ANOS 1970
Seguindo informações de alguns historiadores ou cronistas da Literatura Brasileira, 1975 é o marco de uma nova era. No Ceará, entretanto, e em outros Estados talvez, esse marco não é bem nítido, eis que bem antes daquele ano se publicaram importantes livros de contos de escritores cearenses, como Mundinha Panchico, de Juarez Barroso, em 1969; A Morte Trágica de Alain Delon, de Francisco Sobreira, em 1972; Os Olhos do Lixo, de Socorro Trindad, no mesmo ano, com prefácio de Câmara Cascudo; Pluralia Tantum, de Gilmar de Carvalho, em 1973. Sem falar nos romances e conjuntos de poemas.
No Ceará alguns observadores já vinham apontando a existência de uma espécie de paralisia na literatura. Eusélio Oliveira, ao escrever sobre o primeiro livro de Francisco Sobreira, dizia: “A Morte Trágica de Alain Delon, antes de ser mais um livro de contos, é uma prova inequívoca de desafio contra o relaxamento improdutivo do movimento literário cearense”. João Antônio, nas dobras do livro Joaquinho Gato, de Juarez Barroso, afirma: “a publicação de alguns novos autores” (...) “motivou a palavra boom como designativo de um movimento literário vindo de publicações levadas a público a partir de 1975”.
A revista O Saco começou a nascer em 1975 e foi em volta dela que, no Ceará, os novos contistas se tornaram mais ou menos conhecidos no resto do Brasil, iniciando-se um período de edição de seus livros no Rio de Janeiro e em São Paulo e de contos esparsos em jornais e revistas de todo o país. Alexandre Barbalho escreveu o mais importante estudo daquele período, no Ceará, dando ênfase àquela publicação, no livro Cultura e Imprensa Alternativa. Um dos capítulos (pág. 35) assim se inicia: “Para perceber o boom da imprensa alternativa dos anos 70 é necessário saber que a eclosão editorial e a proliferação de publicações, nas mais variadas formas, ocorreram por todo o país”. Entretanto, bem antes de O Saco alguns escritores novos já divulgavam suas narrativas em jornais, revistas e antologias. Outros publicaram seus primeiros livros de histórias curtas, como se observou no início deste capítulo. Sendo assim, aquela revista significou a conseqüência de uma agitação iniciada individualmente e não ainda como grupo.
Em 1976 Glauco Mattoso e Nilto Maciel organizaram uma antologia de contos dos novos escritores brasileiros, intitulada Queda de Braço – Uma Antologia do Conto Marginal, publicada no ano seguinte. Do Ceará participaram A. Rosemberg (que em seguida adotou o nome Rosemberg Cariry), Airton Monte, Carlos Emílio Corrêa Lima, Edvar Costa, Francisco Sobreira, Jackson Sampaio, João Bosco Sobreira Bezerra, Nilto Maciel, Paulo Véras e Victor Cintra, quase todos inéditos em livro naquele ano.
A seguir viria o Grupo Siriará de Literatura, que continuaria, de certa forma, o trabalho desenvolvido pelo pessoal de O Saco, aglutinando os escritores cearenses em torno de um programa e de uma revista. Consoante a opinião de Dimas Macedo, em “Literatura e Escritores Cearenses” (CI, págs. 145/158), o Siriará, “que eclodiu no final da década de setenta, além de um manifesto e de uma revista que morreu com o primeiro número, não deixou a meu juízo uma contribuição significativa, enquanto movimento de renovação estética e literária”. E mais adiante: “Mas é indiscutível também que do Siriará provêm alguns dos melhores escritores cearenses da década de 1980, com raízes num período bem anterior, que remonta à criação da revista O Saco”.
Noticia F. S. Nascimento, no livro Augusto dos Anjos: “Com o advento da revista cultural O Saco em abril de 1976, reconhecidamente o mais audacioso projeto editorial da época no Ceará, a jovem intelectualidade da terra ganhava o espaço gráfico reclamado para o exercício de sua criatividade, fazendo literatura e desenvolvendo suas aptidões artísticas. Comandado por Manoel Raposo, Jackson Sampaio, Carlos Emílio Corrêa Lima e Nilto Maciel, o empreendimento tornou-se responsável pela afirmação de poetas, ficcionistas e ensaístas hoje com acesso aos suplementos literários e demais publicações de âmbito nacional, o que autoriza dizer que O Saco fez em sua meteórica existência o que outros órgãos do gênero não têm conseguido realizar em dezenas de anos”.
Adriano Spínola, em “A Nova Ficção Cearense”, afirma: “Numa terra tradicionalmente de poetas – talvez por ser o modo mais fácil de se destacar culturalmente, num meio de poucas oportunidades, ou porque o Ceará seja mesmo um manancial de talentos poéticos, quem sabe – a ficção narrativa tem merecido pouca atenção/dedicação por quantos militam na literatura. Da velha geração, há o exemplo raro de fidelidade ao conto, acompanhado de um constante aprimoramento, por parte do Sr. Moreira Campos, mestre inconteste no gênero, reconhecido nacionalmente; o Sr. Fran Martins, novelista de primeira, ao que parece contentou-se com o seu Dois de Ouro, um trabalho notável, nada nos dando, porém, posteriormente, que se lhe igualasse em peso; o Sr. Jáder de Carvalho, há muito preferiu ser poeta lírico, com qualidades; e há o Sr. Eduardo Campos, que, tendo-se realizado mais plenamente na área dramática, com algumas peças de merecido sucesso nacional, abandonou, ao que tudo indica, a novelística; Juarez Barroso, não fora a morte prematura, bem que nos poderia ter dado uma ficção que se ligasse à força de uma D.Guidinha do Poço, por exemplo. Vivência não lhe faltava, nem talento. Mas não o fez”.
No mesmo artigo Adriano anotou: “Na nova geração, o interesse pela narrativa literária ganha poucos adeptos. Tomando como base o Grupo Siriará, formado em 79, dos seus 24 membros, apenas 4 a 5 se empenharam na criação de personagens e enredos. O resto, tome poesia! Era, na verdade, muito mais um grupo de poetas, todos ansiosos em revelarem suas produções nascentes e serem os primeiros bardos anunciadores de um novo tempo, que se avizinhava, ao cair do obscurantismo político-cultural, que sentíamos ainda grudado nos dedos”.
Para concluir, Spínola observou: “Se poucos foram os que se ligaram à prosa ficcional, em compensação o fizeram com uma garra e uma categoria superlativa. Como é o caso de Airton Monte, Nilto Maciel, Paulo Véras e Carlos Emílio”.
Durante os anos 1970 diversos foram os livros de contos de novos escritores cearenses editados em Fortaleza, bem como em outras capitais. O primeiro deles, em 1972, foi A Morte Trágica de Alain Delon, de Francisco Sobreira. No mesmo ano se publicaram mais três coleções: Exercício Para o Salto, de Cláudio Aguiar; Os Olhos do Lixo, de Socorro Trindad; e A Coleira de Peggy, de Holdemar Menezes, com uma peculiaridade: o primeiro e o terceiro fora do Ceará e o segundo no Ceará, porém de escritora nascida em outro Estado. Em 1973 apareceu um dos mais importantes e singulares livros de ficção curta do Ceará: Pluralia Tantum, de Gilmar de Carvalho. Em 1974 Nilto Maciel estreou com Itinerário. Em São Paulo no ano de 1975 veio a lume O Casarão, de Caio Porfírio Carneiro, que havia estreado ainda em 1961 e, portanto, não se enquadra no rol dos novos contistas. O mesmo se pode dizer de Juarez Barroso, com seu Joaquinho Gato, de 1976. Desse ano é O Menino D’água, de Fernanda Teixeira Gurgel do Amaral. No ano seguinte saíram Depoimento de um Sábio, de Cláudio Aguiar, Milagre na Salina (catalogado como romance), de Mario Pontes, e Coisas & Bichos, de José Hélder de Souza, todos então radicados fora do Ceará. No mesmo ano se publicou Tocaia, de Yehudi Bezerra. Os mais velhos continuaram editando narrativas curtas, como Moreira Campos, que em 1978 apresentou ao público Os Doze Parafusos. Naquele ano estrearam duas contistas: Socorro Trindad, com Cada Cabeça uma Sentença, e Glória Martins, com Reencontro. 1979 pode ser visto como um ano fértil em livros de contos no Ceará. Francisco Sobreira editou seu segundo volume, A Noite Mágica, e aconteceu a estréia de quatro contistas: Gerardo Mello Mourão, com Piero Della Francesca ou As Vizinhas Chilenas; Geraldo Markan, com O Mundo Refletido nas Armas Brilhantes do Guerreiro; Airton Monte, com O Grande Pânico; e Paulo Véras, com O Cabeça-de-Cuia.
Alguns contistas surgidos naquele período só viriam a publicar livro de contos muito depois, como é o caso de Carlos Emílio Corrêa Lima, Joyce Cavalcante, Audifax Rios, Batista de Lima, Barros Pinho, Rosemberg Cariry e Marly Vasconcelos. Dois faleceram ainda jovens: Paulo Véras e Yehudi Bezerra. Outros desapareceram do cenário das letras impressas. Poucos se mantiveram ativos no gênero conto.
