sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

Professor Garcia (Sonetos Avulsos) – 4


A MÚSICA NO TEMPO

Se a música no tempo é fascinante,
tem porquês, de uma língua natural,
a música, linguagem dominante,
onde quer que ela exista, é sempre igual.

Uma raça qualquer, por mais errante,
escutando uma nota musical,
ela sente o poder alucinante
dessa força sonora, universal.

Quem compôs essa sábia partitura,
teve a glória total dessa ventura,
e escreveu para sempre em seus anais:

Todo o encanto, das auras do infinito,
numa escala, de um jeito tão bonito,
tendo só, sete notas musicais!

(3° lugar na Espanha em 10,02.2017)
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BRISAS DE OUTONO

Quando as brisas do outono sopram mansas,
trazem sonhos de amor ao ser humano,
refazendo as perdidas esperanças
e afastando o temor do desengano.

Sou um amante das brisas, das mudanças,
da estação que me faz mudar de plano,
brisas soltas de outono são andanças
que me causam prazer, ano após ano.

Quando, à noite, não vejo os pirilampos,
a tristeza da treva invade os campos
e um cenário de dor, me faz tristonho...

Os murmúrios das folhas pelo chão,
são as vozes do outono, que se vão,
recitando os poemas do meu sonho!

(1° lugar na Argentina em 14,05.2017)
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CANTARES

Hoje a tarde morreu sem nostalgia,
na moldura do céu, que linda tela:
Era a noite bebendo a luz do dia
e as estrelas pintando outra aquarela.

A pestana do sol, já não se via,
mas a lua no céu era tão bela...
Que a cortina da noite se escondia,
para a lua brilhar na passarela.

Neste terno cenário, sobre um monte,
vislumbrava Delcy, lá no horizonte,
dando exemplo de tudo que se ufana.,,

Era a mestra dos Pampas, gargalhando,
sobre as nuvens, sentada, recitando
um dos lindos sonetos de Quintana!

(Homenagem aos 80 anos da poetisa Delcy Canalles+, 16.05.2011)
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CREPÚSCULO E AURORA

Quando a luz do arrebol rasga a cortina,
e o clarão da manhã, o céu decora,
todo o orvalho respinga da campina
matizando de prata a luz da aurora!

A tristeza do sol se descortina,
ante a tarde que chega, e se apavora;
o crepúsculo triste na retina,
diz que um velho gigante também chora!

Ao nascer chega ungido de esplendor,
traz na luz, esperança, paz e amor,
mas à tarde começa a entristecer;

desse jeito caminha o sol do esteta:
De manhã, é feliz por ser poeta,
e à tardinha, é a luz do entardecer!

(l° lugar em Portugal em 11.02.2016)
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GEOMETRIA DO LABOR

Se esta vida é, de fato, uma disputa
de uma guerra sem trégua e, sem medida,
é o trabalho, uma regra de conduta,
que nos leva ao prazer, por toda a vida.

Cada passo é uma marca dessa luta,
pela trilha da estrada percorrida...
Muitos vivem felizes, sem labuta,
e outros morrem na luta mais sofrida.

Há uma regra esquisita e muito estranha,
pois quem muito trabalha, pouco ganha,
mas com o pouco que ganha, também ama,

e eu conheço ricaço e mais ricaço,
que acumula fortuna a cada passo;
e por tudo que tem, ainda reclama!

Fonte> Professor Garcia. Poemas do meu cantar. Natal/RN: Trairy, 2020.
Livro enviado pelo autor.

Antonio Brás Constante (Miss Creve - a musa dos escritores (e outras misses))

Outro dia escutei algumas pessoas comentando sobre a Miss Universo 2011, onde diziam que havia ficado estranha a sonoridade da junção das palavras “Miss” e “Angola”, visto que a ganhadora do concurso foi a Miss Angolana, a bela Leila Lopes. A partir daí resolvi pesquisar sobre localidades que causassem um efeito similar, o resultado da pesquisa e outras maluquices seguem abaixo para o seu deleite (se não gostar, por favor, reclame... Para sua querida Mãe):

Miss Cabella – Itália, Miss Tragha – Reino Unido, Miss Buraka – Paquistão, Miss Quessy – França, Miss Tura – Rússia, e Miss Gana – África.

Além das combinações formadas por locais que existem neste nosso, mais ou menos, redondo mundo, eu também inventei e encontrei na internet outras combinações interessantes:

Miss Plode e Miss Toura – Primeira dupla de candidatas terroristas e suicidas da história de nossa (des) humanidade, que chegaram arrasando literalmente no evento.

Miss Quenta – Candidata considerada como “pé frio” entre as concorrentes.

Miss Sá – Candidata devota e religiosa que tinha muita fé em sua vitória.

Miss Comunga – Concorrente e rival de Miss Sá, totalmente incrédula sobre as chances da rival.

Miss Noba – Patricinha de nariz empinado, chegou ao concurso se achando a bolachinha mais recheada do pacote.

Miss Pera - Candidata que perdeu o táxi e quase perdeu o horário do desfile. Representante das mulheres frutas no concurso.

Miss Corre – Participante com problemas de corrimento nasal.

Miss Correga – Caiu três vezes durante o desfile e botou a culpa no piso, dizendo que estava liso.

Miss Tatela – Também escorregou e acabou caindo da passarela e quebrando o tornozelo.

Miss Craviza – Concorrente Sado masoquista

Miss Peta – Antes de ser candidata trabalhava como bonequinha de vodu.

Miss Creve – Candidata e musa dos escritores no concurso de Miss.

Miss Cuta – Concorrente com problemas nas cordas vocais, de voz baixa, quase inaudível.

Miss Goela – Ao contrário da Miss Cuta, essa candidata falava sempre gritando.

Miss Frega – Trabalhava como faxineira antes de ser descoberta para participar do concurso de Miss.

Miss Guicha – Única mãe do concurso, que nas horas vagas amamentava a filha recém-nascida com fartura de leite materno.

Miss Miúça, Miss Pecifica, Miss Plica e Miss Clarece – Irmãs quadrigêmeas e concorrentes com os mesmos problemas de entendimento sobre as regras do concurso.

Miss Palha – Concorrente a Miss e fofoqueira de plantão.

Miss Parrama – Candidata espaçosa que queria a passarela todinha só para ela.

Miss Panta – Adorava assustar suas concorrentes com histórias de terror sobre os bastidores do concurso.

Miss Põe – a Candidata mais exibida do desfile

Miss Pressa – Só não foi eleita como oradora oficial do concurso por ser afobada e gostar de falar muito rápido.

