Eu e Helinho éramos muito amigos. Estávamos sempre juntos. Digo, éramos, porque com o passar dos anos fomos nos distanciando, assim como acontece com a maioria das pessoas. A turma na época dizia que pegava mal, e fazia gozação conosco dizendo que tínhamos um caso. Estávamos com 17 anos.
Certo dia, Helinho resolveu desabafar comigo um particular envolvendo ele e a namorada. Na ocasião ele me contou que a mãe dela implicava muito com ele, interferindo no namoro deles. Meu amigo disse-me não saber mais o que fazer para resolver aquela situação, e por isso resolveu pedir minha ajuda. Como ajudar se eu não a conhecia. Mesmo assim ele insistiu dizendo que daria um jeito de nos apresentar. Será que iria dar certo?
- De onde você tirou essa ideia, Helinho? Que a mãe da sua namorada vai me ouvir? Eu nem sequer a conheço.
- Você foi a única pessoa que me veio a mente, Paulinho. Você é um sujeito bom de lábia, é bem articulado, bom com as palavras (pausa) – Ah! Quebra essa pra mim, meu amigo!
- Claro que eu gostaria de te ajudar. Só não sei se essa ideia vai dar certo.
- Não custa nada tentar. Eu gosto demais da Íris, mas infelizmente ela vai muito pela cabeça da mãe. Eu tenho medo que ela estrague o nosso namoro.
- Eu entendo, amigo. E o marido dela? E se ele estiver lá? Eu não quero confusão para o meu lado. – e concluiu, sorrindo. – Eu estou muito novo para morrer.
- Quanto a isso você pode ficar tranquilo. Dona Vilma é viúva. E então? Você topa fazer pelo menos uma tentativa para me ajudar?
- Só vou fazer isso porque gosto muito de você, meu amigo. Só não posso garantir que terei êxito.
A data escolhida por Helinho não poderia ter sido melhor. 24 de dezembro. Estávamos no final do ano de 1977. Como todos sabem, véspera de natal. Ele me passou o endereço e ficamos de nos encontrar por lá mais ou menos as 21 hs, e logo depois iríamos para a casa da tia dele que morava em outro bairro. Segundo ele, o natal na casa da tia era muito bom. Antes disso eu tive que cumprir com a minha jornada de trabalho naquele dia e em virtude de um imprevisto ¨felizmente¨ acabei me atrasando. Depois, você vai entender o porque eu disse felizmente acabei me atrasando. Cheguei na casa de Íris um pouco exausto na tentativa de ainda encontrá-los por lá. Toquei a campainha e fui recebido supostamente pela mãe dela.
- Boa noite, senhora. Aqui é a casa da Íris? Eu sou Paulo, amigo do Helinho, namorado dela.
- Sim. Boa noite. Eu sou Vilma, mãe da Íris. Eles acabaram de sair. Você quer entrar um pouco?
Eu seria muito bobo se não aceitasse o convite para entrar. Pensei. Eu entrei e fui logo dizendo:
- Eu imaginei que eles não fossem me esperar tanto. Eu me atrasei demais. Tive um imprevisto no trabalho, peguei trânsito também. O pior é que eu não sei onde a tia do Helinho mora.
- A Íris ficou de me ligar. Eu aproveito e digo que você está aqui (pausa) – Sente-se rapaz! Descanse um pouco! Quer tomar uma água? Um suco?
- Eu aceito uma água.
- Eu vou buscar.
Dona Vilma retirou-se lentamente em direção a cozinha e só aí que eu me dei conta da mulher que era a mãe da namorada do eu amigo. Eu estava admirado, encantado com tamanha beleza. Dona Vilma era simplesmente linda. Ela voltou com a água, sentou-se de frente para mim e cruzou as pernas. Que formosura de mulher. Eu mal conseguia disfarçar o meu encanto, meu entusiasmo de estar ali diante dela. Eu nem sei mais se gostaria de ir ao encontro dos meus amigos. Seria melhor que a Iris nem ligasse e se ligasse não perguntasse por mim. Notando minha inquietude, meus olhares, ela surpreendeu-me com uma pergunta:
- O que tanto você me olha, menino?
Aquela palavra, menino, veio para mim como se ela estivesse colocando uma enorme distância entre nós, e meio sem jeito respondi:
- Longe de mim querer ser ousado, dona Vilma. A senhora é muito bonita!
