sexta-feira, 20 de junho de 2008

Teatro

As novas técnicas de espetáculo e o aparecimento do cinema e da televisão foram fundamentais para a renovação da linguagem cênica e dramatúrgica. O espetáculo libertou-se do palco e a dramaturgia transcendeu a ação linear. Assim, o teatro contemporâneo tornou-se uma aventura incerta, mas profundamente estimulante.

O teatro, expressão das mais antigas do espírito lúdico da humanidade, é uma arte cênica peculiar, pois embora tome quase sempre como ponto de partida um texto literário (comédia, drama e outros gêneros), exige uma segunda operação artística: a transformação da literatura em espetáculo cênico e sua confrontação direta com uma platéia. Assim, por maior que seja a interdependência entre o texto dramático e o espetáculo, o ator e a cena criam uma linguagem específica e uma arte essencialmente distinta da criação literária. Existem também representações mudas (a pantomima, o teatro de bonecos), ou improvisadas (a commedia dell'arte), que eventualmente prescindem de um texto literariamente construído.

Durante o espetáculo, o texto dramático se realiza mediante a metamorfose do ator em personagem. À força da palavra somam-se gestos, inflexões da voz, pausas e mesmo o silêncio, segundo o ritmo da ação que se desenrola diante do espectador e de acordo com as imposições, necessidades e recursos dos demais elementos cênicos: iluminação, cenários, sonoplastia etc. A história da dramaturgia é, portanto, inseparável da história do espetáculo.

O texto dramático, que por si só consiste em gênero literário dos mais importantes como testemunho de época, sobrevive a seu próprio tempo não só como palavra, mas como ambiente, vestimenta, objetos e costumes, permitindo a reconstrução, no palco, de situações pretéritas ou prestando-se a adaptações que recolocam no tempo questões de interesse universal.

Origens e história

Antiguidade clássica

A dramatização como forma artística surgiu num estágio relativamente avançado da evolução cultural. Os rituais religiosos em honra ao deus Dioniso deram origem ao teatro grego, que mais tarde, emancipado do culto, foi o primeiro a afirmar-se como arte. Os textos teatrais gregos sobreviveram em traduções romanas.

Em Atenas -- na época dos grandes trágicos Ésquilo, Sófocles e Eurípides; e de Aristófanes, cultor da comédia antiga, essencialmente política -- o teatro era instituição pública, organizada e custeada pelo estado. As representações inseriam-se no calendário, ligadas às grandes festas nacionais. Havia estreita interdependência entre dramaturgia e cenografia, assim como profundo acordo entre poeta e público. A arte, expressão de toda uma civilização, tinha função cívica.

Com o domínio romano, no final do século V a.C., a literatura grega entrou em declínio. O fim das atividades públicas nas cidades da época helenística fez com que a arte trágica perdesse a função. A tragédia e a comédia antigas não tiveram sucessores à altura. A chamada comédia nova, cultivada por Menandro, sofreu restrições oficiais e limitou seus enredos a questões familiares e amorosas, além de focalizar exclusivamente a vida da elite, numa época desmitologizada e despolitizada.

A comédia nova influenciou os romanos Plauto e Terêncio. As melhores tragédias da época romana -- entre as quais as de Sêneca, as únicas do período que sobreviveram completas e que exerceriam influência sobre a arte renascentista inglesa -- foram escritas para recitação em pequenos ambientes fechados.

Paralelamente, uma tradição nativa e popular da comédia persistia, como nas peças phlyax (farsas acrobáticas) e nas atelanas, populares em Roma no século III a.C., cujos arquétipos parecem antecipar os da commedia dell'arte, embora nenhum vínculo entre essas formas seja historicamente comprovado.

O sensacionalismo dos grandes espetáculos oficiais -- lutas mortais de gladiadores e animais selvagens, cristãos transformados em tochas humanas -- chegou a dispensar a existência de qualquer tipo de texto teatral e marginalizou tanto os escritores como o público que desejava outro tipo de entretenimento. Tomaram a cena a pantomima (gênero burlesco remanescente da tragédia) e, principalmente, o mimo, cuja estética do grotesco se coadunava com a dos grandes espetáculos.

O Império Romano entrou em decadência, cristianizou-se e dividiu-se em duas partes. O segmento ocidental, centralizado em Roma, foi invadido pelos povos germânicos e, no século V, o teatro foi proibido, embora as cerimônias religiosas cristãs continuassem utilizando elementos dramáticos. Os registros das manifestações teatrais surgidas em torno da igreja oriental bizantina, sediada em Constantinopla (posterior Istambul), perderam-se quase completamente, após a invasão dos turcos.

Teatro medieval

Embora os textos do teatro romano continuassem acessíveis, já que a Igreja Católica manteve o latim como língua oficial, o legado da cultura clássica foi deixado de lado por mais de 900 anos. O mimo, apesar das proibições, sobreviveu e garantiu a continuidade entre o mundo clássico e a Europa moderna: a cultura popular medieval, com seus artistas ambulantes, acrobatas, malabaristas e menestréis espalhados por toda a Europa, preservou habilidades remanescentes do mimo romano e somou-as às festas pagãs agrícolas e outras tradições folclóricas. Inaugurou-se a divisão entre teatro popular e literário.

O rompimento radical com a tradição teatral clássica fez com que a evolução do teatro ocidental recomeçasse do nada. O desenvolvimento do cantochão durante o século IX levou à criação de textos para serem cantados durante a missa e, assim, novamente as cerimônias religiosas propiciaram o surgimento do teatro. Por volta do ano 1000 surgiram os tropos -- pequenos diálogos cantados, acrescentados ao texto dos Evangelhos. Logo, toda a liturgia da Páscoa ganhou forma dramática e, no final do século XIII, eram assim representadas também as liturgias da Paixão e do Natal.