Miss Prime – Tagarela que gostava de falar pelos cotovelos. Acabou sendo ela a oradora do desfile.

Miss Preita – Candidata que sempre olhava para trás ao desfilar achando que alguém estava seguindo-a na passarela.

Miss Taciona – Trabalhava antes do concurso como manobrista em um badalado restaurante da capital

Miss Tica – Fez cirurgia para aumentar sua estatura e conseguir participar do concurso de Miss.

Miss Timula – Candidata com problemas de depressão e baixa auto-estima ou alta baixa-estima, ela não soube explicar.

Miss Corraça – Expulsa três vezes de concursos de beleza por ser muito inconveniente e extremamente irritante.

Miss Conde – Candidata extremamente tímida e encabulada.

Miss Panca, Miss Bofeteia e Miss Tapeia – Apanharam muito para conseguir entrar para o concurso de Miss.

Miss Balda – Baladeira de plantão, vive no cheque-especial por conta de suas contas.

Miss Tremece – Considerada como o tipo de concorrente que chega abalando as estruturas do concurso.

Miss Culhamba – Miss metida a engraçada que ficava o tempo todo fazendo piadinhas de si mesma.

Miss Traçalha – Candidata de estilo selvagem e arrasador.

Miss Ericórdia – A Miss mais assustadora, horripilante e tenebrosa do evento.

Por hoje é só, e que a Miss Sá (ou outra qualquer, dependendo dos gostos de cada um) povoe os sonhos dos amigos e que a Miss Ericórdia agracie os sonhos de todos os chatos que perambulam por aí.

Hinos de Cidades Brasileiras (Pinhalão/PR)


Letra e Música: Lairton Trovão de Andrade

Sob a crista altaneira da serra,
proliferas febril Pinhalão.
Do humilde recanto da terra
surges meiga na imensa nação.

Bis: Nas sombras dos teus bosques
brilhou o céu de anil,
profundo desafio
a virgem selva em flor.

Estribilho
Doce Torrão querido,
Reino dos cafezais,
Bis: Onde se tem palmeiras
E lindos pinheirais.

Verdes campos de reses mimadas,
tremulantes jardins de cereais,
enobrecem tuas mãos calejadas
sobre o solo de mil minerais.

Bis: 
As ondas das colinas,
Planícies, serranias,
emitem melodias
do ouro vegetal.

Estribilho
Doce Torrão querido,
Reino dos cafezais,
Bis: Onde se tem palmeiras
E lindos pinheirais.

Terra amada de eterna bonança,
com firmeza aderiste ao Brasil.
Turbilhões em caudais de esperança
Revigoram-te o ardor varonil

Bis: 
"Rio Cinzas"!... "Boa Vista"!
"Triângulo" e "Serrinha"!
"Campina" e "Lavrinha"!
Oh! Salve! Salve! Salve!

Estribilho
Doce Torrão querido,
Reino dos cafezais,
Bis: Onde se tem palmeiras
E lindos pinheirais.

Graciliano Ramos (A doença de Alexandre)

— Como vai, seu Alexandre? Que estrago foi esse? perguntou mestre Gaudêncio à porta da 
camarinha.

— Macacoas da idade, suspirou o doente. Na beira da cova desde a semana passada. Tomei a purga de pinhão que o senhor me ensinou. Entre, seu Gaudêncio, vá-se abancando. Tomei a purga de pinhão e uns xaropes. Depois sinha Terta andou por aí e me deu um suadouro. 

Estava na cama de varas, a testa enrolada num lenço vermelho, a camisa de algodão aberta mostrando os pelos do peito e o rosário de contas brancas e azuis. Cesária e Das Dores levaram
para o quarto a mobília da sala: a pedra de amolar, a esteira, a mala de couro cru e o cepo. 

Mestre Gaudêncio abaixou-se, encolheu-se na passagem estreita e escorregou da treva do corredor para a meia luz que a candeia de azeite espalhava. Seu Libório acompanhou-o. O cego preto Firmino sondou a abertura com o cajado, arriscou alguns passos e, tateando a parede, acercou-se da cama:

— Onde é a dor, seu Alexandre?

— Sei não, seu Firmino, respondeu mole o dono da casa. Pega na raiz do cabelo e vai ao dedo grande do pé. Sente, seu Firmino, sentem vossemecês. Me dê água, Cesária. 

Os visitantes mergulharam na sombra que se adensava nos cantos, procuraram, descobriram e utilizaram os móveis. Das Dores saiu, voltou com um caneco de lata enferrujada, que ofereceu ao padrinho. O enfermo ergueu-se lento num cotovelo, bebeu, deixou cair desanimado no travesseiro a cabeça cor de sangue, como a de um galo-de-campina.

— Arreado, meu amigo, queixou-se. A princípio era uma gastura, o estômago embrulhado e a vista escurecendo. Botei para o interior a purga de pinhão de mestre Gaudêncio e a garrafada que Cesária fez. Das Dores rezou uma oração forte. Depois veio sinha Terta. Ai!

— Esteja quieto, seu Alexandre, murmurou o negro. É melhor vossemecê calar a boca, fechar os olhos e descansar.

— Que descansar! A vida inteira aqui descansando, seu Firmino! Isto é negócio? Não adianta descansar. Ai! Não há mezinha que sirva. Desta vez acho que embarco.

— Não embarca não, sentenciou mestre Gaudêncio curandeiro. É assim mesmo. A moléstia vai comendo, vai comendo, e quando mata a fome, deixa o corpo do cristão. Aí o suplicante se levanta e mata a fome também. Endurece, engorda, conversa, desempena o espinhaço.

— Se o senhor fala, é porque sabe, seu Gaudêncio, gemeu Alexandre. Peço a Deus que os anjos digam amém. Esta fé é que me traz em pé. Ora vejam que besteira. Em pé! Aqui de papo para o ar, contando os caibros, não presto para nada. Cesária fez uma promessa: se me endireitar, arranja umas novenas, vai à missa um ano inteiro todos os domingos e paga cinco libras de cera a Nossa Senhora do Amparo.

— Seu Alexandre, tornou o cego, vossemecê está gastando fôlego à toa, perdendo força.