Os contistas surgidos por volta de 1970 podem ser agrupados em três segmentos: o dos que viviam fora do Ceará, o dos que viviam no Ceará e publicaram seus primeiros livros de histórias curtas a partir de 1970 e o dos que só viriam a editar coleções de narrativas após 1980, embora já as escrevessem e até as publicassem em jornais, revistas e antologias. Do primeiro segmento fazem parte Francisco Sobreira, Cláudio Aguiar, Holdemar Menezes, Mario Pontes, José Hélder de Souza, Gerardo Mello Mourão e Moacir C. Lopes. Integram o segundo grupo Socorro Trindad, Gilmar de Carvalho, Nilto Maciel, Fernanda Teixeira Gurgel do Amaral, Yehudi Bezerra, Glória Martins, Geraldo Markan, Airton Monte e Paulo Véras. O último segmento é composto de Nilze Costa e Silva, Fernando Câncio, Carlos Emílio Corrêa Lima, Rosemberg Cariry, Joyce Cavalcante, Audifax Rios, Barros Pinho e Batista de Lima.
Um dos que se dedicaram quase que exclusivamente à peça ficional curta é Francisco Sobreira. Sua obra tem sido objeto de inúmeros estudos. Já publicou oito livros de peças curtas. Nas dobras do primeiro volume, Eusélio Oliveira anotou: “Francisco Sobreira consegue dominar com segurança logística o código de intercâmbio vivencial latente em cada constelação ficcional de seus contos”. Ao publicar A Morte Trágica de Alain Delon, Francisco Sobreira não chegou a ultrapassar as limitadas fronteiras da província cearense, permanecendo, por assim dizer, no ineditismo. Seu segundo livro, A Noite Mágica, nada tem de revolucionário, de vanguardista, de inovador. Muito pelo contrário, é tecnicamente conservador, tal como a obra de José Lins do Rego que, por esta mesma razão, adquiriu renome dentro do romance regionalista brasileiro.
Francisco Sobreira não faz nenhuma alquimia de estilo, não cria nenhuma nova linguagem. No entanto, esta aparente acomodação do contista não indica seja ele um simples contador de histórias.
Sendo conservador na forma, o livro de Sobreira segue a trilha da prosa de ficção de pós-1964. Perpassa por quase todos os contos um vento forte de paranóia, caudaloso na literatura urbana brasileira dos últimos anos do século XX. Histórias de medo, terror, alucinação. Medo de ser preso, de perder o emprego, de morrer de fome, medo disso e daquilo. As pessoas se sentem caçadas como bichos, ameaçadas, perseguidas. Os amigos e os parentes são delatores ou espiões a serviço do Poder. A própria sombra de cada ser humano é um dedo-duro em potencial. Esse horror kafkiano é notório em “O Caçado”, “Enquanto o Diabo Esfrega o Olho”, “O Falso Álibi”, “O Caçador de Nostálgicos”, percebido até nos títulos. O narrador, sempre perseguido, sempre paranóico, torna-se perseguidor, delator, comparsa da polícia (representação do direito de perseguir), como em “A Voz do Vizinho”.
O absurdo é, assim, o ingrediente principal da iguaria narrada. Às vezes um absurdo que, de tão cotidiano, perde o sabor de coisa literária. Em “A Lâmina”, por exemplo. Porque ninguém é mais dono de nada. Outras vezes, o absurdo apresenta-se como se o personagem fosse apenas um deficiente mental, incapaz de perceber a vida e a morte ao seu redor, manejado por tentáculos tão torturantes quanto os fantasmas dos pesadelos. A realidade narrada aproxima-se, então, do sonho. Os protagonistas e os espectadores são meros joguetes nas malhas de seres todo-poderosos que inventam a vida ou o fato. Por isto, em alguns contos a presença do elemento onírico é perfeitamente perceptível ou mesmo preponderante. Os atos e as imagens se sucedem de forma incoerente, deixando o personagem simplesmente perplexo, espantado diante da estranha realidade de que tenta desesperadamente fugir. Assim, reduz à condição de ficção, de brincadeira de mau gosto, de encenação, quando muito de logro, a peça que lhe pregam. Não acredita ser possível tão absurda realidade. Por fim se convence e tenta fugir. Porém já é tarde demais. “A Pedra” é belíssima obra e tem dimensão diferente dos demais. No entanto, o mesmo clima de perseguição, de repressão, na pessoa de um pobre sertanejo virado pagador de promessas.
No artigo “Fitas”, estampado no Jornal do Brasil, Antônio M. Nunes se refere ao uso e abuso do “insólito dos acontecimentos para instaurar uma outra realidade que, devido a sua linguagem e estrutura, aproxima-se do thriller cinematográfico”.
Ao comentar Um Dia... Os Mesmos Dias, Jorge de Sá, em “Como Se Fosse Uma Objetiva”, enuncia: “o contista se afasta do “fantástico” e se aproxima de uma realidade própria dos documentários”.
Na apresentação de O Tempo Está Dentro de Nós, Jaime Hipólito Dantas chama a atenção do leitor para a “prosa trabalhada, aqui e ali um pouco dramática, é certo, mas sempre sem qualquer obscuridade ou afetação”.
Wilson Martins se manifestou assim: “Os contos reunidos em Clarita são de qualidade desigual, muitos deles (a começar pelo que dá título ao livro, e é o melhor) tomando a invenção arbitrária, ou seja, inverossímil, por imaginação criadora”.
Em “Sobreira: aderindo à vigorosidade da vida” (Jornal O Norte, João Pessoa, PB, 3/8/97), ao comentar Grandes Amizades, Hildeberto Barbosa Filho observa que os personagens e as situações, “mesmo as mais cotidianas, adquirem certa nuance enigmática que, a seu turno, termina por envolver os seus contos numa atmosfera de suspense e de estranhamento”.
Nas dobras de Crônica do Amor e do Ódio, Nelson Patriota comenta: “Com personagens despojados de grandes projetos existenciais, uma vez que estes aconteceram, e se mostraram falhos, no passado, Sobreira vai construindo uma obra fiel ao seu tempo”.
A obra literária de Cláudio Aguiar está exaustivamente analisada por diversos críticos, brasileiros e estrangeiros, em artigos e ensaios reunidos no livro Viento del Nordeste, com o subtítulo Homenaje Internacional al Escritor Brasileño Cláudio Aguiar, em espanhol, da Universidad Pontificia de Salamanca, 1995. Num dos ensaios, “El Descubrimiento en Caldeirão”, César Real Ramos, Professor de Literatura Espanhola da referida Universidade, faz a gênese do Caldeirão e vê no primeiro livro de histórias curtas de Cláudio os primeiros pingos d’água que iriam gerar o grande rio do romance: “En Exercício, además, a través de continuos cambios de focalizacion y de voz narrativa, poco a poco nos vamos adentrando en el interior de los personajes, en las almas, en las conciencias”.
Holdemar Menezes não deixou vasta obra no gênero conto. No dizer de Assis Brasil, “podemos sentir a mão do ficcionista, numa linguagem forte, contundente, participante, onde já se abrigavam Dalton Trevisan e Rubem Fonseca”. Em “Repressão, Revolta e Engajamento”, capítulo do livro Itinerário do Conto, Hélio Pólvora o filia “à linha ficcional de Albert Camus e pensadores assemelhados”. E sintetiza: “Na ficção brasileira deste último meio século, Holdemar Menezes é o narrador consciente dos pequenos dramas provocados pela tragédia essencial do ser e pela tragédia da repressão político-social que o violenta, emudece e constrange”.
Embora venha escrevendo desde muito antes de 1970, Mario Pontes tem publicado pouco. Em 1999 deu a lume Andante com Morte, composto de quatro histórias longas. Ivo Barroso, nas dobras, relembra o primeiro livro, Milagre na Salina, como “Uma série de narrativas que se interpenetram, que se recosem para formar um painel picasseano de linhas simples e dramáticas, onde não falta igualmente o colorido vivo da ironia e do humor”. Ao se referir ao segundo livro, o chama de reunião de quatro novelas. E sintetiza: “Uma delas, ‘A Morte Infinita’, anteriormente batizada com o mesmo título do livro Andante com Morte, impressionou tanto a Didier Lamaison, o tradutor francês de Carlos Drummond de Andrade, que logo se propôs a transladá-la para sua língua, numa permanente reescrita, com a mesma meticulosidade com que o autor trabalhara seu texto. É uma novela de andamento cinematográfico em que a ação se prolonga num ralenti quase insuportável, longo como a aridez do areal em que ela se desenrola, para, de repente, adquirir uma dinâmica de duelo faroéstico, violentas imagens em zoom e primeiros planos cortantes e minuciosos como o grande close da boca de um revólver no momento do disparo”. De 2003 é Um Homem Chamado Noel, cuja estrutura narrativa é semelhante à de Milagre na Salina (1977). Ambos podem ser lidos como coletâneas de contos ou como novelas.
Outro que vive fora do Ceará há tempos é José Hélder de Souza. Seu primeiro livro, Coisas & Bichos (1977), mereceu estudo de Clovis Sena, na introdução intitulada “Caçadas Humanas & Bala de Prata”, onde argumenta: “Aqui o principal não está propriamente na linguagem elaborada, opção literária bonita, sem ser bem o caso. Neste conjunto de contos de José Hélder a beleza se acha na narrativa mesma”. No terceiro parágrafo, observa Sena: “Com um poder narrativo ora lírico, ora dramático, por vezes humorado, o Autor nos coloca em face da situação da caçada: perseguido-perseguidor”.
Em “Um Contador de Causos” (CI, págs. 26/28), Dimas Macedo destaca “a sua fidelidade à linguagem popular, ao lado do seu estilo e do seu jeito de dizer muito peculiar, porque individualíssima a sua escritura literária. Histórias, enredos bem arquitetados ao gosto do leitor, fala e linguajar matutos que penetram bem fundo o coração, sentando tendas na alma, cravejando punhais de beleza nos olhos, invadindo a imaginação do leitor até a sedução total do espírito”.