Esses dramas litúrgicos, circunscritos ao interior das igrejas, inspiraram pequenas peças religiosas, que passaram ao pátio e finalmente a outros locais da cidade. Com a intenção de tornar os eventos mais claros à assistência, foram adotadas, ao lado do latim, as línguas vernáculas, e partes do texto cantado passaram a ser faladas.

No início do século XIV, era freqüente que representantes leigos das corporações de ofícios, e não clérigos, comandassem as representações. Conhecidas na Espanha como autos sacramentais e na Inglaterra e na França como mistérios, essas peças tinham textos inteiramente vernáculos. O distanciamento da solenidade religiosa e a substituição do latim abriram espaço para o surgimento de pequenos interlúdios cômicos, em forma de farsas derivadas do folclore local, que eram incorporados à trama principal. Ciclos dessas peças eram levados em praça pública, em espetáculos que se estendiam por vários dias e contavam com a participação de inúmeros atores.

Durante o século XV, desenvolveram-se as moralidades, alegorias de temática social e religiosa, protagonizadas por entes abstratos como a humanidade, o bem, o mal, a morte e a castidade. As moralidades eram um dos três principais gêneros, ao lado dos milagres, que narravam a vida de um santo, e dos mistérios. Destinadas à educação moral, surgiram na classe média nascente das cidades. Pregavam sobretudo a abstinência dos sete pecados capitais, num contexto de rápidas e irreversíveis transformações sociais que ameaçavam os valores éticos da então decadente estrutura feudal.

La Celestina ou Comedia de Calisto y Melibea (1499), obra atribuída a Fernando de Rojas, exerceu grande influência na Europa de então. Com elementos humanistas e renascentistas, representa uma etapa decisiva na gênese da comédia clássica. O português Gil Vicente, figura máxima da literatura ibérica do século XVI, criou um teatro ainda marcado por elementos medievais que prenuncia a dramaturgia renascentista.

Renascimento

A perda de importância de Roma depois da invasão dos germânicos e a revalorização das artes e as ciências que haviam florescido no antigo império determinou a imitação dos modelos clássicos gregos e romanos pelos artistas italianos, ideal que dominou todo o mundo ocidental durante o Renascimento.

A admiração por uma civilização pagã incentivou em muitos aspectos a laicização da sociedade. O humanismo colocou o homem no centro do universo e a vida terrena foi valorizada em relação à vida eterna depois da morte. A própria igreja sofreu reformulações, adaptou-se às idéias humanistas e incentivou as ciências e as artes, mesmo quando entravam em confronto com a doutrina cristã, o que resultou em grande desenvolvimento da arte profana.

A invenção da imprensa de tipos móveis por Gutenberg é contemporânea à redescoberta dos textos gregos e romanos, o que facilitou sua difusão e ampliou sua influência. Inicialmente revivido, o teatro grego e romano -- sobretudo a comédia -- logo foi imitado pelos primeiros humanistas, entre os quais Ludovico Ariosto. A descoberta da perspectiva, que passou a ser largamente utilizada em pintura, fez florescer também a cenografia. Em Vicenza, Sebastiano Serlio inventou o palco italiano, cuja perspectiva criava a ilusão de grande profundidade e que permanece até a atualidade.

Itália

A imitação italiana da tragédia grega, sempre mediada pela obra de Sêneca, teve curta duração. Já a imitação das comédias de Plauto e Terêncio -- na chamada commedia erudita, encenada por atores diletantes e dirigida a um pequeno público da aristocracia -- produziu pelo menos uma obra-prima, Mandragola (1524; Mandrágora), de Maquiavel.

A síntese do gosto popular e da comédia plautina operou-se no teatro de Angelo Beolco, natural de Pádua e conhecido como Ruzzante, organizador de uma das primeiras companhias profissionais de atores, no início do século XVI.

Os "tipos" de Ruzzante são considerados os precursores das figuras da commedia dell'arte, forma original italiana com diálogos inteiramente improvisados, personagens regionais e as maschere (Arlequim, Polichinelo, Colombina etc.). O sucesso do gênero, que chegou a alto nível de virtuosismo, foi responsável pela proliferação de grupos profissionais de atores, de formação fixa. A commedia dell'arte, de origem popular, foi recebida nos palácios e tornou-se internacionalmente famosa, sobretudo na França, onde predominou no século XVII. Sua influência, presente na obra de Molière e Shakespeare, estendeu-se ao século seguinte -- Goldoni, na Itália, baseou-se nela para criar a comédia de costumes; e Marivaux, na França, também utilizou seus personagens -- e permaneceu até o teatro do século XX.

Espanha

O drama religioso teve continuidade na Espanha, não afetada pela Reforma protestante. Paralelamente, durante a segunda metade do século XVI (o Século de Ouro espanhol), estabeleceram-se na Espanha e na Inglaterra inúmeras companhias laicas de atores profissionais. As primeiras, como a de Lope de Rueda, eram grupos de ambulantes sem nenhum recurso material. Criaram um teatro que, influenciado pela commedia dell'arte e livre das regras do classicismo, tornou-se tradicional no país.

O estabelecimento de corrales (quintais), onde eram encenados espetáculos que atraíam um público composto por representantes de todas as classes sociais, significou um meio de vida mais seguro para os atores e uma maior possibilidade de controle por parte da igreja e das autoridades.

Os primeiros autores de textos teatrais eram também empresários dos espetáculos. Sua produção artística, rápida e comercial, admitia o recurso ao lugar-comum, o emprego repetitivo de cenas preconcebidas e o plágio. Mesmo assim, algumas obras diferenciaram-se pela qualidade. Os maiores dramaturgos do Século de Ouro foram Lope de Vega, a quem se atribui mais de 1.500 peças, e Calderón de la Barca. Ambos escreveram tragédias e comédias e foram os primeiros cultores da zarzuela, gênero de teatro musical tipicamente espanhol.