— Há uma semana que não falo, seu Firmino, e se falo, é para soltar variedades. Agora que estou no meu juízo não me calo, nem por decreto. Preciso desabafar, dizer o que vi naqueles sonhos agoniados de quem está de viagem para a terra dos pés juntos. Primeiro foi um bode. Montei-me nele, e o bicho cresceu, passou as nuvens, chegou ao céu, ficou tão alto que eu não enxergava a terra. Um fumaceiro, um pretume. Segurava-me desesperadamente, com receio de me despencar lá de cima e esbagaçar-me. O infeliz saltava como se tivesse o diabo no couro, espetava as estrelas com as pontas, dava marradas na lua e sapecava os cabelos do focinho no sol. Num dos pulos desaprumei-me e caí. Caí escanchado numa onça-pintada, que se atirou pelo mundo correndo, um pé de vento. Andou, virou, mexeu, atravessou um espinheiro (lá deixei o olho esquerdo num garrancho), meteu-se num mato cheio de marquesões cobertos de jacas maduras, parou na beira de um rio que, pelos modos, era o S. Francisco. Vai senão quando uma coisa me bateu no estribo. Levantei o rebenque, saltei no chão, mas aí notei que estava com a perna metida na goela de uma jiboia, até a coxa.

— “Valha-me o Senhor S. Bento, gritei. Sou um homem frito.” Nessa altura a cachorra Moqueca apareceu e começou a latir. A cobra assustou-se, livrei-me dela devagarinho, saí atrás de uma guariba que fumava cachimbo e usava gibão e guarda-peito.

— Desarranjo no interior, segredou mestre Gaudêncio curandeiro.

— Isso mesmo, seu Gaudêncio, concordou Alexandre. Miolo avariado. O aperreio do sonho continuou, misturado a casos verdadeiros. Uma confusão, um sarapatel, seu Firmino. Das Dores rezando a oração forte, Cesária no cós da saia de Nossa Senhora, e eu malucando na beira do S. Francisco, rastejando uma guariba. Tremia que era um deus nos acuda, procurava afastar aquelas bobagens, mas um papagaio, com um olho de gente no bico, chegava junto de mim, arrastando os pés apalhetados: — “Está aqui, seu major. Está aqui o olho que eu achei estrepado num garrancho, coberto de moscas e formigas. Bote o olho na cara, seu major.” Eu aceitava o conselho e via perfeitamente o papagaio, o S. Francisco, Cesária de joelhos, bulindo nas contas, Das Dores rezando a oração de sustância. A febre não era deste mundo, um febrão pior que o fogo do inferno, sim senhores. Aí sinha Terta se apresentou. Sentiu de longe a quentura, sentiu a quentura no fim do pátio, lá para os pés de juá, foi o que ela disse. Foi ou não foi, Cesária?

— Foi, Alexandre, confirmou Cesária. Podem perguntar a sinha Terta.

— Não senhora, interveio o curandeiro. Fale, seu Alexandre. Está com vontade de falar, fale. É bom. Nós escutamos e o senhor espalha a morrinha. Fale até rebentar.

— Uma peste, seu Gaudêncio. Já andou perto de fornalha de engenho? Era aquilo. Sinha Terta sentiu o calor no fim do pátio.

— Não é muito não? perguntou o cego.

— Sei lá, respondeu Alexandre. Pode ser que seja. Sinha Terta disse, mas se vossemecê julga que ela se enganou, não discuto. Isso não tem importância. A verdade é que eu estava com febre. E estou. Pegue aqui no meu pulso. Escangalhado, seu Firmino. Felizmente agora já penso direito, a leseira desapareceu, Deus seja louvado. Pois, como ia contando, sinha Terta chegou, estirou o beiço, foi à cozinha e ferveu muita flor de sabugueiro. Bebi uma panela toda. Sinha Terta me consolou, arrumou em cima de mim uma serra de panos e saiu com Das Dores, que não se aguentava nas pernas, coitada. Cesária, bamba também, se amadorrou ali na rede. Fiquei só. E começou o efeito do remédio, um despotismo, sim senhores. Quase me desmanchei em suor. As bobagens da arrelia voltaram, achei-me de novo no S. Francisco, ouvindo as lorotas do papagaio, que me acompanhava em voos curtos. A sede me apertou. Deitei-me de barriga para baixo, encostei a boca na correnteza e empanzinei-me com mais de uma canada, mas quando me levantei, estava seco, a língua dura, cuspindo bala. Avistei de supetão uma canoa que se largava para a outra banda, carregada de tatus. 

— “Entre para dentro, major Alexandre, convidou-me o dr. Silva, que era o canoeiro. Tem lugar para o senhor.” Despedi-me do papagaio, acomodei-me na embarcação e ela se afastou. Dr. Silva quis puxar conversa, mas eu estava repugnado, suando, suando. — 

“Santa Maria! estranhou o dr. Silva. Que é que o senhor tem que está pingando tanto, major Alexandre?” E eu me expliquei: — “Armadas de sinha Terta. Empurrou-me no bucho um suadouro brabo, e estou assim, derretendo-me como sebo na brasa. Parece que me sumo. Quando acabar esta desgraceira, não me resta nem osso.” Fomos navegando. Dr. Silva dizia uns casos e eu suava. 

A canoa, com o peso do suor, no meio do rio emborcou. — “Estamos afundando, gritou o dr. Silva. Caia na água, major. Caia na água e veja se alcança terra.” Dito e feito. Saltei da cama, num desespero, aos berros: — “Cesária, que é das minhas alpercatas?” Saibam vossemecês que eu estava com água pela canela. Cesária deixou a rede, as saias levantadas, num assombro: — “Jesus, Maria, José! A gente se afoga.” 

Ainda azuretado, com o S. Francisco e o dr. Silva na cabeça, não me espantei muito. Depois tomei tento e informei-me: — “Está chovendo, Cesária?” — “Está não, Xandu. Certamente houve trovoada nas cabeceiras do riacho.” Foi ver as coisas lá fora e achou tudo em ordem: o tempo limpo, o céu estrelado, o riacho na largura do costume. Voltou — e percebemos o motivo daquele despropósito. O suor tinha enchido a casa, fazia um barulho feio no corredor, saía pelos fundos e entrava no barreiro. Entendem? Horrível, meus amigos.

— Um desadoro, pois não, concordou o cego. Mas quem sabe se aquilo não era trapalhada? Talvez vossemecê estivesse zuruó, tresvariando.

— Estava não, seu Firmino, respondeu Alexandre. Acordei. E Cesária molhou a barra do vestido. Podem perguntar a ela. A casa está úmida. Assim de noite, com esta candeia safada, não se nota, mas de dia vê-se bem. E as alpercatas sumiram-se. As alpercatas foram encontradas anteontem no quintal, enganchadas num pé de muçambê. O senhor quer prova melhor, seu Firmino? Ai! Aquele suadouro me arrasou. Eu queria conversar com os senhores, mas não posso, estou feito um molambo. Não reparem na falta não, meus amigos. Vou dormir.

