mãos à cara, irritado, e me repetia o impropério do saguão, que não escrevi nem escrevo. Parei assustado, e vi que me enganara. E logo ouvi rir no ar, e levantei a cabeça: eram as estrelas, contempladoras remotas da vida, que se riam dos meus planos e ilusões, com tal força, que cuido arrebentaram os colchetes, enquanto o meu colega ia concluindo furioso o negócio do inventário do Matos:

— ...um escândalo!

Fonte:
Publicado originalmente em Gazeta de Notícias, de 04/10/1885.
Obra Completa, de Machado de Assis, vol. II, Nova Aguilar, Rio de Janeiro, 1994.

quarta-feira, 27 de julho de 2022

Dorothy Jansson Moretti (Album de Trovas) - 11

 

Caldeirão Poético LI


Áurea Pires da Gama
Angra dos Reis/RJ, 1876 – 1949, Rio de Janeiro/RJ

LIBERTA


Não volto mais! Irei por este mundo escuro
em busca de outro amor, de outra afeição mais nobre.
Adeus! Levo somente a lira e a cruz de pobre,
mas Deus me ajudará na estrada do futuro.

Levante-se minha alma e, rútila, desdobre
as asas da esperança. Eu parto... eu me aventuro
no vasto mar da vida. A estrela que procuro
verei brilhar um dia, embora além sossobre!

Porém, se a rosa branca e pulcra de meus sonhos
fanar-se no embrião, e a morte compassiva
finalmente acabar meus dias enfadonhos,

tu não finjas a dor de uma alma sensitiva,
não! Respeita a mudez dos túmulos tristonhos...
Ai! Não finjas à morta o que fingiste à viva!
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Beatrix dos Reis Carvalho
Rio de Janeiro/RJ, ???

CONTRIÇÃO


Meu Deus, eu sei. Eu sei, não merecia
esse bem que me dás em profusão.
Sofrer é justo como a luz do dia,
mas ser feliz é prêmio, é galardão!

Quase me acostumara à tirania
da vida que castiga, sem razão.
E, para mim, o amor como eu queria
era, longe, uma estrela na amplidão.

Não devia existir, e se existisse,
querê-la não passava de tolice,
que as estrelas não vêm à nossa mão...

Meu Deus! Puseste a estrela em meu caminho!
Por esse amor que é todo o meu carinho,
perdão se duvidei, perdão, perdão!
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Beni Carvalho
Aracati/CE, 1886 – 1959, Rio de Janeiro/RJ

O CAIS


Quando te vejo, velho cais, em ruínas,
perscruto a tua vida secular:
— Manhãs radiosas em que te iluminas!
— Serenas noites de encantado luar!

Viste, partindo, ao canto das matinas,
velhas naus, brancas velas, pelo mar:
— Dourados sonhos, ilusões divinas,
ânsia de descobrir e conquistar!

Hoje, todo em tristeza, te esbarrondas;
mas uma voz oculta, dentre as ondas,
te diz: "A sorte não te foi tão má:

Terás, em ti, esta legenda impressa:
— Recolheste o sorrir do que regressa
e a saudade de quem não voltará".
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Carlyle Martins
Fortaleza/CE, 1899 – 1986

O ENTERRO DO SOL


O sol empalidece entre a seda macia
de um leito de rubis e opalas recamado.
As montanhas, entoando o funeral do dia,
de aromas sem iguais vão perfumando o prado.

Há um pesar pela terra inteira, que dir-se-ia
tudo na escuridão já ficou mergulhado.
Ao longe na ampla várzea enlutada e sombria,
vagaroso  se arrasta, em fileiras, o gado.

Torpor e indecisão. Vai chegando a penumbra.
Nuvens fogem do céu. Nada mais se vislumbra
nas matas onde a treva está quase a envolvê-las.

A noite, como um duende, a estender-se por tudo,
atira sobre a terra um manto de veludo
e desfia, no espaço, um rosário de estrelas.
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Carolina Ramos
Santos/SP

VIAGEM DOLOROSA


Enfrento, combalida, a jornada que assume
dimensões de montanha e nuvens de incerteza.
A dúvida recobre o intransponível cume.
A vida tumultua a própria correnteza.

Rochas por toda a parte... e flores sem perfume!
Por todo o lado a escarpa, o abismo sem beleza!
Por todo o tempo, a noite a se estender sem lume,
tornando negro o verde e o azul da natureza.

Mas, seguirei, ferindo as mãos pelos espinhos.
E seguirei, cortando os pés pelos caminhos,
sem temer empecilho e sem temer fracassos,

se souber que me espera apenas uma rosa!
E esta viagem, por fim, tão triste e dolorosa,
me der repouso e paz, no ninho dos teus braços!

Fonte:
Vasco de Castro Lima. O mundo maravilhoso do soneto. 1987.

Jaqueline Machado (Harry Potter: O menino que sobreviveu)

Triste pensar na falta de sorte de quem nasce diferente, ao lado de criaturas infelizes, amargas, preconceituosas e por isso tudo, bastante más. Pessoas assim, normalmente são tidas como pessoas normais, mas não são, não. Notem que sempre pegam uma pessoa para Cristo. Pois precisam descontar a raiva que os habitam em alguém. E fazem de tudo, tudinho mesmo, para provar que a vítima é a verdadeira culpada de tudo de ruim que acontece em suas porcarias de vidas.

Quem conhece a saga Harry Potter, da autoria de Joanne Rowling, sabe bem do que estou falando. Harry James Potter é filho único de Tiago Potter e Lílian Potter. Ele foi o sobrevivente da maldição do vilão "Lord Voldemort", que tentou matá-lo quando ele ainda era bebê. Seus pais foram mortos pelo bruxo, mas Harry sobreviveu. Em sua inocência de criança, não podia imaginar que por ter sido o primeiro a sobreviver ao ser maligno, já era famoso, e o mundo festejava a sua existência. Órfão, o menino foi deixado por Albus Dumbledore, diretor da Escola de Bruxos, Hogwarts, a qual Harry seria membro mais tarde, pela professora Minerva McGonagall e pelo professor Rúbeo Hagrid, na porta da casa nº4, na rua dos Alfeneiros.

Este era o endereço da família Dursley, que era formada pelo Sr. Dursley, um chato diretor de uma firma chamada Grunnings, que fazia perfurações, pela sua tia materna, Sra. Petúnia, e pelo primo Duda. Os professores os consideravam como sendo o pior tipo de “trouxas”, trouxas eram chamados os que não são "bruxos'', mas eles eram a única família que poderia cuidar do menino. Petúnia, uma mulher de atitudes superficiais, que vivia bisbilhotando e fofocando sobre o comportamento da vizinhança, se envergonha da sua irmã, pois a considerava estranha, diferente dos outros familiares e despreza o pobre Harry, que cresceu sofrendo todo tipo privações, inclusive, a pior de todas, a falta de amor.

Harry dormia dentro de um armário, que ficava debaixo da escada que dava para o segundo andar da casa e, ao contrário do primo que tinha todas as suas vontades feitas, não ganhava festa de aniversário, nem presentes. Vestia as roupas velhas do primo, que ficavam largas, já que Harry era um garoto franzino, e o seu primo, era muito gordo. Ele também usava óculos remendados e tinha de ajudar os tios em alguns afazeres de casa. Harry também apanhava do primo Duda. Apesar de toda humilhação, os Dursley se achavam perfeitos e grandiosos por cuidarem do sobrinho órfão.