Tornou-se muito popular na época o entremez, peça curta e cômica intercalada entre os atos das grandes tragédias, que teve em Cervantes seu mais importante autor. A Tirso de Molina deve-se a criação de um dos grandes tipos do teatro moderno, o Don Juan, em El burlador de Sevilla y convidado de piedra (1630; O sedutor de Sevilha e o convidado de pedra). Contribuição importante é também a de Juan Ruiz de Alarcón, mexicano radicado na Espanha e criador da comédia de caracteres, precursora do teatro francês nesse gênero.

Inglaterra

O drama neoclássico italiano teve pouca influência na Inglaterra protestante, refratária a tudo o que viesse de Roma ou pertencesse à tradição latina e, sob permanente ameaça de invasão estrangeira, apegada a elementos nacionais. Relativamente livre do modelo clássico, o teatro inglês elisabetano adaptou o drama religioso medieval a temas profanos e, ao lado do espanhol, constituiu o fundamento do teatro moderno.

O espírito da Reforma dominou as artes cênicas e fez surgirem interlúdios cômicos que satirizavam as peças católicas tradicionais. Adaptadas de milagres e moralidades, essas encenações tornaram-se estopim de tumultos e desordens. Os autores teatrais foram submetidos a crescente censura, os atores mantidos sob observação e os locais de espetáculo passaram a depender de licença oficial para funcionar.

No final do século XVI, após a derrota da armada espanhola, a Inglaterra finalmente abriu-se a novas idéias em arte e educação. Mas já então o teatro inglês definira sua personalidade. Profissionalmente organizado, financiado pelos grandes comerciantes e apoiado pela corte, o teatro de Chistopher Marlowe, William Shakespeare, Ben Jonson e John Webster manteve sua ligação com a herança medieval e o teatro popular, autoconfiante o bastante para não se deixar levar pelos preceitos neoclássicos.

Os primeiros teatros ingleses, surgidos na segunda metade do século XVI, eram ao ar livre, como os corrales espanhóis. As companhias eram também contratadas para atuar nos palácios. As três primeiras tragédias inglesas -- entre as quais Gorboduc (1561-1562), escrita por Thomas Sackville e Thomas Norton sob a inconfundível influência de Sêneca -- surgiram entre 1560 e 1570. Iniciava-se a "era das blood tragedies" ("tragédias sangrentas"). Três gerações sucessivas de dramaturgos exploraram o gênero trágico: a primeira, com Thomas Kyd e Marlowe; a segunda, com George Chapman, Shakespeare, John Marston, Cyril Tourneur, Thomas Middleton e William Rowley; a última, com Philip Massinger, Webster e John Ford.

Shakespeare, considerado o maior dramaturgo da literatura universal, escreveu comédias e tragédias. O florescimento da grande dramaturgia de sua época coincidiu com a inauguração dos primeiros teatros cobertos, no estilo italiano. Em 1642, a censura puritana impôs o fechamento dos teatros. Reabertos em 1660, com a restauração da monarquia, encontraram a elite conquistada pelo teatro clássico francês. Mesmo assim, as obras de Shakespeare, John Dryden e Thomas Otway passaram ao repertório moderno.

França

No início do século XVI, o drama religioso foi oficialmente proscrito, numa tentativa de impedir seu uso a favor do avanço do protestantismo. Ressurgida tardiamente em relação às formas barrocas da comédia espanhola, da commedia dell'arte e do drama elisabetano, a dramaturgia francesa do século XVII orientou-se pelo ideal clássico do grupo de poetas La Pléiade, entre os quais Ronsard e Joachim du Bellay. Um conjunto rigoroso de regras passou a determinar a construção do texto, independentemente da ambientação histórica e geográfica da trama, numa forma dramática fixa, rígida e formal. As obras de Molière, Racine e Corneille, primeiro exemplo de teatro moderno, predominaram na Europa e demonstraram que tais regras podiam ser respeitadas sem prejuízo da criatividade. Molière, inspirado de início na commedia dell'arte e em Terêncio, criou a comédia de costumes e de caracteres, protagonizadas por personagens arquetípicos. Racine e Corneille escreveram tragédias de grande profundidade psicológica.

Alemanha e Áustria

Envolvidos em constantes guerras, cisões religiosas e sem nenhum centro urbano preponderante que se afirmasse como núcleo cultural, os países de língua alemã não desenvolveram uma arte dramática própria nesse período. Atraíram muitos atores ingleses que, afugentados pelas restrições ao teatro na Inglaterra, praticaram ali uma arte mambembe e popular, ao ar livre, nas feiras e praças e, em virtude das dificuldades com a língua, baseada na mímica. O teatro de bonecos italiano influenciou o teatro popular austríaco. No final do século XVII, as companhias de commedia dell'arte fizeram grande sucesso nas cortes austríacas e seu estilo foi imitado.

Numa época em que não havia ensino obrigatório, em que poucos sabiam ler e escrever e em que o conhecimento e as viagens eram acessíveis apenas a alguns privilegiados, os atores ambulantes foram os principais responsáveis pelo rompimento do isolamento cultural dos países de língua alemã em relação às culturas européias vizinhas e impulsionaram o surgimento de um teatro profissional na Alemanha e na Áustria.

Teatro jesuítico

Conscientes do poder de persuasão da dramatização, os jesuítas criaram a principal vertente do drama religioso entre os séculos XVI e XVIII. Utilizado como meio de ensinar maneiras aristocráticas aos noviços e, sobretudo, como instrumento de catequese nas colônias ibéricas recém-descobertas, o teatro jesuítico deu origem ao teatro brasileiro e a vários teatros nacionais da América Latina. Legítimos representantes da vanguarda do pensamento humanista europeu, os jesuítas excederam suas intenções didáticas iniciais e, a partir do século XVII, alguns deles e seus pupilos figuraram entre os mais importantes teóricos do teatro barroco.