Fonte> Graciliano Ramos. Histórias de Alexandre. Publicado originalmente em 1944.Disponível em Domínio Público 

quinta-feira, 4 de janeiro de 2024

Mensagem na Garrafa - 71 -

Carlos Drummond de Andrade
Itabira/MG (1902 - 1987) Rio de Janeiro/RJ

A UM AUSENTE

Tenho razão de sentir saudade,
tenho razão de te acusar.
Houve um pacto implícito que rompeste
e sem te despedires foste embora.

Detonaste o pacto.
Detonaste a vida geral, a comum aquiescência
de viver e explorar os rumos de obscuridade
sem prazo sem consulta sem provocação
até o limite das folhas caídas na hora de cair.

Antecipaste a hora.
Teu ponteiro enlouqueceu, enlouquecendo nossas horas.
Que poderias ter feito de mais grave
do que o ato sem continuação, o ato em si,
o ato que não ousamos nem sabemos ousar
porque depois dele não há nada?

Tenho razão para sentir saudade de ti,
de nossa convivência em falas camaradas,
simples apertar de mãos, nem isso, voz
modulando sílabas conhecidas e banais
que eram sempre certeza e segurança.

Sim, tenho saudades.
Sim, acuso-te porque fizeste
o não previsto nas leis da amizade e da natureza
nem nos deixaste sequer o direito de indagar
porque o fizeste, porque te foste. 

Contos e Lendas do Paraná - 19 (Esperança Nova – Paranaguá)


ESPERANÇA NOVA
Quebradeira

O caso ganhou destaque na imprensa da região de Umuarama, quando no ano de 1994, na estrada Jequitibá, distrito das Três Vendas, município de Esperança Nova, uma casa assombrada causava medo, risos e incredulidade nas pessoas. 

No sítio do senhor Derso moravam o seu Neno, a esposa e três filhos; sendo uma menina e dois adolescentes. Na condição de empreiteiros, a família do seu Neno, por mais que trabalhasse, era considerada muito pobre pelos vizinhos sitiantes. Porém, ninguém desabonava a conduta honesta daquela gente simples e humilde. Uma doença nos olhos obrigou seu Neno a retirar um olho, colocando no lugar uma espécie de burca, deixando a família ainda mais necessitada de recursos financeiros.

Certa feita, determinados fenômenos passaram a acontecer na casa daquela família: xícaras, pratos e copos amanheciam quebrados. Garfos entortados podiam ser vistos pela casa. Tochas de fogo acendiam sozinhas e o telhado da casa se encheu de buracos. Seu Neno comunicou o assombro para o patrão, que veio ligeiro de Curitiba para constatar o fato. 

Tamanho foi seu susto, quando um dia dormia tranquilo e, no  meio da noite, às escuras, sentiu a cama suspensa. Aí sim a notícia chegou aos jornais e emissoras da região, culminando nas visitas e orações de crentes, curiosos, padres, pastores e espíritas. 

A filha do Zé Turilho dizia, por exemplo, que o seu rosário havia quebrado em diversos pedaços só por ter se aproximado da casa. O Zé Carlos ofereceu lar aos meninos. O povo dizia que a assombração destruiria com tudo. 

O padre de Pérola achou por bem transferir a família para uma casinha no pátio da Igreja das Três Vendas. A vizinhança ajudava com donativos. A comunidade se comprometeu a ajudar com dinheiro aqueles assustados moradores. Mas, seu Quintino e outros poucos vizinhos não acreditavam naquilo; chamaram a polícia, que visitou o local, conversou com os membros da família e se foi. 

Entretanto, investigadores deixaram na casa uma câmera para filmar o “fenômeno”. Tamanha foi a surpresa, quando a polícia viu as imagens dos sorrateiros moleques, jogando tijolos no telhado, quebrando e danificando os móveis e objetos domésticos. 

Conduzidos à delegacia, confessaram tratar-se de um plano que visava arrecadar dinheiro para reverter o estado de pobreza em que se encontravam. Liberados após os depoimentos e sermões, a família retornou à tal casa assombrada, onde vive até hoje, sem maiores alaridos ou quebradeiras.
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PARANAGUÁ
A lenda do brejo que canta

Cheguei a conhecer, já octogenário, o João Bomsinho, que tinha um sítio lá para as bandas do Porto dos Padres, assim chamado o lugar onde tiveram os Jesuítas uma fazenda de criação, na foz do Imboguassu. Neste sítio o velho cultivava algodão e foi ele quem me contou a história do
“Brejo que Canta”:

A meio caminho da cidade, na embocadura do Imboguassu, há um terreno vasto e alagadiço, onde o lírio do brejo cresce viçoso. Com as chuvas o lugar se transforma num lago e com bom tempo prolongado continua a ser temível atoleiro, do qual o gado por instinto se afasta, receoso de desaparecer no sumidouro.

E assim falava, na sua pitoresca linguagem, o João Bomsinho:

– O brejo canta, sim Sinhô, mas só uma vez no ano, à meia-noite, justa de quinta pra Sexta-feira santa e nessa hora quem por ali passa, ouve muito bem o batido dum fandango, ao som de duas violas e da cantiga dos violeiros. Deus permite que saiam as suas almas do purgatório na noite da paixão pra correrem o fado, em castigo da ofensa ao “Sinhô Morto”.

– Almas de quem? perguntei.

– “Dos violeiros e dos dançadores, os excomungados que cantavam e fandangueavam na noite em que nosso Sinhô morreu. Escuite mecê; no lugar do brejo era um terreno enxuto, bom, de terra branca e firme e nele morava em casa de pedra e cal um tal de Roberto Inglês, ruivo e herege como o diabo, não gostava de Deus nem dos santos. Decerto esse mardito era criminoso e até diziam que fora pirata.

“O meu avô que o conheceu de vista, sempre que o encontrava fazia o sinal da cruz e com ele nunca quis parceria, receoso do castigo do céu. Ora, numa quinta-feira maior estava a vila entregue aos ofícios da semana santa, enlutados os moradores e até o capitão-mor dera ordem à milícia que fizesse a guarda, com a boca dos arcabuzes voltada para o chão e não permitissem cantorias nem folguedos até a hora da aleluia, sob pena de cadeia. Quando o danado, em conluio com o “coisa ruim”, resolveu uma folgança pra essa noite.

“Andava por aqui nesse tempo o coronel Afonso Botelho, que assistiu à missa devotadamente com um laço de crepe no copo da espada, e a Câmara, com o estandarte do rei, de luto, que o vereador mais moço conduzia, foi incorporada à matriz para fazer guarda ao Sinhô Morto.

