sábado, 12 de outubro de 2024

Recordando Velhas Canções (Rasguei minha fantasia)


(marcha/carnaval, 1935) 

Compositor: Lamartine Babo

Rasguei a minha fantasia
O meu palhaço
Cheio de laço e balão
Rasguei a minha fantasia
Guardei os guizos no meu coração

Fiz palhaçada
O ano inteiro sem parar
Dei gargalhada
Com tristeza no olhar
A vida é assim...
A vida é assim...
O pranto é livre
Eu vou desabafar

Tentei chorar
Ninguém no choro acreditou
Tentei amar
E o amor não chegou
A vida é assim...
A vida é assim...
Comprei uma fantasia de pierrô

A Melancolia por Trás da Fantasia
A música 'Rasguei a Minha Fantasia', de Lamartine Babo, é uma obra que explora a dualidade entre a alegria aparente e a tristeza interior. A letra começa com o eu lírico declarando que rasgou sua fantasia de palhaço, um símbolo de alegria e diversão. No entanto, ao rasgar essa fantasia, ele revela que guardou os 'guiços' (sinos) no coração, sugerindo que a tristeza e a melancolia ainda estão presentes, mesmo que escondidas.

O segundo verso aprofunda essa dualidade ao descrever como o eu lírico fez palhaçadas o ano inteiro, mas com tristeza no olhar. Essa imagem é poderosa, pois mostra como muitas vezes as pessoas escondem suas verdadeiras emoções atrás de uma máscara de felicidade. A frase 'A vida é assim!' é repetida, enfatizando a resignação do eu lírico diante das dificuldades e desilusões da vida. Ele tenta chorar, mas ninguém acredita em seu choro, e tenta amar, mas o amor não chega. Essas tentativas frustradas reforçam a sensação de isolamento e incompreensão.

Por fim, a música termina com o eu lírico comprando uma nova fantasia de pierrô, outra figura tradicionalmente associada à tristeza e à melancolia. Isso sugere que, apesar de tentar se livrar da fantasia de palhaço, ele ainda está preso em um ciclo de tristeza e desilusão. A escolha do pierrô como nova fantasia é significativa, pois essa figura é conhecida por sua expressão de tristeza e solidão, contrastando com a imagem alegre do palhaço. Assim, 'Rasguei a Minha Fantasia' é uma reflexão profunda sobre a complexidade das emoções humanas e a dificuldade de encontrar verdadeira felicidade e compreensão.
Fonte: https://www.letras.mus.br/lamartine-babo/1877876/significado.html

sexta-feira, 11 de outubro de 2024

José Feldman (Grinalda de Versos) * 3 *

 

A. A. de Assis (Banheiroteratura)

Neste mundo de gente apressada não sobra tempo livre para nada, muito menos para ler. Mal e mal se dá um jeito de olhar por alto alguns jornais e revistas, e só porque estar informado é ainda investimento. Livro quase ninguém mais abre.

Há, porém, dois derradeiros tipos de leitores inveterados: os que não conseguem dormir sem antes folhear um livro e os que fazem do banheiro seu gabinete cultural. Os adeptos da “sonoteratura” passam às vezes um ano com o mesmo volume, lendo duas ou três páginas por noite; os praticantes da “banheiroteratura”, idem.

Reza a medicina das vovós que ler no troninho pode prejudicar a saúde – sei lá se é verdade. Poucos, porém, parecem atentos a tais preocupações. Conheço gente que não entra no banheiro sem algo escrito. No mínimo como garantia para eventual carência de papel.

Um professor me disse que leu e releu a “Ilíada” e a “Odisseia” assim. Durante quase dois anos, dez minutos por dia. Outro aproveitou a ideia e está usando o mesmo processo para ler “Os sertões”, do Euclides. Depois pretende entrar no “Grande sertão – veredas”, do Rosa. Quem sabe algum dia chegue a Virgílio, Camões, Cervantes… 

Antigamente todo mundo curtia leitura. Sem televisão, sem rádio, sem cinema, sem celular, sem barzinho, a noite era vazia. O jeito era ler.

Gordos volumes de romances, contos, poemas. Minha mãe, embora tivesse feito na escola somente as primeiras séries, jamais ficava sem uma pilha de livros ao lado da cama. Leu toda a obra de Machado de Assis, de José de Alencar, e sabia de cor os versos da maioria dos poetas românticos e parnasianos.

Veio depois o que se costuma chamar de progresso, e com ele a necessidade de as pessoas trabalharem mais horas por dia. Veio também a maior variedade de programas.

E a leitura foi ficando de lado.

O jovem moderno lê apostilas e livros didáticos, sem os quais não consegue passar de ano na escola. O adulto lê o que interessa para o exercício de sua profissão. Literatura (arte literária) não tem mais vez. A não ser naqueles dez minutos diários a ela dedicados pelos que cultivam a “sono-“ ou a “banheiroteratura”.

O professor que leu a “Ilíada” e a “Odisseia” na “casinha” explica suas razões: dá aulas de manhã, de tarde e de noite, fica muitas vezes até de madrugada corrigindo trabalhos e provas ou preparando a matéria que ensinará no dia seguinte. Os únicos momentinhos sobrantes são mesmo aqueles em que se tranca para as urgências orgânicas. O bom e sábio Homero, lá do seu nobre assento etéreo, há de generosamente compreender e perdoar a irreverência. Afinal, neste agitado tempo de gente sem tempo, ler no banheiro já é uma grande homenagem prestada a quem escreve…

(Crônica publicada no Jornal do Povo em 10.10.2024)

Fonte: Texto enviado pelo autor 

Estante de livros (Madame Bovary; A Educação Sentimental; Bouvard e Pécuchet, de Flaubert)


As obras de Gustave Flaubert são marcos do realismo literário, cada uma abordando questões universais de modo profundo e provocativo. Através de sua prosa refinada e personagens complexos, o autor continua a ressoar com leitores contemporâneos, oferecendo reflexões sobre a condição humana e as contradições da sociedade.