Drama burguês e romantismo

As primeiras reações ao neoclassicismo surgiram na década de 1730 e vieram da classe média, até então relativamente alheia à produção cultural. Entre 1773 e 1784, desenvolveu-se o movimento alemão do pré-romantismo, ao qual se filiaram Herder, Jakob Lenz e os jovens Göethe e Schiller. O novo modelo era Shakespeare, cujas primeiras traduções para o alemão surgiram entre 1726 e 1766. Logo, porém, a produção teatral caiu na estagnação, e o romantismo, sobretudo na Alemanha, não foi capaz de produzir obras dramáticas comparáveis às do pré-romantismo.

Alemanha

Posteriormente conhecido como Sturm und Drang (Tempestade e tensão), expressão extraída do título de uma peça de Friedrich Klinger, o movimento pré-romântico surgido na Alemanha afirmava que a emoção e a sensibilidade do artista eram os únicos pré-requisitos da criação, independentemente de regras formais. O Fausto, de Göethe, cuja primeira parte foi publicada em 1808, é uma das maiores obras da literatura alemã e universal. Embora iniciada em 1770 e, portanto, com raízes nessa fase, dificilmente pode ser filiada a uma corrente literária.

França

A decadência do teatro clássico francês foi retardada pelo gênio de Voltaire e pelo talento e habilidade de Marivaux. Enfim, as tendências revolucionárias infiltraram-se também na produção literária, a exemplo da comédia satírico-política de Beaumarchais, e sufocaram o classicismo.

As peças do inglês George Lillo, na década de 1730, representaram um passo adiante na busca de certo realismo. O novo mundo da burguesia seria o ponto de partida de Diderot, que se tornou o teórico do "drama burguês", gênero comprometido com a descrição realista da vida social.

Entre 1820 e 1830, Stendhal, Alfred de Vigny e Victor Hugo lançaram suas obras e, juntamente com Manzoni na Itália, inauguraram o drama romântico. Com a estréia de Hernani, de Victor Hugo, em 1830, o teatro transformou-se em verdadeira batalha, travada entre a juventude romântica e os conservadores. O triunfo do drama romântico foi, entretanto, de curta duração e o repertório clássico voltou a dominar o teatro francês, embora obras como Antoine (1831), de Alexandre Dumas, e Lorenzaccio (1830), de Alfred de Musset, insistissem na mentalidade romântica.

Realismo e naturalismo

O movimento romântico do início do século XIX despertou o interesse por temas históricos e uma preocupação obsessiva com a autenticidade de cenários e figurinos. Até mesmo cavalos vivos subiram ao palco. A veracidade dos recursos cênicos passou a exigir atitudes mais naturais também por parte dos atores.

O realismo francês, introduzido no romance por Flaubert e Balzac, continuou no teatro de Alexandre Dumas filho, autor de La Dame aux camélias (1852; A dama das camélias). Na Rússia, a obra de Gogol representou a transição do romantismo ao realismo. Depois do fracasso das revoluções de 1848, o teatro do norueguês Henrik Ibsen -- de início romântico, depois realista e, por fim, simbolista -- dominou os palcos europeus.

As companhias de teatro, até o final do século XIX, estruturavam-se basicamente em torno de um ator principal, que centralizava também as decisões administrativas. Em 1866, George II, duque de Saxe-Meiningen, assumiu pessoalmente a direção de sua companhia oficial de teatro e alcançou um nível até então desconhecido de harmonia de conjunto entre os atores. Entre 1874 e 1890, a companhia viajou por toda a Europa com grande sucesso e difundiu a nova forma de trabalho, centralizada no diretor ou encenador. As inovações tecnológicas do período, que abriram novas possibilidades de complicados efeitos cênicos, contribuíram para a mudança. Todas as diferentes tendências do teatro moderno cristalizaram-se em torno de diretores.

O primeiro drama naturalista foi Thérèse Raquin (1873), de Émile Zola. O autor propunha uma arte dramática que fosse uma "análise científica da vida", representação literal dos fatos. A escola naturalista revolucionou a estética teatral e a ela pertenceram o sueco August Strindberg; o encenador André Antoine, do Théâtre Libre (1887-1896), em Paris; Otto Brahm, do Freie Bühne, em Berlim (1889); Jacob Grein e Bernard Shaw, do Independent Theatre Club (1891-1897), em Londres; e finalmente Konstantin Stanislavski, que montou as peças de Tchekhov no Teatro de Arte de Moscou (1898-1913). Alguns dos teatros independentes surgidos a favor do naturalismo mantiveram-se -- ou desdobraram-se -- mais tarde como núcleos de teatro experimental. Na Rússia, Tolstoi, Tchekhov e Gorki lideraram a evolução da dramaturgia, de forma independente do ibsenismo.

Teatro no século XX

Três fatores determinaram a evolução da arte teatral na primeira metade do século XX: o advento do comunismo, a crise da burguesia capitalista e a invenção do cinema e da televisão, que praticamente tomaram o lugar do teatro popular.

A caracterização psicológica dos personagens integrou conceitos da psicanálise, e o desenvolvimento tecnológico modificou todo o aparato técnico que cerca o espetáculo: luzes, cenários, som e efeitos especiais diversos. A filosofia contemporânea e os valores morais e sociais, revolucionados após as duas guerras, impregnaram o pensamento e a obra de autores e diretores. O questionamento dos valores burgueses e a recém-conquistada valorização social das massas populares, trouxe a preocupação de uma criação teatral não elitista. A negação do espaço cênico tradicional, a substituição de autor e diretor pela proposta de criação coletiva, e a busca de um novo relacionamento com o espectador foram também características marcantes da experimentação teatral do período.

Reações ao realismo

Embora o realismo do final do século XIX tenha tido continuidade, as inovações mais significativas no teatro no início do século XX foram resultado de uma violenta reação ao realismo, ao naturalismo e à concepção do mundo linear e burguesa por eles representada. A detalhada reconstituição da realidade na cena foi substituída pela simplicidade e pelo uso de símbolos.

O cenógrafo suíço Adolphe Appia compreendia os recursos cênicos como meios para colocar o ator no foco das atenções e propôs a iluminação como principal criadora de ambiência, num cenário vazio e abstrato. Suas idéias foram levadas à frente pelo diretor Gordon Craig, que expôs no livro The Art of the Theatre (1905; A arte do teatro) sua concepção do "teatro total", em que o diretor seria o único responsável pela harmonização dos vários elementos da produção teatral num todo unificado.

A vocação do teatro político de massas afirmou-se sobretudo na Alemanha, onde, a partir de 1905, Max Reinhardt procurou manter o realismo na expressão dos sentimentos, sem a monótona exatidão da reprodução da realidade. Ao invés disso, encenou peças fora das tradicionais casas de espetáculo, em circos e praças. Conseguiu assim estabelecer uma nova relação com o espectador e atingir um público popular.

O futurismo italiano, iniciado por Marinetti em 1909, prefigurou a maior parte das abordagens não-realistas do teatro posterior: dadaísmo, surrealismo, construtivismo, teatro do absurdo e mesmo os happenings da década de 1960. Velocidade, loucura, o homem como máquina foram alguns dos principais temas do movimento. Os atores misturavam-se aos espectadores, quebrando a barreira que os separava.

Expressionismo

O movimento expressionista, ponto de partida da cultura de massas, atingiu todas as artes, sobretudo a pintura, a literatura e o cinema. Sua proposta básica era alcançar o significado essencial por meio da distorção das aparências. Entre os principais expressionistas do teatro estão George Kaiser e, numa fase posterior, comprometida com o ativismo político, Ernst Toller. Na década de 1920, Erwin Piscator, um militante da organização revolucionária Liga Espartaquista, procurou atingir o inconsciente do espectador por meio de uma técnica de choque e despertar o espírito de luta no proletariado alemão, traumatizado pela primeira guerra mundial e prostrado pela miséria.

No mundo capitalista, a estética expressionista, vulgarizada pelo cinema da época e alijada de seus objetivos políticos, forneceu uma visão sintética a um público exposto a uma avalanche de informações que culminaram na crise do próprio teatro, evidenciada na metalinguagem de Pirandello; na arte irracional do surrealismo e do absurdo; e nas diversas experiências de expressão do individualismo e de criação coletiva baseada na explosão do instinto e do inconsciente.

Teatro de Artaud

As proposições únicas e anárquicas de Artaud, expressas no livro Le Théâtre et son double (1938; O teatro e seu duplo), denunciaram a decadência do humanismo e pretendiam subverter a lógica convencional. Os elementos básicos de sua concepção de teatro, que ele chamou "teatro da crueldade", foram o duplo, o transe e a própria crueldade.

Teatro marxista

Experimentações como o construtivismo de Vsevolod Meyerhold, inicialmente apoiadas pelo governo de Lenin, foram banidas por Stalin a partir de 1932, em nome do "realismo socialista", que compreendia as artes apenas como um meio de educar a população segundo os ideais da revolução comunista. Os cenários tornaram-se cada vez mais detalhados e toda tentativa de abstração ou simbolismo foi condenada, como expressão de formalismo burguês e vazio. O teatro russo entrou em total estagnação.

O teatro épico de Brecht -- autor alemão que se tornou marxista no final da década de 1920 e radicou-se em Berlim oriental no final da década de 1940 -- alterou de forma irreversível a história do espetáculo teatral.

Multiplicação de tendências

No decorrer do século, tornou-se praticamente impossível classificar todas as tendências da dramaturgia, que se recombinam continuamente em novas formulações. Propostas racionais e políticas muitas vezes empregam recursos típicos do que seria o teatro metafísico e irracional e vice-versa.

O realismo, modificado pelas correntes estéticas que o contestaram, sobreviveu com Ibsen e Bernard Shaw. As peças de tese, que apresentam e defendem um ponto de vista, cresceram em importância depois de 1945, com as obras de Albert Camus e, sobretudo, Sartre. O teatro realista desenvolveu-se principalmente nos Estados Unidos e no Reino Unido.

Stanislavski, Artaud e Brecht foram os principais inspiradores do teatro contemporâneo. O método interpretativo de Stanislavski influenciou a atividade teatral no mundo inteiro, sobretudo na Rússia e Estados Unidos. O sucesso da obra de Brecht desencadeou um verdadeiro surto de teatro político nos Estados Unidos. Na América Latina, destacou-se a obra de García Lorca, reveladora dos costumes nacionais e da estrutura social patriarcal, e do mexicano Rodolfo Usigli.

A herança de Artaud perpetuou-se em diretores como Roger Blin, Maurice Béjart, Jorge Lavelli, Victor García e Peter Brook; em dramaturgos como Jean Genet e Jean Cocteau, que renovaram a literatura francesa; e em grupos como o americano Living Theater e o Teatro Laboratório do polonês Jerzy Grotowski. Eugène Ionesco, com La Cantatrice chauve (1950; A cantora careca), e Samuel Beckett, com En attendant Godot (1953; Esperando Godot), inauguraram o teatro do absurdo, que rompeu com o humanismo, os enredos psicológicos e destruiu o sentido lógico do texto.

Teatro no Brasil

Período colonial

O teatro brasileiro teve origem com os jesuítas, que utilizaram o espetáculo como instrumento de catequese. Atribui-se ao padre José de Anchieta a autoria dos textos conhecidos atualmente e encenados pelos jesuítas no século XVI. As peças, catequéticas e didáticas, eram freqüentemente bilíngües ou trilíngües, escritas em português, espanhol e tupi. Anchieta, influenciado pelos autos do português Gil Vicente, seguiu a tradição do teatro religioso medieval e escreveu peças de circunstância, porém adaptadas à nova realidade americana, com a inclusão de elementos da cultura indígena.

