terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Hegel Pontes (Álbum de Trovas e Sonetos)



Hegel Pontes (Monte Santo de Minas/MG, 05 de dezembro de 1932 – Juiz de Fora/MG, 15 de novembro de 2012)

TROVAS

A honra é a imagem casta
 dentro do espelho do Bem:
 - Se a gente dele se afasta
 ela se afasta também...

A lágrima comovida
 que vem de dentro de nós,
 é uma palavra sofrida
 que chega aos olhos sem voz.

A quiromante não lia,
 ao fazer a predição,
 que o destino me daria
 justamente a sua mão.

A voz dos ventos distantes,
 dentro das conchas do mar,
 são preces de navegantes,
 que não puderam voltar.

Cidade Poema, eu queria,
 já que a fonte não se esgota,
 beber o encanto e a poesia
 que até de seu nome brota. 

Com que ironia o destino
 pode este quadro pintar:
 De um lado, um lar sem menino;
 de outro, um menino sem lar.

Conversas de marinheiro
 ouço nas conchas do mar.
 São almas de jangadeiros
 Que não puderam voltar.

Depois da falsa meiguice
 e dos falsos beijos seus,
 “Adeus”; sem graça, ela disse,
 e eu disse: - Graças a Deus!

É noite em nossa favela
e o vento, em leve rumor,
apaga a chama da vela
e acende a chama do amor.

Felicidade, és somente
 meu horizonte fugaz:
 quando dou um passo à frente
 dás um passo para trás...

Jogou, perdeu, e hoje sabe,
 vivendo um natal sombrio,
 que a consciência não cabe
 num sapatinho vazio.

Não julgues pelo semblante
 A honra alheia, meu filho:
 - Na lua, a face brilhante
 oculta a face sem brilho!

Nesta noite nordestina,
quando o luar me arrebata,
é lindo ver toda salina,
banhada de prata

No beco dos infelizes,
 se houver saída, me aponte:
 - quem vive sob as marquises
 não vê céu nem horizonte...

O cego, na estrada escura,
 vai tateando... e sua mão
 parece que faz ternura
 na face da escuridão!

O drama da despedida
 foi termos, ambos, notado
 tua lágrima fingida
 e o meu sorriso forçado...

O sino é um ser sem razão,
 que não tem razão de ser:
 quando pára um coração,
 ele começa a bater...

Partiste e chovia tanto!...
mas entendi na saudade
que a leve gota de um pranto
molha mais que tempestade.

- Pescadores, foi milagre!
E o fanfarrão se gabava:
Só a foto do meu bagre
Mais de dez quilos pesava

Quando a vejo sobre o monte,
 qual pipa vagando ao léu,
 pego a linha do horizonte
 e empino a lua no céu!

SONETOS

A ALMA DA PEDRA
  
Longa pesquisa. E o mestre hindu descobre
que existe uma fadiga nos metais;
que o descanso renova, do ouro ao cobre,
o reino singular dos minerais.

Eu também sinto que a matéria encobre
estranhas vibrações emocionais.
É que a pedra tem alma, simples, nobre,
sonhando evoluções espirituais.

E a alma da pedra imovel é a energia
que evolui, na ilusória letargia,
entre seres gigantes e pigmeus.

E sonha, nos milênios que a consomem,
ser um cacto que sonha ser um homem,
ser um homem que sonha ser um Deus.

AMOR ADOLESCENTE

Esta noite, meu bem, foi tão comprida
e tão sem graça foi a madrugada,
que eu senti que você é minha vida
e a vida sem você não vale nada.

Mas é tarde demais. A despedida
é como a pedra que já foi lançada:
mesmo partindo da pessoa amada,
nunca mais poderá ser recolhida.

Tudo acabado: os sonhos que sonhei,
seu amor, seu carinho e seu desvelo...
E esta noite, meu bem, foi tão comprida,

que dei graças a Deus quando acordei
e percebi, após o pesadelo,
que entre nós dois nunca houve despedida.

DEVANEIO

È noite de natal, estou sozinho
E escuto ela chegando passo a passo;
Entra no quarto e agora, de mansinho,
Afaga minha fonte e meu cansaço.