1. Madame Bovary
Este livro narra a vida de Emma Bovary, uma mulher que se sente entediada e insatisfeita com sua vida provincial e seu casamento com Charles Bovary, um médico simples e bondoso. Emma anseia por paixão e emoção, inspirada por romances idealizados que leu em sua juventude. Ela busca escapar da monotonia através de relacionamentos extraconjugais com Rodolphe e Léon, além de gastar dinheiro em luxos que não pode pagar.

A busca incessante de Emma por uma vida ideal leva a consequências trágicas. Sua infidelidade e consumismo resultam em dívidas crescentes, e, ao perceber que seus sonhos permanecem inatingíveis, ela se desespera. No final, Emma toma a drástica decisão de se suicidar, deixando Charles devastado e os credores atrás de sua família.

"Madame Bovary" é uma crítica incisiva à sociedade burguesa do século XIX, explorando temas como o descontentamento, a busca por identidade e a ilusão do romance. Flaubert utiliza um estilo de realismo meticuloso, usando detalhes vívidos para retratar a vida cotidiana e as emoções de Emma. A estrutura do romance é notável, com uma narrativa que interliga os pensamentos íntimos de Emma e a percepção externa da sociedade.

O personagem de Emma é complexo; ela simboliza a luta entre a aspiração e a realidade. Sua insatisfação reflete não apenas uma crise pessoal, mas também uma crítica social à falta de opções para as mulheres da época. Flaubert desafia as convenções do romance romântico, subvertendo as expectativas do leitor e apresentando a tragédia de uma mulher que busca algo além do que a vida lhe oferece.

2. A Educação Sentimental
Esta obra acompanha a vida de Frédéric Moreau, um jovem de 18 anos que se muda para Paris em busca de amor e aventura. Frédéric se apaixona por Madame Arnoux, uma mulher casada que representa o ideal romântico que ele busca. Ao longo da narrativa, ele testemunha e participa de eventos políticos e sociais que moldam a França do século XIX, incluindo as revoluções de 1848.

A história explora as desilusões amorosas de Frédéric, suas amizades e seus encontros com uma variedade de personagens que representam diferentes aspectos da sociedade. Apesar de suas aspirações e sonhos, Frédéric acaba se sentindo perdido e incapaz de realizar suas ambições, levando a um sentimento de frustração e desilusão.

"A Educação Sentimental" é uma rica análise da juventude, do amor e das transformações sociais. Flaubert utiliza uma narrativa fragmentada e um estilo de prosa altamente detalhado para capturar a complexidade da vida parisiense e a confusão emocional de Frédéric. O romance é também uma crítica à superficialidade da sociedade burguesa e das convenções sociais que limitam a liberdade individual.

Os personagens de Flaubert são multifacetados, refletindo a diversidade da experiência humana. Frédéric, em particular, é um anti-herói que encarna a incerteza da geração que viveu durante períodos de grande mudança. Sua incapacidade de agir e sua busca por significado ressaltam a alienação e o desencanto que permeiam a obra.

3. Bouvard e Pécuchet
Segue a história de dois copistas, Bouvard e Pécuchet, que, após herdarem uma pequena fortuna, decidem buscar conhecimento e se aventurar em várias disciplinas, incluindo a medicina, a agricultura e a filosofia. No entanto, suas tentativas de aprender e aplicar novos conhecimentos são tratadas com um tom de ironia e sátira, pois eles rapidamente se tornam obcecados e desiludidos.

A história é marcada por uma série de fracassos e mal-entendidos, levando Bouvard e Pécuchet a perceber que o desejo de conhecimento muitas vezes é fútil. Ao final, eles retornam a suas vidas simples de copistas, sem realmente compreenderem as lições que tentaram aprender.

"Bouvard e Pécuchet" é uma crítica mordaz à superficialidade do conhecimento e ao entusiasmo irracional pela ciência e pela educação. Flaubert explora a ideia de que o saber não é suficiente para garantir a sabedoria ou a felicidade. A obra aborda as limitações do conhecimento humano e as armadilhas do empirismo.

O estilo de Flaubert é caracterizado por uma ironia sutil, e ele utiliza o humor para expor a tolice de seus personagens. Bouvard e Pécuchet representam a busca incessante da humanidade por compreensão e controle, enquanto suas falhas ilustram a fragilidade da condição humana. Flaubert, com seu olhar crítico, questiona a validade da aquisição de conhecimento sem entendimento profundo e reflexão.

Fonte: José Feldman. Estante de livros. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul, 2024.

Recordando Velhas Canções (Os olhos dela)

(xote, 1906) 

Compositores: Catulo da Paixão Cearense e Irineu de Almeida

Eu sou capaz de confessar 
Aos pés de Deus 
Que eu nunca vi em mundo algum 
Uns olhos como os teus! 
Eu não sei mesmo 
Como os hei de comparar, não sei 
Eu já tentei cantar 
O teu divino olhar

Depois de tanto versejar 
Debalde em vão 
Depois de tanto apoquentar 
A minha inspiração 
Cheguei à triste conclusão 
De que eu só sei sofrer 
E o que teus olhos são 
Não sei dizer

Deixa-te estar que quando eu morrer 
Irei verter os prantos meus nos céus 
Hei de contar em segredo a Deus 
As travessuras desses olhos teus 
Hei de mostrar ao Senhor Jesus 
Ao Pai nos céus, apiedado 
Meu coração crucificado 
Nos braços teus de luz

Os olhos teus são lágrimas do amor 
Os olhos teus são dois suspiros de uma flor 
São dois soluços d’alma 
São dois cupidos de poesia 
Que sinfonia tem o teu olhar 
Que até às vezes já nos faz chorar! 
Ai, quem me dera me apagar assim 
À luz do teu olhar!

