quarta-feira, 30 de outubro de 2024

Vereda da Poesia = 144 =

Nota do editor: 
A partir do número 146, a imagem que abre a vereda da poesia será com uma trova premiada nos Concursos do Blog.
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Soneto de
LUIZ POETA
Rio de Janeiro/RJ

Afetos de menino

Em todas vezes que eu vivi... eu fui criança...
sobrevivi... e sobrevivo... até então,
do mesmo amor que reconstrói meu coração,
quando ele teima em se perder da esperança.

Lembranças boas são saudades... a constância
que me desvia da aspereza desse mundo
o faz com que eu voe na ternura de um segundo
para bem longe da mentira e da arrogância.

Ingenuidade, inocência, sonhos, risos
afetuosos para quem sequer merece
são minhas marcas indeléveis... pueris…

... e embora diante dos que não mostrem seus guizos...
sempre propenso a crer no amor que me apetece,
construo afetos... de menino... e sou feliz.
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Trova de
ZAÉ JÚNIOR
Botucatu/SP, 1929 – 2020, São Paulo/SP

Entre as flores volto ao beco
do sobrado em que moraste;
na janela um vaso seco,
sinal… de que não voltaste!
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Poema de
DANIEL MAURÍCIO
Curitiba/PR

Meu amor
eternamente
envelopado
acho
que o carteiro
esqueceu
de entregar.
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Trova Premiada de
RENATA PACCOLA
São Paulo/SP

De paixão mal acabada
guardei as recordações
numa página rasgada
de um bloco de anotações.
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Poema de
VANICE ZIMERMAN
Curitiba/PR

Flutuam as taças...

Noite fria,
O castelo em silêncio -
Na sala com o piso de pedras
Há sensação de saudade:
Dos sons do piano e dos passos,
E, as cadeiras permanecem vazias
Sobre a mesa,
Entre os candelabros - pontes de teias
E ao lado de umas das três taças de prata
A chave quebrada...
A toalha branca, suavemente tingida
Em sintonia
Com algumas gotas de vinho...
Depois da meia-noite,
Percebe-se
Que as velas despertam,
Em tons de amarelo
E, no espelho da sala
Os reflexos das taças surgem -
Aproximam-se para brindar
Mas, misteriosamente
As mãos que as seguram
Não aparecem no espelho,
Enquanto as pétalas da rosa azul
Do poema anterior
Aconchegam-se à chave quebrada...
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Fábula em Versos
adaptada dos Contos e Lendas da África
JOSÉ FELDMAN
Campo Mourão/PR

A Menina e o Elefante

Uma menina travessa, no campo a brincar,
encontrou um elefante, que estava a chorar.
“Por que estás tão triste, amigo elefante?”
“O homem me caça, e o futuro é horripilante.”
A menina, firme, decidiu ajudar,
com coragem no coração, não ia hesitar.

Juntos partiram, para lá longe, na cidade,
a menina gritou: “Vamos parar essa insanidade!”
Com astúcia e bravura, alertaram a nação,
e os caçadores mudaram, por sua ação.
O elefante agradeceu, com um toque gentil,
e a menina sorriu, seu coração era sutil.

A coragem em defesa dos fracos não é em vão,
uma voz pode mudar o mundo, trazendo compaixão.
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Trova Popular

Rouxinol canta de noite,
de manhã a cotovia;
todos cantam, só eu choro
toda a noite e todo o dia!
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Soneto de
JERSON BRITO
Porto Velho/RO

Bálsamo

Pelas insípidas tardes vagueio
Acinzentado, o jardim m'entristece
Dos rouxinóis não mais ouço o gorjeio
Nada mais brilha... Minh' alma fenece

De fel e dor, asseguro, estou cheio
Um brado ecoa, plangente, qual prece
O sentimento sufoca, alardeio:
"Ah, se teus beijos de novo tivesse..."

Envolto em manto espinhoso reclamo
Aqueles sons, vesperal sinfonia
Aquelas cores prazentes, vivazes

Oh, meu amor, quanta falta me fazes!
Só tu dissipas ess' acre agonia
Contigo é certo que o peito balsamo
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Trova de
JOÃO FREIRE FILHO
Rio de Janeiro/RJ (1941 – 2012)

Quando um príncipe encantado
partiu contigo, risonho,
eu vi meu sonho levado
pelo encanto de outro sonho!...
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Poema de
GONÇALVES DIAS
Caxias/MA, 1823 – 1864, Guimarães/MA

Doce amor

Doce Amor — a sorrir-se brandamente
Em sonhos me falou com tal brandura,
Que eu só de o escutar vida mais pura
Senti coar-me n'alma fundamente.

Depois tornou-se o tredo fogo ardente
Que o instante, o ano, a vida me tortura.
Bem longe de gozar tanta ventura,
Cresta-me o rosto agora o pranto quente.

Homem, se homem és no sentimento,
Não zombes, não, de mim tão desditosa,
Nem seja o teu alívio o meu tormento.