Notei que ela ficou meio sem jeito, desconcertada, e logo em seguida disse:
- Muito obrigada! Mas falando desse jeito você me deixa constrangida, Paulo.
Dona Vilma era uma mulher encantadora. Morena, pele lisa, um corpo perfeito e um par de olhos castanhos lindos que me deixavam perdido entre eles, além de uma fala muito suave. O que fazer diante de uma viúva tão formosa na altura dos seus 35 ou 36 anos que era mais ou menos o que ela deveria ter. Conversa vai, conversa vem e eu não conseguia entrar no assunto sobre o qual teria que falar com ela.
- Você aceita uma taça de vinho? – perguntou-me solícita. – Daqui à pouco a Íris me liga, como te falei ainda pouco.
- Sim. Eu aceito. Só não sei se ainda quero me encontrar com eles.
Servimo-nos do vinho e logo em seguida o telefone tocou. Era a Iris. Ela conversou alguns minutos com a filha, fez algumas recomendações e em seguida despediram-se. Um detalhe chamou a minha atenção: Ela não mencionou a minha presença, e isso já era um ótimo sinal.
- A hora passou tão rápido que eu nem me dei conta. Já são quase 23hs. – disse ela enquanto tomava mais um pouco de vinho.
- É porque a conversa está agradável.
Parei e fiquei olhando-a por alguns instantes tentando tomar coragem e entrar no assunto envolvendo Helinho.
- O que foi, Paulo? Você ficou quieto de repente. Você quer me dizer alguma coisa?
- Quero sim. Mas estou sem coragem. Não sei se devo (pausa) – É sobre o Helinho.
Ela fez uma expressão séria e perguntou-me:
- O que você quer falar sobre aquele rapaz? Eu não aprovo o namoro deles. Acho que ele não vai fazer minha filha feliz. Mas ela insiste neste namoro. Fazer o quê?
Pela expressão e o jeito como ela falou, achei que estivesse colocado tudo a perder. Silenciei pensando em um jeito de reverter aquela situação. Naquele momento tudo o que eu mais queria era ficar com ela. Tê-la em meus braços nem que fosse somente por aquela noite. Ela continuou:
- Se você veio aqui para falar sobre ele, perdeu seu tempo. Eu não simpatizo nem um pouco com aquele rapaz. Tenho medo que ele faça a minha filha sofrer.
Mesmo correndo risco de estragar aquela noite, tentei argumentar:
- Eu acho que a senhora está enganada a respeito do Helinho. Ele é um bom sujeito. Somos amigos há anos. Posso garantir à senhora que ele é uma pessoa direita. A senhora pensa assim talvez por não conhecê-lo melhor.
- Olha aqui, Paulo. Eu sei que vocês são amigos, se gostam muito, você também é amigo de minha filha, mas eu não quero falar sobre isso com você.
Depois de ouvir essas palavras pensei: – Estava tudo perdido. Só cabia a mim naquele momento me justificar e tentar salvar aquela noite que estava mal começando:
- Desculpe-me, dona Vilma! Eu não quis ser inconveniente (pausa) – A senhora quer que eu vá embora?
- Não precisa se desculpar. Você não foi inconveniente e nem precisa ir embora. Eu só não quero falar sobre este assunto contigo. Vamos esquecer este assunto. Eu vou preparar uns petiscos para comermos e mais um pouquinho de vinho enquanto aguardamos a chegada do natal.
- Só não podemos ficar embriagados. – complementei sorrindo.
- Com certeza! - concordou ela, servindo-me mais um pouco de vinho.
- Eu posso colocar uma música, dona Vilma?
- Fique à vontade. Só não sei se você vai gostar dos discos que temos aqui.
Apanhei alguns discos, e entre eles escolhi uma melodia que eu gostava muito. Hotel Califórnia que fazia muito sucesso na época. Em seguida a surpreendi com um convite.
- Vamos dançar!
Ela pensou por alguns segundos e respondeu logo em seguida.
- Sim. Vamos. Há tempos eu não sei o que é dançar.
Aquela foi a primeira oportunidade de abraçá-la, sentir aquele corpo, aquele cheiro. Que momento lindo! Que entrada de natal maravilhoso! Que presente! Sem dúvida um momento para nunca mais ser esquecido. Impulsionado pela melodia tentei beijá-la:
- Por favor, Paulo! Não! Ainda é muito cedo pra isso.
- Por que não? Só estamos nós dois aqui. Eu quero e sei que você também quer. Deixa acontecer! Não temos nada a perder.
