segunda-feira, 9 de novembro de 2009

Leandro Rodrigues (Escrever ou não escrever, eis a questão!)


Conversando com uma prezada professora de Letras, a colunista deste site (http://www.escritoresdosul.com.br/) Tânia Ramos, soube de algo que já imaginava: A maioria dos estudantes de Letras têm medo de escrever, deixam de escrever, resolvem apenas lecionar, pesquisar, fazer qualquer coisa menos literatura. Isso acontece, entre outras, pelas cobranças que se fazem em relação à língua, à gramática, às concordâncias a serem utilizadas, à escolha das melhores palavras, enfim, diversos fatores linguísticos que bloqueiam o processo criativo e o seu fluxo.

Lógico que muitos escrevem bem, formam-se, fazem mestrado, doutorado, pós-doutorado, o diabo a quatro e publicam boas obras – o próprio entrevistado do site deste mês, Renato Tapado, é um exemplo. Mas, leiam novamente o que eu escrevi no primeiro parágrafo, e que agora ratifico aqui em letras maiúsculas: A MAIORIA deixa de escrever. E, se a maioria deixa de escrever, é sinal que uma graduação em letras não é o melhor caminho para quem deseja escrever seus sonhados best-sellers, é bom dizer. Nem sei, na verdade, se existe "melhor caminho" para se escrever algum best-seller, mas o que quero dizer é que aqueles que imaginam que a faculdade de Letras fará com que virem exímios Saramagos, Kafkas, Clarices, Éricos, tirem o "cavalinho da chuva". Não é por aí.

Se eu, que não faço Letras, fico me perguntando todos os dias a frase-título desta crônica ("escrever ou não escrever, eis a questão!") imaginem os que se graduam! Tantos exames fazem, tantas livros clássicos maravilhosos (ou trechos) lêem, tantas regras encaram, tantas exigências e cuidados para não maltratarem a língua possuem que abdicam até mesmo de tentar fazer uma boa literatura. “É melhor não tentar a fazer uma porcaria”, pensam, com certeza. De porcarias o mundo já está cheio mesmo, basta visitar a seção de mais vendidos das livrarias, por exemplo, ou criar um site de literatura como este e ver isso ainda mais de perto...

Todos os dias novas porcarias são publicadas. Graças a Deus, criariam a Internet e, desta forma, muitos pseudo-escritores puderam criar seus blogs e escreverem bobagens por lá ou nos fóruns das comunidades de relacionamentos, por exemplo. Se não fosse a Internet, teríamos mais destruições de milhares de árvores por aí para fabricação de papel para produção de mais lixo literário, o que é um atentado contra a natureza, que deveria ser punido como qualquer outro crime. Destruição da natureza para a produção de lixo literário é um absurdo que eu abomino! Viva a Internet!

Aliás, sou a favor de algo tipo "exame de OAB" para alguém poder ser declarar escritor (uma “OEB” – Ordem dos Escritores do Brasil), pois mesmo que estes exames não necessariamente formem bons advogados, pelo menos ninguém pode sair se declarando advogado por aí porque cursou um ou dois anos de Direito ou mesmo terminou a faculdade. É necessário mais que isso para ser considerado um advogado, bem como deveria ser necessário mais que um ou dois livros de poesias para alguém ser chamado de escritor. E falo não somente em relação à quantidade, pois há autores de um livro só muito bons, logicamente, mas sim em relação à qualidade, visto que da mesma forma há quem escreva quinze, vinte livros ruins e, portanto, não deveria ser chamado de escritor.

Na Bienal do Livro de Curitiba até livro do Alexandre Frota eu encontrei. Acho que ele ainda não se disse “escritor”, mas muitos que escrevem como ele se dizem. Sem contar os autores sem-noção e sem-talento que ficam enviando e-mails coletivos quase todos os dias (ou semanas) divulgando um monte de coisas desinteressantes que estão fazendo à espera de alguma atenção, elogio ou notoriedade.

Quero ressaltar então que se a faculdade de Letras é ruim pelo bloqueio criativo que ela pode trazer, o bom é que pelo menos ela dá para muitos esta noção de que é melhor não escrever para que depois não fiquem se ridicularizando por aí que nem estes autores que estou comentando, os divulgadores inconscientes de ruindades próprias. Pois acredito que é melhor não se dizer um “jogador de futebol” a ser um futebolista medíocre, que fica no banco de reservas ou nem no banco de reservas de um timeco da quarta divisão tem lugar.

Claro que muitos escrevem só pelo prazer de escrever, publicam só pelo prazer de publicar, bem como muitos jogam futebol nos campinhos de várzeas nos fins de semana com os amigos apenas porque gostam do esporte - fazendo uma pequena comparação, já que trouxe a questão do futebol. Só que não é por causa disse que podem se dizer “escritores”. Penso que o ideal seria dizer: “Eu escrevo”; “Eu gosto de escrever”, “Eu aprecio brincar de literatura”, mas não se identificar como “Escritor”.

“Eu sou escritor”, como alguns adoram dizer por ego ou sei lá o quê, é ofensivo, virulento e machuca a verdadeira e boa literatura.

Não tenho preconceito contra quem sabe que não é escritor, contra quem escreve por brincadeira, por prazer, por contentamento interno ou por julgar que só é feliz mesmo quem planta uma árvore, faz um filho e publica um livro. Tenho preconceito apenas contra quem escreve mal e afirma ao mundo que é escritor, mas mesmo assim seus nomes (muitos nomes) estão até mesmo neste site que edito porque não gosto de discriminações. Se dizem que são escritores e não há exames de “OEB” para dizer o contrário, quem sou eu para contestar? Por que tiraria um doce da boca de uma criança?

Meu maior preconceito, no entanto, é contra quem escreve bem mas decide não escrever devido às regras, bloqueios e exigências que passou a ter na faculdade, sobretudo na faculdade de Letras. Estes, sim, são até piores que os que escrevem mal e gritam ao mundo que são escritores, porque, como diria Kant, "não usar um talento que se tenha é uma das piores coisas que alguém pode fazer contra si mesmo." – é bonito citar Kant, mesmo que uma das poucas coisas claras realmente nele, algo quase inconfessável, é verdade, para a maioria dos estudantes de filosofia).

Mas, voltando à literatura, para terminar, escreva independente de alguma graduação se você de fato tem talento (mas não faça esta pergunta à sua mãe e a seus amigos, é lógico). E faça urgentemente uma faculdade de Letras se você não tem talento porque, desta forma, você se desencatará e não escreverá - ou pelo menos publicará lixos com algum requinte, disfarçados de "formosos" - o que é até aceitável, pois a beleza é sempre admirável, ainda que de palavras, frases soltas ou unicamente da capa...

(*Leandro Rodrigues (lerodriguesoriginal@hotmail.com) é editor do site Escritores do Sul, co-editor da revista Ciências da Saúde, estudante de filosofia da UFSC e autor de alguns textos que, talvez, um dia, virem livros...sabe-se lá...)

Fonte:
http://www.escritoresdosul.com.br/

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