domingo, 25 de outubro de 2009

Clério José Borges (A Trova Folclórica Capixaba)



Um dos mais importantes pesquisadores do Folclore do Estado do Espírito Santo foi o Professor Guilherme Santos Neves. Nascido a 14 de Setembro de 1906 e já falecido, o Professor Guilherme nasceu no Espírito Santo e foi membro da Academia Espirito-Santense de Letras. Publicou os livros “Cantigas de Roda”, em 1948 e “Cancioneiro Capixaba de Trovas Populares”, em 1949, entre outros livros.

GUILHERME SANTOS NEVES nasceu no dia 14 de setembro de 1906, na cidade de Baixo Guandu, ES. Bacharelou-se em Ciências Jurídicas e Sociais, exerceu as funções de Juiz do Trabalho e Professor da Universidade Federal do Espírito Santo. Dedicou-se, de corpo e alma, ao estudo do Folclore, havendo publicado mais de cem livros e folhetos, entre os quais Cancioneiro capixaba de trovas populares (1949), Alto está e alto mora (1954), História popular do convento da Penha (1958), Folclore brasileiro: Espírito Santo (1959), Romanceiro capixaba (1980), Cantigas de Roda I e II (s/d), além de artigos e ensaios publicados em jornais e revistas especializadas. Foi membro do Conselho Nacional de Folclore. Faleceu em Vitória, ES, no dia 21 de novembro de 1989.

Antes de falecer, já bastante idoso, o professor Guilherme Santos Neves, no período de 1980 a 1989, participou de algumas promoções do Clube dos Trovadores Capixabas, CTC, chegando a prefaciar o livro “O Trovismo Capixaba”, de Clério José Borges, publicado em 1990.

Na Revista “Folclore”, órgão da Comissão Espirito-Santense de Folclore, número 92, publicada em agosto de 1979, o Professor Guilherme conta a história de Dalmácia Ferreira Nunes, uma mulher nascida em Caçaroca, pequena vila do interior de Cariacica, Espírito Santo que fôra trabalhar como empregada doméstica em sua casa.

Conta ele que Dalmacinha ou Macinha foi trabalhar em sua casa em março de 1946, ou seja três anos antes do professor Guilherme publicar o seu livro “Cancioneiro Capixaba de Trovas Populares.”

Dalmácia Ferreira Nunes era dotada de excelente memória. Humilde e de pouca instrução, tinha o privilégio, isto é, a qualidade de gravar com facilidade as cantigas e os versos que ouvia. Ouvira as cantigas e as Trovas de sua mãe e de suas tias, quando de noite se reuniam para conversar. Como naquele tempo as pessoas do interior não possuíam rádio e a televisão ainda não existia, pois só chegou no Brasil em 1950, o maior divertimento eram as reuniões que se faziam com as famílias durante a noite, no quintal das casas do interior do Brasil.

Assim as histórias, as cantigas e as Trovas eram contadas e cantadas pelos mais velhos e Dalmacinha, em Caçaroca, ainda criança, ia gravando-as na memória.

Literatura Oral era a forma praticada pelos antigos que contavam histórias e recitavam Trovas para os mais novos, numa época em que os livros eram raros, ou seja, quase não existiam. Assim Dalmacinha e muitas outras mulheres idosas e os conhecidos “pretos velhos” deste país, portadores de excelente memória, são os que dão excepcional contribuição para os pesquisadores, formando a Literatura Oral Brasileira.

Dalmácia faleceu a 13 de Agosto de 1968, sendo enterrada, junto aos seus parentes, no cemitério de Barra do Jucu, então um povoado, hoje bairro importante e turístico de Vila Velha, Município da Grande Vitória.

Na Revista já citada “Folclore”, de 1979, o artigo do professor Guilherme Santos Neves ocupa oito páginas. Ali estão 76 Trovas. Três estórias. Vinte e nove superstições e crendices, onde constam mais três Trovas e cinco Advinhas. O título é “Folclore de Caçaroca” e traz uma foto de uma senhora com um lenço na cabeça e a legenda: “Informante Dalmácia Ferreira Nunes.”

A primeira Trova refere-se ao fato de que, segundo o Professor Guilherme, Dalmácia: “Para comentar um fato, registrar um instante, para fixar um sentimento, dizia sempre uma Trova. Alguém falava em viajar, e logo, lá vinha a Trova adequada:

Adeus, minha sempre-viva,
até quando nos veremos.
As pedras do mar se encontram,
assim nós também seremos...”

Eis algumas Trovas Populares, resgatada do passado graças a oportuna pesquisa do Professor Guilherme Santos Neves e a memória de Dalmacinha e que constam do artigo publicado na Revista “Folclore”:

De correr venho cansada,
de cansada me assentei,
achei o que procurava,
agora descansarei...

Abacate é fruta boa
enquanto não apodrece.
O amor é muito bom
enquanto não aborrece...

Atirei um limão doce
na menina da janela.
Ela me chamou de doido,
doidinho estava eu por ela.

Eu não quero Santo alheio
dentro do meu oratório.
Eu só quero meu santinho
prá fazer meu peditório...

Eu perguntei à Fortuna
de que é que eu viveria.
Ela foi me respondeu
que o tempo me ensinaria.

Eu plantei um pé de cravo
na janela do meu bem.
Todo mundo passa e cheira,
eu não sei que cheiro tem...

Menino se tu soubesses
o bem com que eu te adoro,
fazia dos braços remo,
remavas prá onde eu moro...

Já fui amada e querida
até das flores do campo.
Hoje me vejo desprezada
de quem eu queria tanto.

Quando eu entrei nesta casa,
logo vi cheia de rosa,
meu coração logo disse
que aqui tem moça formosa...

Uma velha muito velha,
de tão velha se curvou.
Ouviu falar em casamento
a velha se endireitou...

Tanto verso que eu sabia,
veio o vento, carregou.
Só ficou-me na memória
o que meu bem me ensinou...

Vamos dar a despedida
como deu cachorro magro,
que encheu sua barriga
e foi sacudindo o rabo.

Fontes:
– Clério José Borges. Origem Capixaba da Trova. Serra, ES: 2007.
http://www.clerioborges.com.br/

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