Os olhos teus 
Quando nos querem castigar 
Parecem dois astros de gelo 
Que nos vêm gelar 
Mas quando querem nos ferir 
Direito o coração 
Eu não te digo não 
O que os teus olhos são

Pois quando o mundo quiser 
De vez findar 
Basta acendê-lo com um raio 
Desse teu olhar 
Que os olhos todos das mulheres 
Que mais lindas são 
Dos olhos teus 
Não têm a irradiação

A Fascinação e o Mistério dos Olhos Dela
A música "Os Olhos Dela" é uma ode à beleza e ao mistério dos olhos de uma mulher amada. Desde o início, o eu lírico confessa que nunca viu olhos tão impressionantes em toda a sua vida, comparando-os a algo divino e inigualável. A dificuldade em descrever a profundidade e o impacto desses olhos é evidente, pois ele admite que, apesar de seus esforços poéticos, não consegue encontrar palavras adequadas para expressar o que sente.

A letra explora a dualidade dos olhos da amada, que podem tanto castigar quanto ferir o coração do eu lírico. Essa ambiguidade é uma metáfora para a complexidade das emoções humanas e a capacidade do olhar de transmitir sentimentos contraditórios. Os olhos são descritos como astros de gelo que podem gelar, mas também como algo que pode ferir profundamente, mostrando a intensidade do amor e da dor que eles podem causar.

No final, o eu lírico eleva os olhos da amada a um nível quase sagrado, comparando-os aos de Maria, a mãe de Jesus. Essa comparação não só exalta a pureza e a santidade dos olhos, mas também sugere um amor que transcende o mundano e se aproxima do divino. A música, portanto, é uma celebração da beleza, do mistério e da complexidade das emoções humanas, encapsuladas no olhar de uma mulher.
Fonte: https://www.letras.mus.br/vicente-celestino-musicas/os-olhos-dela/significado.html

quinta-feira, 10 de outubro de 2024

Daniel Maurício (Poética) 78

 

José Feldman (Pafúncio no campo de futebol)

Era uma tarde ensolarada em uma cidade onde o futebol era quase uma religião. O clima estava eletrizante, pois o grande jogo da final do campeonato nacional se aproximava. A revista “Fuxicos & Fofocas”, sempre em busca de uma boa história, decidiu que era hora de fazer uma cobertura especial do evento, e, claro, o jornalista Pafúncio Epaminondas foi escolhido para entrevistar os jogadores.

O problema? Pafúncio não entendia nada de futebol. Ele sabia que a bola era redonda e que o objetivo era fazer gols, mas isso era tudo. No entanto, seu editor acreditava que sua habilidade de fazer perguntas poderia resultar em algumas respostas memoráveis. E assim, ele se preparou para a missão.

Chegando ao estádio, Pafúncio vestia uma camisa de um time que ele nem sabia qual era — ele simplesmente pegou a primeira que viu no armário. O ambiente estava repleto de torcedores animados, bandeiras tremulando e gritos de incentivo. Ele se sentiu um pouco deslocado, mas decidiu seguir em frente.

Com seu bloco de notas e caneta em mãos, o jornalista se dirigiu à área de entrevistas, onde os jogadores estavam se preparando para falar com a imprensa. Ele avistou o famoso atacante da equipe, um homem musculoso chamado “Marco Gol”, e foi em sua direção.

“Oi, Marco! Se você fosse um animal, qual seria e por quê?” Pafúncio perguntou, com um sorriso que revelava sua total falta de noção. O jogador, surpreso, olhou para ele e respondeu: “Um leão, porque sou o rei do campo!”

Pafúncio, sem perder tempo, anotou: “Marco Gol se vê como um leão! O rei do campo!” Em sua mente, isso era ouro puro para a revista.

Mas ele não parou por aí. Em seguida, decidiu entrevistar a goleira da equipe, uma mulher chamada “Tana Defesa”. Ele chegou perto e, sem pensar, disparou: “Tana, se você tivesse que escolher entre salvar um gol ou comer um bolo de chocolate, o que escolheria?”

Tana, com uma expressão de espanto e riso, respondeu: “Bom, eu sempre escolheria salvar o gol, mas um bolo de chocolate depois do jogo é tentador!”

“Então, o segredo de uma grande goleira é um bom bolo!” Pafúncio anotou, divertindo-se com sua própria lógica.

Depois de algumas entrevistas absurdas, Pafúncio se sentia cada vez mais confiante, mesmo que não entendesse nada do que estava acontecendo. Ele viu uma oportunidade de ouro ao avistar o técnico da equipe, um homem sério chamado “Armando Tática”. Pafúncio se aproximou, tentando parecer profissional, e perguntou: “Armando, se o futebol fosse uma dança, qual seria e por quê?”

Armando, que não esperava essa pergunta, hesitou e respondeu: “Talvez um tango, porque é preciso muito trabalho em equipe.”

Pafúncio, anotando tudo, pensou em como poderia transformar isso em uma matéria divertida. “Armando Tática diz que o futebol é um tango! Preparem-se para a dança do campeonato!”

Enquanto isso, a atmosfera do estádio estava se aquecendo, e Pafúncio decidiu que precisava fazer mais perguntas. Ele encontrou um jogador que estava se alongando e perguntou: “Se você fosse um super-herói, qual seria seu poder durante uma partida?” O jogador, já acostumado com perguntas estranhas, respondeu: “Super velocidade, claro!”

Pafúncio, animado, exclamou: “Então, você corre mais rápido do que a fofoca na redação!” O jogador riu, mas Pafúncio não percebeu que estava começando a perder a noção da situação.