Aos onze anos, Harry fica sabendo que é um mago branco, através do guarda florestal de "Hogwarts", que o levou para morar na casa "Grifinória" - uma das quatro casas na época da inauguração da Escola dos Bruxos. Lá, ele recebe a oportunidade de ter um novo lar, faz boas amizades e descobre que a sua vida nunca será fácil, pois tem como missão, derrotar "Lord Voldemort", que em verdade, representa a ira, a dor, a inveja e a infelicidade, que neste mundo em que vivemos reina sem se cansar de perseguir quem nasce para fazer o bem. Pois, quem nasce para fazer o bem, sempre é considerado um ser estranho, a quem muitos, por motivos diferentes, passam temer…

Fonte:
Texto enviado pela autora.

terça-feira, 26 de julho de 2022

Filemon Martins (Meu Pé de Jabuticaba)

Alguns amigos já conhecem essa história, mas resolvi registrar aqui porque é possível que outras pessoas tenham também passado pela decepção que passei.

Tudo começou em 2008 quando transferi minha residência de São Paulo para Itanhaém, litoral sul de São Paulo. Um amigo Flávio Mendonça já morava por lá desde 1996 e eu chegando lá vi que o quintal no fundo da casa era relativamente grande possibilitando o plantio de algumas floreiras e até árvores frutíferas, embora estivesse todo concretado. Fiz isso, plantei algumas flores, carambola, laranja e quis plantar um pé de jabuticaba. Convidei o amigo Flávio Mendonça e saímos atrás de uma muda de jabuticaba. No Balneário de Gaivotas entramos numa floricultura e achamos o pé de jabuticaba. Foi-nos informado de que se tratava de jabuticaba, tiramos dúvidas, conversamos, pagamos e levamos pra casa o objeto desejado.

Escolhemos o local e o amigo Flávio me ajudou a plantar o pé de jabuticaba. Ciente de que deveria regar diariamente, obedeci religiosamente. E aos poucos ela foi crescendo. E os anos também foram passando e quando eu comentava com alguém mais chegado que ela estava demorando dar frutos, ouvia sempre a mesma explicação. É assim mesmo, mas quando começar a frutificar, você vai ver. Apesar de o quintal estar todo concretado, minha neta Nicole plantou numa das floreiras, algumas sementes de melancia. E ela cuidava muito bem daquele pé de melancia. E nós também ajudamos nessa tarefa. E não é que tivemos melancias e tomates em cima daquele concreto?

Enquanto isso eu procurava todos os dias encontrar um fruto de jabuticaba naquele pé tão bem cuidado e nada. Tal como na passagem bíblica, onde "Jacó serviu sete anos como pastor a Labão, mas não servia ao pai, servia a Raquel, que ele amava e pretendia". Também eu me dedicava àquela jabuticabeira, já passava dos sete anos, até que, num certo dia contratei um jardineiro experiente para podar minhas plantas e lhe disse quando o Sr. terminar aqui na frente, lá atrás tem algumas plantas e árvores que precisam ser podadas, mas dê uma atenção especial à minha jabuticabeira e fui com ele até o fundo da casa para não haver dúvidas. Uma vez lá no fundo da casa, ele iniciou a poda e limpeza das plantas.

Em certo momento já próximo à jabuticabeira, ele me chamou Sr. Filemon, sua jabuticabeira é essa daqui? Respondi que sim. Ele, então, olhando para mim, disse: "O Sr. vai morrer sem conseguir colher uma jabuticaba daqui".

Fiquei atordoado e perguntei: estou tão mal assim? Ele percebeu o embaraço e foi logo dizendo não, não é isso. O problema é que essa árvore parece jabuticabeira, mas não é. Nunca foi. É muito comum essa confusão. É uma falsa jabuticabeira e disse o nome da árvore, que não me lembro. Contei a história para o meu amigo Flávio, que sugeriu, vamos arrancar e voltar lá para reclamar. Retruquei mas depois de quase 8 anos não vamos brigar. É possível que o moço da floricultura também tenha sido enganado. E foi assim que fiquei sem o meu pé de jabuticaba.

Um projeto para a construção de uma piscina se encarregou de tirar a árvore de lá. Mas um amigo de São Paulo, o Aparecido Donelli não me deixa esquecer do episódio. De quando em quando ele me manda fotos da jabuticabeira dele carregada de frutos. Acho que ele anda me provocando ou então me convidando para conhecer a jabuticabeira dele.

Fonte:
Filemon Martins. Caminhos do Jordão da Bahia. SP: RG Editores, 2022.
Livro enviado pelo autor.

Nei Garcez (O Paraná em Trovas)

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Curitiba em Trovas
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Conheça nossa cidade,
seus shoppings, parques e praças,
e em Santa Felicidade,
6ons vinhos, frangos e massas.
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Venha fazer um passeio
na Curitiba sorriso.
Seus parques, sempre em recreio,
são formas de paraíso.
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Curitiba hoje o convida,
entre o sol, ou com respingos,
conhecer a mais comprida
feira-livre dos domingos.
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Se você é enclausurado
por ouvir só dissabores,
deixe a tristeza de lado...
Venha pra Rua das Flores!
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Quando a vontade é viajar,
acompanhado, ou sozinho,
nunca fique a divagar...
Curitiba é um bom caminho!
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Da Curitiba de dantes
Saint Hilaire* deixou a ideia
de que, aqui, tinha habitantes
com tradição europeia.
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Todas as vinte e oito etnias
que imigraram para cá,
trouxeram intenções sadias
dando vida ao Paraná.
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O Paraná cresceu tanto
com os povos que acolheu
e, hoje, agradece este encanto
que cada etnia lhe deu.
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Curitiba de outrora,
pela cultura formada,
mostra, ao seu jovem de agora,
que continua ilustrada.
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Curitiba, tanta graça,
entre a prosa e a poesia
quanto mais o tempo passa
és, das Letras, a magia!

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Paranaguá em Trovas
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Desde o seu descobrimento,
o Brasil Colonial
principiou seu crescimento
a partir do litoral.
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Quem conhece a geografia
e as memórias de onde está,
sabe que aqui principia
a História do Paraná!
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Ao formar-se a povoação,
erigiu-se um santuário
- a Capela - em devoção
à Senhora do Rosário…
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Isto tudo começou
em meio a mil e seiscentos,
quando Lara** anunciou
muito ouro, aos quatro ventos!
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A corrida pelo ouro
descobriu Paranaguá
que, encontrando este tesouro,
desbravou o Paraná!
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A Província e sua História,
desmembrando o Paraná,
principiou, com grande glória,
dentro de Paranaguá!
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* Nascido em Orleans, o botânico, naturalista francês Augustin François César Prouvençal de Saint-Hilaire (1779 – 1853) chegou ao Brasil em 1816, acompanhando a missão do Duque de Luxemburgo. Na visita que fez  pela região em 1820, o botânico conta em seu livro aspectos dos Campos Gerais; as vilas e fazendas da região; costumes indígenas e aspectos físicos. Ele começou sua viagem em Itararé e passou por Castro, Curitiba, Paranaguá e Guaratuba, até continuar sua missão por Santa Catarina.