Deixa-me a teus pés cair chorosa,
Soltar no extremo pranto o extremo alento,
Que eu morrendo a teus pés serei ditosa.
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Trova de
JAIME PINA
São Paulo/SP

Busco, às vezes, na memória,
momentos de paz e alento...
E encontro instantes de glória
caídos no esquecimento.
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Soneto de 
AMILTON MACIEL MONTEIRO
São José dos Campos/SP

Estro perdido

Quem encontrar algum estro perdido,
me conte por favor, que irei buscá-lo;
pois deve ser o meu, que anda sumido,
feito coisa que foge pelo ralo.

Ele é fácil de ser reconhecido;
só basta vê-lo e ouvi-lo e num estalo,
os trejeitos e a voz desse bandido
vão logo denunciar de quem eu falo:

A sua timidez é inconfundível,
o seu cantar é bem desafinado
e seus poemas têm cadência horrível...

Mas assim mesmo prende o meu amor,
como um milagre a ser inda explicado...
E sem meu estro, eu morro em meio à dor!
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Trova do
Príncipe dos Trovadores
LUIZ OTÁVIO
Rio de Janeiro/RJ, 1916 – 1977, Santos/SP

Às vezes, tenho pensado
que a nostalgia é, somente,
desejo de que o Passado
seja, de novo, Presente...
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Soneto de
FLORBELA ESPANCA 
Vila Viçosa, 1894 – 1930, Matosinhos

Errante

Meu coração da cor dos rubros vinhos
Rasga a mortalha do meu peito brando
E vai fugindo, e tonto vai andando
A perder-se nas brumas dos caminhos.

Meu coração o místico profeta,
O paladino audaz da desventura,
Que sonha ser um santo e um poeta,
Vai procurar o Paço da Ventura…

Meu coração não chega lá decerto…
Não conhece o caminho nem o trilho,
Nem há memória desse sítio incerto…

Eu tecerei uns sonhos irreais…
Como essa mãe que viu partir o filho,
Como esse filho que não voltou mais!
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Trova Funerária Cigana

Dorme, dorme, meu bom pai,
descansa onde a estrela brilha,
que ao trono de Deus irão
as preces de tua filha.
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Spina de 
SOLANGE COLOMBARA
São Paulo / SP

Reencontro

Suspiros ao vento
traduzem a calma
do achado perfeito.

Gaivotas assistem um lindo deleito,
o sol deslizando devagarinho pelos
braços do horizonte, sensível afeito.
No abraço matutino engrandece, as
andorinhas tímidas, saúdam o feito.
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Trova Humorística de 
ANTONIO CARLOS TEIXEIRA PINTO
Niterói/RJ

Enfrentando a escuridão
eu li, à luz de lanterna,
que o beco não dava mão.
Mas... como! Dava até perna!
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Poema de 
ELISA ALDERANI
Ribeirão Preto/SP

Angústia
 
Não sei de onde vem tanta tristeza
Que sem motivo aperta o coração.
Será lembrança de lágrimas escondidas
Desta inútil talvez fútil razão.
 
Será o tempo que passou perdido
Esperando um amor que não voltou.
Quem sabe, a procura envelhecida,
Não deu vazão para encontrar alguém.
 
De onde virá então tanta ansiedade,
Se o coração a tempo está em repouso?
Querendo doar somente ao semelhante
Amor fraterno, refletindo paz.
Inquieto agora insurge e quer gritar?
 
Encontrar a resposta certa
Para a alma tão dilacerada.
Será culpada a nuvem que desaba
Suas gotas pesadas de repente...
Até voltar um raio de sol que beija
A solidão que gorjeia
Como pássaro fechado na gaiola.
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Trova de
A. A. DE ASSIS
Maringá/PR

Caridade, um gesto nobre 
que faz os próprios ateus 
sentirem que "dar ao pobre 
é como emprestar a Deus".
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Soneto de
FILEMON MARTINS
São Paulo/SP

Velho mar

Nasci longe do mar, mas seduzido
por seu fascínio belo, encantador,
fico ouvindo, na praia, o seu gemido
e os madrigais de um velho pescador.

Mas às vezes me sinto assim perdido
como um barco singrando sem motor,
ouço as ondas num grito dolorido,
uma angústia que cala a própria dor.

Vejo, da praia, a imensidão do mar,
as ondas que o rochedo vêm beijar,
depois, voltam serenas sem rancor.

Cada onda que vem morrer na praia,
parece a minha vida que desmaia
ao pensar em perder o teu amor.
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Poetrix de
SUELY BRAGA
Osório/RS

Viver

     Vive com fé o presente,
     pois o futuro é uma incógnita.
     e o passado já ficou ausente.
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Soneto de
JOSÉ XAVIER BORGES JUNIOR
São Paulo/SP

Mágoas de amor

Não pense que eu seria indiferente
a tudo quanto tu representaste.
Teu Ser sempre será onipresente
No pouco que ficou do que levaste.