Ao longo do dia, ele continuou a fazer perguntas absurdas, como: “Se você pudesse trocar de lugar com a bola durante um jogo, o que diria a ela?” e “Qual música você cantaria se estivesse em campo, e por que seria uma balada romântica?” Os jogadores, embora confusos, se divertiram.

Finalmente, chegou a hora do grande jogo. Pafúncio, agora um pouco mais confortável, decidiu que precisava fazer uma última pergunta para o capitão da equipe, um homem carismático chamado “Lino Capitão”. Ele se aproximou e, em um momento de pura inspiração, soltou: “Lino, se a vitória fosse um sabor de sorvete, qual seria e por quê?”

Lino, sem saber se ria ou se ficava sério, respondeu: “Chocolate, porque é sempre a escolha certa!” Pafúncio, radiante, gritou: “Vitória é chocolate! Preparem-se para a taça mais doce da história!”

O jogo começou, e Pafúncio, agora como um verdadeiro comentarista, decidiu que tinha que fazer uma análise ao vivo. Ele começou a gritar coisas como: “Olhem! O leão está correndo para o gol!” e “Tana vai guardar o gol como uma mãe guarda seu filho!” As pessoas ao seu redor riam da sua empolgação, e até alguns torcedores começaram a aplaudir suas observações absurdas.

Ao final do jogo, que terminou em uma vitória emocionante para a equipe de Pafúncio, ele se sentiu como o verdadeiro herói da história. Embora não tivesse entendido nada do que aconteceu em campo, ele conseguiu capturar a essência do evento com suas perguntas inusitadas e seu jeito descontraído.

De volta à redação, Pafúncio escreveu uma matéria que misturava futebol com humor, destacando a visão única que ele trouxe ao evento. E assim, com risadas e trapalhadas, ele provou que, mesmo sem entender o jogo, ainda era capaz de fazer uma cobertura inesquecível e divertida. Afinal, no mundo do futebol, o mais importante é saber aproveitar a alegria do momento — e, se possível, comer um bom bolo de chocolate depois!

Fonte: José Feldman. Peripécias de um jornalista de fofocas & outros contos. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul, 2024.

Gilmário Braga (E assim conheci o amor)

Eu e Helinho éramos muito amigos. Estávamos sempre juntos. Digo, éramos, porque com o passar dos anos fomos nos distanciando, assim como acontece com a maioria das pessoas. A turma na época dizia que pegava mal, e fazia gozação conosco dizendo que tínhamos um caso. Estávamos com 17 anos.

Certo dia, Helinho resolveu desabafar comigo um particular envolvendo ele e a namorada. Na ocasião ele me contou que a mãe dela implicava muito com ele, interferindo no namoro deles. Meu amigo disse-me não saber mais o que fazer para resolver aquela situação, e por isso resolveu pedir minha ajuda. Como ajudar se eu não a conhecia. Mesmo assim ele insistiu dizendo que daria um jeito de nos apresentar. Será que iria dar certo?

- De onde você tirou essa ideia, Helinho? Que a mãe da sua namorada vai me ouvir? Eu nem sequer a conheço.

- Você foi a única pessoa que me veio a mente, Paulinho. Você é um sujeito bom de lábia, é bem articulado, bom com as palavras (pausa) – Ah! Quebra essa pra mim, meu amigo!

- Claro que eu gostaria de te ajudar. Só não sei se essa ideia vai dar certo.

- Não custa nada tentar. Eu gosto demais da Íris, mas infelizmente ela vai muito pela cabeça da mãe. Eu tenho medo que ela estrague o nosso namoro.

- Eu entendo, amigo. E o marido dela? E se ele estiver lá? Eu não quero confusão para o meu lado. – e concluiu, sorrindo. – Eu estou muito novo para morrer.

- Quanto a isso você pode ficar tranquilo. Dona Vilma é viúva. E então? Você topa fazer pelo menos uma tentativa para me ajudar?

- Só vou fazer isso porque gosto muito de você, meu amigo. Só não posso garantir que terei êxito.

A data escolhida por Helinho não poderia ter sido melhor. 24 de dezembro. Estávamos no final do ano de 1977. Como todos sabem, véspera de natal. Ele me passou o endereço e ficamos de nos encontrar por lá mais ou menos as 21 hs, e logo depois iríamos para a casa da tia dele que morava em outro bairro. Segundo ele, o natal na casa da tia era muito bom. Antes disso eu tive que cumprir com a minha jornada de trabalho naquele dia e em virtude de um imprevisto ¨felizmente¨ acabei me atrasando. Depois, você vai entender o porque eu disse felizmente acabei me atrasando. Cheguei na casa de Íris um pouco exausto na tentativa de ainda encontrá-los por lá. Toquei a campainha e fui recebido supostamente pela mãe dela.

- Boa noite, senhora. Aqui é a casa da Íris? Eu sou Paulo, amigo do Helinho, namorado dela.

- Sim. Boa noite. Eu sou Vilma, mãe da Íris. Eles acabaram de sair. Você quer entrar um pouco?

Eu seria muito bobo se não aceitasse o convite para entrar. Pensei. Eu entrei e fui logo dizendo:

- Eu imaginei que eles não fossem me esperar tanto. Eu me atrasei demais. Tive um imprevisto no trabalho, peguei trânsito também. O pior é que eu não sei onde a tia do Helinho mora.

- A Íris ficou de me ligar. Eu aproveito e digo que você está aqui (pausa) – Sente-se rapaz! Descanse um pouco! Quer tomar uma água? Um suco?

- Eu aceito uma água. 

- Eu vou buscar.