** Gabriel de Lara foi um sertanista paulista, natural de Santana do Parnaíba, no atual estado de São Paulo, e que fundou arraiais e vilas no sul do Brasil, sendo as principais Paranaguá e Curitiba.


Fonte:
Trovas em marcadores de livros enviados pelo trovador.

Aparecido Raimundo de Souza (Coriscando) 24: Por quem os sinos nunca deixaram de dobrar?!

Efetivamente, por nós. Faz muito tempo, eu diria, sem medo de errar, faz muito tempo que a coisa vem de remotos espaços que eu consideraria límbicos. Apesar desses abruptos extensos cercados de densas lacunares, você mora nos meus sonhos. Desde pequena você povoa meu universo de quimeras e devaneios. É como se a vida toda eu já soubesse de sua existência, sem você sequer existir dentro de mim. Junto com a minha vida, você veio e se concretizou como um presente caído do céu.

Uma prenda, eu diria sem medo de errar, um brinde de cunho valoroso com o qual eu sonhei a vida toda e nunca chegou, de verdade, às minhas mãos.  O meu querer, a minha aflição foi tão forte, tão intensa, que você acabou se materializando e caindo diretamente no meu caminho. Hoje, anos depois, que ironia! Somos adultos, temos vida própria, vivemos na mesma avenida e mesmo bairro... compramos no mesmo supermercado e quando temos alguma indisposição, a farmácia logo ali na esquina nos recebe de portas abertas.

Apesar de morarmos no mesmo prédio, dividimos a mesma portaria, vizinhos, cachorros, gatos, faxineiros, porteiros, elevadores, e quando falta luz, as mesmas escadas que nos levam ou nos trazem do topo, nos permitem descer ou subir usando os mesmos degraus e corrimões. Só o que não coincide é o andar. Uma gota no oceano, se visto pela lógica do espanto anunciado. Estou no décimo oitavo e você no décimo quinto.

Apesar desse pequeno deslize do destino, tivemos sorte. Numa dessas idas e vindas, nos esbarramos no hall de entrada. Você vinha cheia de sacolas de supermercado, e eu, as mãos sobrecarregadas de livros. A força do seu coração quando nos reencontramos, ficou marcada. Foi tão forte a emoção, tão densa a alegria, magnânimo o encantamento, enfim, tão robusta e eficaz, tão inexplicável, que ficamos estupefatos, como o doce enlevo que nos brindou, aproveitando a deixa e fez o caminho inverso, incendiando os recônditos da alma de uma maneira quase inexplicável.

Aproveitando a deixa, e fazendo o caminho inverso, incendiando os recônditos das nossas almas de uma maneira quase inexplicável, o “Acaso”. Por esse “Acaso”, os sinos nunca deixaram de reverberarem, incansáveis, em busca de nosso amor apartado. Nesse breve lapso, me senti na esteira dos vinte e cinco anos. Você e eu, cada um acondicionado dentro de um desses carrinhos de bate-bate, nos idos em que cursávamos a mesma faculdade e fugíamos das aulas chatas para comermos pipocas e tomarmos refrigerantes no parque que chegara recentemente à cidade.

Lembro que você ao me ver no saguão da porta do edifício, se abriu como mala velha, agigantou um sorriso largo, se faceirou, angelical e, ao mesmo tempo tão adulta, tão mulher... que num piscar de olhos seguinte ao reencontro, me flagrei ressuscitando pensamentos pretéritos e os colocando no ápice da sua magnificência. Você me superou. Foi além das expectativas. Se fez tão linda e carente, frágil e dócil que por breves quimeras fantasiosas imaginei, em delírio, houvesse saído do plano terrestre e ido parar em um planeta paralelo onde as eternidades se fazem plenas e intangíveis.

Sua voz, ao me reconhecer —, cedeu vez a um abalado grito clamoroso de acordar ilusões, e, acredite, todo meu ser se derramou auspicioso despertando em festa, de susto e espanto. Senti-me remoçado, como se vindo de uma academia de ginástica, os movimentos obtidos nos aparelhos, me devolvendo a flexibilidade de antes, tipo aquela força hercúlea de retorno, se engajando ao espírito e não só a ele, ao corpo inteiro, qual com uma febre de quarenta graus. Num segundo momento perdi a morbidez do medo, como um nadador que se atira na água depois de se esbambear hesitante por breves momentos perante um mergulho às escuras, apesar do pulo previamente planejado.

Com você de volta ao meu universo, desde então, cada espaço me preencheu com sua alacridade. Cada olhar, agora, é como se nascesse no meu eu “escondido”, um querer de júbilo etéreo. Mesmo tom, cada “mirada” sua, me permite perceber nitidamente um punhado de estrelas fulgurantes se revezando em pleno por do sol e, transformando as flores murchas do meu ontem esquecido, num imenso jardim, repaginando as nossas afeições imorredouras.

No vestíbulo de nosso prédio, desde aquele dia em que nos reencontramos, que nos reaproximamos, que reassumimos as almas apartadas, a partir daquele sublime minuto em que reatamos o elo que estava disperso, esquecido, adormecido e, além disso, no ensejo exato em que abrimos a passagem secreta para os desvãos possíveis, algo anormal se fez imperioso. Um milagre, eu diria, se condensou em formosuras. As sendas não ocorridas, os vales e as dimensões não percorridas... voltaram do nada, regressaram a todo vapor do agora.

Literalmente fomos atrás, saímos juntos, de mãos dadas, em busca de nosso amor. Tudo em derredor criou beleza e cor. As manhãs escuras afloraram engrinaldadas. Virou pura magia o nosso anfêmero. Não somos mais velhas lembranças adormecidas, figuras de filmes antigos, personagens de nossas dores e tristezas. Deixamos lá fora, na calçada, as fotografias amarelas, os papéis pálidos no palco onde nosso romance se tornou uma peça de final feliz. E o vento levou embora. Para bem longe, tão distante que não nos alcançará jamais.

Bem sabemos, conhecemos a realidade que a cada porvir se apressura mais forte e pujante. Na mesma linha benigna e complacente, um não sei o que de mavioso se avigorou e rejuvenesceu, rebrotou mais cálido e indestrutível dentro do nosso (ou melhor dizendo), dentro do acorrentado, no intrínseco daquilo que juntos, rostos colados, corpos em regozijo de transe, almas cativas ardendo em festa, corações tresloucados batendo na mesma pulsação, chamamos de ventura, bambúrrio, empolgação desmedida e, igualmente, de indubitável jocosidade.

Entre altos e baixos, subidas e descidas, línguas ferinas fustigando contra pessoas, a favor, outras não, chuvas e ventos, sol e escuridão... todas as intempéries, somadas a outros inumeráveis e infinitos repletados de intuitos maléficos, estamos superando, vencendo, dando a volta por cima. De todas as ciladas e insídias, saímos ilesos e vivos. Logramos viver presentemente, amarrados nos laços inquebrantáveis e indescritíveis da paz. Irmanados a ela, gozamos, a dois, do magnetismo surreal e contínuo da auspiciosa e sempre presente, FELICIDADE.

