OLHOS VERDES
Alfredo de Assis
Tinha o mar para mim, sempre, um novo atrativo.
Quanta vez eu lhe disse as minhas alegrias,
Sentindo-o, forte e belo, estremecer, cativo
Dos meus sonhos, num brando exalar de harmonias!
Hoje o meu velho amigo, hoje o mar, como vivo,
Só me traz o pavor e cruéis agonias.
Já não posso fitá-lo, ai! não posso, que avivo
Estas penas sem fim! estas mágoas sombrias!
Porque o verde do mar lembra o verde de uns olhos
Que me foram na vida a suprema ventura.
E por quem vivo agora a gemer e a chorar.
Olhos cheios de luz, olhos cheios de escolhos,
Cheios duma divina expressão de ternura,
E cruéis... e fatais como as águas do mar...
(Lôbo, Antônio. Os Novos Atenienses. São Luís: SIOGE/AML, 1970. p.58.)
SERTANEJAS
Luís de Carvalho
I
Vem nascendo a manhã. A lavandisca
Desfere o canto à sombra das ramadas.
Tremendo, o orvalho límpido faísca
Das paineiras nas flores desatadas.
Solta, pelos capões correndo, a arisca
Seriema as estridentes gargalhadas.
E a aurora as nuvens de oiro e sangue risca,
Doira e ensangüenta a areia das estradas.
Todo o sertão está desperto. O brando
E frio vento da manhã sacode
O mangueiral, as mangas despencando.
Sobe da mata o aroma das resinas.
E a codorniz, assobiando, acode
Aos pios matinais das sururinas.
II
Meio dia. Lá fora um sol violento
Cai do céu, queima o pó, doira as espigas.
À beira da água o gado sonolento
Repousa, e batem roupa as raparigas.
Agora a mata é quieta e muda. O vento
Cessou. Cessaram todas as cantigas.
Nem um leve rumor, nem um lamento
No seio bom das árvores amigas.
O engenho, entanto, à luz do sol trabalha.
A cana guincha nas moendas. Fuma
Fuligem negra a férvida fornalha.
Borbulha o mel nas tachas referventes
E um bafo sobe, ao desflorar da espuma,
Entre o fragor das máquinas trementes.
III
Agora o curvo céu resplende. O cheiro
Bom da jurema os ares embalsama.
Dorme o curral. O gênio feiticeiro
Da noite anda a sonhar de rama em rama.
Fia o luar nas árvores a trama
Da luz. Da casa-grande no terreiro
Tem a viola enleios de quem ama,
Entre os dedos nervosos do vaqueiro.
Grilos... O fogo azul dos pirilampos...
O murmurar dos ninhos e do rio,
A mãe-da-lua aos gritos pelos campos...
Noite de minha terra, mansa e boa!
Deixa que eu durma ouvindo o desafio
Das cantigas dos sapos na lagoa!...
(p. 63-64)
(Lôbo, Antônio. Os Novos Atenienses. 2. ed. São Luís: SIOGE/AML, 1970.)
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