Dona Vilma retirou-se lentamente em direção a cozinha e só aí que eu me dei conta da mulher que era a mãe da namorada do eu amigo. Eu estava admirado, encantado com tamanha beleza. Dona Vilma era simplesmente linda. Ela voltou com a água, sentou-se de frente para mim e cruzou as pernas. Que formosura de mulher. Eu mal conseguia disfarçar o meu encanto, meu entusiasmo de estar ali diante dela. Eu nem sei mais se gostaria de ir ao encontro dos meus amigos. Seria melhor que a Iris nem ligasse e se ligasse não perguntasse por mim. Notando minha inquietude, meus olhares, ela surpreendeu-me com uma pergunta:

- O que tanto você me olha, menino?

Aquela palavra, menino, veio para mim como se ela estivesse colocando uma enorme distância entre nós, e meio sem jeito respondi:

- Longe de mim querer ser ousado, dona Vilma. A senhora é muito bonita!

Notei que ela ficou meio sem jeito, desconcertada, e logo em seguida disse:

- Muito obrigada! Mas falando desse jeito você me deixa constrangida, Paulo.

Dona Vilma era uma mulher encantadora. Morena, pele lisa, um corpo perfeito e um par de olhos castanhos lindos  que me deixavam perdido entre eles, além de uma fala muito suave. O que fazer diante de uma viúva tão formosa na altura dos seus 35 ou 36 anos que era mais ou menos o que ela deveria ter. Conversa vai, conversa vem e eu não conseguia entrar no assunto sobre o qual teria que falar com ela.

- Você aceita uma taça de vinho? – perguntou-me solícita. – Daqui à pouco a Íris me liga, como te falei ainda pouco.

- Sim. Eu aceito. Só não sei se ainda quero me encontrar com eles.

Servimo-nos do vinho e logo em seguida o telefone tocou. Era a Iris. Ela conversou alguns minutos com a filha, fez algumas recomendações e em seguida despediram-se. Um detalhe chamou a minha atenção: Ela não mencionou a minha presença, e isso já era um ótimo sinal.

- A hora passou tão rápido que eu nem me dei conta. Já são quase 23hs. – disse ela enquanto tomava mais um pouco de vinho.

- É porque a conversa está agradável.

Parei e fiquei olhando-a por alguns instantes tentando tomar coragem e entrar no assunto envolvendo Helinho.

- O que foi, Paulo? Você ficou quieto de repente. Você quer me dizer alguma coisa?

- Quero sim. Mas estou sem coragem. Não sei se devo (pausa) – É sobre o Helinho.

Ela fez uma expressão séria e perguntou-me:

- O que você quer falar sobre aquele rapaz? Eu não aprovo o namoro deles. Acho que ele não vai fazer minha filha feliz. Mas ela insiste neste namoro. Fazer o quê?

Pela expressão e o jeito como ela falou, achei que estivesse colocado tudo a perder. Silenciei pensando em um jeito de reverter aquela situação. Naquele momento tudo o que eu mais queria era ficar com ela. Tê-la em meus braços nem que fosse somente por aquela noite. Ela continuou:

- Se você veio aqui para falar sobre ele, perdeu seu tempo. Eu não simpatizo nem um pouco com aquele rapaz. Tenho medo que ele faça a minha filha sofrer.

Mesmo correndo risco de estragar aquela noite, tentei argumentar:

- Eu acho que a senhora está enganada a respeito do Helinho. Ele é um bom sujeito. Somos amigos há anos. Posso garantir à senhora que ele é uma pessoa direita. A senhora pensa assim talvez por não conhecê-lo melhor.

- Olha aqui, Paulo. Eu sei que vocês são amigos, se gostam muito, você também é amigo de minha filha, mas eu não quero falar sobre isso com você.

Depois de ouvir essas palavras pensei: – Estava tudo perdido. Só cabia a mim naquele momento me justificar e tentar salvar aquela noite que estava mal começando:

- Desculpe-me, dona Vilma! Eu não quis ser inconveniente (pausa) – A senhora quer que eu vá embora?

- Não precisa se desculpar. Você não foi inconveniente e nem precisa ir embora. Eu só não quero falar sobre este assunto contigo. Vamos esquecer este assunto. Eu vou preparar uns petiscos para comermos e mais um pouquinho de vinho enquanto aguardamos a chegada do natal.

- Só não podemos ficar embriagados. – complementei sorrindo. 

- Com certeza! - concordou ela, servindo-me mais um pouco de vinho.

- Eu posso colocar uma música, dona Vilma?

- Fique à vontade. Só não sei se você vai gostar dos discos que temos aqui.

Apanhei alguns discos, e entre eles escolhi uma melodia que eu gostava muito. Hotel Califórnia que fazia muito sucesso na época. Em seguida a surpreendi com um convite.

- Vamos dançar!

Ela pensou por alguns segundos e respondeu logo em seguida.

- Sim. Vamos. Há tempos eu não sei o que é dançar.

Aquela foi a primeira oportunidade de abraçá-la, sentir aquele corpo, aquele cheiro. Que momento lindo! Que entrada de natal maravilhoso! Que presente! Sem dúvida um momento para nunca mais ser esquecido. Impulsionado pela melodia tentei beijá-la:

- Por favor, Paulo! Não! Ainda é muito cedo pra isso.

- Por que não? Só estamos nós dois aqui. Eu quero e sei que você também quer. Deixa acontecer! Não temos nada a perder.

Embalados pela música nos entregamos aos nossos sentimentos e desejos, e ali nasceu o nosso primeiro beijo.

- Isso não deveria ter acontecido, Paulo.

- Por que? Você não gostou? Eu amei.

Sem nenhuma resistência ela se entregou novamente em meus braços, e apanhando-a no colo fomos para o lugar mais confortável daquela casa. O quarto dela. Aquele foi o melhor natal de minha vida e tenho certeza que o dela também. Nos amamos, e passamos a noite quase toda namorando. E Assim conheci o Amor. No amanhecer do dia nos despedimos com muitos beijos e juras de amor. Eu queria passar o dia 25 com ela, mas não seria bom a Íris me encontrar por lá.