Fonte:
Texto enviado pelo autor.

domingo, 24 de julho de 2022

A. A. de Assis (Jardim de Trovas) 10

 

Contos e Lendas do Paraná - 11 (Antonio Olinto – Arapoti – Piraí do Sul)


Município de Antonio Olinto

O CAIXÃO

Em um rio de Antonio Olinto há um caixão, todo feito de cimento, que vaga pelas águas; poucas pessoas conseguiram vê-lo, pois ele aparece às vezes. Dizem que um dia, quando um homem estava pescando viu o tal caixão. O pescador, que sempre levava uma arma, naquele dia já a havia utilizado para atirar em uma pomba na beira do rio; mas quando ele foi pegá-la só havia penas e o misterioso caixão. Assustado, foi contar para os amigos e vizinhos que logo foram ver no local o caixão.

Ao chegarem no local, nada havia; desapareceu o misterioso caixão. Contam, também, que para retirar esse caixão da água é preciso que se tenha dois bois gêmeos. As pessoas que viram esse caixão já tentaram tirá-lo da água, mas, até hoje, ninguém conseguiu.
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Município de Arapoti
O ESPÍRITO DO CEMITÉRIO

Há anos atrás ocorreu um fato no cemitério da cidade. Alguns jovens, em uma brincadeira de mau gosto, apostavam quem pegava mais cruzes, brincadeira esta que era muito comum naquela época. Certo dia, uma moça muito bonita faleceu por causa não relatada, deixando um clima sombrio no local. Ao chegar o dia de finados, mais ou menos duas semanas depois do acontecimento, um rapaz senta-se sobre um túmulo e repara em uma bela garota ao seu lado. Inicia-se a conversa entre os dois que acaba repentinamente quando ele revela que roubava cruzes. Ela o desafia a roubar uma cruz naquela noite, a sua própria. Ela entrega-lhe uma rosa e desaparece no meio de outras pessoas. Ele guarda a flor dentro do bolso, envolta em um lenço azul.

Naquela noite, para a surpresa dele e de seus amigos, não havia nenhuma lápide e nenhuma cruz; era como se aquele lugar nunca tivesse existido. Ele lembrou-se da rosa. Quando pôs a mão no bolso teve uma terrível surpresa: a rosa transformara-se em um pedaço de osso humano
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Município de Piraí do Sul
O TÚMULO DE MARIA QUEBRA

Já existindo como aglomerado populacional desde o início do século XVII, o então Bairro da Lança manteve até o início do século XX as mesmas características das povoações habitadas por portugueses e seus descendentes, em sua convivência com o índio e o negro. A Proclamação da Independência, a libertação dos escravos, a Proclamação da República ou a Revolução Federalista, ou outro fato nacional, em muito pouco modificaram o dia-a-dia dos habitantes do Bairro da Lança. Localizado às margens do caminho do Viamão a Sorocaba, o pequeno povoado que englobava as localidades de Cercadinho (Campo Comprido), Lança, Silva, Fundão, Machadinho, Furnas (Murtinho), Tabor e Jararaca, assistia à passagem do viajante que demandava São Paulo ao Rio Grande do Sul, ou dos Pampas ao Norte do País.

Por ser o único caminho de ligação com o sul do Brasil, ou acolhia o tropeiro em sua passagem para a feira de Sorocaba, ou na volta aos campos de criação do Sul, sem que as características do seu dia-a-dia fossem modificadas significativamente.

Os mortos eram enterrados com o tradicional cerimonial da época, nos cemitérios existentes nas concentrações mais importantes do bairro como: Campo da Lança, Campo Comprido, Furnas e Fundão e mais recentemente no cemitério da Vila Piraí, localizado no Alto da Rua XV, onde os portugueses, brasileiros, índios ou escravos recebiam sepultura sob as bênçãos da fé cristã, o respeito às Leis, aos costumes e à tradição.

Entre os séculos XIX e XX, residia na rua hoje denominada Julieta Veiga Queiroz, nas imediações da casa de dona Zelinda Miro, uma senhora a quem chamavam “Maria Quebra”. Tinha esse nome em razão do gênio atirado, ou por suas atitudes violentas e rudes, o que era motivo constante de brigas e desentendimentos, o que lhe valeu o apelido.

A passagem para o século XX veio trazer a Piraí do Sul sensíveis modificações em todos os segmentos da vida local, notadamente em seus costumes e hábitos, comércio, sociedade, modificações estas que perduram até o final da Primeira Guerra Mundial. A população local que era constituída essencialmente de descendentes de portugueses, com suas mesclas com o índio e o negro, recebeu o choque da imigração europeia (alemães, poloneses, russos/ucranianos e italianos), bem como um significativo contingente árabe. Novos rumos tomou o aglomerado populacional, com um significativo aumento na construção de casas em novos estilos e o traçado de novas ruas.

O dia-a-dia da Vila Piraí foi modificado sensivelmente, com novos hábitos na vida social, na igreja, no casamento, na comida, na escola, no comércio e na política, conservando até hoje a influência da imigração italiana. Com o aumento da população da sede da Vila, o pequeno cemitério da rua XV (alto), passa a receber os mortos não só da zona urbana, mas também da zona rural, recebendo melhoramentos, bem como túmulos artisticamente construídos.

Maria Quebra, na sua vivência com bebidas e festas e pela vida devassa que levava, contraiu o mal de Hansen, tendo padecido por longos anos desta enfermidade. Em meados do ano de 1917 veio a falecer, preparando-se o seu sepultamento, que seria realizado no cemitério ao alto da rua XV, como era de costume para os moradores da Vila. Sepultamento esse que não foi autorizado, sob a alegação de que Maria Quebra havia morrido de lepra e não poderia ser enterrada junto aos mortos daquele cemitério.

O cemitério mais próximo da Vila era o Campo da Lança, que estava sendo desativado, primeiro pelo novo hábito de se utilizar o cemitério da Vila e, também, porque o local estava infestado de tatus rabo mole, ou testa de ferro; animais que profanavam as sepulturas, levando a que as famílias se negassem a enterrar seus mortos naquele local. O cadáver de Maria Quebra, insepulto, esperava local para seu merecido descanso, tendo em vista a negativa da autorização do uso do cemitério municipal.

Por fim, decidiu-se que ela poderia ser enterrada nas proximidades daquele campo santo, desde que fora dos muros. Assim, Maria Quebra recebeu sepultura ao lado direito da estrada que passa nos fundos do cemitério municipal e vai em direção ao bairro do Bonsucesso. Sua sepultura está a uns 700 metros além dos muros, ao pé de um centenário cedreiro, onde até hoje alguns devotos depositam suas preces e oferendas.

Fonte:
Renato Augusto Carneiro Jr (coordenador). Lendas e Contos Populares do Paraná. Curitiba : Secretaria de Estado da Cultura , 2005.

Cecília Meireles (Antologia Poética) = 8 =

CORPO NO MAR

Água densa do sonho, quem navega?
Contra as auroras, contra as baías:
barca imóvel, estrela cega.

Bate o vento na vela e não a arqueia.
— Não foi por mim!
Partiram-se as cordas, rodaram os mastros,
os remos entraram por dentro da areia...

Os remos torceram-se, e trançaram raízes.
— Inútil forçá-los — alastram-se, fogem
na sombra secreta de eternos países...

Mudou-se a vela em nuvem clara!
Choraram meus olhos, minhas mãos correram...
— Alto e longe! — Não foi por mim...