No prefácio ao terceiro livro de Hélder, Pequenas Histórias Matutas, observou Dimas Macedo: “Sendo poeta de fino amanho com o convívio das musas, sabe ser também o imenso ficcionista que é: um contista consciente do valor do universo que pretende explorar, que quer denunciar para melhor se fazer compreender, pelo gosto mesmo de esculpir a expressão, a matéria-prima de sua bela escritura artesanal”. Em outro parágrafo anotou: “Sem desmerecimento para nenhum dos seus livros, penso que em Rio dos Ventos (1992) reside o valimento maior da sua trajetória de escritor, especialmente a sua trajetória de contista” (...).
Embora nascido em 1917 (Moreira Campos é de 1914), Gerardo Mello Mourão se inclui neste capítulo em razão do ano da publicação de seu primeiro livro de contos, 1979. É tido como um dos nomes fundamentais da poesia brasileira e reside há vários anos no Rio de Janeiro. Nas orelhas de Piero Della Francesca ou As Vizinhas Chilenas o editor escreveu: “O autor nos deixa aqui, às vezes, diante da parábola pura, diante do conto, a história inventada e contada, em que as coisas, as pessoas e os lugares saltam vivos da inventada fantasia. Nesses contos, de resto, escritos quase todos em dias de exílio ou de peregrinação por outros países da América, há muitos nomes de pessoas reais. Talvez os fatos em que elas se envolvem nem sempre sejam mera coincidência. O próprio autor, porém, faz questão de deixar claro que ele mesmo não sabe se Abigail Gonçalves se suicidou ou se Miguel Eyquem continua a carregar Helena Vial na garupa de sua motocicleta. Mas tanto no relato épico do Coronel paraguaio, como na aventura lawrenciana de Rosa Maria Bandera, é difícil distinguir entre a fantasia e a realidade, até porque a fantasia e a realidade são uma única e mesma coisa”.
Moacir C. Lopes não costuma ser mencionado em livros de história e crítica literária cearenses. Também de geração muito anterior à daqueles que estrearam nos anos 1970, organizou e editou a Antologia de Contistas Novos em 1971. Apesar disso, seu primeiro livro é O Navio Morto e Outras Tentações do Mar, de 1995. As nove composições reunidas no volume se centram em temas do mar. Nas abas do volume anotou o editor: “Histórias em que, além de jogos de estilo originais, o autor exercita um animismo muito particular – erotizado – da natureza, que se torna algo maligno, cruel, obsceno, em “Do Corpo de Marisa Brotarão Orquídeas”, ou selvagem e exótico, poético e surpreendente em “O Mar Devolverá o Corpo de Clarissa”, principalmente quando os humanos são tomados pelos espíritos marinhos”.
***********
Estrearam com livro de contos nos anos 1970 Socorro Trindad, Gilmar de Carvalho, Nilto Maciel, Fernanda Teixeira Gurgel do Amaral, Yehudi Bezerra, Glória Martins, Geraldo Markan, Airton Monte e Paulo Véras.
Salvo engano, Socorro Trindad publicou somente duas coleções. Após o livro de estréia, editou Cada Cabeça uma Sentença, em 1978, com prefácio de Aguinaldo Silva, intitulado “A Árdua Batalha Contra os Papangoos”. São dele estas palavras: “Enquanto invenção, este livro, a nosso ver, situa-se solitariamente dentro do que se convencionou chamar de “o novo conto brasileiro”. Esta solidão é pelo fato de que a autora não se prende à linha que começa com Dalton Trevisan e que vai até a assimilação da influência dos modernos latino-americanos”.
“O Massacre no Mangue” é uma crônica atualíssima de sabor página policial, até mesmo estilisticamente, e também à maneira do romance gótico. Socorro Trindad tem duas virtudes essenciais: o poder de misturar o joio e o trigo e uma esplêndida cultura literária. Leia-se “Bodas de Ouro”, história de trancoso tão extraordinária como as do arco-da-velha.
Entre os que acreditaram ter concluído sua obra de contista está Gilmar de Carvalho. No entanto, pela singularidade de suas narrativas, não pode ser comparado a nenhum prosador de ficção do Ceará. Não somente porque seus contos são fundados na erudição, seja no latim, no inglês, na História, na Filosofia, na mitologia, na Bíblia etc. Também porque ora escreve como poeta, ora como salmista, ora como ninguém. Juarez Barroso, nas dobras de Pluralia Tantum, diz que a literatura de Gilmar é “uma afirmação de liberdade. Mas ele não fica junto à turma do sereno, ao bloco da contracultura. Formalmente, rejeita o marginalismo artístico, os vanguardismos escandalizantes. Seu estilo é clássico, sua narração, fabular, levemente borgiana. A partir daí ele constrói, ou destrói, ri dos deuses, mais perto de Lúcifer que do Arcanjo São Miguel (afinal de contas, uma figura do establishment), simpatizante dos exus, louvador da pomba-gira, Vênus mestiça e mais sensual, naturalmente”. A seguir se nega chamar de contos os textos de Gilmar. Na verdade, não são contos tradicionais. Em comum com estes apenas o terem títulos, alguns personagens, alguma narração. O resto é bem diferente. Afirma Juarez: “Gilmar não escreve contos. O conto, por mais de vanguarda que seja, tem a sua disciplina, sua forma de discurso. Gilmar é um compositor de cantos em prosa, discípulo remoto do Rei Salomão, que tanto trabalho deu ao Senhor com sua rebeldia e sua mania de amor. Amante da vestal romana, consagrada em virgindade ao deus maior, Gilmar, libertário e libertador sofre agora o mesmo castigo de Prometeu. Zeus acorrentou-o ao relógio da Praça do Ferreira, à Coluna da Hora. Que, aliás, não existe mais”.
Na apresentação do citado livro, em forma de carta, Mario Pontes confessa: “Na minha humilde fantasia, seu texto me dá a impressão de ter sido escrito por uma criatura semelhante àquela divindade indiana de muitas mãos. Como cada mão escreve algo diferente da outra, o meu comodismo quer me obrigar a ver no produto final apenas uma colagem arbitrária, um trabalho habilidoso de justaposições meramente formais. Mas mesmo um preguiçoso como eu acabo por suspeitar que, de fato, a “simples” colagem mascara um sem número de relações particulares e ricas. E entregando-me à suspeita, chego até ao espanto diante dessa prodigalidade de teses e antíteses, desse jogo calidoscópico de coincidências e contrastes, dessa facilidade de supressão de distâncias que me arrastam ao centro de um redemoinho de significados inacessíveis à minha miopia crítica”.
Ensina Dimas Macedo, em “A Ficção de Gilmar de Carvalho” (Leitura e Conjuntura, págs. 54/56): “sua concepção borgeana e, portanto, inusitada do apreender a concretude do universo ficcional, aliada a uma refinada capacidade de resgatar o insólito através de recursos estilísticos alegorizantes, tudo isso tem concorrido para emprestar à produção literária de Gilmar de Carvalho uma situação privilegiada entre o inventário dos seus contemporâneos de geração”.
Outro que, como Francisco Sobreira, tem se dedicado à elaboração de histórias curtas é Nilto Maciel, com sete volumes editados. Em “Os Contos de Nilto Maciel” (Novos Ensaios, págs. 106/110), Sânzio de Azevedo observou: (...) “de nada adiantaria ao escritor engendrar estórias bem urdidas, fundamentá-las com os alicerces dos mitos, se não pudesse dispor de um instrumento lingüístico adequado”.
F. S. Nascimento reuniu num só estudo, “A Ficção de Nilto Maciel”, (AAA, págs. 177/186), três ensaios estampados em jornais. Constata: “O avanço do contista ficou bem evidenciado, tanto na manipulação da linguagem, como no tratamento ficcional dado aos episódios reproduzidos”. José Alcides Pinto (PA-II, págs. 76/78) considera Tempos de Mula Preta “um dos livros de conto mais ousados que foram editados nesses últimos dez anos, não só em termos do Ceará, mas em todo o País, ao lado de outro grande livro, este de autor consagrado pela crítica e de nome firme na literatura — Os Doze Parafusos, do mestre Moreira Campos”.
Em “A Nova Ficção Cearense”, Adriano Spínola escreveu: “Inscreve-se ele no que de melhor temos no momento em matéria de contos no Brasil. Percebe-se no autor um tal domínio do ficcional, uma capacidade inventiva e transfigurante da linguagem, aliada a uma não menos capacidade de alteridade, versátil e verossímil, com relação aos personagens, que o colocam entre os mais avançados e promissores contistas da atualidade”.
No prefácio de Punhalzinho Cravado de Ódio, Dimas Macedo viu no contista um “mestre na arte de contar estórias inesperadamente fabulosas”. Tanussi Cardoso, em “A Impressão da Realidade em As Insolentes Patas do Cão, de Nilto Maciel”, observou: o contista “lima as gorduras do texto e, vigorosamente, trabalha com a palavra certa, no lugar certo e na hora certa”. E o inclui no “rol dos grandes escritores deste país”.
Em “As Insolentes Patas do Cão” (TC, págs. 21/24), Francisco Carvalho escreveu: “Nilto Maciel é atualmente, sem nenhum favor, um dos nomes mais representativos da moderna literatura brasileira”. E mais: “O leitor razoavelmente familiarizado com a disciplina literária não terá dificuldade em concluir que entre essas narrativas, todas elas de excelente extração, existem algumas obras-primas da moderna ficção brasileira”. Para ele, o contista “é um narrador admirável. Possui todas aquelas virtudes (talento, imaginação, invenção, técnica de narrar e de expor) que de modo algum podem faltar a um bom contador de histórias”.
