sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Jean-Pierre Bayard (História das Lendas) Parte XII


CAPÍTULO IV

O CICLO ARTURIANO

O ciclo arturiano, apresenta-se como um conjunto vasto e fértil que prossegue os Romances corteses. E também denominado Matéria da Bretanha. A figura central continua a ser a de Artur, rei lendário de origem céltica; pretendeu-se ver nesse rei o mantenedor da luta contra os saxônios e que, para salvaguardar sua ilha, deixou-se matar em 542; esse rei liberal teria nascido em Tintagel, na Cornualha.

Artur — ou Artus — triunfa com suas armas maravilhosas, mas também pela amizade do mágico Merlin que é considerado algumas vezes como sendo um personagem real.

A rainha Guenièvre, filha do rei Léodagan, figura ideal da dama da corte, toma emprestado alguns traços a Isolda, outro personagem do ciclo. Guenièvre reina sobre os seus cavaleiros que se reúnem em volta da Távola Redonda; o casal real comanda empresas nobres e temerárias; o “geis” que é ao mesmo tempo um pedido piedoso e uma injunção de defesa, cria um obstáculo que é a base de perigosas aventuras. A fim de levar a bom termo a conquista de objetos-talismã e de taças com virtudes mágicas que embelezarão os tesouros do rei, as fadas ajudam os cavaleiros. Esses combates sobre naturais, esses próprios objetos, vêm de uma tradição pagã muito divulgada.

Quando o poderoso Artur vai penetrar em Roma, a revolta de seu sobrinho Mordret — que talvez seja também filho do adultério e do incesto entre Artur e a esposa do rei Loth — obriga-o a reconquistar seu reinado. Nessa campanha sangrenta, seus leais servidores morrem. Os saxônios aproveitam-se do sucedido para invadir o país e, no último episódio da carnificina, Artur e Mordret se ferem de morte.

É a ruína da cavalaria bretã, mas a sua esperança sobrevive. Artur teria sido levado vivo para o reino das fadas e um dia voltaria para restituir ao seu povo a independência e o poderio.

O ciclo arturiano contém a extraordinária Demanda do Santo Graal que se inicia com um romance de cavalaria e termina como uma narrativa mística.

Essas demandas permitiram a cada narrador de compor uma narrativa de acordo com seu temperamento; os episódios de combate se alternam com cenas sentimentais; atos de bravura sucedem às imagens voluptuosas e ordens breves de estratégia guerreira, às palestras galantes. Os progressos sucessivos afastam pouco a pouco o tema da deixa primitiva e depois os romances em prosa efetuam a fusão entre as lendas arturianas e as narrativas do Graal.

Essa mitologia céltica ter-se-ia formado por ocasião da invasão saxônia (450-510) e ter-se-ia enriquecido posteriormente com a inspiração vinda do continente. A história Britonum, atribuída a Nênio, foi retomada no século XII na História Regum Brittaniac de Geoffroi de Monmouth (1137). Wace menciona a Távola Redonda no seu Roman de Brut. A origem é talvez gaulesa a partir de Kuchwch e 0lwen ou irlandesa como diz Jean Marx baseado no texto dos Mafinogion.

Chrétien de Troyes nos legou esse conjunto extraordinário e sobrenatural. Hábil narrador, aproveitou a tendência do povo pelo fabuloso e criou romances de aventuras e de episódios palpitantes. Ao descrever Lancelote à procura da, rainha (Le chevalier à la charrette), imaginou um herói que tendo merecido o amor de sua amante arrisca-se a adormecer numa vida ociosa. Mas Yvain (ou Le chevalier au lion), voltará ao manejo das armas. Erec, o “cavaleiro do falcão”, depois das censuras de sua dama Enide, encontra novamente sua força.

Não podendo citar todos os trabalhos relativos a esse ciclo (remetemos o leitor à Histoire littéraire de la France, t. XXX e XXXI, de Gaston Paris e aos Romans de la Table Ronde, de Paulin Paris), observaremos que o assunto continua a ser o de um jovem cavaleiro desconhecido que, da corte de Artur, levará a bom termo uma aventura tida como impraticável; graças às suas qualidades, desposa a jovem que se acha envolvida e que lhe dá, como dote, um reinado.

Todas essas lendas comportam elementos míticos, pagãos, druídicos nos quais se envergará uma concepção mística cristã. Histórias humanas mescladas de história sagrada, conjunto que forma a tragédia da fraqueza humana cobiçando os poderes do espírito (o Graal). Este tema se assemelha ao de Fausto; Lancelote ficou sendo o valete de nossas cartas e o uso da torta de reis veio até nós. Estudaremos sucessivamente: A demanda do Santo Graal, Merlin, Tristão e Isolda.
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continua...
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Fonte:
BAYARD, Jean-Pierre. História das Lendas. (Tradução: Jeanne Marillier). Ed. Ridendo Castigat Mores

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