E apenas para
um corpo na barca vazia,
à mercê das metamorfoses,
olhos vertendo melancolia...

O vento sopra no coração.

Adeus a todos os meridianos!
Deito-me como num caixão.

Ah! sobrevive o mar no meu ouvido...
«Marinheiro! Marinheiro!»

(Ilhas...Pássaros...Portos... — nesse ruído,
— O mar...O mar!...O mar inteiro!...)

Mas é tempo perdido!
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DESCRIÇÃO

Há uma água clara que cai sobre pedras escuras
e que, só pelo som, deixa ver como é fria.

Há uma noite por onde passam grandes estrelas puras.
Há um pensamento esperando que se forme uma alegria.

Há um gesto acorrentado e uma voz sem coragem,
e um amor que não sabe onde é que anda o seu dia.

E a água cai, refletindo estrelas, céu, folhagem...
Cai para sempre!

E duas mãos nela mergulham com tristeza,
deixando um esplendor sobre a sua passagem.

(Porque existe um esplendor e uma inútil beleza
nessas mãos que desenham dentro da água sua viagem
para fora da natureza,

onde não chegará nunca esta água imprecisa,
que nasce e desliza, que nasce e desliza...)
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DIÁLOGO

Minhas palavras são a metade de um diálogo obscuro
continuado através de séculos impossíveis.

Agora compreendo o sentido e a ressonância
que também trazes de tão longe em tua voz.

Nossas perguntas e respostas se reconhecem
como os olhos dentro dos espelhos. Olhos que choraram.

Conversamos dos dois extremos da noite,
como de praias opostas. Mas com uma voz que não se importa...

E um mar de estrelas se balança entre o meu pensamento e o teu.
Mas um mar sem viagens.
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ESTRELA

Quem viu aquele que se inclinou sobre palavras trêmulas,
de relevo partido e de contorno perturbado,
querendo achar lá dentro o rosto que dirige os sonhos,
para ver si era o seu que lhe tivessem arrancado?

Quem foi que o viu passar com sues ímãs insones,
buscando o polo que girava sempre no vento?
— Seus olhos iam nos pés, destruindo todas as raízes líricas,
e em suas mãos sangrava o pensamento.

E era o seu rosto, sim, que estava entre versos andróginos,
preso em círculos de ar, sobre um instante de festa!
Boca fechada sob flores venenosas,
e uma estrela de cinza na testa.

Bem que ele quis chamar pelo seu nome em voz muito alta,
— mas o desejo não foi além do seu pescoço.
E ficou diante de sua cabeça, estruturando-se
como o frio dentro de um poço.

E não pode contar a ninguém seu fim quimérico.
A ninguém. Pois a língua que fora sua estava morta,
e ele era um prisioneiro entre paredes transparentes,
entre paredes transparentes, mas sem porta.

Disto ele soube. O que nunca entendeu, porém, e o que lhe amarra
o coração com ardentes cordas de desgosto
é aquela estrela de cinza — aquela estrela grande e plácida —
derramando sombra em seu rosto.
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NOTURNO

Volto a cabeça para a montanha
e abandono os pés para o mar.
— Coitado de quem está sozinho
e inventa sonhos com que sonhar!

Minhas tranças descem pela casa abaixo,
entram nas paredes, vão te procurar.
Envolvem teu corpo, beijam-te os ouvidos.
— Querido, querido, devias voltar.

Meus braços caminham pelas ruas quietas:
— caminho de rios, fluidez de luar... —
levam minhas mãos por todo o seu corpo:
— Querido, querido, devias voltar.

Partem os meus olhos, parte a minha boca,
Na noite deserta, ninguém vê passar,
pedaço a pedaço, minha vida inteira,
nem na tua casa me escutam chegar.

Meu quarto vazio só pensa que durmo...

Coitado de quem está sozinho
e assiste o seu próprio sonhar!

Fonte:
Cecília Meirelles. Viagem. Lisboa: Império, 1938.

João do Rio (Os tatuadores)

— Quer marcar?

Era um petiz de doze anos talvez. A roupa em frangalhos, os pés nus, as mãos pouco limpas e um certo ar de dignidade na pergunta. O interlocutor, um rapazola louro, com uma dourada carne de adolescente, sentado a uma porta, indagou:

— Por quanto?

— É conforme, continuou o petiz. É inicial ou coroa?

— É um coração!

— Com nome dentro?

O rapaz hesitou. Depois:

— Sim, com nome: Maria Josefina.

— Fica tudo por uns seis mil réis.

Houve um momento em que se discutiu o preço, e o petiz estava inflexível, quando vindo do quiosque da esquina um outro se acercou.

— Ó moço, faço eu; não escute embromações!

— Pagará o que quiser, moço.

O rapazola sorria. Afinal resignou-se, arregaçou a manga da camisa de meia, pondo em relevo a musculatura do braço. O petiz tirou do bolso três agulhas amarradas, um pé de cálix com fuligem e começou o trabalho. Era na Rua Clapp, perto do cais, no século XX... A tatuagem! Será então verdade a frase de Gautier: “o mais bruto homem sente que o ornamento traça uma linha indelével de separação entre ele e o animal, e quando não pode enfeitar as próprias roupas recama a pele”?

A palavra tatuagem é relativamente recente. Toda a gente sabe que foi o navegador Loocks que a introduziu no ocidente, e esse escrevia tattou, termo da Polinésia de tatou ou to tahou, desenho. Muitos dizem mesmo que a palavra surgiu no ruído perceptível da agulha da pele: tac, tac. Mas como é ela antiga! O primeiro homem, decerto, ao perder o pelo, descobriu a tatuagem.

Desde os mais remotos tempos vê-mo-la a transformar-se: distintivo honorífico entre uns homens, ferrete de ignomínia entre outros, meio de assustar o adversário para os bretões, marca de uma classe para selvagens das ilhas Marquesas, vestimenta moralizadora para os íncolas da Oceânia, sinal de amor, de desprezo, de ódio, bárbara tortura do Oriente, baixa usança do Ocidente. Na Nova Zelândia é um enfeite; a Inglaterra universaliza o adorno dos selvagens que colhem o phormium tenax para lhe aumentar a renda, e Eduardo com a âncora e o dragão no braço esquerdo é só por si um problema de psicologia e de atavismo.

Da tatuagem no Rio faz-se o mais variado estudo da crendice. Por ele se reconstrói a vida amorosa e social de toda a classe humilde, a classe dos ganhadores, dos viciados, das fúfias de porta aberta, cuja alegria e cujas dores se desdobram no estreito espaço das alfurjas e das chombergas, cujas tragédias de amor morrem nos cochicholos sem ar, numa praga que se faz de lágrimas. A tatuagem é a inviolabilidade do corpo e a história das paixões. Esses riscos nas peles dos homens e das mulheres dizem as suas aspirações, as suas horas de ócio e a fantasia da sua arte e a crença na eternidade dos sentimentos — são a exteriorização da alma de quem os traz.

Há três casos de tatuagem no Rio, completamente diversos na sua significação moral: os negros, os turcos com o fundo religioso e o bando das meretrizes, dos rufiões e dos humildes, que se marcam por crime ou por ociosidade. Os negros guardam a forma fetiche; além dos golpes sarados com o pó preservativo do mau olhado, usam figuras complicadas. Alguns, como o Romão da Rua do Hospício, têm tatuagens feitas há cerca de vinte anos, que se conservam nítidas, apesar da sua cor — com que se confunde a tinta empregada.