Diz Carlos Augusto Viana, em “Nilto Maciel Reconstrói o Mundo a Partir da Linguagem” (DN, 1/3/1995): “Lançando o seu olhar agudo sobre o cotidiano, filtrando as ações humanas a partir do humor e da ironia, flagra o insólito, o inesperado, os momentos abissais da condição humana”.
Anotou Caio Porfírio Carneiro, em “A Unidade de Babel”: “Senhor de todos os segredos da arte de contar, caminhando, com segurança, pelo regional, o fantástico, o alegórico, o mágico, indo do fotográfico ao sombrio” (...). Astrid Cabral, em “Babel Contemporânea” (Literatura n.º 14), escreveu: “Aberto a múltiplas tendências, NM ora reverencia a tradição literária consagrada, ora se lança na experimentação lingüística e estrutural”.
Yehudi Bezerra não teve tempo de escrever mais. Deixou publicado apenas o livro Tocaia. Em carta-prefácio, Airton Monte escreveu: “Você, seu judeu safado, de rosto cheio de esquinas de ângulos, possui a rebeldia dos que viveram o que escrevem, não a piedade inútil, humilhante dos que sabem por ouvir dizer, dos que chegam no sertão e ficam olhando tudo, como se fosse tudo uma pintura imóvel no tempo e no espaço, com o olhar mais bobo que o de quem está num jardim zoológico espiando a bicharada fazer o que eles gostam de ver, não o que na verdade é”. E depois: “Tocaia surge de repente no universo das letras cearenses como um pé-de-vento, para arrebentar o mofo de uma literatura mumificada, quebradiça e facilmente digestiva. No seu livro as coisas são ditas com seus verdadeiros nomes, há a despreocupação das sofisticações temáticas, das frescuras estéticas que tanto deliciam o senso estético duvidoso das patotas divinas”.
Na categoria dos que escreveram ou publicaram pouco está Glória Martins. Teve o livro Reencontro prefaciado por Pedro Paulo Montenegro, para quem “a nota dominante (no livro) é a espontaneidade, espontaneidade tão grande que pode mesmo a alguns parecer, em determinados momentos, descuidos formais.” E conclui: “Duas grandes notas podemos detectar numa leitura de Reencontro: imaginação e capacidade de observação da parte da autora e, como mensagem mais profunda, aquela ânsia de libertação”. Composto de nove narrativas, o livro apresenta narração linear, ora na primeira, ora na terceira pessoa. A contista pouco se vale do diálogo, mais presente em “Se Eu Passo no Botequim Eu Fico”. Um ou outro monólogo interior, como em “Sim, Doutor”, história urbana, como a maioria, com uma pitada de humor. “Tia Bela” oscila entre o romantismo e o realismo, em ambiente de fazenda.
Embora Geraldo Markan tenha nascido em 1929, estreou no gênero conto somente em 1979, com O Mundo Refletido nas Armas Brilhantes do Guerreiro. Dias da Silva, no artigo de título igual ao do livro, integrante do volume III do livro Da Pena ao Vento (2001), enuncia: “De começo, devo dizer que não é tão simples determinar-se o gênero da obra. Livro de contos? Livro de crônicas? Momentos de puros devaneios da imaginação sensível? Textos fantásticos? De gênero maravilhoso? De gênero estranho?”
Raras vezes, um diálogo menos artificial ou uma narração de fatos. Até porque o outro está sempre indo embora, fugindo, escorregadio ou inacessível. E o narrador termina só, ruminando seu desespero. Isso se reflete no próprio corpo das narrativas. No final, Geraldo Markan faz poesia ou crônica leve, apesar de se dizer o nunca-poeta. Termina fazendo markanices, ele também personagem.
O Mundo Refletido nas Armas Brilhantes do Guerreiro é título poético e metafórico, porque, na verdade, o mundo refletido naquilo que simboliza o poder: à época de Alexandre e companhia, as armas brilhantes do guerreiro; hoje, o ouro, a moeda, o carro, a piscina – adereços e o próprio ser, a um só tempo. O mundo refletido no ouro do burguês.
Passeiam, pelas páginas quase sempre de uma delicadeza e uma pureza clássicas, personagens de voz amena, alguns falando inglês ou citando Baudelaire, Fernando Pessoa e o lírico Camões. Remoendo seus vazios, tateando os muros escuros de seus labirintos pegajosos. Vez por outra, um deslize imperdoável ante a poesia a minar de cada palavra. E surge quase uma historinha de fotonovela: “Ecidujerp, ou seja, Otiecnocerp”. Apesar disso, um ranço bom de naturalismo ainda inexplorado – a nostalgia do domínio holandês no Nordeste.
Embora a crítica esperasse uma avalanche de livros de Airton Monte, tal não se deu. No entanto, poderá ter as gavetas empanturradas de contos. Seja como for, é ele um dos mais importantes contistas cearenses surgidos depois de 1970. Os críticos lhe concederam os melhores louvores. Em “O Grande Pânico, de Airton Monte” (FM, págs. 197/200), Batista de Lima assim resume seu livro inaugural: “São 102 páginas contendo 15 histórias breves, densas e crispadas, retiradas dos pontos mais sombrios e marginais da sociedade. Transcrição de um mundo transeunte de suas retinas de vampiro da quase grande noturna Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção, do Farol do Mucuripe, dos hospícios e dos campos de futebol. A marginalização. A tragédia de uma sociedade obcecada pela vontade de viver. O medo, a loucura e a fome. Reinvenção dos mitos que essa gente cultiva”.
Seus personagens são seres humanos desesperados no amor impossível. Farrapos humanos que teimam em viver ou perdem toda e qualquer esperança. Cegos, mendigos, prostitutas decaídas, cornos, devoradores de moscas, tarados, velhos, solitários, assassinos arrependidos e idiotizados, loucos, todos loucos, pois a loucura não é senão sentir-se sem rumo, sem esperança, sem saída.
A linguagem de Homem Não Chora é poética, ritmada, ondulante, viva, apaixonada. Como em “Velho ao Telescópio”, talvez um dos mais poéticos e inventivos contos da literatura brasileira.
Incrédulo diante do homem, o contista vasculha as vísceras de uma sociedade embrutecida e revela criaturas que os mais crédulos pensavam existirem apenas no reino da fantasia.
As peças ficcionais de Airton Monte são voltadas para o drama do homem suburbano, do marginal, da “gente chinfrim, ralé miúda”. Na mesma categoria estão os loucos, os alcoólatras, as prostitutas pobres, os pivetes, os fracassados de todo o gênero.
Para Dimas Macedo, em “Os Contos de Airton Monte” (LC, págs. 79/81), “seus contos revelam um engajamento humano quase que sem precedentes na nova safra de contistas seus contemporâneos, são textos graves que dissecam o cotidiano de marginalidade e penetram nos recônditos do desespero e da tragédia dos perseguidos pelos fantasmas de uma sociedade opressora. Relatos pungentes da odisséia dos drogados da vida, dos enlouquecidos e abandonados, dos embriagados pelo absurdo existencial, os seus contos refletem igualmente, por assim dizer, o sórdido e o patético do estrangulado universo social que paulatinamente nos vem resgatando”.
Em “Homem Não Chora (Mas... Ama)” (PA-II, págs. 71/72), José Alcides Pinto comenta: “A plasticidade da linguagem, a comovente reação dos personagens (ele trabalha com poucos), os recursos criativos, a consciência de um mundo caótico, conflitante, o desamor, tudo isso vem juntar-se à denúncia social, ao grito e à dor humana para completar o painel de agonia e sofrimento em que se esbate a humanidade de hoje.”
Como Yehudi Bezerra, falecido precocemente, Paulo Véras deixou poucos contos, reunidos em O Cabeça-de-Cuia (Editora Moderna, São Paulo, 1979). Lígia Morrone Averbuck, na contracapa do livro, anotou: “O que mais impressiona no ficcionista Paulo Véras é a sua prodigiosa inventividade, a riqueza de sua criação de personagens, plenas de força e atuantes numa ampla gama de situações. Movendo-se num universo de fantasia e realidade, essas personagens pertencem a um tempo mítico, são recuperadas do passado pela memória, projetando-se num clima difuso e indefinido, sem perderem sua força de verdade”.
Paulo Véras enveredou também pela análise psicológica das personagens. Suas obras são quase todas tecidas a partir do fio da memória, razão por que os personagens situam-se entre a infância e a adolescência.
As composições de O Cabeça-de-Cuia são todas curtas, quase sintéticas, quase à maneira de Dalton Trevisan. Períodos incisivos, sem rodeios, sem malabarismos de linguagem. Espécie de roteiro para elaboração de narrativas mais extensas.
Os vinte e seis contos de O Cabeça-de-Cuia carregam esta mesma maneira de escrever, porém não há homogeneidade temática. Uns são mais voltados para o interior das personagens, outros para o binômio homem-ambiente. E são estes últimos, quase todos circunscritos ao espaço rural, os que apresentam melhor feição. Gravitam em torno de personagens situados entre a infância e a adolescência. Neles o contista melhor se revela.
Em “Os Contos de Paulo Véras” (FM, págs. 224/225), Batista de Lima afirma: “Usando de uma linguagem que muito bem se casa com o clima da trama. Usando de um estilo flexível. Às vezes períodos curtíssimos, às vezes longos e em uma oportunidade, “O Cochicho dos Cavalos” (história de um suicida), todo um conto sem um ponto sequer”.