Embalados pela música nos entregamos aos nossos sentimentos e desejos, e ali nasceu o nosso primeiro beijo.
- Isso não deveria ter acontecido, Paulo.
- Por que? Você não gostou? Eu amei.
Sem nenhuma resistência ela se entregou novamente em meus braços, e apanhando-a no colo fomos para o lugar mais confortável daquela casa. O quarto dela. Aquele foi o melhor natal de minha vida e tenho certeza que o dela também. Nos amamos, e passamos a noite quase toda namorando. E Assim conheci o Amor. No amanhecer do dia nos despedimos com muitos beijos e juras de amor. Eu queria passar o dia 25 com ela, mas não seria bom a Íris me encontrar por lá.
Alguns dias depois, Helinho me procurou feliz da vida para me falar sobre as mudanças repentinas da futura sogra em relação a ele. Estava tratando-o superbem e não intrometia-se mais no namoros deles. Eu fiquei feliz por eles e mais ainda por naquela noite ter conhecido o grande amor de minha vida.
No início não foi fácil assumirmos o nosso amor. Por um lado, os meus pais por causa da minha idade, e por outro, a filha dela apesar de sermos amigos. O que eu senti por Vilma quando eu a vi pela primeira vez não foi somente desejo, mas sim amor. Lutamos contra as barreiras e o preconceito, mas felizmente nosso amor venceu.
Palavras do Autor: Só com Amor venceremos todas as barreiras.
Fonte: Texto enviado por Aparecido Raimundo de Souza
2 comentários:
Vou me atrever a falar um pouco do conto de Gilmário Braga, autor do lindo texto “E assim conheci o autor”, publicado nesse blog em data de 10 de outubro de 2024. A história por ele compartilhada é sobre como o Paulo (figurando como narrador), conheceu o amor de uma maneira inesperada e complexa. Ele começa falando de sua amizade com Helinho e do pedido de ajuda que este fez para lidar com a mãe de sua namorada, a Íris, quem de cara, não aprovava o relacionamento deles. O cenário de Natal de 1977 marca um ponto de virada quando Paulo acaba conhecendo Vilma, a mãe de Íris, e um sentimento inesperado surge entre eles. Embora o plano fosse ajudar o amigo, o encontro entre Paulo e Vilma toma um rumo inesperado. Eles compartilham um momento íntimo e especial, que leva Paulo a descobrir o que ele chama de "amor verdadeiro”. A complexidade da situação é evidente, já que envolve relações familiares e de amizade que tornam o romance entre Paulo e Vilma complicado e sensível. Ainda assim, o texto enfatiza que o amor verdadeiro pode superar barreiras e preconceitos, como os que Paulo e Vilma enfrentaram para ficar juntos. A mensagem reflete ainda, sobre a força do amor e sua capacidade de superar obstáculos, um tema comum em histórias de romances improváveis. Na minha opinião pessoal, como leitora, sem pretensões ao estrelato, a principal mensagem que o autor quis passar, e, na verdade passou, é que o amor verdadeiro pode surgir de maneira inesperada e superar barreiras, mesmo em situações complexas e socialmente delicadas. O autor descreve um relacionamento que nasce de forma improvável, entre Paulo e Vilma, a mãe da namorada de seu amigo, Helinho. Esse romance desafia as normas sociais e preconceitos, mas, apesar das dificuldades, o amor triunfa. O texto ressalta ainda que, mesmo quando as circunstâncias parecem estar contra, o amor tem o poder de unir e vencer qualquer obstáculo. Além disso, Gilmário Braga reforça a ideia de que o amor não segue regras convencionais e pode florescer em momentos e lugares onde menos se espera. O final positivo da história, com Paulo e Vilma superando as críticas e o julgamento, sublinha a crença de que a força do amor é capaz de superar até os maiores desafios. Portanto, em resumo, e não querendo de forma alguma ser repetitiva, a mensagem central de Gilmário parece ser a de que, investido na roupagem da força espiritual e com a devida coragem e perseverança, o amor verdadeiro pode vencer e, de fato vence, como no conto, a bem da verdade, e acima dos preconceitos, venceu todas as barreiras.
Tatiana Gomes Neves
De Vitória ES e Minas Gerais MG
Foi mal, meu grande amigo senhor José Feldman.
Agora acertei, até porque apareceu a minha foto.
Tatiana Gomes Neves
de Vitória ES e Minas Gerais MG
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