Quase todos os negros têm um crucificado. O feiticeiro Ononenê, morador à Rua do Alcântara, tem do lado esquerdo do peito as armas de Xangô, e Felismina de Oxum a figura complicada da santa d’água doce. Esses negros explicam ingenuamente a razão das tatuagens. Na coroa imperial hesitam, coçam a carapinha e murmuram, num arranco de toda a raça, num arranco mil vezes secular de servilismo inconsciente:

— Eh! Eh! Pedro II não era o dono?

E não se fotografam com um pavor surdo, como se fosse crime usar essas marcas simbólicas.

Os turcos são muçulmanos, maronitas, cismáticos, judeus, e nestas religiões diversas não há gente mais cheia de abusões, de receios, de medos. Nas casas da Rua da Alfândega, Núncio e Senhor dos Passos, existem, sob o soalho, feitiçarias estranhas, e a tatuagem forra a pele dos homens como amuletos. Os maronitas pintam iniciais, corações; os cismáticos têm verdadeiros eikones primitivos nos peitos e nos braços; os outros trazem para o corpo pedaços de paramentos sagrados. É por exemplo muito comum turco com as mãos franjadas de azul, cinco franjas nas costas da mão, correspondendo aos cinco dedos. Essas cinco franjas são a simbolização das franjas da taleth, vestimenta dos Khasan, nas quais está entrançado a fio de ouro o grande nome de Ihaveh.

A outra camada é a mais numerosa, é toda a classe baixa do Rio — os vendedores ambulantes, os operários, os soldados, os criminosos, os rufiões, as meretrizes. Para marcar tanta gente a tatuagem tornou-se uma indústria com chefes, subchefes e praticantes. Quase sempre as primeiras lições vieram das horas de inatividade na cadeia, na penitenciária e nos quartéis; mas eu contei só na Rua Barão de São Félix, perto do Arsenal de Marinha, e nas ruelas da Saúde, cerca de trinta marcadores. Há pequenos de dez, doze anos, que saem de manhã para o trabalho, encontram os carregadores, os doceiros sentados nos portais.

— Quer marcar? perguntam; e tiram logo do bolso um vidro de tinta e três agulhas.

Muitos portugueses, cujos braços musculosos guardam coroas da sua terra e o seu nome por extenso, deixaram-se marcar porque não tinham que fazer.

— Que quer vossa senhoria? O pequeno estava a arreliar. Marca, moço, marca! E tanto pediu que pôs pra aí os risquinhos.

Os pequenos, os outros marcadores ambulantes, têm um chefe, o Madruga, que só no mês de abril deste ano fez trezentas e dezenove marcações. Madruga é o exemplo da versatilidade e da significação miriônima da tatuagem. Tem estado na cadeia várias vezes por questões e barulhos, vive nas Ruas da Conceição e São Jorge, tem amantes, compõe modinhas satíricas e é poeta. É dele este primor, que julga verso:

Venha quanto antes D. Elisa
Enquanto o Chico Passos não atiça
Fogo na cidade...

Homem tão interessante guarda no corpo a síntese dos emblemas das marcações — um Cristo no peito, uma cobra na perna, o signo de Salomão, as cinco chagas, a sereia, e no braço esquerdo o campo das próprias conquistas. Esse braço é o prolongamento ideográfico onde a quiromancia vê as batalhas do amor. Quando a mulher lhe desagrada e acaba com a chelpa, Madruga emprega leite de mulher e sal de azedas, fura de novo a pele, fica com o braço inchado, mas arranca de lá a cor do nome.

Enquanto andou a fornecer-me o seu profundo saber, Madruga teve três dessas senhoras — a Jandira, a Josefa e a Maria. A primeira a figurar debaixo de um coração foi a Jandira. Um belo dia a Jandira desaparecia, dando lugar à Josefa, que triunfava em cima, entre as chamas. Um mês depois a letra J sumira-se e um M dominava no meio do coração.

Os marcadores têm uma tabela especial, o preço fixo do trabalho. As cinco chagas custam 1.000$, uma rosa 2.000$, o signo de Salomão,o mais comum e o menos compreendido porque nem um só dos que interroguei o soube explicar, 3.000$, as armas da Monarquia e da República 6$ a 8$, e há Cristos para todos os preços.

Os tatuadores têm várias maneiras de tatuar: por picadas, incisão, por queimadura subepidérmica. As conhecidas entre nós são incisivas nos negros que trouxeram a tradição da África e, principalmente, as por picadas que se fazem com três agulhas amarradas e embebidas em graxa, tinta, anil ou fuligem, pólvora, acompanhando o desenho prévio. O marcador trabalha como as senhoras bordam.

Lombroso diz que a religião, a imitação, o ócio, a vontade, o espírito de corpo ou de seita, as paixões nobres, as paixões eróticas e o atavismo são as causas mantenedoras dessa usança. Há uma outra — a sugestão do ambiente. Hoje toda a classe baixa da cidade é tatuada — tatuam-se marinheiros, e em alguns corpos há o romance imageográfico de inversões dramáticas; tatuam-se soldados, vagabundos, criminosos, barregãs, mas também portugueses chegados da aldeia com a pele sem mancha, que influência do meio obriga a incrustar no braço coroas do seu país.

Andei com o Madruga três longos meses pelos meios mais primitivos, entre os atrasados morais, e nesses atrasados a camada que trabalha braçalmente, os carroceiros, os carregadores, os filhos dos carroceiros deixaram-se tatuar porque era bonito, e são no fundo incapazes de ir parar na cadeia por qualquer crime. A outra, a perdida, a maior, o oceano malandragem e da prostituição é que me proporcionou o ensejo de estudar ao ar livre o que se pode estudar na abafada atmosfera das prisões. A tatuagem tem nesse meio a significação do amor, do desprezo, do amuleto, posse, do preservativo, das ideias patrióticas do indivíduo, da sua qualidade primordial.

Quase todos os rufiões e os rufistas do Rio têm na mão direita entre o polegar e o indicador, cinco sinais que significam as chagas. Não há nenhum que não acredite derrubar o adversário dando-lhe uma bofetada com a mão assim marcada. O marinheiro Joaquim tem um Senhor cruficificado no peito e uma cruz negra nas costas. Mandou fazer esse símbolo por esperteza. Quando sofre castigos, os guardiões sentem-se apavorados e sem coragem de sová-lo.

— Parece que estão dando em Jesus!

A sereia dá lábia, a cobra atração, o peixe significa ligeireza na água, a âncora e a estrela o homem do mar, as armas da República ou da Monarquia a sua compreensão política. Pelo número de coroas da Monarquia que eu vi, quase todo esse pessoal é monarquista. Os lugares preferidos são as costas, as pernas, as coxas, os braços, as mãos. Nos braços estão em geral os nomes das amantes, frases inteiras, como por exemplo esta frase de um soldado de um regimento de cavalaria: viva o marechal de ferro!... desenhos sensuais, corações. O tronco é guardado para as coisas importantes, de saudade, de luxúria ou de religião. Hei de lembrar sempre o Madruga tatuando um funileiro, desejoso de lhe deixar uma estrela no peito.