“Tudo era respeito ao dia. Mas no caminho do Porto dos Padres, o inglês, zombando das coisas santas, procurou e achou uns infelizes que aceitaram o convite. À meia-noite estrondeava o fandango, longe da vila e por isso despercebido da autoridade. A cachaça corria aos copázios. Maneco Eduvirges e Domingos Pedrão, violeiros e já embriagados, cantavam quadrinhas blasfemas, desafiando a majestade divina, com aprovação do diabo ruivo. Quando cantavam esta:

Si Deus morreu porque quis
Não é caso pra chorá
Bate firme, minha gente
Bate forte, até suá

“Nesse instante, a casa moveu-se e todos sentiram que afundava, mas antes do alarme ainda se ouviu o Pedro e o Eduvirges cantarem mais esta barbaridade:

Si morreu pra nos salvá
O fio do padre eterno,
Ele que vá buscá nois
Lá nas profunda do Inferno!

“O movimento acentuou-se e o pânico se manifestou naquelas almas entenebrecidas pelo vício e pela impiedade, despertada nelas a compreensão do desastre e morte inevitável. O primeiro impulso foi de fuga, mas quando tentaram evadir-se já as portas e janelas estavam entaipadas pelo lodo mole que invadia o interior. 

“Apagaram-se as luzes. Nas trevas e começando a respirar dificultosamente, aqueles desgraçados se debatiam. Não havia salvação possível! O fim pela asfixia era fatal. Não tardou a agonia. O terreiro, há pouco ainda sólido, com laranjeiras e cajueiros, dum pra outro instante virou lodaçal e tudo se afundou.

“Consumada a tragédia, a habitação desapareceu no abismo e com ela quantos estavam no fandango sacrílego e fatal. No dia seguinte os sitiantes vizinhos, que iam para a vila assistir à missa da sexta-feira santa, viram com espanto um brejo no local onde de véspera se erguia a moradia do inglês e isto sem que tivesse chovido. E brejo ficou o lugar maldito. Na noite de quinta-feira santa do ano seguinte, alguém por ali passando, noite alta, ouviu claramente o batido dum fandango, ao toque das violas e o cantar dos violeiros. Correu espavorido a contar na vila o prodígio que a tradição trouxe, do Brejo que Canta. De geração em geração, até o presente, vem enchendo de terror a gente supersticiosa que a tudo se arriscará neste mundo, menos transitar pela estrada que margeia o trágico alagadiço, na noite da paixão de Jesus.”

Fonte> Renato Augusto Carneiro Jr (coordenador). Lendas e Contos Populares do Paraná. 
Curitiba : Secretaria de Estado da Cultura , 2005.

Hans Christian Andersen (Olavinho-fecha-os-olhos)

Não há ninguém no mundo que conheça tantas histórias como Olavinho-fecha-os-olhos, ou quem pode relacioná-los tão bem. À noite, enquanto as crianças estão sentadas à mesa ou em suas cadeirinhas, ele sobe as escadas muito suavemente, pois anda de meia, depois abre as portas sem o menor barulho e lança uma pequena quantidade de poeira muito fina em seus olhos, apenas o suficiente para impedi-los de mantê-los abertos, e assim eles não o veem. Então ele se arrasta atrás deles e sopra suavemente sobre seus pescoços, até que suas cabeças começam a cair.

Mas Olavinho-fecha-os-olhos não deseja magoá-los, pois gosta muito de crianças e só quer que eles fiquem quietos para que ele possa se relacionar com essas histórias bonitas, e eles nunca ficam quietos até que estejam na cama adormecidos. Assim que dormem, Olavinho-fecha-os-olhos se senta na cama. Ele está bem vestido; seu casaco é feito de seda; é impossível dizer de que cor, pois muda de verde para vermelho e de vermelho para azul quando ele se vira de um lado para o outro. Sob cada braço, ele carrega um guarda-chuva; um deles, com fotos por dentro, que se espalham em boas crianças, e então eles sonham com as mais belas histórias a noite toda. Mas o outro guarda-chuva não tem fotos, e ele segura as crianças malcriadas para que durmam pesadamente e acordem de manhã sem terem sonhado.

Agora ouviremos como Olavinho-fecha-os-olhos veio todas as noites durante uma semana inteira ao menino chamado Hjalmar, e o que ele lhe disse. Havia sete histórias, pois há sete dias na semana.

SEGUNDA-FEIRA

"Agora, preste atenção", disse Olavinho-fecha-os-olhos, à noite, quando Hjalmar estava na cama, "e eu decorarei o quarto".

Imediatamente todas as flores nos vasos se tornaram árvores grandes, com galhos compridos chegando ao teto e se estendendo ao longo das paredes, de modo que a sala inteira parecia uma estufa. Todos os galhos estavam carregados de flores, cada flor tão bonita e perfumada como uma rosa; e, se alguém os provasse, os teria achado mais doce que a geleia. A fruta brilhava como ouro, e havia bolos tão cheios de ameixas que quase estouravam. Era incomparavelmente bonito. Ao mesmo tempo, soaram lamentos sombrios da gaveta da mesa onde estavam os livros escolares de Hjalmar.

“O que pode ser isso agora?” Disse Olavinho-fecha-os-olhos, indo para a mesa e puxando a gaveta.

Era uma lousa, tão angustiada por causa de um número falso na soma, que quase se partira em pedaços. O lápis puxou e puxou a corda como se fosse um cachorrinho que queria ajudar, mas não conseguiu.

E então veio um gemido do caderno de Hjalmar. Oh, foi terrível ouvir isso! Em cada folha havia uma fileira de letras maiúsculas, cada uma com uma pequena letra ao lado. Isso formou uma cópia; sob essas havia outras cartas que Hjalmar havia escrito: imaginavam que pareciam a cópia, mas estavam enganadas; pois estavam inclinados de um lado como se pretendessem cair sobre as linhas de lápis.

"Veja, é assim que você deve se manter", disse a cópia. "Olhe aqui, você deve inclinar-se assim, com uma curva graciosa."

"Oh, estamos muito dispostos a fazê-lo, mas não podemos", disseram as cartas de Hjalmar; "Somos tão miseravelmente feitos".

"Então você deve estar riscado", disse Olavinho-fecha-os-olhos.

“Oh, não!” Eles choraram, e então se levantaram tão graciosamente que foi um prazer olhar para eles.

"Agora devemos desistir de nossas histórias e exercitar essas cartas", disse Olavinho-fecha-os-olhos; - Um, dois, um, dois ... Então ele os treinou até que se levantassem graciosamente e parecesse tão bonito quanto uma cópia poderia parecer. Mas depois que Olavinho-fecha-os-olhos se foi, e Hjalmar olhou para eles pela manhã, eles estavam tão miseráveis ​​e desajeitados como sempre.