Ela fala das flores do caminho,
E ainda sem notar meu embaraço,
Fala de velhos sonhos, de carinho,
De um beijo antigo, de um antigo abraço.

E por falar comigo desse jeito,
Vai removendo amargas cicatrizes
E arrancando lembranças do meu peito.

Eu ouço e peço: “Cala-te saudade,
Não se deve dizer aos infelizes
Que algum dia existiu felicidade”.

DUAS CHAMAS

Qual monge recolhido em sua cela,
Rezando a derradeira Ave-Maria,
Estava só e apenas uma vela
Velava a minha noite de agonia.

Eu contemplava a ardente sentinela
Que em vigília também se consumia,
E percebia uma oração singela,
No declínio da chama fugidia...

...Agora é madrugada e, por um fio,
Duas chamas de vida em decadência
Vacilam e se apagam no vazio.

E apenas uma, ao fim da claridade,
Caindo no vazio da existência,
Ressurge no esplendor da eternidade.

ESTRELA DA MANHÃ

Estrela da manhã que resplandece
no céu espiritual de minha vida,
vislumbro em seu olhar a mesma prece
que envolve ao longe a solitária ermida.

Brilha no azul. Porém quando escurece,
não passa de uma lágrima perdida
na imensidão da noite que aparece,
de estrelas fulgurantes, revestida.

E, levando meus sonhos noite afora,
eu posso vê-la ainda ao sol nascente,
quando as estrelas todas vão embora.

Pois só você, estrela entristecida,
não tem repouso e brilha suavemente
no céu espiritual de minha vida.

SÃO FIDÉLIS

De São Fidélis guardo a ressonância
 De pássaros cantando nas capoeiras;
 No olhar conservo as flores das primeiras
 Primaveras perdidas na distância…

 Toucou-me um dia a incontrolável ânsia
 De procurar caminho e abrir porteiras,
 Deixando para trás velhas mangueiras
 Que encheram de doçura a minha infância.

 Comércio, indústria, o campo verde, o açude…
 Cidade Poema, te esquecer não pude,
 Porque, mesmo partindo da cidade,

 Como carro-de-boi que geme e chora,
 Eu vou levando pela vida afora
 A colheita indelével da saudade!

SÃO FIDÉLIS II

Cidade poema, tu não és somente
 Um recanto de esplêndida beleza,
 Fruto de tua rica natureza
 E também do labor de tua gente.

 Não é apenas a visão presente
 De tudo que compõe tua grandeza:
 Jardins e monumentos, e a surpresa
 Que a cada passo o visitante sente…

 São Fidélis, tu és a extraordinária
 Imagem da Matriz bicentenária,
 Testemunha de sua trajetória.

 Ela é o ontem que acena ao amanhã
 E que se eleva como guardiã
 De tua longa e luminosa história.

SONETO VERDE

"O Paraibuna, rio singular 
Que vai passando mas não vai embora 
É testemunha mais que milenar 
Da mata do Krambeck em Juiz de Fora 

E diz que a mata é dona do lugar, 
Porque usucapiu a fauna e a flora 
E tudo que devemos preservar 
Desde ontem, hoje e séculos afora 

A mata é o grito verde permanente 
Da natureza em prol do meio-ambiente, 
O bem maior que a humanidade tem.

A mata é vida e em nome da harmonia 
A poetisa Clevane já dizia: 
Quem mata a mata morrerá também."
--
Fontes:
http://artculturalbrasil.blogspot.com.br/2009/02/escola-juiz-forana-de-trovas.html
http://poesiaemtrovas.blogspot.com
http://vendavaldasletras.wordpress.com
http://trovaspequenasnotaveis.blogspot.com.br/
http://colunaacontecendo.blogspot.com.br/2012/11/nota-de-falecimento-hegel-pontes.html
http://www.sardenbergpoesias.com.br/200_anos_matriz_sao_fidelis/obras_vencedoras/obras_vencedoras.htm 
Alguns sonetos foram enviados pelo poeta mineiro Luciano Brandão

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