Levaste quase tudo, e em minha frente
espessam-se as brumas que causaste.
De tudo o que ficou resta somente
farrapos de um amor, que abandonaste.

Buscando-te no tempo, sigo o sonho
nas asas vacilantes da esperança,
que a ti meu coração cantando ata.

E assim, o coração a ti deponho
rendendo-me à tua mais cruel vingança:
a mágoa que me salva é a que me mata…
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Trova Humorística de
THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA
São Paulo/ SP

Passa o efeito do remédio
e o velho, sem jeito, avisa:
- Demorou demais o assédio
e o – furacão- virou "brisa"!
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Poema de 
FERNANDO PESSOA
Lisboa/Portugal, 1888 – 1935

Vendaval

Ó vento do norte, tão fundo e tão frio,
Não achas, soprando por tanta solidão,
Deserto, penhasco, coval mais vazio
Que o meu coração!

Indômita praia, que a raiva do oceano
Faz louco lugar, caverna sem fim,
Não são tão deixados do alegre e do humano
Como a alma que há em mim!

Mas dura planície, praia atra em fereza,
Só têm a tristeza que a gente lhes vê
E nisto que em mim é vácuo e tristeza
É o visto o que vê.

Ah, mágoa de ter consciência da vida!
Tu, vento do norte, teimoso, iracundo,
Que rasgas os robles — teu pulso divida
Minh'alma do mundo!

Ah, se, como levas as folhas e a areia,
A alma que tenho pudesses levar -
Fosse pr'onde fosse, pra longe da ideia
De eu ter que pensar!

Abismo da noite, da chuva, do vento,
Mar torvo do caos que parece volver -
Porque é que não entras no meu pensamento
Para ele morrer?

Horror de ser sempre com vida a consciência!
Horror de sentir a alma sempre a pensar!
Arranca-me, é vento; do chão da existência,
De ser um lugar!

E, pela alta noite que fazes mais'scura,
Pelo caos furioso que crias no mundo,
Dissolve em areia esta minha amargura,
Meu tédio profundo.

E contra as vidraças dos que há que têm lares,
Telhados daqueles que têm razão,
Atira, já pária desfeito dos ares,
O meu coração!

Meu coração triste, meu coração ermo,
Tornado a substância dispersa e negada
Do vento sem forma, da noite sem termo,
Do abismo e do nada!
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Trova da
Princesa dos Trovadores
CAROLINA RAMOS
Santos/SP

Os ponteiros marcham lento,
mais um ano que se acaba
- pede PAZ meu pensamento,
para um mundo que desaba!
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Hino de 
Amajari/RR

No extremo norte do Brasil
Surge opulenta
Terra querida Amajari
És o primeiro imponente e altaneiro
Força, Varonil, nunca se viu; Vila Brasil.

Os teus heróis e ancestrais que escreveram
As páginas da tua história,
Algo vistoso o que lhe é peculiar

Cheio de lutas e vitórias.
e na vanguarda tu deves ir
preeminente és Amajari

Amajari, rio Parimé
Ereu, Santa Rosa, Tiporém
Tuas palmeiras; proteção.
Aos aborígenes, irmãos.
Teu campo é um referencial da pecuária
Minérios e beleza têm,
No Paiva, Tepequém

A tua fauna abriga o tamanduá
Tua flora, pau-rainha e variedades,
Em Maraça para a posteridade.
Na sinfonia dos teus pássaros que lindo ouvir!
O belo canto do bem-te-vi,
Tens em teu nome a conjugação do verbo amar
Quem te vê, te ama e não esqueceu de ti.
Amajari
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Trova de
WAGNER MARQUES LOPES
Pedro Leopoldo/MG

Buganvílias em floradas,
junto ao muro do quintal.
Presença da passarada.
Primavera triunfal!
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Soneto de 
FRANCISCA JÚLIA
(Francisca Júlia da Silva Munster)
Eldorado/SP (antiga Xiririca) 1874 –  1920, São Paulo/SP

A um artista

Mergulha o teu olhar de fino colarista
No azul: medita um pouco, e escreve; um nada quase:
Um trecho só de prosa, uma estrofe, uma frase
Que patenteie a mão de um requintado artista.

Escreve! Molha a pena, o leve estilo enrista!
Pinta um canto do céu, uma nuvem de gaze
Solta, brilhante ao sol; e que a alma se te vaze
Na cópia dessa luz que nos deslumbra a vista.

Escreve!... Um céu ostenta o matiz da selagem
Onde erra o sol, moroso, entre vapores brancos,
Irisando, ao de leve, o verde da paisagem...

Uma ave banha ao sol o esplêndido plumacho...
Num recanto de bosque, a lamber os barrancos,
Espumeja em cachões uma cachoeira embaixo...
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Trova Premiada de
RITA MARCIANO MOURÃO 
Ribeirão Preto/SP

Neste teatro que há em mim,
do meu papel não lamento.
Sem saber qual é meu fim
enceno o final que invento.

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