— No peito não! cuspiu o mulato, no peito eu quero Nossa Senhora!

A sociedade, obedecendo à corrente das modernas ideias criminalistas, olha com desconfiança a tatuagem. O curioso é que — e esses estranhos problemas de psicologia talvez não sejam nunca explicados — o curioso é que os que se deixam tatuar por não terem mais que fazer, em geral, o elemento puro das aldeias portuguesas, o único quase incontaminável da baixa classe do Rio, mostram sem o menor receio os braços, enquanto os criminosos, os assassinos, os que já deixaram a ficha no gabinete de antropometria, fazem o possível para ocultá-los e escondem os desenhos do corpo como um crime. Por quê? Receio de que sejam sinais por onde se faça o seu reconhecimento? Isso com os da polícia talvez. Mas mesmo com pessoas, cujos intentos conhecem, o receio persiste, porque decerto eles consideram aquilo a marca de fogo da sociedade, de cuja tentação foram incapazes de fugir, levados pela inexorável fatalidade.

Há tatuagens religiosas, de amor, de nomes, de vingança, de desprezo, de profissão, de beleza, de raça, e tatuagens obscenas. A vida no seu feroz egoísmo é o que mais nitidamente ideografa a tatuagem.

As meretrizes e os criminosos nesse meio de becos e de facadas têm indeléveis ideias de perversidade e de amor. Um corpo desses, nu, é um estudo social. As mulheres mandam marcar corações com o nome dos amantes, brigam, desmancham a tatuagem pelo processo do Madruga, e marcam o mesmo nome no pé, no calcanhar.

— Olha, não venhas com presepadas, meu macacuano. Tenho-te aqui, desgraça! E mostram ao malandro, batendo com o chinelo, o seu nome odiado.

É a maior das ofensas: nome no calcanhar, roçando a poeira, amassado por todo o peso da mulher...

Há ainda a vaidade imitativa. As barregãs das vielas baratas têm sempre um sinalzinho azul na face. É a pacholice, o grain de beauté, a gracinha, principalmente para as mulatas e as negras fulas que o consideram o seu maior atrativo. Quando envelhecem, as pobres mulheres mandam apagar os sinais — porque querem ir limpas para o outro mundo, e a Florinda, há pouco falecida, que rolara quarenta anos nos bordéis de São Jorge e da Conceição, dizia-me antes de morrer:

— Ai, meu senhor, isto é para os homens! Quando se fica velho arranca-se, porque a terra não vê e Deus não perdoa.

Grande parte desses homens e dessas mulheres têm o delírio mais sensual, fazem os nomes queridos em partes melindrosas, marcam os membros delicados com punhais, lâmpadas e outros símbolos. Neste caso eu tenho o Antônio Doceiro, um lindo rapazito que foi bombeiro depois de ter rolado pelo mundo, e a Anita Pau. Ambos têm desenhos curiosos por todo o corpo, e a pobre Anita mostra no calcanhar por extenso o nome do pai seus filhos e traz em cada seio a inicial dos dois pequenos como numa oferenda — a sua única oferenda de mãe aos desgraçados perdidos...

Num meio de tão fraca ilusão, onde as miçangas substituem os pendentifs d’arte e a vida ruge entre o desejo e o crime, depois de muito os pobres entes marcados como uma cavalhada — a cavalhada da luxúria e do assassínio —, começa a gente a sentir uma concentrada emoção e a imaginar com inveja o prazer humano, o prazer carnal, que eles terão ao sentir um nome e uma figura debaixo da pele, inalteráveis e para todo o sempre.

Aquele pequeno impressionou-me de novo na sua profissão estranha. Indaguei:

— Quanto fizeste hoje?

— Hoje fiz doze mil réis.

E eu compreendi que afinal tatuador deve ser uma profissão muito mais interessante que a de amanuense de secretaria…

Fonte:
João do Rio. A Alma Encantadora das Ruas. Publicado em 1908.

sábado, 23 de julho de 2022

Adega de Versos 86: Marciano Lopes e Silva

 

3º Concurso de Trovas Cidade de Curitiba (Trovas Premiadas) Estudantil


ENSINO FUNDAMENTAL – 6º E 7º ANO:

Tema: Colorido


1º Lugar:
Maria Eduarda
7º ano
Escola Estadual Santo Antônio

Em um grande mar de rosas
um arco-íris se reflete,
eu vejo as flores viçosas,
eu conto as cores: são sete!
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2º Lugar:
Yasmim Cristina
6º ano
Escola Estadual Santo Antônio

Como eu gosto de viver
com os lápis, com as flores.
Eu pinto no amanhecer.
Vivo num mundo de cores.
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3º Lugar:
Lorrany Vitória da Silva Serra
6º ano
Escola Estadual Santo Antônio

O arco-íris tem sete cores,
o mundo tem muito mais,
temos o mundo das flores;
tem colorido demais.
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3º Lugar:
Thiago Miguel Vieira de Oliveira
6º ano
Escola Estadual Santo Antônio

Fui fazer uma visita
na casa do João de Barro,
sua cor é bem bonita,
só faltam flores no jarro.
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4º Lugar:
Pedro Henrique Schewinski Pereira
6º ano
Colégio Estadual Professor Guido Arzua

A natureza tem cores,
árvores, o sol, o mar,
e a grama cheia de flores,
para o poeta admirar.
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5º Lugar:
Kamila Carvalho Monteiro
7 º ano
Escola Estadual Santo Antônio

Arco-íris é brilhante
suas cores são variadas
tem cor quente e elegante
Deus que fez as pinceladas.

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ENSINO FUNDAMENTAL – 8º E 9º ANO

Tema: Colorido


1º Lugar:
Laura L. de Souza
9º ano
 Colégio Estadual Guido Straube

A natureza tem cores,
tem o verde, o azul do mar.
E seus jardins com as flores,
fazem minha alma cantar.
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2º Lugar:
Raissa Mayara Morges
9º ano
Colégio Estadual Guido Straube

A cor verde das florestas,
e seu mundo de alegria,
os pássaros fazem festas,
com beleza e harmonia.
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3º Lugar:
Raissa Mayara Morges
9º ano
Colégio Estadual Guido Straube

Vendo a cor azul do mar,
enfeitando a natureza,
no céu, o sol a brilhar,
tudo tem muita beleza.
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4º Lugar:
Lucas Leandro de Almeida Alelua
9º ano
Colégio Estadual Guido Straube

Dia belo e colorido,
e neste lindo universo,
vendo meu mundo florido,
eu declamo novo verso.
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5º Lugar:
Roberta Hella Nievolla
8º ano
Colégio Estadual Guido Straube

Minha mãe muito se assusta,
quando vê que estou usando
saia colorida e justa.
Eu vou poder usar quando?
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6º Lugar:
Geovana dos Santos
9º ano
Colégio Estadual Guido Straube

Meu caminho é colorido
muito belo e radiante
é comprido e bem florido.
Um caminho fascinante
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7º Lugar:
Jorge Luiz
8º ano
Colégio Estadual Guido Straube

Na primavera tem cores,
no verão muito calor,
e no outono não tem flores,
cada estação, seu valor!
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7º Lugar:
Ana Luiza Araújo
9º ano
Colégio Estadual Guido Straube

