quinta-feira, 14 de julho de 2022

Carlos Leite Ribeiro (Nomes que nos marcam numa época...)

Há nomes que nos marcam para sempre, principalmente, quando se referem à nossa juventude. Para mim, o nome Nandinha, traz-me recordações da minha meninice.

Teria uns dez anos, morava num rés-do-chão de um prédio da Pascoal de Melo (Estefânia – Lisboa), e no último andar, por sinal o 5º, morava a Nandinha, uma moça que na altura teria uns 16 ou 17 anos. A mãe da moça, de nome Senira, viúva de um obscuro subchefe de uma repartição, era uma figura muito castiça: Muito magra, não muito alta, sempre vestida de preto e, fosse em que estação fosse, andava sempre de sombrinha. Quando aqui em Portugal passou a telenovela “Tieta do Agreste” (que eu parodiei para a radiodifusão), logo me lembrei da D. Senira, que a vi retratada na “Charifú” desta novela.

A Nandinha era filha única e sua mãe a defendia de todos e quaisquer “Moinhos de Vento”. Se a moça lhe ia fazer algum recado, logo a mãe se empoleirava na varanda começando logo a berrar assim que ela saía do prédio: “Nandinhaaaaa! Não te demores, olha que eu estou aqui à tua espera!” ; ou “Nandinhaaaaaa! Estás a demorar muito! Que estás para aí a fazer?”.

Se nas traseiras da casa, a moça estava a estender a roupa na varanda, lá estava sua mãe ralhando comigo: “Olha lá, menino, estás a olhar para as pernas da Nandinha... etc ...”.

Recordo-me um vez minha tia dizer em voz alta para ela ouvir bem: “Carlitos, não olhes para cima! Podes estar a cobiçar umas pernas que não valem nada ...”. Claro que a opinião era de minha tia, porque a minha, embora não me recorde bem, talvez fosse uma “bela panorâmica”!

Mas voltando à Nandinha, andava num colégio de feiras, onde a mamãe a ia levar e trazer. Recordo-me de um carnaval no Clube Estefânia, em que a D. Senira quando notava (?) que o par da filha a estava a agarrar “demais”, se levantava e o ia afastar do corpo da filha. De tantas vezes que repetiu, que se tornou um escândalo hilariante. Nessa altura, um D. Juan da época, virou-se para a D. Senira, perguntando-lhe: “Olhe lá minha senhora, é católica?”. A senhora olhando-o de frente, replicou-lhe: “Sou sim, seu desavergonhado!” Então o “malandreco” respondeu-lhe perante a hilaridade de todos : “Então vá com Deus e deixe sossegada a sua filha!”.

Era assim a vida da Nandinha...

Meses depois, a pequena, não se sabendo muito bem porquê, apareceu grávida. É verdade! Já na gravidez avançada, tanto a mãe como ela, juravam a pés juntos que não sabiam com “aquilo tinha acontecido”. Algumas vizinhas, daquelas mais aconselhadas, aconselharam a D. Senira a ir a uma senhora de grande virtude, que morava na Horta das Tripas (Casal de Santa Luzia – Rua D. Estefânia) para que ela expulsasse o “Mafarrico” do corpo da moça, porque tal só podia ter sido “obra do diabo”. Outras menos “cultas” diziam que tinha era sido “obra e graça do Espírito Santo”... Fosse como fosse nasceu um bebê que teve como nome Francisco (o Chiquinho).

Muito mais tarde, já a D. Senira tinha entregado a alma a Deus e o corpo à terra fria, a Nandinha confessou que “talvez fosse obra de um ajudante de limpa-chaminés”. Na altura, existiam em Lisboa os “limpa-chaminés” que subiam aos telhados, punham uma corda muito comprida dentro das chaminés e tiravam a “ferrugem”; pelo menos faziam muito lixo. Normalmente quem tinha a chave da porta que dava para o telhado era o locatário do último andar. Assim, um dia, a Nandinha foi abrir a porta ao ajudante de limpa-chaminés, enquanto o mestre ficava junto às chaminés das cozinhas, segurando a corda, o ajudante abanava-a no telhado.

Ainda segundo o relato da Nandinha “foi tudo muito rápido”. Nós podemos acrescentar: Rápido e Eficiente! Ficamos sem saber se teria sido no abrir da porta, ou, ao abanar da corda. Mas isso também não interessa.

Claro que a moça teve depois vários namorados. Enquanto esperavam pela dama, havia sempre um “malandreco” a avisá-lo: “Não cuspas para cima que ela pode engravidar...”.

E assim, o nome de Nandinha, ficou sempre gravado na minha memória…

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