quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Epigramas e Trovas

De Corrêa de Almeida a Millôr Fernandes


Epigrama: poesia breve, satírica; dito mordaz e picante.

Trova: composição lírica ligeira e mais ou menos popular; quadra popular.


Corrêa de Almeida:
Dedicatória

— É esta a cara cediça
do tal Corrêa de Almeida:
é padre que não diz missa,
poeta — sem ter Eneida...

(Em retrato oferecido a um amigo)

Laurindo Ribeiro:
Para mostrar que é mui sábio
E filho de boa gente,
E dos passados ministros,
Ser em tudo diferente,
Sua excelência da Guerra
Em tudo que der à luz,
Em vez de assinar o nome
Pretende assinar em cruz.

(visava ao ministro da Guerra, Cel. Manuel Felizário de Sousa e Melo)

***
Cabeça, triste é dizê-lo!
Cabeça, que desconsolo!
Por fora não tem cabelo,
Por dentro não tem miolo!

Martim Francisco:
Ó caso feio! Ó caso extraordinário!
Caso que me entrou fundo na lembrança!
Tem o vigário a cara da criança,
Tem a criança a cara do vigário!

***
O Moura-Bule é ilustrado,
Mas quase sempre se esquece
quando se usa de — s —
quando de c cedilhado

(visava ao deputado J.Ferreira de Moura, apelidado Moura-Bule pela atitude constante que assumia, de mãos nas cadeiras)

Belmiro Braga:
— Vi teus braços... que ventura!
teu colo... as pernas... que gosto!
Agora, tira a pintura,
Que eu quero ver o teu rosto.
***
— Na noite de núpcias. O Gama
encontra a esposa envolvida
num lindo roupão e exclama:
— Posso, enfim, ver-te vestida!
***
— Mui decentes eu não acho
teus vestidos minha prima:
são altos demais em baixo,
são baixos demais em cima!
***
— A beleza não te atrai?
Só te casas por dinheiro?
Tu pensas como teu pai,
Que morreu velho e... solteiro.

Roberto Correia:
Se espichas (vou ser-te franco)
os teus cabelos, ó João,
tu pretendes é ser branco,
ao menos em comissão...
***
Político e sempre graúdo,
De moço a quase senil,
Do Brasil tem tido tudo!
Nada tem dado ao Brasil...

Antônio Sales:

— Passa na estrada um camelo
e um corcunda palpitante
de alegria, disse ao vê-lo:
— "Mas que animal elegante!"
***
Um demagogo exemplar,
Com uma violência louca,
Levou a vida a clamar,
E só deixou de gritar,
Quando lhe encheram a boca!

Victor Caruso:
A um matemático

Jaz aqui um matemático.
Se dele queres saber
Pede à historia que to diga:
Sendo do cálculo amador fanático
Teve para morrer um meio prático
E resolveu morrer
De cálculos na bexiga...

Bocage:
A Moléstia e a Cura

Aqui jaz um homem rico
nesta rica sepultura;
escapava da moléstia,
se não morresse da cura.

Pe. Celso de Carvalho:

Natural que os noivos digam:
"Nosso ninho..." É bom sonhar!
Mas as aves, quando brigam,
xingam seus ninhos... de lar!
***
Se toda ilusão frustrada
se tornasse assombração,
que casa mal assombrada
não seria o coração!
***
Vá que se louve a formiga,
e à cigarra se condene...
Mas, quem teceu essa intriga
foi a cigarra — La Fontaine!

Vão Gogo (Millôr Fernandes):

Quando a garota morena
mergulha assim tão segura,
não sei por que lembro a frase
"água fria na fervura".
***
Namorar, minha menina,
é andar de caminhão:
a gente só passa à frente
se andar na contra-mão.
***

Epitáfio

Aqui jaz minha mulher
que partiu para o Além.
Agora descansa em paz
e eu também.

Fonte:
Textos extraídos de
"Antologia de Humorismo e Sátira", Editora Civilização Brasileira - Rio de Janeiro,1957 (seleção de R. Magalhães Júnior), e "Humor e Humorismo - Poesias e versos", Editora Brasiliense - São Paulo, 1961,(seleção de Idel Becker). Disponível em http://www.releituras.com/

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