Alguns dias depois, Helinho me procurou feliz da vida para me falar sobre as mudanças repentinas da futura sogra em relação a ele. Estava tratando-o superbem e não intrometia-se mais no namoros deles. Eu fiquei feliz por eles e mais ainda por naquela noite ter conhecido o grande amor de minha vida.

No início não foi fácil assumirmos o nosso amor. Por um lado, os meus pais por causa da minha idade, e por outro, a filha dela apesar de sermos amigos. O que eu senti por Vilma quando eu a vi pela primeira vez não foi somente desejo, mas sim amor. Lutamos contra as barreiras e o preconceito, mas felizmente nosso amor venceu.

Palavras do Autor: Só com Amor venceremos todas as barreiras.

Fonte: Texto enviado por Aparecido Raimundo de Souza

Recordando Velhas Canções (Tristeza de Caboclo)

(tanguinho, 1916) 


Compositores: Marcelo Tupinambá e Arlindo Leal

Quando na roça anoitece 
Fico sempre a meditá!..  
(Coro) Fica sempre a meditá!... (bis) 
Meu coração, que padece, 
 Não me deixa sossegá!... 
(Coro) Não o deixa sossegá!.. (bis)

Estribilho: 
Minh'arma, com fervô, 
Quando há lua 
Chora o seu amô 
E sem podê
se aconsolá 
Garra logo a suspirá!... 
(Coro) Quem ama, com fervô… (bis)

Meu coração, com tristeza, 
Quando surge o bom luá. 
(Coro) Quando surge o bom luá... (bis) 
Sabe, com muita firmeza, 
Seus queixumes disfarçá!... 
(Coro) Seus queixumes disfarçá!.. (bis)

Estribilho: 
Minh'arma, com fervô, 
Quando há lua 
Chora o seu amô 
E sem podê
se aconsolá 
Garra logo a suspirá!... 
(Coro) Quem ama, com fervô… (bis)

Quem sabe amá, com ternura, 
Nunca deixa de sonhá... 
(Coro) Nunca deixa de sonhá! (bis) 
Não sofre a negra amargura 
Que me anda a acabrunhá! 
(Coro) Que o anda a acabrunhá!.. (bis)

Estribilho:
Minh'arma, com fervô, 
Quando há lua 
Chora o seu amô 
E sem podê
se aconsolá 
Garra logo a suspirá!... 
(Coro) Quem ama, com fervô… (bis)

Quando eu pego na viola, 
Com vontade de cantá, 
(Coro) Com vontade de cantá!... (bis) 
Meu coração se aconsola, 
Alliviando seus pená!…
 (Coro) Alliviando seus pená!... (bis)

Fonte: https://cifrantiga3.blogspot.com/2006/03/tristeza-de-caboclo.html

terça-feira, 8 de outubro de 2024

Varal de Trovas n. 613

 

José Feldman (Peripécias de um Jornalista de Fofocas)

Na redação da famosa revista de fofocas "Fuxicos e Fofocas", o clima era de agitação. O editor-chefe, um homem de bigode espesso e olhar afiado, caminhava de um lado para o outro como um tigre na jaula. Era dia de lançamento da nova edição, e o que todos esperavam era uma matéria bombástica sobre a última festa da alta sociedade.

No meio daquela confusão estava Pafúncio, o jornalista mais atrapalhado da equipe. Ele era conhecido por suas histórias engraçadas e sua habilidade inata de se meter em encrencas. Para ele, cada dia era uma nova aventura — ou desventura, dependendo do ponto de vista.

Na noite anterior, Pafúncio havia sido enviado para cobrir a festa de lançamento do novo perfume da atriz famosa, Catarina Monteiro. “Isso vai render uma capa!” gritou o editor, enquanto entregava a missão a Otávio, que balançou a cabeça, tomando um gole de café que quase lhe queimou a língua.

“Sem problemas, chefe! Vou tirar as melhores fotos!” prometeu, embora já tivesse esquecido onde havia colocado seus apetrechos.

Chegando ao evento, Pafúncio percebeu que, haviam várias coisas que ele havia esquecido: o nome da atriz, o endereço exato do local e, parece, toda a sua dignidade. A festa estava cheia de celebridades, e ele se sentiu um peixe fora d’água. Ele decidiu que o melhor a fazer seria se misturar à multidão e esperar que a sorte o ajudasse.

“Um brinde ao novo perfume!” anunciou Catarina, com um sorriso que poderia iluminar uma cidade inteira. As câmeras dos paparazzi dispararam, flashes iluminando o ambiente.

Pafúncio, com a mão suando, percebeu que tinha que agir rápido. “Preciso de uma foto! Preciso de uma foto!” repetia para si mesmo, enquanto tentava se aproximar da atriz.

Com um golpe de sorte, ele conseguiu um lugar na primeira fila. Mas, ao se agachar para ajustar a lente da câmera, Pafúncio se distraiu e, em um movimento desastrado, derrubou seu copo de bebida em cima do tapete. “Oh não!” ele gritou, enquanto tentava limpar a bagunça com as mãos.

Nesse momento crucial, ele se esqueceu completamente de sua câmera, que estava pendurada em seu pescoço. Ao se levantar, a câmera balançou, e antes que ele pudesse perceber, foi parar no chão, fazendo um barulho que ecoou pela sala. “Parece que alguém está com problemas!” ouviu alguém rir.

“Ah, ótimo!” pensou Pafúncio, enquanto tentava recuperar a dignidade. Mas ao olhar para o chão, percebeu que a câmera havia desaparecido.

“Não! Não! Não!” ele sussurrou desesperadamente. A única coisa que ele conseguiu tirar da festa era um belo retrato do seu próprio desespero.

