Havia um rei de nome Andrada, que tinha três filhas, e lhes disse que o que sonhassem lhe contassem todos os dias pela manhã.
Uma delas, logo no dia seguinte, contou ao rei um sonho que foi o seguinte: “Sonhei que havia de mudar de estado nestes poucos dias, e cinco reis haviam de me beijar a mão, e entre eles el-rei meu pai.”
O rei ficou muito zangado com a filha e lhe ordenou que, se de novo sonhasse aquilo, não lhe contasse mais, senão a mandaria matar.
A moça tornou a sonhar coisa semelhante, e pela manhã, apesar de lhe rogarem as irmãs, ela contou o sonho ao pai. Ele mandou matá-la, e cortar-lhe o dedo mindinho que os matadores lhe deviam trazer.
Os criados do rei levaram a princesa para um ermo, e tiveram pena de a matar; cortaram-lhe somente o dedo, que levaram ao rei, deixando a moça nas brenhas.
Ela começou a caminhar, e, muito longe, encontrou um buraco, e entrou por ele dentro, e, quanto mais entrava, mais o buraco se alargava até que ela foi dar num rico palácio. Aí ela tinha o almoço, a janta, e a ceia, sem ver ninguém, porque o palácio era encantado. Apenas ela ouvia, de um quarto que estava fechado, falar um papagaio.
Depois de alguns dias, apareceu-lhe um lindo moço que lhe deu a chave do quarto, e disse que o abrisse e respondesse ao papagaio coisa que fizesse sentido ao que ele dissesse. O moço desapareceu.
A princesa abriu o quarto, e o papagaio, que era muito grande e bonito, e das asas douradas, ficou muito alegre, sacudindo-se todo, e disse:
“Como vem a filha
Do rei Andrada
Tão bonita,
Tão formosa,
E tão ornada!”
— Ó meu papagaio dourado,
Eu das tuas ricas penas
Pretendo fazer um toucado.
Aí o papagaio desencantou-se no lindo moço que antes lhe tinha aparecido. O moço mandou logo vir um padre e se casou com a princesa, mandando convidar cinco reis, que no cortejo beijaram a mão de sua noiva.
No meio deles veio o rei Andrada. Todos os outros beijaram a mão da princesa, e, quando chegou a vez do rei Andrada, a nova rainha não lhe quis dar a mão; pelo que ele ficou muito injuriado, e foi queixar-se ao rei seu amigo, e dono da casa.
O noivo, indo perguntar a razão daquilo, a moça lhe contou a sua história, o que sabendo o rei Andrada foi pedir perdão à sua filha.
Fonte: Sílvio Romero. Contos populares do Brasil. Publicado originalmente em 1885. Disponível em Domínio Público.
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