Seguindo informações de alguns historiadores ou cronistas da Literatura Brasileira, 1975 é o marco de uma nova era. No Ceará, entretanto, e em outros Estados talvez, esse marco não é bem nítido, eis que bem antes daquele ano se publicaram importantes livros de contos de escritores cearenses, como Mundinha Panchico, de Juarez Barroso, em 1969; A Morte Trágica de Alain Delon, de Francisco Sobreira, em 1972; Os Olhos do Lixo, de Socorro Trindad, no mesmo ano, com prefácio de Câmara Cascudo; Pluralia Tantum, de Gilmar de Carvalho, em 1973. Sem falar nos romances e conjuntos de poemas.
No Ceará alguns observadores já vinham apontando a existência de uma espécie de paralisia na literatura. Eusélio Oliveira, ao escrever sobre o primeiro livro de Francisco Sobreira, dizia: “A Morte Trágica de Alain Delon, antes de ser mais um livro de contos, é uma prova inequívoca de desafio contra o relaxamento improdutivo do movimento literário cearense”. João Antônio, nas dobras do livro Joaquinho Gato, de Juarez Barroso, afirma: “a publicação de alguns novos autores” (...) “motivou a palavra boom como designativo de um movimento literário vindo de publicações levadas a público a partir de 1975”.
A revista O Saco começou a nascer em 1975 e foi em volta dela que, no Ceará, os novos contistas se tornaram mais ou menos conhecidos no resto do Brasil, iniciando-se um período de edição de seus livros no Rio de Janeiro e em São Paulo e de contos esparsos em jornais e revistas de todo o país. Alexandre Barbalho escreveu o mais importante estudo daquele período, no Ceará, dando ênfase àquela publicação, no livro Cultura e Imprensa Alternativa. Um dos capítulos (pág. 35) assim se inicia: “Para perceber o boom da imprensa alternativa dos anos 70 é necessário saber que a eclosão editorial e a proliferação de publicações, nas mais variadas formas, ocorreram por todo o país”. Entretanto, bem antes de O Saco alguns escritores novos já divulgavam suas narrativas em jornais, revistas e antologias. Outros publicaram seus primeiros livros de histórias curtas, como se observou no início deste capítulo. Sendo assim, aquela revista significou a conseqüência de uma agitação iniciada individualmente e não ainda como grupo.
Em 1976 Glauco Mattoso e Nilto Maciel organizaram uma antologia de contos dos novos escritores brasileiros, intitulada Queda de Braço – Uma Antologia do Conto Marginal, publicada no ano seguinte. Do Ceará participaram A. Rosemberg (que em seguida adotou o nome Rosemberg Cariry), Airton Monte, Carlos Emílio Corrêa Lima, Edvar Costa, Francisco Sobreira, Jackson Sampaio, João Bosco Sobreira Bezerra, Nilto Maciel, Paulo Véras e Victor Cintra, quase todos inéditos em livro naquele ano.
A seguir viria o Grupo Siriará de Literatura, que continuaria, de certa forma, o trabalho desenvolvido pelo pessoal de O Saco, aglutinando os escritores cearenses em torno de um programa e de uma revista. Consoante a opinião de Dimas Macedo, em “Literatura e Escritores Cearenses” (CI, págs. 145/158), o Siriará, “que eclodiu no final da década de setenta, além de um manifesto e de uma revista que morreu com o primeiro número, não deixou a meu juízo uma contribuição significativa, enquanto movimento de renovação estética e literária”. E mais adiante: “Mas é indiscutível também que do Siriará provêm alguns dos melhores escritores cearenses da década de 1980, com raízes num período bem anterior, que remonta à criação da revista O Saco”.
Noticia F. S. Nascimento, no livro Augusto dos Anjos: “Com o advento da revista cultural O Saco em abril de 1976, reconhecidamente o mais audacioso projeto editorial da época no Ceará, a jovem intelectualidade da terra ganhava o espaço gráfico reclamado para o exercício de sua criatividade, fazendo literatura e desenvolvendo suas aptidões artísticas. Comandado por Manoel Raposo, Jackson Sampaio, Carlos Emílio Corrêa Lima e Nilto Maciel, o empreendimento tornou-se responsável pela afirmação de poetas, ficcionistas e ensaístas hoje com acesso aos suplementos literários e demais publicações de âmbito nacional, o que autoriza dizer que O Saco fez em sua meteórica existência o que outros órgãos do gênero não têm conseguido realizar em dezenas de anos”.
Adriano Spínola, em “A Nova Ficção Cearense”, afirma: “Numa terra tradicionalmente de poetas – talvez por ser o modo mais fácil de se destacar culturalmente, num meio de poucas oportunidades, ou porque o Ceará seja mesmo um manancial de talentos poéticos, quem sabe – a ficção narrativa tem merecido pouca atenção/dedicação por quantos militam na literatura. Da velha geração, há o exemplo raro de fidelidade ao conto, acompanhado de um constante aprimoramento, por parte do Sr. Moreira Campos, mestre inconteste no gênero, reconhecido nacionalmente; o Sr. Fran Martins, novelista de primeira, ao que parece contentou-se com o seu Dois de Ouro, um trabalho notável, nada nos dando, porém, posteriormente, que se lhe igualasse em peso; o Sr. Jáder de Carvalho, há muito preferiu ser poeta lírico, com qualidades; e há o Sr. Eduardo Campos, que, tendo-se realizado mais plenamente na área dramática, com algumas peças de merecido sucesso nacional, abandonou, ao que tudo indica, a novelística; Juarez Barroso, não fora a morte prematura, bem que nos poderia ter dado uma ficção que se ligasse à força de uma D.Guidinha do Poço, por exemplo. Vivência não lhe faltava, nem talento. Mas não o fez”.
No mesmo artigo Adriano anotou: “Na nova geração, o interesse pela narrativa literária ganha poucos adeptos. Tomando como base o Grupo Siriará, formado em 79, dos seus 24 membros, apenas 4 a 5 se empenharam na criação de personagens e enredos. O resto, tome poesia! Era, na verdade, muito mais um grupo de poetas, todos ansiosos em revelarem suas produções nascentes e serem os primeiros bardos anunciadores de um novo tempo, que se avizinhava, ao cair do obscurantismo político-cultural, que sentíamos ainda grudado nos dedos”.
Para concluir, Spínola observou: “Se poucos foram os que se ligaram à prosa ficcional, em compensação o fizeram com uma garra e uma categoria superlativa. Como é o caso de Airton Monte, Nilto Maciel, Paulo Véras e Carlos Emílio”.
Durante os anos 1970 diversos foram os livros de contos de novos escritores cearenses editados em Fortaleza, bem como em outras capitais. O primeiro deles, em 1972, foi A Morte Trágica de Alain Delon, de Francisco Sobreira. No mesmo ano se publicaram mais três coleções: Exercício Para o Salto, de Cláudio Aguiar; Os Olhos do Lixo, de Socorro Trindad; e A Coleira de Peggy, de Holdemar Menezes, com uma peculiaridade: o primeiro e o terceiro fora do Ceará e o segundo no Ceará, porém de escritora nascida em outro Estado. Em 1973 apareceu um dos mais importantes e singulares livros de ficção curta do Ceará: Pluralia Tantum, de Gilmar de Carvalho. Em 1974 Nilto Maciel estreou com Itinerário. Em São Paulo no ano de 1975 veio a lume O Casarão, de Caio Porfírio Carneiro, que havia estreado ainda em 1961 e, portanto, não se enquadra no rol dos novos contistas. O mesmo se pode dizer de Juarez Barroso, com seu Joaquinho Gato, de 1976. Desse ano é O Menino D’água, de Fernanda Teixeira Gurgel do Amaral. No ano seguinte saíram Depoimento de um Sábio, de Cláudio Aguiar, Milagre na Salina (catalogado como romance), de Mario Pontes, e Coisas & Bichos, de José Hélder de Souza, todos então radicados fora do Ceará. No mesmo ano se publicou Tocaia, de Yehudi Bezerra. Os mais velhos continuaram editando narrativas curtas, como Moreira Campos, que em 1978 apresentou ao público Os Doze Parafusos. Naquele ano estrearam duas contistas: Socorro Trindad, com Cada Cabeça uma Sentença, e Glória Martins, com Reencontro. 1979 pode ser visto como um ano fértil em livros de contos no Ceará. Francisco Sobreira editou seu segundo volume, A Noite Mágica, e aconteceu a estréia de quatro contistas: Gerardo Mello Mourão, com Piero Della Francesca ou As Vizinhas Chilenas; Geraldo Markan, com O Mundo Refletido nas Armas Brilhantes do Guerreiro; Airton Monte, com O Grande Pânico; e Paulo Véras, com O Cabeça-de-Cuia.
Alguns contistas surgidos naquele período só viriam a publicar livro de contos muito depois, como é o caso de Carlos Emílio Corrêa Lima, Joyce Cavalcante, Audifax Rios, Batista de Lima, Barros Pinho, Rosemberg Cariry e Marly Vasconcelos. Dois faleceram ainda jovens: Paulo Véras e Yehudi Bezerra. Outros desapareceram do cenário das letras impressas. Poucos se mantiveram ativos no gênero conto.
