domingo, 24 de julho de 2022

Contos e Lendas do Paraná - 11 (Antonio Olinto – Arapoti – Piraí do Sul)


Município de Antonio Olinto

O CAIXÃO

Em um rio de Antonio Olinto há um caixão, todo feito de cimento, que vaga pelas águas; poucas pessoas conseguiram vê-lo, pois ele aparece às vezes. Dizem que um dia, quando um homem estava pescando viu o tal caixão. O pescador, que sempre levava uma arma, naquele dia já a havia utilizado para atirar em uma pomba na beira do rio; mas quando ele foi pegá-la só havia penas e o misterioso caixão. Assustado, foi contar para os amigos e vizinhos que logo foram ver no local o caixão.

Ao chegarem no local, nada havia; desapareceu o misterioso caixão. Contam, também, que para retirar esse caixão da água é preciso que se tenha dois bois gêmeos. As pessoas que viram esse caixão já tentaram tirá-lo da água, mas, até hoje, ninguém conseguiu.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = = = =

Município de Arapoti
O ESPÍRITO DO CEMITÉRIO

Há anos atrás ocorreu um fato no cemitério da cidade. Alguns jovens, em uma brincadeira de mau gosto, apostavam quem pegava mais cruzes, brincadeira esta que era muito comum naquela época. Certo dia, uma moça muito bonita faleceu por causa não relatada, deixando um clima sombrio no local. Ao chegar o dia de finados, mais ou menos duas semanas depois do acontecimento, um rapaz senta-se sobre um túmulo e repara em uma bela garota ao seu lado. Inicia-se a conversa entre os dois que acaba repentinamente quando ele revela que roubava cruzes. Ela o desafia a roubar uma cruz naquela noite, a sua própria. Ela entrega-lhe uma rosa e desaparece no meio de outras pessoas. Ele guarda a flor dentro do bolso, envolta em um lenço azul.

Naquela noite, para a surpresa dele e de seus amigos, não havia nenhuma lápide e nenhuma cruz; era como se aquele lugar nunca tivesse existido. Ele lembrou-se da rosa. Quando pôs a mão no bolso teve uma terrível surpresa: a rosa transformara-se em um pedaço de osso humano
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = = = =

Município de Piraí do Sul
O TÚMULO DE MARIA QUEBRA

Já existindo como aglomerado populacional desde o início do século XVII, o então Bairro da Lança manteve até o início do século XX as mesmas características das povoações habitadas por portugueses e seus descendentes, em sua convivência com o índio e o negro. A Proclamação da Independência, a libertação dos escravos, a Proclamação da República ou a Revolução Federalista, ou outro fato nacional, em muito pouco modificaram o dia-a-dia dos habitantes do Bairro da Lança. Localizado às margens do caminho do Viamão a Sorocaba, o pequeno povoado que englobava as localidades de Cercadinho (Campo Comprido), Lança, Silva, Fundão, Machadinho, Furnas (Murtinho), Tabor e Jararaca, assistia à passagem do viajante que demandava São Paulo ao Rio Grande do Sul, ou dos Pampas ao Norte do País.

Por ser o único caminho de ligação com o sul do Brasil, ou acolhia o tropeiro em sua passagem para a feira de Sorocaba, ou na volta aos campos de criação do Sul, sem que as características do seu dia-a-dia fossem modificadas significativamente.

Os mortos eram enterrados com o tradicional cerimonial da época, nos cemitérios existentes nas concentrações mais importantes do bairro como: Campo da Lança, Campo Comprido, Furnas e Fundão e mais recentemente no cemitério da Vila Piraí, localizado no Alto da Rua XV, onde os portugueses, brasileiros, índios ou escravos recebiam sepultura sob as bênçãos da fé cristã, o respeito às Leis, aos costumes e à tradição.

Entre os séculos XIX e XX, residia na rua hoje denominada Julieta Veiga Queiroz, nas imediações da casa de dona Zelinda Miro, uma senhora a quem chamavam “Maria Quebra”. Tinha esse nome em razão do gênio atirado, ou por suas atitudes violentas e rudes, o que era motivo constante de brigas e desentendimentos, o que lhe valeu o apelido.

A passagem para o século XX veio trazer a Piraí do Sul sensíveis modificações em todos os segmentos da vida local, notadamente em seus costumes e hábitos, comércio, sociedade, modificações estas que perduram até o final da Primeira Guerra Mundial. A população local que era constituída essencialmente de descendentes de portugueses, com suas mesclas com o índio e o negro, recebeu o choque da imigração europeia (alemães, poloneses, russos/ucranianos e italianos), bem como um significativo contingente árabe. Novos rumos tomou o aglomerado populacional, com um significativo aumento na construção de casas em novos estilos e o traçado de novas ruas.

O dia-a-dia da Vila Piraí foi modificado sensivelmente, com novos hábitos na vida social, na igreja, no casamento, na comida, na escola, no comércio e na política, conservando até hoje a influência da imigração italiana. Com o aumento da população da sede da Vila, o pequeno cemitério da rua XV (alto), passa a receber os mortos não só da zona urbana, mas também da zona rural, recebendo melhoramentos, bem como túmulos artisticamente construídos.

Maria Quebra, na sua vivência com bebidas e festas e pela vida devassa que levava, contraiu o mal de Hansen, tendo padecido por longos anos desta enfermidade. Em meados do ano de 1917 veio a falecer, preparando-se o seu sepultamento, que seria realizado no cemitério ao alto da rua XV, como era de costume para os moradores da Vila. Sepultamento esse que não foi autorizado, sob a alegação de que Maria Quebra havia morrido de lepra e não poderia ser enterrada junto aos mortos daquele cemitério.

O cemitério mais próximo da Vila era o Campo da Lança, que estava sendo desativado, primeiro pelo novo hábito de se utilizar o cemitério da Vila e, também, porque o local estava infestado de tatus rabo mole, ou testa de ferro; animais que profanavam as sepulturas, levando a que as famílias se negassem a enterrar seus mortos naquele local. O cadáver de Maria Quebra, insepulto, esperava local para seu merecido descanso, tendo em vista a negativa da autorização do uso do cemitério municipal.

Por fim, decidiu-se que ela poderia ser enterrada nas proximidades daquele campo santo, desde que fora dos muros. Assim, Maria Quebra recebeu sepultura ao lado direito da estrada que passa nos fundos do cemitério municipal e vai em direção ao bairro do Bonsucesso. Sua sepultura está a uns 700 metros além dos muros, ao pé de um centenário cedreiro, onde até hoje alguns devotos depositam suas preces e oferendas.

Fonte:
Renato Augusto Carneiro Jr (coordenador). Lendas e Contos Populares do Paraná. Curitiba : Secretaria de Estado da Cultura , 2005.

Nenhum comentário: