Um velho cruza a soleira
De botas longas, de barbas longas
De ouro o brilho do seu colar
Na laje fria onde quarava
Sua camisa e seu alforje de caçador
Oh, meu velho e invisível
Avôhai
Oh, meu velho e indivisível
Avôhai
Neblina turva e brilhante
Em meu cérebro, coágulos de sol
Amanita matutina
E que transparente cortina
Ao meu redor
E se eu disser que é mei sabido
Você diz que é mei pior
E pior do que planeta
Quando perde o girassol
É o terço de brilhante
Nos dedos de minha avó
E nunca mais eu tive medo da porteira
Nem também da companheira
Que nunca dormia só
Avôhai! Avô e pai!
Avôhai! Avôhai!
O brejo cruza a poeira
De fato existe um tom mais leve
Na palidez desse pessoal
Pares de olhos tão profundos
Que amargam as pessoas que fitar
Mas que bebem sua vida
Sua alma na altura que mandar
São os olhos, são as asas
Cabelos de avôhai
Na pedra de turmalina
E no terreiro da usina, eu me criei
Voava de madrugada
E na cratera condenada, eu me calei
E se eu calei foi de tristeza
Você cala por calar
E calado vai ficando
Só fala quando eu mandar
Rebuscando a consciência com medo de viajar
Até o meio da cabeça do cometa
Girando na carrapeta no jogo de improvisar
Entrecortando eu sigo dentro a linha reta
Eu tenho a palavra certa
Pra doutor não reclamar
Não reclamar!
Avôhai! Avô e pai!
Avôhai! Avôhai!
Avôhai!
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Avôhai: Uma Ode às Raízes e à Sabedoria Ancestral
A música 'Avôhai' de Zé Ramalho é uma homenagem poética e carregada de simbolismo ao avô do cantor, figura que representa sabedoria, tradição e a conexão com as raízes familiares e culturais. O termo 'Avôhai' é uma junção das palavras 'avô' e 'pai', indicando a importância do avô na vida do artista, como um segundo pai ou até mesmo um guia espiritual.
A letra descreve o avô com imagens rústicas e místicas, como um homem de 'botas longas' e 'barbas longas', adornado com um colar de ouro, sugerindo uma figura quase mítica, que carrega consigo a história e a cultura de seu povo. A menção à 'neblina turva e brilhante' e à 'amanita matutina' (um tipo de cogumelo) pode ser interpretada como uma alusão a estados alterados de consciência ou sabedoria transcendental, que o avô parece possuir.
A música também aborda a relação entre a vida e a morte, a sabedoria e a ignorância, e a importância de enfrentar os medos e desafios da vida. A referência à 'pedra de turmalina' e ao 'terreiro da usina' onde o cantor cresceu, trazem o ouvinte para o ambiente físico e cultural do Nordeste brasileiro, onde Zé Ramalho foi criado. 'Avôhai' é uma celebração da ancestralidade e do legado que as gerações mais velhas deixam para as mais novas, um convite para honrar e lembrar das origens.
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