Os contistas surgidos por volta de 1970 podem ser agrupados em três segmentos: o dos que viviam fora do Ceará, o dos que viviam no Ceará e publicaram seus primeiros livros de histórias curtas a partir de 1970 e o dos que só viriam a editar coleções de narrativas após 1980, embora já as escrevessem e até as publicassem em jornais, revistas e antologias. Do primeiro segmento fazem parte Francisco Sobreira, Cláudio Aguiar, Holdemar Menezes, Mario Pontes, José Hélder de Souza, Gerardo Mello Mourão e Moacir C. Lopes. Integram o segundo grupo Socorro Trindad, Gilmar de Carvalho, Nilto Maciel, Fernanda Teixeira Gurgel do Amaral, Yehudi Bezerra, Glória Martins, Geraldo Markan, Airton Monte e Paulo Véras. O último segmento é composto de Nilze Costa e Silva, Fernando Câncio, Carlos Emílio Corrêa Lima, Rosemberg Cariry, Joyce Cavalcante, Audifax Rios, Barros Pinho e Batista de Lima.
Um dos que se dedicaram quase que exclusivamente à peça ficional curta é Francisco Sobreira. Sua obra tem sido objeto de inúmeros estudos. Já publicou oito livros de peças curtas. Nas dobras do primeiro volume, Eusélio Oliveira anotou: “Francisco Sobreira consegue dominar com segurança logística o código de intercâmbio vivencial latente em cada constelação ficcional de seus contos”. Ao publicar A Morte Trágica de Alain Delon, Francisco Sobreira não chegou a ultrapassar as limitadas fronteiras da província cearense, permanecendo, por assim dizer, no ineditismo. Seu segundo livro, A Noite Mágica, nada tem de revolucionário, de vanguardista, de inovador. Muito pelo contrário, é tecnicamente conservador, tal como a obra de José Lins do Rego que, por esta mesma razão, adquiriu renome dentro do romance regionalista brasileiro.
Francisco Sobreira não faz nenhuma alquimia de estilo, não cria nenhuma nova linguagem. No entanto, esta aparente acomodação do contista não indica seja ele um simples contador de histórias.
Sendo conservador na forma, o livro de Sobreira segue a trilha da prosa de ficção de pós-1964. Perpassa por quase todos os contos um vento forte de paranóia, caudaloso na literatura urbana brasileira dos últimos anos do século XX. Histórias de medo, terror, alucinação. Medo de ser preso, de perder o emprego, de morrer de fome, medo disso e daquilo. As pessoas se sentem caçadas como bichos, ameaçadas, perseguidas. Os amigos e os parentes são delatores ou espiões a serviço do Poder. A própria sombra de cada ser humano é um dedo-duro em potencial. Esse horror kafkiano é notório em “O Caçado”, “Enquanto o Diabo Esfrega o Olho”, “O Falso Álibi”, “O Caçador de Nostálgicos”, percebido até nos títulos. O narrador, sempre perseguido, sempre paranóico, torna-se perseguidor, delator, comparsa da polícia (representação do direito de perseguir), como em “A Voz do Vizinho”.
O absurdo é, assim, o ingrediente principal da iguaria narrada. Às vezes um absurdo que, de tão cotidiano, perde o sabor de coisa literária. Em “A Lâmina”, por exemplo. Porque ninguém é mais dono de nada. Outras vezes, o absurdo apresenta-se como se o personagem fosse apenas um deficiente mental, incapaz de perceber a vida e a morte ao seu redor, manejado por tentáculos tão torturantes quanto os fantasmas dos pesadelos. A realidade narrada aproxima-se, então, do sonho. Os protagonistas e os espectadores são meros joguetes nas malhas de seres todo-poderosos que inventam a vida ou o fato. Por isto, em alguns contos a presença do elemento onírico é perfeitamente perceptível ou mesmo preponderante. Os atos e as imagens se sucedem de forma incoerente, deixando o personagem simplesmente perplexo, espantado diante da estranha realidade de que tenta desesperadamente fugir. Assim, reduz à condição de ficção, de brincadeira de mau gosto, de encenação, quando muito de logro, a peça que lhe pregam. Não acredita ser possível tão absurda realidade. Por fim se convence e tenta fugir. Porém já é tarde demais. “A Pedra” é belíssima obra e tem dimensão diferente dos demais. No entanto, o mesmo clima de perseguição, de repressão, na pessoa de um pobre sertanejo virado pagador de promessas.
No artigo “Fitas”, estampado no Jornal do Brasil, Antônio M. Nunes se refere ao uso e abuso do “insólito dos acontecimentos para instaurar uma outra realidade que, devido a sua linguagem e estrutura, aproxima-se do thriller cinematográfico”.
Ao comentar Um Dia... Os Mesmos Dias, Jorge de Sá, em “Como Se Fosse Uma Objetiva”, enuncia: “o contista se afasta do “fantástico” e se aproxima de uma realidade própria dos documentários”.
Na apresentação de O Tempo Está Dentro de Nós, Jaime Hipólito Dantas chama a atenção do leitor para a “prosa trabalhada, aqui e ali um pouco dramática, é certo, mas sempre sem qualquer obscuridade ou afetação”.
Wilson Martins se manifestou assim: “Os contos reunidos em Clarita são de qualidade desigual, muitos deles (a começar pelo que dá título ao livro, e é o melhor) tomando a invenção arbitrária, ou seja, inverossímil, por imaginação criadora”.
Em “Sobreira: aderindo à vigorosidade da vida” (Jornal O Norte, João Pessoa, PB, 3/8/97), ao comentar Grandes Amizades, Hildeberto Barbosa Filho observa que os personagens e as situações, “mesmo as mais cotidianas, adquirem certa nuance enigmática que, a seu turno, termina por envolver os seus contos numa atmosfera de suspense e de estranhamento”.
Nas dobras de Crônica do Amor e do Ódio, Nelson Patriota comenta: “Com personagens despojados de grandes projetos existenciais, uma vez que estes aconteceram, e se mostraram falhos, no passado, Sobreira vai construindo uma obra fiel ao seu tempo”.
A obra literária de Cláudio Aguiar está exaustivamente analisada por diversos críticos, brasileiros e estrangeiros, em artigos e ensaios reunidos no livro Viento del Nordeste, com o subtítulo Homenaje Internacional al Escritor Brasileño Cláudio Aguiar, em espanhol, da Universidad Pontificia de Salamanca, 1995. Num dos ensaios, “El Descubrimiento en Caldeirão”, César Real Ramos, Professor de Literatura Espanhola da referida Universidade, faz a gênese do Caldeirão e vê no primeiro livro de histórias curtas de Cláudio os primeiros pingos d’água que iriam gerar o grande rio do romance: “En Exercício, además, a través de continuos cambios de focalizacion y de voz narrativa, poco a poco nos vamos adentrando en el interior de los personajes, en las almas, en las conciencias”.
Holdemar Menezes não deixou vasta obra no gênero conto. No dizer de Assis Brasil, “podemos sentir a mão do ficcionista, numa linguagem forte, contundente, participante, onde já se abrigavam Dalton Trevisan e Rubem Fonseca”. Em “Repressão, Revolta e Engajamento”, capítulo do livro Itinerário do Conto, Hélio Pólvora o filia “à linha ficcional de Albert Camus e pensadores assemelhados”. E sintetiza: “Na ficção brasileira deste último meio século, Holdemar Menezes é o narrador consciente dos pequenos dramas provocados pela tragédia essencial do ser e pela tragédia da repressão político-social que o violenta, emudece e constrange”.
Embora venha escrevendo desde muito antes de 1970, Mario Pontes tem publicado pouco. Em 1999 deu a lume Andante com Morte, composto de quatro histórias longas. Ivo Barroso, nas dobras, relembra o primeiro livro, Milagre na Salina, como “Uma série de narrativas que se interpenetram, que se recosem para formar um painel picasseano de linhas simples e dramáticas, onde não falta igualmente o colorido vivo da ironia e do humor”. Ao se referir ao segundo livro, o chama de reunião de quatro novelas. E sintetiza: “Uma delas, ‘A Morte Infinita’, anteriormente batizada com o mesmo título do livro Andante com Morte, impressionou tanto a Didier Lamaison, o tradutor francês de Carlos Drummond de Andrade, que logo se propôs a transladá-la para sua língua, numa permanente reescrita, com a mesma meticulosidade com que o autor trabalhara seu texto. É uma novela de andamento cinematográfico em que a ação se prolonga num ralenti quase insuportável, longo como a aridez do areal em que ela se desenrola, para, de repente, adquirir uma dinâmica de duelo faroéstico, violentas imagens em zoom e primeiros planos cortantes e minuciosos como o grande close da boca de um revólver no momento do disparo”. De 2003 é Um Homem Chamado Noel, cuja estrutura narrativa é semelhante à de Milagre na Salina (1977). Ambos podem ser lidos como coletâneas de contos ou como novelas.
Outro que vive fora do Ceará há tempos é José Hélder de Souza. Seu primeiro livro, Coisas & Bichos (1977), mereceu estudo de Clovis Sena, na introdução intitulada “Caçadas Humanas & Bala de Prata”, onde argumenta: “Aqui o principal não está propriamente na linguagem elaborada, opção literária bonita, sem ser bem o caso. Neste conjunto de contos de José Hélder a beleza se acha na narrativa mesma”. No terceiro parágrafo, observa Sena: “Com um poder narrativo ora lírico, ora dramático, por vezes humorado, o Autor nos coloca em face da situação da caçada: perseguido-perseguidor”.
Em “Um Contador de Causos” (CI, págs. 26/28), Dimas Macedo destaca “a sua fidelidade à linguagem popular, ao lado do seu estilo e do seu jeito de dizer muito peculiar, porque individualíssima a sua escritura literária. Histórias, enredos bem arquitetados ao gosto do leitor, fala e linguajar matutos que penetram bem fundo o coração, sentando tendas na alma, cravejando punhais de beleza nos olhos, invadindo a imaginação do leitor até a sedução total do espírito”.