TERÇA-FEIRA

Assim que Hjalmar estava na cama, Olavinho-fecha-os-olhos tocou, com sua varinha mágica, todos os móveis do quarto, que imediatamente começaram a tagarelar, e cada artigo falava apenas de si.

Sobre a cômoda, pendia uma imagem grande em uma moldura dourada, representando uma paisagem, com belas árvores velhas, flores na grama e um amplo riacho que fluía através da madeira, passando por vários castelos, longe no oceano selvagem. Olavinho-fecha-os-olhos tocou a foto com sua varinha mágica, e imediatamente os pássaros começaram a cantar, os galhos das árvores farfalharam e as nuvens se moveram pelo céu, projetando suas sombras na paisagem abaixo deles. Então Olavinho-fecha-os-olhos ergueu o pequeno Hjalmar até a moldura e pôs os pés na foto, bem na grama alta, e lá estava ele, com o sol brilhando sobre ele através dos galhos das árvores.

Ele correu para a água e sentou-se em um pequeno barco ali, pintado de vermelho e branco. As velas brilhavam como prata, e seis cisnes, cada um com uma argola dourada em volta do pescoço e uma estrela azul brilhante na testa, puxaram o barco para o bosque verde, onde as árvores falavam de ladrões e bruxas, e as lindas flores. pequenos elfos e fadas, cujas histórias as borboletas tinham relacionado a eles. Peixes brilhantes, com escamas como prata e ouro, nadavam atrás do barco, às vezes formando uma mola e espirrando água ao redor deles, enquanto pássaros vermelhos e azuis, pequenos e grandes, voavam atrás dele em duas longas filas.

Os mosquitos dançaram ao redor deles, e os chocadeiras gritaram "Buz, buz". Todos queriam seguir Hjalmar, e todos tinham alguma história para contar. Foi uma vela muito agradável. Às vezes as florestas eram densas e escuras, às vezes como um belo jardim, alegre ao sol e flores; depois passou por grandes palácios de vidro e mármore, e nas varandas havia princesas, cujos rostos eram os de menininhas que Hjalmar conhecia bem, e com quem brincava com frequência. Um deles estendeu a mão, na qual havia um coração feito de açúcar, mais bonito do que qualquer confeiteiro já vendido. Enquanto Hjalmar navegava, ele segurou um lado do coração de açúcar e o segurou com força; a princesa também se segurou, de modo que se partiu em dois pedaços.

Hjalmar tinha uma peça e a princesa a outra, mas a de Hjalmar era a maior. Em cada castelo havia pequenos príncipes atuando como sentinelas. Eles apresentaram armas, e tinham espadas de ouro, e fizeram chover ameixas e soldados de estanho, para que fossem príncipes de verdade.

Hjalmar continuou a velejar, às vezes pelos bosques, às vezes por grandes salões e depois pelas grandes cidades. Por fim, ele chegou à cidade onde morava sua enfermeira, que o carregara nos braços dela quando era muito pequeno e sempre fora gentil com ele. Ela assentiu e acenou para ele, e então cantou os pequenos versos que ela mesma compôs para ele:

“Quantas vezes minha memória se volta para ti,
Meu próprio Hjalmar, sempre querido!
Quando eu pude assistir tua alegria infantil,
Ou beije uma lágrima perolada.
Tem nos meus braços tua língua falsa
Primeiro falou a palavra meio esquecida,
Enquanto os teus passos cambaleantes eu pendurava,
Minha carinhosa proteção para pagar.
Despedida! Oro para o poder celestial
Para te manter até a hora da morte."

E todos os pássaros cantaram a mesma música, as flores dançavam nos caules e as árvores velhas assentiam como se Olavinho-fecha-os-olhos também lhes estivesse contando histórias.

QUARTA-FEIRA

Como a chuva caiu! Hjalmar podia ouvir isso enquanto dormia; e quando Olavinho-fecha-os-olhos abriu a janela, a água correu bastante até o peitoril da janela. Tinha a aparência de um grande lago do lado de fora e um belo navio jazia perto da casa.

“Você vai velejar comigo esta noite, pequeno Hjalmar?” Disse Olavinho-fecha-os-olhos; "Então veremos países estrangeiros e voltarás aqui de manhã."

De repente, estava Hjalmar, com suas melhores roupas, no convés do nobre navio; e imediatamente o tempo ficou bom. Eles navegaram pelas ruas, contornaram a igreja e, de todos os lados, rolaram o amplo e grande mar. Eles navegaram até a terra desaparecer, e então viram um bando de cegonhas, que haviam deixado seu próprio país, e estavam viajando para climas mais quentes. 

As cegonhas voavam uma atrás da outra, e já havia muito, muito tempo na asa. Um deles parecia tão cansado que suas asas mal o carregavam. Ele foi o último da fila e logo foi deixado para trás. 

Por fim, afundou cada vez mais baixo, com asas estendidas, batendo-as em vão, até que seus pés tocaram o cordame do navio, e ele deslizou das velas para o convés e parou diante deles. Então, um menino de marinheiro o pegou e o colocou no galinheiro, com as aves, os patos e os perus, enquanto a pobre cegonha ficou perplexa entre eles. "Basta olhar para aquele sujeito", disseram as galinhas.

Então o peru-galo estufou o máximo que pôde e perguntou quem ele era; e os patos giram para trás, gritando: "Quack, quack".

A cegonha contou-lhes tudo sobre a África quente, as pirâmides e o avestruz, que, como um cavalo selvagem, atravessa o deserto. Mas os patos não entenderam o que ele disse e gritaram entre si: “Somos todos da mesma opinião; a saber, que ele é estúpido. "

"Sim, com certeza, ele é estúpido", disse o peru; e devorado.

Então a cegonha permaneceu em silêncio e pensou em sua casa na África.

"Essas são suas pernas finas e bonitas", disse o peru. "Quanto custam um quintal?"

"Quack, quack, quack", sorriram os patos; mas, a cegonha fingiu não ouvir.

"Você também pode rir", disse o peru; “Pois esse comentário era bastante espirituoso, ou talvez estivesse acima de você. Ah, ah, ele não é inteligente? Ele será uma grande diversão para nós enquanto permanecer aqui. ”E então ele devorou, e os patos gritaram:“ Devore, devore; Quack, quack.

Que tumulto terrível eles fizeram, enquanto se divertiam tanto entre si!

