sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Fernando A. Cavazzoni Junior (O Encontro com o Menino)



Um Conto De Natal Escrito Para Refletir E Meditar

- Olá! Faz tempo que você está aí?

- Faz. Já faz algum tempo sim, por quê?

- Eu estou indo de um dos meus pastos para outro, mas não pude deixar de notar aquela “muvuca” na estalagem ali embaixo, está vendo?

- Aquele “tropé” ali? - apontando com o dedo indicador – Estou, sim. Por coincidência estava olhando para lá também...

- É mesmo? E você sabe o que está acontecendo lá?

- Sei...

- E... você pode me contar?

- Você não sabe de nada, não é?

- Saber o que? Era para eu saber alguma coisa?

- De fato, não era não...

- Então, vou-me embora... você não vai me contar mesmo, vai?

- Não tem muita coisa para ser dita...

- Já sei! Estou te atrapalhando, não é? Vou embora então...

- Oh, não! Sente-se aqui comigo. Não vai me atrapalhar em nada. A propósito, como você se chama?

- Meu nome é Leigo, e você? Quem é?

- Eu sou Lú Scífer.

- Muito prazer – respondeu estendendo a mão para o cumprimento.

- Ah! O prazer é todo meu! Vejo que já se acomodou...

- Sim...

- Então, vou te contar o que vi até agora. Você está vendo aquele casal; ele na porta da estalagem e ela montada no jumento?

- Sim, estou vendo. Ele parece preocupado...

- Ah, não está não!

- Por quê? Como você sabe?

- Veja bem: eles saíram de Nazaré e vieram à Belém para o recenseamento. Você está sabendo, não está?

- Do recenseamento?

- Claro, meu jovem Leigo!

- Oh! Sim estou! Todos estão, na verdade. Esses romanos vivem contando a gente para ver se podem pegar mais dinheiro de nós...

- É verdade, mas sabe, as populações crescem... não é bom que cresçam muito... você sabe... daí vai faltar comida, casa para todos, é uma dificuldade só...

- O senhor trabalha para o governo?

- Trabalhar? Eu? Não, não... só estava pensando alto...

- Então, mas e o casal lá embaixo? Olha só, agora várias pessoas saíram da estalagem e estão indo para o estábulo, me parece.

- É... que será que vão fazer? Eu ia dizendo que eles vieram a Belém por conta do recenseamento, mas a moça, coitada, está grávida!

- É mesmo! Que legal!

- Legal? É sério? Imagina só! Ele a trouxe até aqui grávida! Deviam ter esperado a criança nascer. Seria muito mais humano para com a mulher, não acha?

- Ah... não sei... é... talvez. Viajar nesse estado deve ser difícil para Ela... vai ver... sei lá o que eles têm para fazer aqui? Talvez seja importante, não sei...

- Importante? O que pode justificar um homem pegar sua mulher grávida, e dizem por aí que nem são casados, e partir por estradas sombrias, de dia e de noite... com tantos perigos...

- Eu vivo por aqui e digo que não é tão perigoso assim... O senhor é daqui?

- Eu? Bem, eu diria que... sou do mundo... uma hora aqui, outra ali...

- Olha! Estão ajudando o homem a limpar o estábulo... acho que eles vão ficar instalados ali...

- É! Olha só... o homem trás a família na ultima hora e quer achar lugar na melhor estalagem da região... é o fim da picada mesmo!

- Será que não tem mais lugar por aí?

- Claro que não! Já estão tudo lotado e...

- Acho que vou até lá... a moça está grávida e eu tenho um quarto para hospedes na minha casa... vou levá-los para lá e dar...

- Você está louco, meu jovem?

- Eu? Por quê?

- Ora, você nem os conhece! Vai dar guarida para gente de fora, que você nunca viu antes? Está louco? O que os outros vão pensar?

- Puxa, mas eles parecem tão bons... não vejo nada estranho...

- Deixe que aqueles forasteiros cuidem deles... já estão lá mesmo!

O jovem Leigo interrompe dizendo em voz alta: - Olha só! Veja aquela...

- O que? O que? – responde Lú Scífer apressadamente.

- Aquela senhora saindo da casa grande, com água e panos nas mãos... acho que a Criança vai nascer agora! Vamos lá ver? É tão legal ver uma Criancinha recém nascida...

- Eu até gostaria de ir com você, mas... olha só... Está um nojo ali perto... tem coco de tudo que é tipo no chão... vamos sair de lá fedendo...

- Bem, tem um pouco de coco aqui e ali, mas é uma região de pastoreio, então tem que ter um pouco de coco por aí...

- Meu jovem; vejo que você está ficando empolgado com essa história, não está?

- Bem, eu queria ver o Neném nascer... é legal ver um nascimento... e veja que estrela linda no céu... está quase claro como dia... vai dar para ver tudo direitinho...

- É mesmo, não tinha notado a estrela... talvez se fossemos para o alto da colina pudéssemos ver melhor, que acha?

- Ir para o alto da colina? Mas aí vamos ficar mais longe. Como vamos ver melhor?

