1
À pergunta: - Qual andar?
Responde o pinguço, a esmo:
- Onde quiser me levar;
já errei de prédio mesmo!
2
Ao vir "de fogo" recua
gritando, após a topada:
- Que faz um poste na rua
às duas da madrugada?!
3
Cai no trilho e a triste sina
maldiz tanto o beberrão...
"Essa escada não termina
e é tão baixo o corrimão!”
4
"Depois do jantar, o mate",
diz, ao filho, o anfitrião.
Foge, ao perigo, o mascate.
Foi sem tomar chimarrão!…
5
- É o piloto... tô em perigo!...
Tem fumaça... e um fogaréu!...
- É a torre... reze comigo:
“Pai nosso, que estais no céu...”
6
Foi o par pro beleléu...
e o fantasma, em tom moderno:
- Venho, à noite, aqui no céu,
ou você vai lá no inferno?
7
Jaz o ancião na cascata!...
Seu anjo, que é seu abrigo,
já velho e com catarata,
não viu a placa "PERIGO"!
8
Na escada, a aposta suicida
dos genros, no arranha-céu:
- Leva, quem perde a corrida,
a sogra como troféu!
9
Não houve pancadaria
nem sufoco na paquera...
“Sou homem”, disse a Maria.
Ainda bem que o Zé não era!
10
O bombeiro subalterno
morreu... e o céu foi seu rogo...
Mas, foi mandado pro inferno
porque no céu não tem fogo!!!
11
Pede a graça ao padroeiro
e promete ao santo, à beça...
É um beato caloteiro
que não paga nem promessa!
12
Querendo ver o acidente,
ele abriu caminho a murro...
Foi dizendo: "Sou parente"...
Mas quem morreu foi um burro!
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SOBRE AS TROVAS DE THEREZINHA
por José Feldman
As trovas humorísticas de Therezinha Dieguez Brisolla capturam de forma leve e irônica situações cotidianas, muitas vezes com um toque de absurdo.
AS TROVAS
1 – Ironia do pinguço: A resposta do pinguço mostra a desorientação que o álcool pode trazer, transformando uma simples pergunta em uma piada sobre confusão, refletindo uma crítica ao consumo excessivo de álcool e suas consequências.
2 – Poste na madrugada: A indignação de encontrar um obstáculo à noite ilustra a falta de atenção que todos podem ter em momentos de distração.
3 – A escada interminável: O desespero do beberrão reflete a frustração de situações que parecem não ter fim, uma metáfora para desafios da vida.
4 – Chimarrão perdido: O mascate foge do perigo sem se preparar adequadamente, uma. É uma crítica ao despreparo e à falta de atenção nas interações sociais, às próprias tradições, ironizando a seriedade que as pessoas costumam dar a eventos triviais.
5 – O piloto em perigo: A cena humorística mostra como a fé pode ser uma reação imediata ao medo, mesmo em situações absurdas.
6 – Fantasma moderno: A troca entre o fantasma e o homem traz um humor surreal, questionando o que é realmente assustador.
7 – Catarata e perigo: A ironia da situação do ancião que ignora um aviso é um lembrete sobre a vulnerabilidade da idade.
8 – Aposta com sogra: A aposta arriscada entre genros e a sogra revela o humor em relações familiares e rivalidades.
9 – Confusão na paquera: A revelação sobre Zé traz um alívio cômico, jogando com expectativas em situações românticas.
10 – Bombeiro no céu: O bombeiro que, ao morrer, é enviado para o inferno porque "no céu não tem fogo" brinca com a expectativa de que heróis vão para o céu, revelando uma ironia sobre o destino das pessoas.
11 – Beato caloteiro: A figura do beato que não cumpre suas promessas é uma crítica social divertida, expõe a falta de sinceridade em práticas religiosas, mostrando como as pessoas muitas vezes não se comprometem com suas palavras.
12 – Abertura de caminho: A busca por atenção em um acidente termina tragicamente cômica, mostrando como a vida pode ser cheia de surpresas.
ESTILO E ESTRUTURA
Ritmo e Rima: As trovas têm uma cadência marcante, com rimas que tornam a leitura leve e divertida.
Personificação: Elementos como fantasmas e anjos são usados para dar vida a ideias e reflexões, criando um ambiente lúdico.
Simplicidade: A linguagem é acessível, o que permite que as mensagens sejam compreendidas por diversos públicos.
A IRONIA NAS TROVAS DE THEREZINHA
A ironia nas trovas humorísticas de Therezinha está profundamente enraizada na cultura brasileira e se relaciona com diversos aspectos da sociedade.
As trovas refletem a oralidade e a riqueza do português falado no Brasil, utilizando expressões coloquiais que ressoam com o cotidiano das pessoas. O uso de ironia e humor é uma forma de expressar a identidade brasileira, revelando a capacidade de rir das próprias desventuras. serve como ferramenta de crítica às injustiças sociais e políticas, algo comum na tradição de humor no Brasil, desde a literatura até as manifestações artísticas.
O brasileiro tem uma tradição de usar o humor como forma de resistência, especialmente em tempos difíceis. A ironia nas trovas reflete essa capacidade de encontrar leveza em situações complicadas, pois o riso é uma parte fundamental da cultura brasileira, e as trovas humorísticas abraçam essa característica, criando um espaço para a reflexão através do humor.
CONCLUSÃO
Essas trovas ressoam por sua capacidade de fazer o leitor rir, enquanto o convida a refletir sobre a condição humana. Elas são uma forma de humor popular que preserva tradições e, ao mesmo tempo, traz à tona questões contemporâneas, cada uma com seu próprio charme e sagacidade.
Essa conexão entre ironia e cultura enriquece a compreensão das trovas, tornando-as não apenas divertidas, mas também significativas dentro do contexto social e cultural do Brasil.
Fonte: José Feldman. 50 Trovadores e suas Trovas em preto e branco. vol.1. Maringá/PR: IA Poe. Biblioteca Voo da Gralha Azul. 2024.