Al Mutamid, poeta do "Al Andaluz" (parte da Península Ibérica ocupada pelos Árabes), nasceu em Beja em 1040 (sul de Portugal e antes da formação da nacionalidade portuguesa que se deu em 1145).Morreu em Marrocos em 1095. Considerado um dos maiores poetas árabes. A poesia árabe canta o amor, os feitos da guerra, os prazeres. A civilização árabe na Península Ibérica atingiu um desenvolvimento brilhante, nomeadamente na poesia e na arquitetura, sendo os habitantes de cada um dos reinos da Península completamente bárbaros, incluindo o que hoje é Portugal. Al Mutamid foi rei de Sevilha, depois e ter sido califa de Silves.
I
Quando será que estarei
Livre de desdém tão fero
Cujos fortes esquadrões
Me dão guerra que não quero.
Desvio assim é injusto.
Juro pela luz altaneira
Que em suas tranças se divisa:
Não sou cobra traiçoeira
Das que mudam de camisa
II
De negras madeixas
Amo uma gazela
Um sol é seu rosto
E palmeira é ela
De ancas opulentas.
Há entre seus lábios
Do néctar o gosto.
Ó sede, se intentas
Sua boca beijar
Não o vais lograr
III
Em encanto não tem
Rival tal senhora,
E fora do sonho,
Quem bela assim fora?
Qual espadas seus olhos
Lhe brilham; e rosas
Lhe enfeitam a face
Na sombra vistosas.
IV
Dá paz ao ardor
De quem te deseja.
Contenta o amor
E faz dom de ti,
amos, sorri,
Quando a boca beija.
Me disse na hora:
«Pecar me refreia.»
Respondi-lhe:
«Ora! Não é coisa feia.»
V
Uma vez era noite
De bem longa festa.
Adormeci. Me disse
Me acordando com esta:
«Teu sono vai longo
Toca a levantar!»
Então me beijou
E eu pus-me a cantar:
«Fazem reviver
Teus lábios a arder!»
VI
Guerra vil e obscena
E que inspira a cantilena
De quem se morre de pena:
«Eu assim não estou bem,
Me sinto desesperar,
Que farei? Vem minha mãe,
Que não paro de chorar.»
VII
SOLTA A alegria! Que fique desatada!
Esquece a ânsia que rói o coração.
Tanta doença foi assim curada!
A vida é uma presa, vai-te a ela!
Pois é bem curta a sua duração.
E mesmo que tua vida acaso fosse
De mil anos plenos já composta
Mal se poderia dizer que fora longa.
Que seres triste não seja a tua aposta
Pois que o alaúde e fresco vinho
Te aguardam na beira do caminho.
Que os cuidados não sejam de ti donos
Se a taça for espada brilhante em tua mão.
Da sabedoria só colherás a turbação
Cravada no mais fundo do teu ser
É que, de entre todos, o mais sábio
É aquele que não cuida de saber.
EVOCAÇÃO DE SILVES
Saúda, por mim, Abg Bakr,
Os queridos lugares de Silves
E diz-me se deles a saudade
É tão grande quanto a minha.
Saúda o palácio dos Balcões
Da parte de quem nunca os esqueceu.
Morada de leões e de gazelas
Salas e sombras onde eu
Doce refúgio encontrava
Entre ancas opulentas
E tão estreitas cinturas!
Mulheres níveas e morenas
Atravessavam-me a alma
Como brancas espadas
E lanças escuras.
Ai quantas noites fiquei,
Lá no remanso do rio,
Nos jogos do amor
Com a da pulseira curva
Igual aos meandros da água
Enquanto o tempo passava..
E me servia de vinho:
O vinho do seu olhar
Às vezes o do seu copo
E outras vezes o da boca.
Tangia cordas de alaúde
E eis que eu estremecia
Como se estivesse ouvindo
Tendões de colos cortados.
Mas retirava o seu manto
Grácil detalhe mostrando:
Era ramo de salgueiro
Que abria o seu botão
Para ostentar a flor.
SIM,
Bebi o vinho derramando luz
Enquanto a noite despia o seu sombrio manto.
Finalmente,
Veio a Lua Cheia, surgida de Gêmeos
Rainha, no cume do esplendor e fausto.
Estrelas brilhantes à compita a rodearam
Para acrescentarem também o seu fulgor.
Depois caminhou até ao Ocidente
E sobre ela flutuou Oríon, feita docel
Um exército de estrelas abriu alas
Sendo então as Pléiades o estandarte.
Assim,
Na terra eu me mostro
No meio de esquadrões e mulheres formosas
Competindo no brilho e na estirpe.
Se as lorigas dos meus bravos espalham a treva
O vinho por donzelas dado traz a claridade.
E se as escravas cantam com a citara
Também meus homens fazem cantar
As espadas nos cascos do inimigo.
=========
I
Quando será que estarei
Livre de desdém tão fero
Cujos fortes esquadrões
Me dão guerra que não quero.
Desvio assim é injusto.
Juro pela luz altaneira
Que em suas tranças se divisa:
Não sou cobra traiçoeira
Das que mudam de camisa
II
De negras madeixas
Amo uma gazela
Um sol é seu rosto
E palmeira é ela
De ancas opulentas.
Há entre seus lábios
Do néctar o gosto.
Ó sede, se intentas
Sua boca beijar
Não o vais lograr
III
Em encanto não tem
Rival tal senhora,
E fora do sonho,
Quem bela assim fora?
Qual espadas seus olhos
Lhe brilham; e rosas
Lhe enfeitam a face
Na sombra vistosas.