Então Hjalmar foi ao galinheiro; e, abrindo a porta, chamou a cegonha. Então ele pulou no convés. Ele havia descansado agora, e parecia feliz, e parecia que ele acenou para Hjalmar, como se quisesse agradecer. Então ele abriu as asas e voou para países mais quentes, enquanto as galinhas estalavam, os patos grasnavam e o peru ficava escarlate na cabeça.

"Amanhã você será transformado em sopa", disse Hjalmar às aves; e então ele acordou e se viu deitado em sua pequena cama.

Foi uma jornada maravilhosa que Olavinho-fecha-os-olhos o fez fazer essa noite.

QUINTA-FEIRA

"O que você acha que eu cheguei aqui?” Disse Olavinho-fecha-os-olhos: “Não se assuste, e você verá um ratinho.” E então ele estendeu a mão para ele, na qual estava uma adorável pequena criatura. “Chegou para convidá-lo para um casamento. Dois ratinhos vão entrar no estado de casamento hoje à noite. Eles residem sob o piso do depósito de sua mãe, e essa deve ser uma excelente moradia. ”

"Mas como posso atravessar o pequeno buraco de rato no chão?", Perguntou Hjalmar.

"Deixe-me administrar isso", disse Olavinho-fecha-os-olhos. "Em breve vou fazer você pequeno o suficiente." E então ele tocou Hjalmar com sua varinha mágica, e depois se tornou cada vez menos, até que finalmente não passou de um dedinho. “Agora você pode pegar emprestado o vestido do soldado de lata. Eu acho que isso serve apenas para você. Parece bom usar um uniforme quando você entra na empresa. ”

"Sim, certamente", disse Hjalmar; e em um momento ele estava vestido tão bem quanto o mais puro de todos os soldados de estanho.

"Você será tão bom a ponto de se sentar no dedal da sua mãe", disse o ratinho, "para que eu possa ter o prazer de atraí-lo para o casamento."

- Você realmente vai se incomodar, mocinha? - perguntou Hjalmar. E assim, ele foi ao casamento do rato.

Primeiro eles entraram no chão e depois passaram por uma longa passagem, que mal era alta o suficiente para permitir que o dedal passasse por baixo, e toda a passagem foi iluminada com a luz fosforescente da madeira podre.

“Não tem um cheiro delicioso?” Perguntou o ratinho, enquanto ela o puxava. “A parede e o chão foram manchados com casca de bacon; nada pode ser melhor."

Muito rapidamente eles chegaram ao salão nupcial. À direita, estavam todas as ratinhas, sussurrando e rindo, como se estivessem brincando umas com as outras. À esquerda estavam os camundongos, acariciando seus bigodes com as patas dianteiras; e no centro do salão podia ser visto o par nupcial, lado a lado, em uma casca de queijo oca, e se beijando, enquanto todos os olhos estavam fixos neles; pois eles já estavam noivos e logo se casariam. Mais e mais amigos continuavam chegando, até que os ratos estavam quase se matando; pois o par nupcial estava agora na porta e ninguém podia entrar ou sair.

A sala havia sido esfregada com casca de bacon, como a passagem, que era toda a bebida oferecida aos convidados. Mas para a sobremesa eles produziram uma ervilha, na qual um rato pertencente ao casal de noivas havia mordido as primeiras letras de seus nomes. Isso era algo bastante incomum. Todos os camundongos disseram que era um casamento muito bonito e que tinham sido muito agradáveis.

Depois disso, Hjalmar voltou para casa. Ele certamente estivera em grande sociedade; mas ele fora obrigado a rastejar debaixo de uma sala e a se tornar pequeno o suficiente para vestir o uniforme de um soldado de lata.

SEXTA-FEIRA

“É incrível a quantidade de idosos que ficariam felizes em me receber à noite”, disse Olavinho-fecha-os-olhos, “especialmente aqueles que fizeram algo errado. 'Bom olá', dizem eles para mim ', não podemos fechar os olhos e ficamos acordados a noite toda e vemos todas as nossas más ações sentadas em nossas camas como pequenos diabinhos e borrifando-nos com água quente. Você vai levá-los embora, para que possamos ter uma boa noite de descanso? ​​', E eles suspiram profundamente e dizem:' Teríamos prazer em pagar por isso. Boa noite, Olavinho, o dinheiro está na janela. - Mas nunca faço nada por ouro. - O que devemos fazer esta noite? - perguntou Hjalmar. "Eu não sei se você gostaria de ir para outro casamento", respondeu ele, "embora seja um assunto completamente diferente do que vimos na noite passada. A boneca grande de sua irmã, que se veste de homem e se chama Herman, pretende se casar com a boneca Bertha. Também é o aniversário das bonecas e elas receberão muitos presentes."

“Sim, eu já sei disso”, disse Hjalmar, “minha irmã sempre permite que suas bonecas mantenham seus aniversários ou se casem quando precisam de roupas novas; isso já aconteceu centenas de vezes, tenho certeza.

“Sim, pode ser; mas hoje à noite é o centésimo primeiro casamento e, quando isso aconteceu, deve ser o último; portanto, isso deve ser extremamente bonito. Apenas olhe."

Hjalmar olhou para a mesa, e lá estava a casinha de bonecas de papelão, com luzes em todas as janelas, e desenhadas diante dos soldados de lata que apresentavam armas. As noivas estavam sentadas no chão, encostadas na perna da mesa, parecendo muito atenciosas e com boas razões. Então Olavinho-fecha-os-olhos vestidos com o vestido preto da avó casou-se com eles.

Assim que a cerimônia foi concluída, todos os móveis da sala se uniram para cantar uma bela canção, composta pelo lápis de chumbo, e que foi para a melodia do Military Tatoo.

“Que sons alegres estão ao vento,
Enquanto os ritos do casamento se unem
Um par calmo e amoroso,
Embora formado de criança, ainda suave e justo!
Viva! Se eles são surdos e cegos,
Vamos cantar, embora o tempo se mostre desagradável. "

E agora veio o presente; mas o casal nupcial não tinha nada para comer, pois o amor era a comida deles.

"Vamos a uma casa de campo ou viajar?", Perguntou o noivo.

Depois, consultaram a andorinha que havia viajado tão longe e a velha galinha no quintal, que criara cinco ninhadas de galinhas.

E a andorinha conversava com eles de países quentes, onde as uvas pendiam em grandes cachos nas videiras, e o ar é suave e suave, e sobre as montanhas brilhando com cores mais bonitas do que podemos imaginar.

“Mas eles não têm repolho roxo como nós”, disse a galinha, “eu estive no país com minhas galinhas por um verão inteiro; havia um grande poço de areia, no qual podíamos andar e arranhar o que quiséssemos. . Então nós entramos em um jardim em que crescemos repolho roxo; oh, como foi bom, não consigo pensar em nada mais delicioso.