O jardim é colorido,
encantando muita gente;
é muito belo e florido,
num dia tão frio, e quente.
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8º Lugar:
Antonio José Mermer de Freitas
9º ano
Colégio Estadual Guido Straube

A chuva que vai caindo,
molha as flores coloridas,
que no jardim vão se abrindo
em cores, todas floridas.
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9º Lugar:
Geovana dos Santos
9º ano
Colégio Estadual Guido Straube

A lua está colorida,
e brilhando muito forte.
Essa lua é minha vida,
é porque ela faz meu norte.
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10º Lugar:
Bruno Eduardo dos Santos
9º ano
Colégio Estadual Guido Straube

Pirulito colorido,
pode ser delicioso,
mamãe diz: é proibido;
mas, acho muito gostoso.
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ENSINO MÉDIO – 1º AO 3º ANO ENSINO REGULAR E TECNOLÓGICO

Tema: Colorido


1º Lugar:
Karem dos Santos da Silva
1º ano Ensino Tecnológico
Colégio Estadual Guido Straube

Os horrores de uma guerra,
têm as cores da tristeza;
enchendo de sangue a terra,
é um tormento com certeza.
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1º Lugar:
Lucas Bisoni
3º ano. Ensino Regular.
Colégio Estadual Dona Branca do Nascimento Miranda

Deus não imaginou raça
quando, de amor preenchido,
despejou a sua graça
num povo tão colorido.
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2º Lugar:
Enrique Rodolfi Moreno
1º ano. Ensino Regular.
Colégio Estadual Guido Straube

Dei a flor vermelha a ela
demonstrando o meu amor,
só não sei quem é mais bela,
se é ela, ou a minha flor…
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3º Lugar:
Jefferson Rodrigues dos Santos
1º ano. Ensino Regular.
Colégio Estadual Guido Straube

Com Deus, eu quero subir,
e no céu permanecer,
os seus louvores ouvir,
dando cores ao meu ser .
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4º Lugar:
Lucas Gabriel Aumann
1º ano. Ensino Regular.
Colégio Estadual Guido Straube

O jardim tem muitas flores,
rosa, jasmim, margarida,
que o campo cheio de cores,
se torna cheio de vida.
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5º Lugar:
Davi Carneiro Mendes
1º ano. Ensino Regular.
Colégio Estadual Guido Straube

O amor cheio de vermelho,
tem a cor de uma paixão.
E depois de bom conselho,
devo usar mais a razão.
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6º Lugar:
Lucas Henrique de Almeida Ramalho
1º ano. Ensino Tecnológico.
Colégio Estadual Guido Straube

Eu tenho certa beleza,
que hoje quero transmitir
com cores da gentileza,
cantando, sempre a sorrir.
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6º Lugar:
Renam Henrique dos Santos
1º ano. Ensino Tecnológico.
Colégio Estadual Guido Straube

Procurando o paraíso,
quando a vida é sem sentido
a criança com um sorriso,
faz o mundo colorido.
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7º Lugar:
João Marcos C. Wagner R. Gomes
1º ano. Ensino Tecnológico.
Colégio Estadual Guido Straube

Com ideias coloridas,
mostrando sempre a verdade,
eu transformo muitas vidas,
para achar felicidade.
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8º Lugar:
Fabricio Cruz Schemberger
1º ano. Ensino Regular.
Colégio Estadual Guido Straube

Tens um olhar colorido,
olho, e te vejo escapar.
Vejo o meu peito destruído,
e eu nunca irei te soltar…
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8º Lugar:
Jefferson Rodrigues dos Santos
1º ano. Ensino Regular.
Colégio Estadual Guido Straube

Colorido é nosso amor;
mas eu queria saber,
se sentindo o meu calor,
você irá me querer!
= = = = = = = = = = =

9º Lugar:
Fernanda Milsted
1º ano. Ensino Regular.
Colégio Estadual Guido Straube

Neste mundo colorido,
eu vejo muita beleza,
pois o sol foi concebido
pela mãe da natureza.
= = = = = = = = = = =

9º Lugar:
Pedro Carneiro Mendes
1º ano. Ensino Regular.
Colégio Estadual Guido Straube

Carbonizadas em vida,
as cores carmins escorrem,
jorra um grito da ferida,
quando muitas bruxas morrem.
= = = = = = = = = = =

10º Lugar:
Mariana Litz Baum
1º ano. Ensino Tecnológico.
Colégio Estadual Guido Straube

Em uma vida sem cor,
nós vemos muita tristeza,
existe também rancor.
Vamos ter mais gentileza?
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11º Lugar:
Ivana Melnek Trajano
1º ano. Ensino Tecnológico.
Colégio Estadual Guido Straube

O mundo ficou sem cor,
com a pandemia no ar,
ao levantar um clamor
todo este mal vai passar.
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12º Lugar:
Lissa Giovana Aumann
1º ano. Ensino Regular.
Colégio Estadual Guido Straube

Natureza colorida,
eu vejo na minha frente,
faz bem para minha vida,
alegrando toda gente.

Irmãos Grimm (O Senhor Korbes)


Houve, uma vez, um franguinho e uma franguinha que resolveram fazer uma viagem juntos. O franguinho construiu um lindo carrinho com quatro rodas vermelhas e atrelaram quatro ratinhos. A franguinha subiu, sentou-se ao lado do franguinho e partiram. Logo mais adiante, encontraram uma gata, que lhes perguntou para onde iam. O franguinho respondeu:

Nós vamos para fora,
Para a casa onde o Senhor Korbes mora.

- Levai-me convosco! - pediu a gata.

- Com muito gosto, - respondeu o franguinho, - senta-te atrás, porque na frente poderás cair.

Muito cuidado é preciso tomar
Para as rodinhas vermelhas não sujar.
Rodinha chia.
Ratinho assobia,
Nós vamos para fora,
Para a casa onde o Senhor Korbes mora.

Depois veio uma mó, depois um ovo, depois uma pata, depois um alfinete, e, por fim, uma agulha. Todos subiram no carro e viajaram juntos.

Mas, quando chegaram à casa do Senhor Korbes, o Senhor Korbes não estava. Os ratinhos levaram o carro ao paiol, o franguinho e a franguinha voaram para um galho, a gata acomodou-se na lareira, a pata empoleirou- se no cabo de bombear água, o ovo se embrulhou na toalha de rosto, o alfinete se enfiou na almofada da poltrona, a agulha pulou para a cama, no meio do travesseiro, e a mó ajeitou-se em cima da porta.

Pouco depois, voltou para casa o Senhor Korbes. Foi à lareira para acender o fogo e a gata atirou-lhe cinzas no rosto. Correu à cozinha para se lavar, e a pata esguichou-lhe água em cima. Quis enxugar-se na toalha, e o ovo rolou-lhe pelo rosto, quebrou-se e grudou-lhe os olhos. Quis descansar e foi sentar na poltrona, o alfinete espetou-o. Louco de raiva, foi atirar-se na cama, mas quando deitou a cabeça no travesseiro, a agulha picou-o de tal modo que ele soltou um grito de raiva e, furioso, quis fugir para fora. Mas, quando chegou à porta, a mó caiu em cima dele e matou-o.

O Senhor Korbes devia ser um homem muito mau, não achas?