quarta-feira, 14 de maio de 2008

Lenda Indígena (A Chefe Naruna: A Rebelião das Mulheres)

Naruna foi eleita governante de sua tribo por ser a mais bonita.

Governava seu povo com a altivez de uma rainha, quando chegaram à aldeia uns estrangeiros de uma tribo dispersa, da qual Jurupari era o chefe.

Naruna, apesar de sua rara beleza, ainda estava solteira, não por opção, mas porque seu coração não havia palpitado mais forte por nenhum guerreiro de sua tribo.

Sendo assim, acolheu os estrangeiros e entre eles, encontrava-se Date, o mais lindo e forte dos estrangeiros que mexeu com suas entranhas de mulher. Escolheu-o então, para ser seu marido.

Date, que também tinha ficado sensibilizado com a beleza e inteligência de Naruna, aceitou-a como esposa.

Marcaram o casamento para a próxima lua. Date temia desgostar à Jurupari, mas estava perdidamente apaixonado por Naruna. Jurupari soube o que se passava pela Mãe do Sono (seu próprio sono). Então partiu com pressa para a aldeia de Naruna, mas só chegou lá no dia do casamento.

Quando começou a entrega dos presentes, Naruna ficou admirada e ao mesmo tempo fascinada com a imponente presença de Jurupari. Como ainda não estava casada com Date, num impulso pediu-o em casamento. Jurupari recusou e se ofendeu. Naruna, cheia de ódio, mandou que seus guerreiros castigassem Jurupari. Naruna, seus guerreiros e todos os índios adormeceram, ficando como que petrificados com o poder de Jurupari.

Jurupari dirige-se a Date e diz:

-"Toma esta puçanga, governa este povo e submete-o às nossas leis. Quando Naruna acordar não se lembrará que foi chefe." A seguir desaparece na floresta.

Date colocou a puçanga, ordenou a Naruna que acordasse e fosse banhar-se no rio.

Naruna sentiu que havia perdido tudo, mas principalmente o poder de governar e então meteu-se em uma talha de cachiri e acabar de vez com seu sofrimento.

À hora da refeição, Date procurou em vão por Naruna. Colocou a puçanga no nariz e chamou-a. A talha, como se tivesse pernas parou junto dele. Date quebrou a talha e encontrou o corpo de Naruna, morta pelos vapores da fermentação do cachiri. Date enterrou-a e todas as noites ia chorar sobre sua sepultura.

Um dia, encontraram-no morto e ali mesmo foi enterrado junto a Naruna. A tribo pintou-se de urucum e maldisse Jurupari!

Na lenda, estamos diante de uma ginecocracia, isto é, um governo de uma mulher, no nosso caso, Naruna. Portanto, é possível afirmar, que já houve épocas, na Amazônia, que imperava o matriarcado, mas que esse direito foi perdido, com o aparecimento de Jurupari, o "Filho do Sol", que instituiu novas leis sociais. Todas as mulheres então, passaram a uma condição de inferioridade.

Não satisfeitas com a nova condição e tendo em vista à forte repressão masculina, muitas fugiram e outras, como é o caso de Naruna, que não conseguiu retomar o poder, preferiu matar-se.

Date, na lenda, é considerado um dos "Filhos do Sol", ou seja, pertencia a uma comunidade de homens, que respeitavam as duras leis de Jurupari.

O Jurupari, foi o responsável pela instituição secreta "Casa dos Homens", que nada mais é do que um divisor de águas entre homens e mulheres, ou seja, servia para impor o caráter patriarcal no seio das tribos.

SITUAÇÃO DAS MULHERES ENTRE OS KAIAPÓS

As mulheres indígenas também são feministas, conhecem seu valor e sabem se impor diante de seus maridos e companheiros.

Na nossa sociedade indígena, em quase todas as tribos conhecidas, há igualdade entre os sexos. As restrições a certos tipos de afazeres possuem raízes mitológicas e não preconceito em relação ao sexo.

Entre os Kaiapós, do grupo Jê, as meninas chegam a puberdade por volta dos onze anos e já recebem instruções de suas mães para a utilização da planta conhecida como "mehrã-kendiô" (gente não deixa gerar), um anticoncepcional natural, com a qual fazem chás que as esterilizam por mais de um ano.

Também fazem uso de pinturas e "arapê kamrik" (bandoleira de fios de algodão na cor vermelha), para mostrar que já estão na idade de iniciar-se sexualmente. Depois elas passeiam pela tribo e arredores, para serem perseguidas pelos homens solteiros e serem desvirginadas. Quando a situação é concretizada, elas relatam aos seus pais e o acontecimento é comemorado.