"Mas um talo de repolho é exatamente igual a outro", disse a andorinha; "E aqui geralmente temos mau tempo".

"Sim, mas estamos acostumados a isso", disse a galinha.

"Mas está muito frio aqui e congela às vezes."

"O tempo frio é bom para os repolhos", disse a galinha; “Além disso, nós o aquecemos aqui algumas vezes. Há quatro anos, tivemos um verão que durou mais de cinco semanas e estava tão quente que mal se podia respirar. E então neste país não temos animais peçonhentos e estamos livres de ladrões. Ele deve ser perverso, que não considera nosso país a melhor de todas as terras. Ele não deveria poder morar aqui. ”E então a galinha chorou muito e disse:“ Eu também viajei. Uma vez, percorri 20 quilômetros em uma gaiola e não foi nada agradável viajar.

"A galinha é uma mulher sensata", disse a boneca Bertha. "Não ligo para viajar por montanhas, apenas para subir e descer novamente. Não, vamos ao poço de areia em frente ao portão e depois daremos um passeio no jardim de repolho.

E então eles resolveram isso.

SÁBADO

“Estou ouvindo mais histórias?” Perguntou o pequeno Hjalmar, assim que Olavinho-fecha-os-olhos o mandou dormir.

"Não teremos tempo esta noite", disse ele, estendendo o guarda-chuva mais bonito sobre a criança. “Olhe para esses chineses”, e então o guarda-chuva inteiro apareceu como uma grande tigela de porcelana, com árvores azuis e pontes pontiagudas, sobre as quais estava o pequeno chinês balançando a cabeça. “Devemos deixar o mundo bonito para amanhã de manhã”, disse Olavinho-fecha-os-olhos, “pois será feriado, é domingo. Agora devo ir ao campanário da igreja e ver se os pequenos sprites que vivem lá poliram os sinos, para que soem docemente.

Então devo ir aos campos e ver se o vento soprou o pó da grama e das folhas, e a tarefa mais difícil de tudo o que tenho que fazer é derrubar todas as estrelas e alegrá-las. Eu tenho que numerá-los primeiro antes de colocá-los no meu avental, e também numerar os lugares de onde os levo, para que eles possam voltar aos orifícios certos, ou então eles não permaneceriam, e devemos ter um número de estrelas cadentes, pois todos caíam um após o outro. ”

“Ouça! Sr. Olavinho-fecha-os-olhos”, disse um retrato antigo pendurado na parede do quarto de Hjalmar. "Você me conhece? Eu sou o bisavô de Hjalmar. Agradeço por contar as histórias dos meninos, mas você não deve confundir as ideias dele. As estrelas não podem ser retiradas do céu e polidas; são esferas como a nossa terra, o que é uma coisa boa para eles. ”

"Obrigado, velho bisavô", disse Olavinho-fecha-os-olhos. "Eu que agradeço; você pode ser o chefe da família, como sem dúvida é, mas eu sou mais velho que você. Eu sou um pagão antigo. Os antigos romanos e gregos me deram o nome de deus dos sonhos. Eu visitei as casas mais nobres e continuo a fazê-lo; ainda sei me conduzir tanto para o alto quanto para o baixo, e agora você pode contar as histórias” e então Olavinho-fecha-os-olhos se afastou, levando os guarda-chuvas com ele.

"Bem, bem, nunca se deve dar uma opinião, suponho", resmungou o retrato. E acordou Hjalmar.

DOMINGO

"Boa noite", disse Olavinho-fecha-os-olhos.

Hjalmar assentiu, depois pulou da cama e virou o retrato do bisavô para a parede, para que não os interrompesse como havia feito ontem. “Agora”, ele disse, “você deve me contar algumas histórias sobre cinco ervilhas verdes que viviam em uma vagem; ou do grão de bico que cortejou o grão de bico; ou da agulha de cerzir, que agiu com tanto orgulho porque se imaginava uma agulha de bordar. ”

"Você pode ter muita coisa boa", disse Olavinho-fecha-os-olhos. “Você sabe que eu gosto mais de lhe mostrar uma coisa, então eu vou lhe mostrar meu irmão. Ele também é chamado Olavinho-fecha-os-olhos, mas ele nunca visita ninguém, mas uma vez, e quando chega, ele o leva a cavalo e conta histórias enquanto andam. Ele conhece apenas duas histórias. Uma delas é tão maravilhosamente bela que ninguém no mundo consegue imaginar algo assim; mas o outro é igualmente feio e assustador, de modo que seria impossível descrevê-lo. ”

Então Olavinho-fecha-os-olhos levantou Hjalmar até a janela. “Agora você pode ver meu irmão, o outro Olavinho-fecha-os-olhos; ele também é chamado de morte. Você percebe que ele não é tão ruim quanto eles o representam nos livros de figuras; lá está um esqueleto, mas agora seu casaco é bordado em prata e ele veste o esplêndido uniforme de um hussardo, e um manto de veludo preto voa atrás dele, sobre o cavalo. Veja como ele galopa.” Hjalmar viu que, enquanto este Olavinho-fecha-os-olhos seguia em frente, ele levantou velhos e jovens e os levou com seu cavalo. Alguns ele sentou na frente dele, outros atrás, mas sempre perguntou primeiro: "Como está o livro das marcas?"

"Bom", todos responderam.

"Sim, mas deixe-me ver por mim mesmo", respondeu ele; e eles foram obrigados a dar-lhe os livros. Então todos aqueles que tinham “Muito bom” ou “Extremamente bom” vieram na frente do cavalo e ouviram a bela história; enquanto aqueles que tinham "miserável", ou "razoavelmente bom", em seus livros, eram obrigados a sentar e ouvir a história assustadora. Eles tremiam e choravam, e queriam pular do cavalo, mas não podiam se libertar, pois pareciam presos ao assento.

"Ora, a morte é um Olavinho-fecha-os-olhos mais esplêndido", disse Hjalmar. "Eu não tenho o menor medo dele."

"Você não precisa ter medo dele", disse Olavinho-fecha-os-olhos, "se tomar cuidado e manter um bom livro de conduta".

"Agora eu chamo isso de muito instrutivo", murmurou o retrato do bisavô. “Às vezes, é útil expressar uma opinião;” ele ficou bastante satisfeito.

Estes são alguns dos feitos e ditados de Olavinho-fecha-os-olhos. Espero que ele possa visitá-lo pessoalmente esta noite e relatar um pouco mais.

Fonte> Hans Christian Andersen. Contos. Publicado originalmente em 11 de novembro de 1843. Disponível em Domínio Público