IV
Dá paz ao ardor
De quem te deseja.
Contenta o amor
E faz dom de ti,
amos, sorri,
Quando a boca beija.
Me disse na hora:
«Pecar me refreia.»
Respondi-lhe:
«Ora! Não é coisa feia.»
V
Uma vez era noite
De bem longa festa.
Adormeci. Me disse
Me acordando com esta:
«Teu sono vai longo
Toca a levantar!»
Então me beijou
E eu pus-me a cantar:
«Fazem reviver
Teus lábios a arder!»
VI
Guerra vil e obscena
E que inspira a cantilena
De quem se morre de pena:
«Eu assim não estou bem,
Me sinto desesperar,
Que farei? Vem minha mãe,
Que não paro de chorar.»
VII
SOLTA A alegria! Que fique desatada!
Esquece a ânsia que rói o coração.
Tanta doença foi assim curada!
A vida é uma presa, vai-te a ela!
Pois é bem curta a sua duração.
E mesmo que tua vida acaso fosse
De mil anos plenos já composta
Mal se poderia dizer que fora longa.
Que seres triste não seja a tua aposta
Pois que o alaúde e fresco vinho
Te aguardam na beira do caminho.
Que os cuidados não sejam de ti donos
Se a taça for espada brilhante em tua mão.
Da sabedoria só colherás a turbação
Cravada no mais fundo do teu ser
É que, de entre todos, o mais sábio
É aquele que não cuida de saber.
EVOCAÇÃO DE SILVES
Saúda, por mim, Abg Bakr,
Os queridos lugares de Silves
E diz-me se deles a saudade
É tão grande quanto a minha.
Saúda o palácio dos Balcões
Da parte de quem nunca os esqueceu.
Morada de leões e de gazelas
Salas e sombras onde eu
Doce refúgio encontrava
Entre ancas opulentas
E tão estreitas cinturas!
Mulheres níveas e morenas
Atravessavam-me a alma
Como brancas espadas
E lanças escuras.
Ai quantas noites fiquei,
Lá no remanso do rio,
Nos jogos do amor
Com a da pulseira curva
Igual aos meandros da água
Enquanto o tempo passava..
E me servia de vinho:
O vinho do seu olhar
Às vezes o do seu copo
E outras vezes o da boca.
Tangia cordas de alaúde
E eis que eu estremecia
Como se estivesse ouvindo
Tendões de colos cortados.
Mas retirava o seu manto
Grácil detalhe mostrando:
Era ramo de salgueiro
Que abria o seu botão
Para ostentar a flor.
SIM,
Bebi o vinho derramando luz
Enquanto a noite despia o seu sombrio manto.
Finalmente,
Veio a Lua Cheia, surgida de Gêmeos
Rainha, no cume do esplendor e fausto.
Estrelas brilhantes à compita a rodearam
Para acrescentarem também o seu fulgor.
Depois caminhou até ao Ocidente
E sobre ela flutuou Oríon, feita docel
Um exército de estrelas abriu alas
Sendo então as Pléiades o estandarte.
Assim,
Na terra eu me mostro
No meio de esquadrões e mulheres formosas
Competindo no brilho e na estirpe.
Se as lorigas dos meus bravos espalham a treva
O vinho por donzelas dado traz a claridade.
E se as escravas cantam com a citara
Também meus homens fazem cantar
As espadas nos cascos do inimigo.
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A PROPÓSITO DE UMA CARTA
Horto, de fulgentes estrelas faladas,
Iluminador do negríssimo fosso das trevas!
Chegou-me o teu poema em hora de tristeza:
Fê-la minguar, depois desaparecer.
Aqui fica um puro poço de amor
Que te convida a beber de novo
Como se fosse agora a vez primeira.
Ó ALMA, não te desesperes!
Peleja com coragem
Ou às mãos do amor acabarás.
A amada tratou-te cruelmente,
Teu coração já não te obedece?
Alguém te injuriou?
Ninguém te dá conforto?
A mágoa, essa,
Negou repouso às pálpebras
E só lhes deu em troca
As lágrimas de sangue.
Ao PASSAR junto da vide
Ela arrebatou-me o manto,
E logo lhe perguntei:
Porque me detestas tanto?
Ao que ela me respondeu:
Porque é que passas, ó rei,(*)
Sem me dares saudação,
Não basta beberes-me o sangue
Que te aquece o coração?
Fonte:
http://escritas.paginas.sapo.pt/al_mutamid.htm
Horto, de fulgentes estrelas faladas,
Iluminador do negríssimo fosso das trevas!
Chegou-me o teu poema em hora de tristeza:
Fê-la minguar, depois desaparecer.
Aqui fica um puro poço de amor
Que te convida a beber de novo
Como se fosse agora a vez primeira.
Ó ALMA, não te desesperes!
Peleja com coragem
Ou às mãos do amor acabarás.
A amada tratou-te cruelmente,
Teu coração já não te obedece?
Alguém te injuriou?
Ninguém te dá conforto?
A mágoa, essa,
Negou repouso às pálpebras
E só lhes deu em troca
As lágrimas de sangue.
Ao PASSAR junto da vide
Ela arrebatou-me o manto,
E logo lhe perguntei:
Porque me detestas tanto?
Ao que ela me respondeu:
Porque é que passas, ó rei,(*)
Sem me dares saudação,
Não basta beberes-me o sangue
Que te aquece o coração?
Fonte:
http://escritas.paginas.sapo.pt/al_mutamid.htm
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