- Não, não... de lá de cima podemos ver mais e melhor... dá um ângulo melhor das coisas...

Enquanto Lú Scífer falava, o jovem Leigo não tirava os olhos da cena. Sem se dar conta do que havia sido dito, o jovem irrompe na conversa:

- Puxa! Veja quanta gente por perto, chegando... está juntando cada vez mais pessoas... Esse casal deve ser de gente importante, não acha?

- Importante! Que nada! É só mais um casal de gente pobre, perdida nesse mundo e incomodando as pessoas... E vai incomodar mais quando Aquela Criança nascer! Você vai ver...

- Então eu vou lá ver! Vamos?

- De jeito nenhum!

- Vamos! É só uma Criança nascendo...

Antes do jovem terminar a frase ouve-se o badalar de sinos – de sinos afinados e numa melodia empolgante, alegre, cheia de esperança.

- Você está ouvindo isso? – pergunta o jovem Leigo.

- O que?

- Esse som de sinos...

- Ah, isso? Estou... E daí?

- Bom, para começar, de onde vem?

- Que importa... vai acordar todo mundo...

- Meus amigos pastores devem estar acordados ainda. De certo estão ouvindo e virão para cá...

- Mais gente!

- É! E daí? Você se incomoda!

- Um pouco...

- Acho que vou até lá então...

- Não! Espera aí! Agora que ia te fazer um convite...

- Convite? Para que?

- Você é pastor, não é?

- Sou.

- Você disse que ia de um pasto seu para outro, certo?

- Certo. Muito observador de sua parte...

- Então você deve estar, digamos, bem na vida, não está?

- Como assim?

- Eu digo, deve ter um outro bicho para fazer um churrasco, não tem?

- Tenho, sim, alguns.

- Então meu caro! Eu queria te convidar para fazermos um churrasco! Que tal! Subimos o morro, vamos até seu pasto e eu mato um novilho enquanto você chama seus amigos... Faremos uma festa! Que tal?

- Legal, mas já é meio tarde e... olha só...

- O que?

- Meus amigos já estão lá embaixo!

- É mesmo?

- É! Só nós estamos aqui...

- Ótimo! Aqui nós estamos a salvo!

- A salvo? A salvo do que?

Lú Scífer vira a cara para o lado e diz em voz baixa: - ...é de quem, seu palerma!

- O que? Que foi que você disse?

- Deixa “prá” lá... Vamos fazer o churrasco ou não?

- Seria legal, mas tenho que ir andando...

- Você não vai lá embaixo, vai?

- Acho que sim. Estou vendo todos os meus amigos lá...

- Eu sou seu amigo e não estou lá...

O jovem Leigo pensa consigo: “que sujeito atrevido! Sinto que preciso ir embora mas ele está sempre me convencendo a ficar. Até que ele tem umas idéias boas, mas eu preciso sair...”

Enquanto o jovem pensava, outra pessoa se aproxima e diz:

- Olá vocês aí! Tudo bem?

Lú Scífer toma um susto e permanece calado. O Jovem responde:

- Tudo bem, obrigado. Você está vindo lá de baixo?

- Na verdade estava indo para lá e vi vocês aqui.

Lú Scífer se intromete, dizendo: - Pode ir então. Eu e meu amigo estamos bem aqui.

O jovem pergunta: - Vocês já se conhecem?

Eles respondem simultaneamente: - Já!

Então o jovem leigo pergunta ao que acaba de chegar: - Qual é seu nome, senhor?

- Eu me chamo Miguel.

- Muito prazer – responde o jovem estendendo a mão para cumprimentá-lo e emenda uma pergunta: - você sabe o que está acontecendo lá embaixo?

- Sei sim - responde Miguel, e continua – e ele também sabe.

- Quem? O Lú Scífer?

- Ele mesmo.

- Bem, isso já não importa mais. Preciso ir andando e não sei direito o que fazer.

Miguel toma a frente no dialogo: - O que você tem para fazer?

- Não sei se vou até lá embaixo ver aquela Criança ou procuro meus amigos para fazer um churrasco.

- Seus amigos estão lá embaixo...

- Parece que estão todos tão felizes naquele estábulo... Sinto uma vontade enorme de ir lá. Não sei por que, mas acho que vou para lá...

Lú Scífer solta um grito e sai correndo pelo campo.

- Puxa! Que sujeito estranho, não é Miguel?

- “Deixa ele pra lá”, mas cuidado! Ele volta qualquer hora dessas.

- Espero não vê-lo mais por aqui...

- Se você vai lá para baixo, eu te faço companhia.

- Ahm... eh... está bem, vou sim...

- Ótimo!

- Você disse que estava indo para lá, não é?

- Na verdade estou sim...

- Você conhece aquele casal?

- Conheço. Eles se chamam Maria e José. Maria acaba de dar a luz a um Menino, que se chama Jesus.

- Puxa! Você sabe tudo, heim!

- Sei muito mais! Vamos indo que te conto tudo no caminho.

- Beleza! Vamos nessa!

Fonte:
http://www.mesadoeditor.com.br/

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