Quando a festa terminou, Pafúncio decidiu que não podia voltar à redação de mãos vazias. “Preciso encontrar essa câmera!” pensou. Ele se lembrou de que, durante a festa, havia visto um garçom com um olhar curioso. “Ele pode ter visto alguma coisa!” Então, saiu em busca do garçom.

“Ei! Você viu uma câmera por aqui?” perguntou Pafúncio, tentando parecer confiante.

“O que é uma câmera?” respondeu o garçom, com um olhar de desprezo. “Desculpe, estou mais preocupado com os copos vazios.”

Desesperado, Pafúncio percorreu o local da festa, perguntando a todos os garçons e convidados se alguém havia visto sua câmera. O problema? Ele não conseguia se lembrar de como ela era. “Era uma câmera… grande… com uma lente… e um botão!” ele dizia, mas ninguém parecia entender.

Depois de horas de busca, Pafúncio finalmente se deu conta de que precisava de um plano B. Ele decidiu que a única solução era implorar para o editor que lhe desse outra câmera. Ao voltar à redação, ele se deparou com um olhar furioso do editor.

“O que aconteceu com a sua matéria?” o editor gritou, com os braços cruzados.

“Er… eu… perdi a câmera,” Pafúncio respondeu, sentindo-se pequeno como um grão de areia.

“Perdeu a câmera? Isso é tudo que você tem a dizer?!” o editor exclamou, quase se engasgando com sua própria indignação.

“Mas, chefe! Eu tenho uma ideia brilhante!” Pafúncio disse, tentando mudar de assunto. “E se eu fizesse uma matéria sobre a arte de perder coisas? Não é todo dia que alguém perde uma câmera na festa da Isabela Monteiro!”

O editor o olhou com uma mistura de incredulidade e raiva, mas, para surpresa de Pafúncio, ele começou a rir. “Você realmente tem um talento para arrumar encrenca, não é? Faça a matéria, mas se lembre: sem mais câmeras perdidas!”

E assim, o que começou como uma desventura desastrosa se transformou em uma crônica hilária sobre a arte de perder coisas, com Pafúncio como o protagonista de sua própria comédia. O artigo foi um sucesso, e a fama do jornalista atrapalhado cresceu na redação.

Na próxima festa, Pafúncio prometeu a si mesmo que não perderia a câmera. Mas, se isso acontecesse, ele sempre poderia escrever sobre “Como perder a dignidade em 10 passos”. Afinal, com ele, cada dia era uma nova aventura — ou desventura — e ele estava mais do que disposto a compartilhá-la com o mundo.

Fonte: José Feldman. Peripécias de um jornalista de fofocas & outros contos. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul, 2024.

Vereda da Poesia = 128 = Acertando Izo Quadra Hino



Trova de
IZO GOLDMAN
Porto Alegre/RS, 1932 – 2013, São Paulo/SP

"Casamento... - alguém já disse -
é chegar à encruzilhada
onde acaba a criancice
e começa...a criançada..."
= = = = = = 




Trova Popular

Alma no corpo não tenho:
minha existência é fingida;
sou como o tronco quebrado,
que dá sombra sem ter vida.
= = = = = = 







Hino de 
Salto do Lontra/PR

Foi chegando o Bandeirante
Seu semelhante a irradiar
A esperança d'alma nobre
Na grandeza do lugar

Mais que a terra tão selvagem
Foi valente o sonhador
Fez brotar da terra bruta
O feijão, a paz e o amor.

(Refrão)
Salto do Lontra és coração do sudoeste
A Senhora Aparecida é quem vigia seu andar
Pelos caminhos da bonança que fizeste
Salto do Lontra és esperança, és Paraná (bis)

O Iguaçu vai junto ao Lontra
Procurando enriquecer
As colinas montanhosas
Onde o sol te viu nascer

De Caxias foi a Salto
Onde a beleza foi morar
No coração do sudoeste
Fiz meu canto, fiz meu lar.
= = = = = = 


Estante de livros (Cidades Mortas, Urupês e Ideias de Jeca Tatu, de Monteiro Lobato)


As obras de Monteiro Lobato oferecem uma rica análise da sociedade brasileira, abordando questões sociais, culturais e existenciais. Através de personagens memoráveis e narrativas envolventes, Lobato provoca reflexões críticas sobre a identidade nacional, a vida rural e a necessidade de mudança. Seu estilo direto e sua capacidade de evocar emoções tornam suas obras atemporais, ressoando com leitores contemporâneos e inspirando uma conscientização social que ainda é relevante hoje.

1. Urupês

"Urupês" é uma coleção de contos que retrata a vida rural no interior de São Paulo, focando especialmente na figura do "Jeca Tatu", um tipo de homem do campo que simboliza a preguiça e a falta de ambição. O livro é uma crítica social à vida no campo, onde Lobato expõe as condições de vida dos agricultores, a cultura popular e as tradições locais.

Os contos apresentam personagens variados, como o próprio Jeca Tatu, que vive em um ambiente de miséria e conformismo, e outros que representam a luta pela sobrevivência e a busca por melhorias. Lobato utiliza a linguagem coloquial e expressões regionais, dando vida à cultura e ao modo de vida do interior. Através das histórias, ele aborda temas como a saúde, a educação e a necessidade de uma reforma agrária.

"Urupês" é uma obra fundamental na literatura brasileira, pois oferece um retrato crítico e realista da vida rural. Lobato não apenas descreve a realidade do campo, mas também provoca reflexões sobre a identidade nacional e as mazelas sociais. O personagem Jeca Tatu, que se tornou ícone da literatura, representa a figura do homem simples que, embora tenha um potencial enorme, é sufocado pela pobreza e pela falta de oportunidades.