As primeiras manifestações teatrais desvinculadas da catequese surgiram no Brasil a partir da segunda metade do século XVIII. A construção de edifícios próprios -- as chamadas casas de ópera, onde passou a funcionar um teatro regular -- atesta o progresso das artes cênicas. Em Vila Rica (posterior Ouro Preto) foi construído provavelmente o mais antigo teatro da América do Sul. Do período colonial, poucas peças, todas de pouco valor dramático, chegaram a nossos dias. Destaca-se a qualidade da obra de Antônio José da Silva, conhecido como o Judeu, brasileiro educado em Portugal, que no entanto pertence mais propriamente à cultura da metrópole.

Comédia brasileira

A independência, proclamada em 1822, criou o ambiente em que eclodiram o romantismo e os sentimentos nacionalistas na arte brasileira. João Caetano, o primeiro grande ator brasileiro, exerceu importante papel na história do teatro nacional. Em 1833, após atuar ao lado de portugueses radicados no Brasil, formou a primeira companhia brasileira.

Em 1836, Gonçalves de Magalhães, em artigo na revista Niterói, editada em Paris por um grupo de brasileiros, chamava a atenção do público para o tema da nacionalidade. Em 1838, a companhia de João Caetano lançou Magalhães, com a peça Antônio José ou O poeta e a Inquisição, e Martins Pena, fundador da comédia de costumes brasileira, com O juiz de paz na roça. A obra de Martins Pena inclui vinte comédias e seis dramas e, embora interrompida pela morte precoce do autor aos 33 anos, representa um divisor de águas, com a introdução no teatro da linguagem popular e coloquial, da sátira social e dos retratos de situações quotidianas. Algumas de suas peças, como O noviço (1845), subsistem no repertório moderno.

Fase romântico-naturalista

A dramaturgia de Gonçalves Dias, embora inferior a sua produção poética, é a mais representativa da segunda metade do século XIX. As peças Patkull e Beatriz Cenci, ambas de 1843, fazem evidentes concessões ao gosto folhetinesco da época, embora já demonstrem grande talento. Em Leonor de Mendonça (1846), que impressiona pelo equilíbrio formal e a elegância e teatralidade do diálogo, o autor se liberta dos previsíveis clichês românticos.

A obra de Qorpo-Santo, pseudônimo do gaúcho José Joaquim de Campos Leão, foi escrita em sua maior parte em 1866, ano em que sofreu grave crise psíquica. Produziu um teatro totalmente estranho ao ambiente romântico, pelo vigor do nonsense. Considerada como uma antecipação do teatro do absurdo, a obra de Qorpo-Santo seria resgatada pelo escritor Guilhermino César na década de 1960.

Os grandes nomes da literatura nacional no século XIX não pareceram, em geral, inclinados ao teatro. Pequena importância alcançou a dramaturgia esporádica de romancistas de talento como Machado de Assis, Joaquim Manuel de Macedo e José de Alencar -- o qual declarou explicitamente que seguia modelos franceses por não existirem os nacionais. Pouco tiveram a acrescentar poetas consagrados como Álvares de Azevedo, Castro Alves e Casimiro de Abreu.

Teatro de costumes

França Júnior e Artur de Azevedo consolidaram a comédia de costumes iniciada por Martins Pena. As peças de França Júnior mostram domínio técnico e uma superação da ingenuidade romântica que aproximam sua obra do espectador contemporâneo. A sátira social se apura em Como se faz um deputado (1882), Caiu o ministério! (1884) e As doutoras (1889). A obra de Artur Azevedo representa uma reação contra os abusos do gênero ligeiro que, àquela altura, ameaçava extinguir o drama e a comédia. Seu estilo é simples, direto e de grande fluência. As burletas A capital federal (1897) e O mambembe (1904) são modelares no gênero.

Simbolismo e reação modernista

No começo do século XX, a produção dramática foi extremamente irregular. O teatro francês ditava as normas da dramaturgia. A primeira guerra mundial dificultou as comunicações com a Europa e, ainda mais, a presença das companhias estrangeiras no Brasil, o que abriu caminho para o teatro nacional. Em 1915 fundou-se no Rio de Janeiro o teatro Trianon. Destacaram-se então como dramaturgos sobretudo João do Rio, pseudônimo de Paulo Barreto, cronista brilhante e autor de Eva (1915) e A bela madame Vargas; e também Gastão Tojeiro, Roberto Gomes e Paulo Gonçalves.

A imaturidade do modelo brasileiro de dramaturgia fez com que as décadas de 1920 e 1930 se caracterizassem como o período em que se manifestou a hegemonia dos atores, cujos nomes famosos eram suficientes para atrair o público, sem que houvesse unidade estética no espetáculo quanto a cenografia, figurino, iluminação e mesmo integração do elenco. Consagraram-se assim Itália Fausta, Leopoldo Fróis, Procópio Ferreira e Dulcina de Morais, entre outros.

Contra o teatro acadêmico e indeciso investiu o movimento modernista de 1922, com Eugênia e Álvaro Moreira, fundadores do efêmero porém notável Teatro de Brinquedo, cujos cenários eram como miniaturas; Joraci Camargo, cuja peça Deus lhe pague (1932) se confunde com a primeira tentativa de teatro social no país; e sobretudo Oswald de Andrade, com O rei da vela (1934) e A morta (1937).

Formação de grupos

O teatro de arte, e não apenas de entretenimento, conquistou definitivamente seu espaço a partir da década de 1930. Em 1938, após conhecer o teatro inglês, Pascoal Carlos Magno fundou no Rio de Janeiro o Teatro do Estudante do Brasil, onde foram encenadas peças de Shakespeare, Ibsen, Sófocles e Eurípides. Ali, instituiu a figura do diretor, extinguiu o ponto (encarregado de murmurar as falas para os atores em cena, em caso de esquecimento) e valorizou a equipe de cenógrafos e figurinistas. Em São Paulo surgiram grupos experimentais que revelaram talentos como os de Cacilda Becker e Paulo Autran. Em Recife surgiu, em 1941, o Teatro de Amadores de Pernambuco.

A renovação estética efetiva do palco brasileiro se deu com a fundação, em 1941, do grupo amador Os Comediantes. A partir de sua imposição, na década de 1940, pode-se afirmar que a tônica do espetáculo passou do intérprete ao diretor. O responsável por essa mudança foi o diretor e intérprete polonês Zbigniew Ziembinski, que chegou ao Rio de Janeiro em 1941, fugindo da guerra. De linguagem expressionista, era um mestre da iluminação e passou a coordenar todos os elementos do espetáculo, o que fez sobressair no resultado final o trabalho de equipe. Em 1943, teve impacto surpreendente sua montagem de Vestido de noiva, peça que impôs o nome de Nelson Rodrigues como o autor que renovaria o teatro nacional. A estréia da peça inaugurou a moderna dramaturgia brasileira, em que se destacaram também Jorge Andrade, com A moratória (1932); Ariano Suassuna, com Auto da compadecida (1955); e Dias Gomes, com O pagador de promessas (1954).

O Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), criado em São Paulo em 1948, herdou as diretrizes de Os Comediantes. Patrocinado por um empresário paulista, manteve um elenco fixo de mais de trinta atores e dominou a produção teatral na década seguinte. Restrito quase exclusivamente a peças consagradas na Europa e Estados Unidos, levou o público de classe média ao teatro. A segunda guerra mundial trouxe também ao Brasil diretores estrangeiros como Adolfo Celi, Luciano Salce, Flaminio Bollini Cerri e Ruggero Jacobbi. Seu trabalho influenciou a formação dos primeiros diretores brasileiros: Antunes Filho, José Renato, Flávio Rangel e outros.

Como reação a esse teatro estrangeiro, surgiu no final da década de 1950 o Teatro de Arena de São Paulo, dirigido inicialmente por José Renato e depois por Augusto Boal. Em 1958, o grupo obteve o primeiro grande êxito, com a montagem de Eles não usam black-tie, de Gianfrancesco Guarnieri, brasileiro de origem italiana. O Arena iniciou então um laboratório de dramaturgia que produziu textos, encenados um após outro, sempre com o propósito de examinar um aspecto da realidade do país. Após um período de hegemonia do diretor, firmou-se assim, no início da década de 1960, a preponderância do dramaturgo brasileiro.

O Arena encenou grandes sucessos de bilheteria e configurou-se como importante centro experimental e criador de uma linguagem autóctone de interpretação e cenografia. A primeira contribuição importante de Boal como dramaturgo foi Revolução na América do Sul (1960). O teatro épico à maneira de Brecht serviu de base à formulação de seu "sistema curinga", em que cada personagem é representado alternadamente por vários atores, que se revezam também na função de "curinga", figura que permanece fora da cena, explicando-a e comentando-a. O recurso foi utilizado pela primeira vez em Arena conta Zumbi (1965), texto escrito em parceria com Gianfrancesco Guarnieri e musicado por Edu Lobo. No Rio de Janeiro, Maria Clara Machado, autora e atriz dedicada basicamente ao teatro infantil, fundou em 1952 o grupo experimental O Tablado, que formou várias gerações de atores.

Surgido em São Paulo em 1961, o Grupo Oficina foi responsável por algumas das montagens mais importantes do teatro brasileiro contemporâneo, dirigidas por José Celso Martínez Correia. Destacou-se inicialmente a peça Os pequenos burgueses, de Gorki, encenada em 1964. Em 1967, a primeira montagem de O rei da vela, de Oswald de Andrade, texto publicado trinta anos antes, marcou o início de uma nova fase -- tropicalista e ligada ao momento político -- no trabalho do grupo e fez de José Celso uma das mais vigorosas e discutidas personalidades do teatro nacional. Seguiram-se, com texto e música de Chico Buarque de Holanda, Roda viva (1967) -- cujo elenco foi mais de uma vez agredido pela platéia e que terminou suspensa pela censura federal -- e montagens de textos de Brecht.

No início da década de 1970, após profunda crise que levou ao afastamento de vários integrantes do elenco original, o Oficina remontou alguns de seus sucessos anteriores, com os quais excursionou pelo país e cobriu prejuízos financeiros sem, no entanto, obter o mesmo impacto. O último espetáculo foi Gracias señor.

O grupo Opinião ateve-se à sátira política em forma de musical. O primeiro espetáculo, que deu nome ao grupo, foi idealizado por Augusto Boal, Oduvaldo Viana Filho, Armando Costa e Paulo Pontes. Reunia os cantores e compositores Zé Kéti e João do Vale e a cantora Nara Leão, que alternavam canções nordestinas, cubanas e sambas de morro com textos que denunciavam injustiças sociais.

Grupos independentes

A renovação do teatro brasileiro muito deve também aos grupos semiprofissionais, existentes em grande número por todo o país: somente no Rio de Janeiro, havia mais de trezentos no início da década de 1980. O grupo carioca Asdrúbal Trouxe o Trombone, surgido nessa época, montou O inspetor geral, de Gogol, e as criações coletivas A farra da Terra, Trate-me leão e Aquela coisa toda.

Final do século XX

A gaúcha Denise Stocklos consagrou-se no mundo inteiro com seu "teatro essencial", cujos espetáculos, baseados em elaborada técnica corporal, são resultado de um trabalho solitário de texto, direção e atuação. Antônio Nóbrega, ator e músico, alcançou grande qualidade na linha de teatro popular, com raízes no cordel e no circo.

A dramaturgia de Nelson Rodrigues foi redescoberta e ocupou os palcos e a televisão brasileiros em meados da década de 1990, após a reedição de suas obras completas e o lançamento de O anjo pornográfico (1994), biografia do dramaturgo escrita por Rui Castro. Experiências de linguagem continuaram a ser feitas por diretores como Gerald Thomas, Bia Lessa, Márcio Viana, Gabriel Vilela e Moacir Góis.