Daí em diante, passam a ser consideradas adultas e vão pertencer à categoria "mekraytuk", mulheres que possuem as coxas pintadas de preto, com direito a fazer amor com quem quiserem.

Os rapazes também passam por uma situação semelhante e são agarrados pelas mulheres. Depois de serem desvirginados, passam a pertencer à categoria menõrõnu e devem usar proteção peniana. Quando as duas categorias se encontram, praticam relações sexuais livremente.

TIPOS DE CASAMENTO ENTRE KAIAPÓS

Já o casamento entre os Kaiapós são de dois tipos. No "me-prõ-printi" (o casamento prometido ou de virgens). A cerimônia é chamada de "abénmó djuuó ngo", que significa "gente, uns aos outros, pão dá". Nela é realizada uma grande festa, onde são servidos beijus com castanha do pará. Durante a festa o casal recolhe-se a uma choça reservada aos nubentes, onde acontece o defloramento. Em seguida, o jovem marido deverá exibir seu pênis sujo de sangue ao Conselho dos Velhos. Caso não haja sangue, fica comprovado que o casal teria tido relações antes do casamento.

O outro tipo de casamento é o que ocorre entre aqueles que já foram iniciados sexualmente. É organizada também uma grande festa para os jovens casadouros formam semi-círculos em frente um do outro, e uma pajé manda uma moça escolher seu marido. Ela aponta o rapaz que mais lhe agradar e, esse não poderá recusar, pois caso contrário, será ridicularizado por seus companheiros. Nesse tipo de casamento não há pacto de fidelidade conjugal até que resolvam consolidar a relação com um filho.

As índias Yanomami casam-se após a segunda menstruação, o que ocorre com a idade de onze à treze anos. Com doze anos, muitas delas já têm filhos. As mulheres também participam das guerras, com medo de servirem de troféus para os vencedores.

A infidelidade feminina, muito constante nessa tribo, é perdoada em troca de uma punição: o irmão aplica uma surra nos amantes. Essa punição redime o adultério e a sociedade não condena mais a mulher.

Também o homem que gosta de se ausentar da tribo e sua mulher não fica contente com a situação, corre o risco de quando voltar já encontrar outro em seu lugar. E a mulher é sempre considerada herdeira inconteste e jamais perde a guarda de seus filhos.

RITUAL DAS AMAZONAS (MEBIÔK)

Apesar de toda essa liberdade feminina os Kaiapós, realizam uma vez ao ano o Mebiôk, o Ritual das Amazonas.

Durante sete dias, ou o período de uma lua, as mulheres se tornam donas da aldeia e instalam-se na "ngobe", ou seja, na Casa dos Homens, proibida às mulheres. Cabe aos homens realizar as tarefas femininas, preparando os alimentos e cuidando dos filhos. À noite, eles são chamados para atender as necessidades das mulheres e provarem que são viris. É como se a época do matriarcado retornasse. Na última noite, no encontro na "ngobe" completamente às escuras, sem mostrar quem realmente são, fazem sexo até o pajé anunciar a aurora. Elas vão tomar banho e depois voltam às suas casas e a sua vida normal.

Através desse ritual, as mulheres relembram a seus maridos de que, se não as tratarem bem, elas podem se rebelar, como já fizeram suas antigas ancestrais, as amazonas.

As lendas das Amazonas não estão presentes apenas na cultura Kaiapó. Enquanto os homens xinguanos (Kamayurá, Ywalapiti, Mehinaku ou Waurá) realizam rituais como Karytu, Yawari ou Kuarup, no qual, além da mensagem mítica, pretendem reafirmar seu poder na sociedade, valorizando a beleza, a força e o vigor dos homens, as mulheres, em oposição, celebram o Yamarikumã, o ritual das Amazonas.

Esse ritual representa a rebelião coletiva contra o desprezo e a humilhação de permanecerem como simples espectadoras, assistindo às demonstrações que consideram machistas. Reagindo, elas fazem o "moitará" (o comércio de troca intertribal), batem nos maridos, apropriam-se dos seus artesanatos e das flautas sagradas, cantam, dançam e lutam "huka-huka" e promovem uma festa tão grande quanto a masculina. Essa é a forma de demonstrarem que a qualquer momento podem repetir o episódio das amazonas guerreiras e viver isoladamente.

Fonte:
http://www.rosanevolpatto.trd.br/lendanaruna.htm

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