No prefácio ao terceiro livro de Hélder, Pequenas Histórias Matutas, observou Dimas Macedo: “Sendo poeta de fino amanho com o convívio das musas, sabe ser também o imenso ficcionista que é: um contista consciente do valor do universo que pretende explorar, que quer denunciar para melhor se fazer compreender, pelo gosto mesmo de esculpir a expressão, a matéria-prima de sua bela escritura artesanal”. Em outro parágrafo anotou: “Sem desmerecimento para nenhum dos seus livros, penso que em Rio dos Ventos (1992) reside o valimento maior da sua trajetória de escritor, especialmente a sua trajetória de contista” (...).
Embora nascido em 1917 (Moreira Campos é de 1914), Gerardo Mello Mourão se inclui neste capítulo em razão do ano da publicação de seu primeiro livro de contos, 1979. É tido como um dos nomes fundamentais da poesia brasileira e reside há vários anos no Rio de Janeiro. Nas orelhas de Piero Della Francesca ou As Vizinhas Chilenas o editor escreveu: “O autor nos deixa aqui, às vezes, diante da parábola pura, diante do conto, a história inventada e contada, em que as coisas, as pessoas e os lugares saltam vivos da inventada fantasia. Nesses contos, de resto, escritos quase todos em dias de exílio ou de peregrinação por outros países da América, há muitos nomes de pessoas reais. Talvez os fatos em que elas se envolvem nem sempre sejam mera coincidência. O próprio autor, porém, faz questão de deixar claro que ele mesmo não sabe se Abigail Gonçalves se suicidou ou se Miguel Eyquem continua a carregar Helena Vial na garupa de sua motocicleta. Mas tanto no relato épico do Coronel paraguaio, como na aventura lawrenciana de Rosa Maria Bandera, é difícil distinguir entre a fantasia e a realidade, até porque a fantasia e a realidade são uma única e mesma coisa”.
Moacir C. Lopes não costuma ser mencionado em livros de história e crítica literária cearenses. Também de geração muito anterior à daqueles que estrearam nos anos 1970, organizou e editou a Antologia de Contistas Novos em 1971. Apesar disso, seu primeiro livro é O Navio Morto e Outras Tentações do Mar, de 1995. As nove composições reunidas no volume se centram em temas do mar. Nas abas do volume anotou o editor: “Histórias em que, além de jogos de estilo originais, o autor exercita um animismo muito particular – erotizado – da natureza, que se torna algo maligno, cruel, obsceno, em “Do Corpo de Marisa Brotarão Orquídeas”, ou selvagem e exótico, poético e surpreendente em “O Mar Devolverá o Corpo de Clarissa”, principalmente quando os humanos são tomados pelos espíritos marinhos”.
***********
Estrearam com livro de contos nos anos 1970 Socorro Trindad, Gilmar de Carvalho, Nilto Maciel, Fernanda Teixeira Gurgel do Amaral, Yehudi Bezerra, Glória Martins, Geraldo Markan, Airton Monte e Paulo Véras.
Salvo engano, Socorro Trindad publicou somente duas coleções. Após o livro de estréia, editou Cada Cabeça uma Sentença, em 1978, com prefácio de Aguinaldo Silva, intitulado “A Árdua Batalha Contra os Papangoos”. São dele estas palavras: “Enquanto invenção, este livro, a nosso ver, situa-se solitariamente dentro do que se convencionou chamar de “o novo conto brasileiro”. Esta solidão é pelo fato de que a autora não se prende à linha que começa com Dalton Trevisan e que vai até a assimilação da influência dos modernos latino-americanos”.
“O Massacre no Mangue” é uma crônica atualíssima de sabor página policial, até mesmo estilisticamente, e também à maneira do romance gótico. Socorro Trindad tem duas virtudes essenciais: o poder de misturar o joio e o trigo e uma esplêndida cultura literária. Leia-se “Bodas de Ouro”, história de trancoso tão extraordinária como as do arco-da-velha.
Entre os que acreditaram ter concluído sua obra de contista está Gilmar de Carvalho. No entanto, pela singularidade de suas narrativas, não pode ser comparado a nenhum prosador de ficção do Ceará. Não somente porque seus contos são fundados na erudição, seja no latim, no inglês, na História, na Filosofia, na mitologia, na Bíblia etc. Também porque ora escreve como poeta, ora como salmista, ora como ninguém. Juarez Barroso, nas dobras de Pluralia Tantum, diz que a literatura de Gilmar é “uma afirmação de liberdade. Mas ele não fica junto à turma do sereno, ao bloco da contracultura. Formalmente, rejeita o marginalismo artístico, os vanguardismos escandalizantes. Seu estilo é clássico, sua narração, fabular, levemente borgiana. A partir daí ele constrói, ou destrói, ri dos deuses, mais perto de Lúcifer que do Arcanjo São Miguel (afinal de contas, uma figura do establishment), simpatizante dos exus, louvador da pomba-gira, Vênus mestiça e mais sensual, naturalmente”. A seguir se nega chamar de contos os textos de Gilmar. Na verdade, não são contos tradicionais. Em comum com estes apenas o terem títulos, alguns personagens, alguma narração. O resto é bem diferente. Afirma Juarez: “Gilmar não escreve contos. O conto, por mais de vanguarda que seja, tem a sua disciplina, sua forma de discurso. Gilmar é um compositor de cantos em prosa, discípulo remoto do Rei Salomão, que tanto trabalho deu ao Senhor com sua rebeldia e sua mania de amor. Amante da vestal romana, consagrada em virgindade ao deus maior, Gilmar, libertário e libertador sofre agora o mesmo castigo de Prometeu. Zeus acorrentou-o ao relógio da Praça do Ferreira, à Coluna da Hora. Que, aliás, não existe mais”.
Na apresentação do citado livro, em forma de carta, Mario Pontes confessa: “Na minha humilde fantasia, seu texto me dá a impressão de ter sido escrito por uma criatura semelhante àquela divindade indiana de muitas mãos. Como cada mão escreve algo diferente da outra, o meu comodismo quer me obrigar a ver no produto final apenas uma colagem arbitrária, um trabalho habilidoso de justaposições meramente formais. Mas mesmo um preguiçoso como eu acabo por suspeitar que, de fato, a “simples” colagem mascara um sem número de relações particulares e ricas. E entregando-me à suspeita, chego até ao espanto diante dessa prodigalidade de teses e antíteses, desse jogo calidoscópico de coincidências e contrastes, dessa facilidade de supressão de distâncias que me arrastam ao centro de um redemoinho de significados inacessíveis à minha miopia crítica”.
Ensina Dimas Macedo, em “A Ficção de Gilmar de Carvalho” (Leitura e Conjuntura, págs. 54/56): “sua concepção borgeana e, portanto, inusitada do apreender a concretude do universo ficcional, aliada a uma refinada capacidade de resgatar o insólito através de recursos estilísticos alegorizantes, tudo isso tem concorrido para emprestar à produção literária de Gilmar de Carvalho uma situação privilegiada entre o inventário dos seus contemporâneos de geração”.
Outro que, como Francisco Sobreira, tem se dedicado à elaboração de histórias curtas é Nilto Maciel, com sete volumes editados. Em “Os Contos de Nilto Maciel” (Novos Ensaios, págs. 106/110), Sânzio de Azevedo observou: (...) “de nada adiantaria ao escritor engendrar estórias bem urdidas, fundamentá-las com os alicerces dos mitos, se não pudesse dispor de um instrumento lingüístico adequado”.
F. S. Nascimento reuniu num só estudo, “A Ficção de Nilto Maciel”, (AAA, págs. 177/186), três ensaios estampados em jornais. Constata: “O avanço do contista ficou bem evidenciado, tanto na manipulação da linguagem, como no tratamento ficcional dado aos episódios reproduzidos”. José Alcides Pinto (PA-II, págs. 76/78) considera Tempos de Mula Preta “um dos livros de conto mais ousados que foram editados nesses últimos dez anos, não só em termos do Ceará, mas em todo o País, ao lado de outro grande livro, este de autor consagrado pela crítica e de nome firme na literatura — Os Doze Parafusos, do mestre Moreira Campos”.
Em “A Nova Ficção Cearense”, Adriano Spínola escreveu: “Inscreve-se ele no que de melhor temos no momento em matéria de contos no Brasil. Percebe-se no autor um tal domínio do ficcional, uma capacidade inventiva e transfigurante da linguagem, aliada a uma não menos capacidade de alteridade, versátil e verossímil, com relação aos personagens, que o colocam entre os mais avançados e promissores contistas da atualidade”.
No prefácio de Punhalzinho Cravado de Ódio, Dimas Macedo viu no contista um “mestre na arte de contar estórias inesperadamente fabulosas”. Tanussi Cardoso, em “A Impressão da Realidade em As Insolentes Patas do Cão, de Nilto Maciel”, observou: o contista “lima as gorduras do texto e, vigorosamente, trabalha com a palavra certa, no lugar certo e na hora certa”. E o inclui no “rol dos grandes escritores deste país”.
Em “As Insolentes Patas do Cão” (TC, págs. 21/24), Francisco Carvalho escreveu: “Nilto Maciel é atualmente, sem nenhum favor, um dos nomes mais representativos da moderna literatura brasileira”. E mais: “O leitor razoavelmente familiarizado com a disciplina literária não terá dificuldade em concluir que entre essas narrativas, todas elas de excelente extração, existem algumas obras-primas da moderna ficção brasileira”. Para ele, o contista “é um narrador admirável. Possui todas aquelas virtudes (talento, imaginação, invenção, técnica de narrar e de expor) que de modo algum podem faltar a um bom contador de histórias”.