Teoria e crítica teatral

Fruto do trabalho de pensadores e filósofos que se dedicam a questões estéticas, de homens de teatro e também de críticos profissionais, a crítica teatral privilegiou tradicionalmente o aspecto literário da dramaturgia, em detrimento do espetáculo.

A poética de Aristóteles, escrita no século IV a.C., é o primeiro documento fundamental de teoria teatral. Estuda as leis que regem a estrutura da tragédia, da comédia e do drama satírico. Considera o teatro como imitação (mimese) de ações da vida real, com o objetivo de suscitar a compaixão e o terror e promover a purgação (catarse) dessas emoções.

O Renascimento italiano foi o ponto de partida da moderna crítica teatral, com a redescoberta e minuciosa análise dos textos greco-romanos. Uma das questões mais controvertidas da teoria teatral renascentista foi a lei das três unidades (ação, tempo e lugar), atribuída a Aristóteles mas formulada explicitamente pela primeira vez em 1570, por Castelvetro. Essa lei postulava que a ação cênica devia transcorrer, durante toda a peça, num único lugar e no tempo real. Transformadas em dogmas inquestionáveis, as proposições aristotélicas, base do classicismo, tiranizaram a produção dramática no Ocidente durante mais de um século.

Na Espanha, a indiferença às normas clássicas foi representada sobretudo pela obra de Lope de Vega. Atacado por Cervantes, veemente defensor do classicismo, Vega defendeu-se em Arte nuevo de hacer comedias en este tiempo (1609), livro em que afirma conhecer as regras mas ignorá-las propositalmente enquanto escreve, para que sua liberdade de criação não seja obstada por falsos preceitos.

Na Inglaterra, até o final do século XVIII, puritanos como Jeremy Collier atacam os homens de teatro. Enquanto isso, na França, a maior parte dos teóricos defendia resolutamente os preceitos clássicos. Apenas no final do século XVII, Saint-Évremond afirma que a Poética não contém leis válidas universalmente e Diderot, criador do drama burguês, pregou o triunfo do homem natural e de uma civilização liberta de preconceitos.

O reformulador do teatro alemão foi Gotthold Ephraim Lessing, que reestudou o sentido da catarse em Aristóteles e postulou que, para que o público de sua época pudesse se identificar com os personagens e experimentasse compaixão e terror, a cena não devia tratar de reis e príncipes, mas de burgueses. Compreendeu o teatro grego como exemplo de dramaturgia nacional e propôs Shakespeare como novo modelo. Acreditava que o gênio não precisa submeter-se às regras literárias, pois é seu criador.

Na França, no início do século XIX, os jornais diários passaram a contar com uma seção especializada em crítica de arte. Ao escrever para o público leigo, que passou a ter acesso a textos dessa natureza em seu jornal habitual, o crítico ganhou relevância social.

Victor Hugo afirmou-se como líder do romantismo a partir do prefácio ao drama Oliver Cromwell (1827), em que elogia Shakespeare, defende a liberdade do autor, proclama o valor do grotesco na arte e a coexistência de elementos trágicos e cômicos numa mesma obra, pois assim é a vida. O trabalho crítico de Zola tornou-se a teorização mais completa e minuciosa da nova corrente literária naturalista.

O romantismo alemão teve como fundadores os irmãos August Wilhelm e Friedrich Schlegel, que juntos publicaram o ensaio teórico Charakteristiken (1801; Características). Hegel e Nietzsche, dois dos mais importantes filósofos do século XIX, deixaram valiosas contribuições à análise do drama. As idéias de Hegel influenciaram mais tarde o marxismo, que por sua vez determinou a direção do teatro político de Bertolt Brecht e Erwin Piscator. Nietzsche, em Die Geburt der Tragödie aus dem Geiste der Musik (1872; O nascimento da tragédia pelo espírito da música), afirmou que a tragédia é fruto da tensão permanente entre a razão e o que há de emocional, instintivo e irracional no homem.

Na Inglaterra, Coleridge estudou Shakespeare e os outros elisabetanos. William Archer, inimigo do teatro poético, atacou-os e introduziu Ibsen nos palcos ingleses. Bernard Shaw defendeu a arte como meio de propaganda política e ideológica, advogou a peça de tese e admitiu a função educativa, de ordem prática e imediata, do teatro. Em The Quintessence of Ibsenism (1891; A quintessência do ibsenismo) colocou Ibsen acima de Shakespeare, ídolo da crítica oficial.

Já no século XX, Adolphe Appia, cenógrafo suíço, defendeu a primazia da encenação sobre o texto literário, visão condizente com o predomínio do diretor teatral a partir de então. Em Le Thêatre et son double, Artaud expôs sua concepção de teatro da crueldade e contesta o racionalismo burguês e a civilização ocidental. Propõe a renúncia à psicologia, à dissecação dos sentimentos e à presença de elementos sociais, deformados por preconceitos e religiões, na obra teatral.

Na Rússia, foi fundamental o trabalho de Stanislavski, sistematizador de uma nova teoria da interpretação que supõe implicitamente uma visão teórica e crítica do teatro. Entre seus opositores, destacou-se Meyerhold, que propunha a anulação da identidade do ator, visto como um mecanismo biológico a serviço da estética global do espetáculo.

Na Alemanha, Brecht, uma das principais figuras do teatro do século XX, produziu também uma obra crítica fundamental. Sua concepção de realismo socialista não pretende hipnotizar ou convencer o público mas, ao contrário, fomentar a discussão, por meio de um teatro épico e narrativo, preservando o distanciamento crítico do espectador. É importante também a obra de Piscator e Walter Benjamin, esse último autor de algumas das mais expressivas análises de Brecht.

Fonte:
E-Learning. DIGERATI. EL010 (CD-Rom)

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