Em algum rio do centro-oeste brasileiro. Enfim a tão esperada pescaria com o grupo de amigos e a certeza de 10 mágicos dias.
No deck de uma pousada à beira do rio que omitirei o nome para evitar que consortes com espírito investigativo possam rastrear a inocente aventura dos maridos, embarcaram em um Boat-hotel e seguiram na busca dos peixes que o “pacote” da operadora de turismo prometera. Descontraídos, apreciavam as lindas paisagens, cada um tomando sua bebida. Conforme aumentava o consumo dos aperitivos, também elevava o teor das mentiras sobre pescarias anteriores e conquistas amorosas.
Algumas horas depois, o comandante do barco informou que haveria a primeira parada.
Alvoroçados, prepararam o material de pesca, quando avistaram, na margem direita, uma construção que lembrava um castelo.
Entreolharam-se surpresos quando ouviram a voz do capitão informando que deveriam descer e adentrar ao local.
O suntuoso cabaré da Eny estava preparado para receber os desavisados pescadores. Pista de dança, palco aparelhado com som de alta qualidade, um bar com Girls- Tender servindo drinks finíssimos.
Solícitas, as garçonetes seminuas e em grande número nunca deixavam os copos esvaziarem.
No lado de fora, uma churrasqueira manejada por um mestre na arte da carne e uma linda piscina com um quiosque, rodeado de bancos, e outra bar-girl especialista em bebidas exóticas.
Em determinado horário, o DJ começa a tocar uma música suave e surgem mulheres trajando vestidos longos, com discreta maquiagem, generosos decotes, que começaram a desfilar no palco, descendo em seguida, passeando entre as mesas e oferecendo companhia aos homens do grupo.
Logo formam-se os pares e todos dirigem-se à parte de trás do castelo, onde há magníficas suítes totalmente equipadas para estimular a imaginação.
De manhã ouvem o apito da embarcação chamando o grupo para reiniciar a viagem. Muito a contragosto, todos sobem ao convés e trocam poucas palavras. Ao chegar ao primeiro local onde cardumes esperam para ser fisgados, poucos tiveram ânimo para jogar as iscas.
O capitão já conhecendo essa reação, inicia um churrasco precedido de caipirinhas elaboradas com uma cachaça que ele reservava para levantar o astral dos hóspedes.
Aos poucos, todos retornaram às atividades de pesca.
Os mais desinibidos foram ao comandante aventar a hipótese de abreviar o tempo de pescaria e retornar ao Castelo da Eny. Chegaram a um acordo e tomaram o caminho de volta ignorando os peixes. Ao chegar ao Castelo, tiveram mais uma noite sem igual, onde o DJ colocou músicas típicas da ocasião, como Boate Azul, Eu vou tirar você deste lugar e sucessos de Nelson Ned, Waldick Soriano e Reginaldo Rossi. Todos cantaram com muita emoção. Novamente, formaram-se os pares e foram às suítes.
De manhã, soou o apito da embarcação e após as despedidas reuniram-se no convés. Repararam a falta de dois deles e foram checar o acontecido. Encontraram os dois agarrados aos pés da cama, quase em histeria, gritando que jamais iriam embora dali.
Eny, com muitos anos de experiência no ramo, foi chamada e pediu para ficar a sós com a dupla.
Assim, com ar professoral, disse que ninguém pode eternamente viver em uma só fantasia, que voltassem para casa e construíssem novos sonhos.
No caminho de casa estabeleceram um tácito acordo em que jamais falariam sobre aquelas duas noites.
Passado um ano, os dois recalcitrantes compraram novo pacote de viagem para o mesmo destino.
Embarcaram e, quando foram se aproximando do local do Castelo, mal podiam conter a ansiedade.
Não contiveram a ansiedade e ao ver que o comandante não diminuía a velocidade para atracar, gritaram desesperadamente, o que fez com que ele encostasse na margem do rio no local indicado pelos dois histéricos passageiros.
Ao não enxergar o Castelo, embrenham-se na mata para tentar achá-lo. Nada encontrando, voltaram desolados ao barco, sem entender o que poderia ter acontecido. Pescaram furiosamente como se os cardumes fossem responsáveis pela frustração.
Eny, no alto de sua experiência e sabedoria, tinha razão: somente insanos vivem dentro de uma fantasia.
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Arthur Thomaz é natural de Campinas/SP. Segundo Tenente da Reserva do Exército Brasileiro e médico anestesista, aposentado. Trovador e escritor, úblicou os livros: “Rimando Ilusões”, “Leves Contos ao Léu – Volume I, “Leves Contos ao Léu Mirabolantes – Volume II”, “Leves Contos ao Léu – Imponderáveis”, “Leves Aventuras ao Léu: O Mistério da Princesa dos Rios”, “Leves Contos ao Léu – Insondáveis”, “Rimando Sonhos” e “Leves Romances ao Léu: Pedro Centauro”.
Fontes:
Arthur Thomaz. Leves contos ao léu: mirabolantes. Volume 2. Santos/SP: Bueno Editora, 2021. Enviado pelo autor
Imagem criada por Jfeldman com Microsoft Bing
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