Diz Carlos Augusto Viana, em “Nilto Maciel Reconstrói o Mundo a Partir da Linguagem” (DN, 1/3/1995): “Lançando o seu olhar agudo sobre o cotidiano, filtrando as ações humanas a partir do humor e da ironia, flagra o insólito, o inesperado, os momentos abissais da condição humana”.
Anotou Caio Porfírio Carneiro, em “A Unidade de Babel”: “Senhor de todos os segredos da arte de contar, caminhando, com segurança, pelo regional, o fantástico, o alegórico, o mágico, indo do fotográfico ao sombrio” (...). Astrid Cabral, em “Babel Contemporânea” (Literatura n.º 14), escreveu: “Aberto a múltiplas tendências, NM ora reverencia a tradição literária consagrada, ora se lança na experimentação lingüística e estrutural”.
Yehudi Bezerra não teve tempo de escrever mais. Deixou publicado apenas o livro Tocaia. Em carta-prefácio, Airton Monte escreveu: “Você, seu judeu safado, de rosto cheio de esquinas de ângulos, possui a rebeldia dos que viveram o que escrevem, não a piedade inútil, humilhante dos que sabem por ouvir dizer, dos que chegam no sertão e ficam olhando tudo, como se fosse tudo uma pintura imóvel no tempo e no espaço, com o olhar mais bobo que o de quem está num jardim zoológico espiando a bicharada fazer o que eles gostam de ver, não o que na verdade é”. E depois: “Tocaia surge de repente no universo das letras cearenses como um pé-de-vento, para arrebentar o mofo de uma literatura mumificada, quebradiça e facilmente digestiva. No seu livro as coisas são ditas com seus verdadeiros nomes, há a despreocupação das sofisticações temáticas, das frescuras estéticas que tanto deliciam o senso estético duvidoso das patotas divinas”.
Na categoria dos que escreveram ou publicaram pouco está Glória Martins. Teve o livro Reencontro prefaciado por Pedro Paulo Montenegro, para quem “a nota dominante (no livro) é a espontaneidade, espontaneidade tão grande que pode mesmo a alguns parecer, em determinados momentos, descuidos formais.” E conclui: “Duas grandes notas podemos detectar numa leitura de Reencontro: imaginação e capacidade de observação da parte da autora e, como mensagem mais profunda, aquela ânsia de libertação”. Composto de nove narrativas, o livro apresenta narração linear, ora na primeira, ora na terceira pessoa. A contista pouco se vale do diálogo, mais presente em “Se Eu Passo no Botequim Eu Fico”. Um ou outro monólogo interior, como em “Sim, Doutor”, história urbana, como a maioria, com uma pitada de humor. “Tia Bela” oscila entre o romantismo e o realismo, em ambiente de fazenda.
Embora Geraldo Markan tenha nascido em 1929, estreou no gênero conto somente em 1979, com O Mundo Refletido nas Armas Brilhantes do Guerreiro. Dias da Silva, no artigo de título igual ao do livro, integrante do volume III do livro Da Pena ao Vento (2001), enuncia: “De começo, devo dizer que não é tão simples determinar-se o gênero da obra. Livro de contos? Livro de crônicas? Momentos de puros devaneios da imaginação sensível? Textos fantásticos? De gênero maravilhoso? De gênero estranho?”
Raras vezes, um diálogo menos artificial ou uma narração de fatos. Até porque o outro está sempre indo embora, fugindo, escorregadio ou inacessível. E o narrador termina só, ruminando seu desespero. Isso se reflete no próprio corpo das narrativas. No final, Geraldo Markan faz poesia ou crônica leve, apesar de se dizer o nunca-poeta. Termina fazendo markanices, ele também personagem.
O Mundo Refletido nas Armas Brilhantes do Guerreiro é título poético e metafórico, porque, na verdade, o mundo refletido naquilo que simboliza o poder: à época de Alexandre e companhia, as armas brilhantes do guerreiro; hoje, o ouro, a moeda, o carro, a piscina – adereços e o próprio ser, a um só tempo. O mundo refletido no ouro do burguês.
Passeiam, pelas páginas quase sempre de uma delicadeza e uma pureza clássicas, personagens de voz amena, alguns falando inglês ou citando Baudelaire, Fernando Pessoa e o lírico Camões. Remoendo seus vazios, tateando os muros escuros de seus labirintos pegajosos. Vez por outra, um deslize imperdoável ante a poesia a minar de cada palavra. E surge quase uma historinha de fotonovela: “Ecidujerp, ou seja, Otiecnocerp”. Apesar disso, um ranço bom de naturalismo ainda inexplorado – a nostalgia do domínio holandês no Nordeste.
Embora a crítica esperasse uma avalanche de livros de Airton Monte, tal não se deu. No entanto, poderá ter as gavetas empanturradas de contos. Seja como for, é ele um dos mais importantes contistas cearenses surgidos depois de 1970. Os críticos lhe concederam os melhores louvores. Em “O Grande Pânico, de Airton Monte” (FM, págs. 197/200), Batista de Lima assim resume seu livro inaugural: “São 102 páginas contendo 15 histórias breves, densas e crispadas, retiradas dos pontos mais sombrios e marginais da sociedade. Transcrição de um mundo transeunte de suas retinas de vampiro da quase grande noturna Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção, do Farol do Mucuripe, dos hospícios e dos campos de futebol. A marginalização. A tragédia de uma sociedade obcecada pela vontade de viver. O medo, a loucura e a fome. Reinvenção dos mitos que essa gente cultiva”.
Seus personagens são seres humanos desesperados no amor impossível. Farrapos humanos que teimam em viver ou perdem toda e qualquer esperança. Cegos, mendigos, prostitutas decaídas, cornos, devoradores de moscas, tarados, velhos, solitários, assassinos arrependidos e idiotizados, loucos, todos loucos, pois a loucura não é senão sentir-se sem rumo, sem esperança, sem saída.
A linguagem de Homem Não Chora é poética, ritmada, ondulante, viva, apaixonada. Como em “Velho ao Telescópio”, talvez um dos mais poéticos e inventivos contos da literatura brasileira.
Incrédulo diante do homem, o contista vasculha as vísceras de uma sociedade embrutecida e revela criaturas que os mais crédulos pensavam existirem apenas no reino da fantasia.
As peças ficcionais de Airton Monte são voltadas para o drama do homem suburbano, do marginal, da “gente chinfrim, ralé miúda”. Na mesma categoria estão os loucos, os alcoólatras, as prostitutas pobres, os pivetes, os fracassados de todo o gênero.
Para Dimas Macedo, em “Os Contos de Airton Monte” (LC, págs. 79/81), “seus contos revelam um engajamento humano quase que sem precedentes na nova safra de contistas seus contemporâneos, são textos graves que dissecam o cotidiano de marginalidade e penetram nos recônditos do desespero e da tragédia dos perseguidos pelos fantasmas de uma sociedade opressora. Relatos pungentes da odisséia dos drogados da vida, dos enlouquecidos e abandonados, dos embriagados pelo absurdo existencial, os seus contos refletem igualmente, por assim dizer, o sórdido e o patético do estrangulado universo social que paulatinamente nos vem resgatando”.
Em “Homem Não Chora (Mas... Ama)” (PA-II, págs. 71/72), José Alcides Pinto comenta: “A plasticidade da linguagem, a comovente reação dos personagens (ele trabalha com poucos), os recursos criativos, a consciência de um mundo caótico, conflitante, o desamor, tudo isso vem juntar-se à denúncia social, ao grito e à dor humana para completar o painel de agonia e sofrimento em que se esbate a humanidade de hoje.”
Como Yehudi Bezerra, falecido precocemente, Paulo Véras deixou poucos contos, reunidos em O Cabeça-de-Cuia (Editora Moderna, São Paulo, 1979). Lígia Morrone Averbuck, na contracapa do livro, anotou: “O que mais impressiona no ficcionista Paulo Véras é a sua prodigiosa inventividade, a riqueza de sua criação de personagens, plenas de força e atuantes numa ampla gama de situações. Movendo-se num universo de fantasia e realidade, essas personagens pertencem a um tempo mítico, são recuperadas do passado pela memória, projetando-se num clima difuso e indefinido, sem perderem sua força de verdade”.
Paulo Véras enveredou também pela análise psicológica das personagens. Suas obras são quase todas tecidas a partir do fio da memória, razão por que os personagens situam-se entre a infância e a adolescência.
As composições de O Cabeça-de-Cuia são todas curtas, quase sintéticas, quase à maneira de Dalton Trevisan. Períodos incisivos, sem rodeios, sem malabarismos de linguagem. Espécie de roteiro para elaboração de narrativas mais extensas.
Os vinte e seis contos de O Cabeça-de-Cuia carregam esta mesma maneira de escrever, porém não há homogeneidade temática. Uns são mais voltados para o interior das personagens, outros para o binômio homem-ambiente. E são estes últimos, quase todos circunscritos ao espaço rural, os que apresentam melhor feição. Gravitam em torno de personagens situados entre a infância e a adolescência. Neles o contista melhor se revela.
Em “Os Contos de Paulo Véras” (FM, págs. 224/225), Batista de Lima afirma: “Usando de uma linguagem que muito bem se casa com o clima da trama. Usando de um estilo flexível. Às vezes períodos curtíssimos, às vezes longos e em uma oportunidade, “O Cochicho dos Cavalos” (história de um suicida), todo um conto sem um ponto sequer”.
.......
continua...
.......
Fonte:
Nenhum comentário:
Postar um comentário