Lobato critica a romantização do ruralismo, mostrando que a vida no campo é repleta de dificuldades e desafios. Através de uma prosa direta e incisiva, ele denuncia a inação e a apatia que permeiam a vida dos personagens, sugerindo que a mudança é necessária e possível. O autor também enfatiza a importância da educação e da conscientização social como ferramentas para transformar a realidade.

2. Cidades Mortas

"Cidades Mortas" é uma coletânea de contos que explora temas de decadência, abandono e a memória de lugares outrora vibrantes. Lobato utiliza a metáfora das cidades mortas para refletir sobre a vida urbana e as transformações que ocorrem ao longo do tempo. Os contos apresentam paisagens desoladas, ruínas e personagens que vivem à sombra do passado, criando uma atmosfera de nostalgia e melancolia.

A narrativa enfatiza a relação entre o homem e o espaço, mostrando como as cidades, que foram uma vez centros de vida, se tornam lugares esquecidos e sem vida. Lobato utiliza descrições vívidas para evocar a sensação de desolação e perda, enquanto seus personagens se confrontam com suas próprias histórias e as memórias que carregam.

"Cidades Mortas" é uma reflexão profunda sobre a passagem do tempo e a efemeridade da vida. Através de suas descrições poéticas e detalhadas, Lobato provoca uma análise sobre a urbanização e a alienação que acompanha o crescimento das cidades. Ele questiona o que acontece com os espaços que foram habitados e como a história de um lugar pode desaparecer.

A obra também toca em questões existenciais, levando o leitor a refletir sobre a própria mortalidade e a inevitabilidade da mudança. Lobato utiliza a cidade como um personagem em si, mostrando como o ambiente pode influenciar e refletir as emoções e as experiências dos indivíduos. A nostalgia permeia os contos, transformando as cidades em símbolos de uma era perdida e despertando a consciência do leitor sobre a importância de preservar a memória.

3. Ideias de Jeca Tatu

"Ideias de Jeca Tatu" é uma obra que reúne ensaios e reflexões de Monteiro Lobato sobre a vida rural e a figura do Jeca Tatu. O livro explora a mentalidade do homem do campo, suas crenças, superstições e a relação com a natureza. Lobato utiliza o personagem Jeca Tatu como uma representação do povo simples, mas também como um veículo para criticar a falta de progresso e a resistência à mudança.

A obra discute temas como a educação, a saúde, a agricultura e a necessidade de modernização no campo. Lobato defende a ideia de que o progresso só é possível através da conscientização e do esforço coletivo, e que o povo rural deve ser despertado para sua própria condição e potencial. A narrativa é permeada por um tom de otimismo, sugerindo que a mudança é viável se houver vontade e dedicação.

"Ideias de Jeca Tatu" é uma obra que vai além da crítica social; é uma convocação à ação. Lobato acredita na capacidade do povo rural de se transformar e se modernizar, mas enfatiza que isso requer educação e um novo olhar sobre suas tradições e modos de vida. O autor utiliza a figura do Jeca Tatu para desafiar o leitor a refletir sobre preconceitos e estereótipos associados à vida no campo.

A prosa de Lobato é acessível e envolvente, misturando humor e ironia com um profundo senso de responsabilidade social. Ele consegue transmitir suas ideias de forma clara, utilizando a simplicidade do personagem Jeca Tatu como um espelho das questões mais complexas que afetam a sociedade. A obra é uma crítica à apatia e à falta de iniciativa, mas também uma celebração do potencial humano para mudar e evoluir.

Fonte: José Feldman. Estante de livros. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul, 2024.

Recordando Velhas Canções (Leva meu samba)


(samba, 1941) 

Compositores: Ataulfo Alves

Leva meu samba
Meu  mensageiro
Este  recado
Para  o  meu  amor  primeiro
Vai  dizer  que  ela  é 
A   razão  dos  meus  ais
Não,  não  posso  mais

Eu que pensava  
que  podia  te  esquecer
Mas  qual  o que  
aumentou  o  meu  sofrer
Falou  mais  alto  
no  meu  peito  uma  saudade
E  para  o  caso  
não  há  força  de  vontade
Aquele  samba  
foi  pra ver  se  comovia  
o teu  coração
Onde  eu dizia   
Vim  buscar  o  meu  perdão

A Saudade e o Perdão em 'Leva Meu Samba'
A música 'Leva Meu Samba' é uma expressão profunda de saudade e arrependimento. A letra revela um eu lírico que envia seu samba como mensageiro para seu amor primeiro, na esperança de reconquistar o coração perdido. A escolha do samba como veículo de comunicação não é aleatória; o gênero musical, com suas raízes profundas na cultura brasileira, carrega consigo uma carga emocional e histórica que amplifica a mensagem de saudade e desejo de reconciliação.

O eu lírico admite que subestimou a força de seus sentimentos, acreditando inicialmente que poderia esquecer seu amor. No entanto, a saudade se mostrou mais forte, revelando a profundidade de seu sofrimento. A letra destaca a luta interna entre a tentativa de seguir em frente e a realidade de um coração ainda preso ao passado. A saudade é personificada como uma força incontrolável, que fala mais alto no peito do eu lírico, evidenciando a intensidade de suas emoções.

O samba enviado como mensageiro é uma tentativa de comover o coração do amado, buscando o perdão e a reconciliação. A música termina com um apelo sincero, onde o eu lírico admite sua vulnerabilidade e o desejo de ser perdoado. A simplicidade e a sinceridade da letra, combinadas com a melodia envolvente do samba, criam uma obra que ressoa profundamente com qualquer pessoa que já tenha experimentado a dor da saudade e o desejo de reconciliação. Ataulfo Alves, com sua habilidade lírica e musical, consegue capturar a essência dessas emoções de maneira tocante e universal.
Fonte: – https://www.letras.mus.br/ataulfo-alves/221909/