ANGÉLICA MATOS FERREIRA (Guapimirim / RJ)
Dias sem mais
Dias roubados,
sonhos estagnados.
A tristeza persiste solitária.
A alma acorrentada
em uma felicidade imaginaria.
Vida passada, desgastada.
Dias iguais...
... dias sem mais.
ANTONIO FERNANDO SODRÉ JÚNIOR (São Luís / MA)
Cordel de estrelas
Os poetas nordestinos
Versam para além de algum prestígio
Cantar do grande Sertão a vida
E nas rimas que fazem, encontram mais belezas
De um rincão de natureza aguerrida
Quase invencível em suas dores e pelejas.
No poema, na fala do repentista
Há raridades que o sofrimento ofusca
A ignorância e o preconceito ocultam...
O Sertão é todo o mundo e um mundo só
Chão lavrado de graças, cinzelado de riquezas...
O homem forte curva-se à terra:
É sequidade latente, almas vivas de aridez
É banho de lua, canto de revoada
Contas de conchas, nuvens, lençóis d’areia
Engenho, resistência e luta...
É na franqueza da gente simples,
Na união dos seus que a terra é reerguida
Do solo estéril, persiste dele a querença
Todas armas contra as lágrimas e a injustiça
O Sertão é cidadela que guarda mistérios
É triunfo que desponta no céu escuro
Feito cordel de estrelas.
BIA WEISER (Viena / Áustria)
Gente que se basta
Tem gente tão completa
que se basta no presente
não projeta nada além
não anseia dimensões
e que vive tão somente
a vida como ela vem.
É gente toda, por inteiro
sem mágoas, sem frustrações,
sem anseios, sem angústias.
É gente que não programa
e aceita o que há de vir
se de bom ou de mau, tanto faz,
pois viver é que é bom.
É gente que vive a vida
que se basta em sua lida,
vida que vai em frente,
é destino, é passageiro.
CARLOS MARCOS FAUSTINO (Tupã / SP)
Velhos tempos
(Quando eu voltava pra casa)
Passar o pontilhão, cair na avenida
Que se abre alegre, simples e bonita
Dobrar no terceiro quarteirão,
De madrugada então, era uma poesia
Os passos na rua silenciosa e calma
O tic tac do coração... uma melodia
Arfar no peito, ânsia pela chegada
Abrir o portão, adentrar à varanda
Os passos lá dentro, o abrir da porta
Choros, risos e abraços, não importa
Uma aquarela de alegrias estampada
O cheiro forte do café tudo invadia
A vida naquele dia mais cedo, vibrava
Ninguém mais dormia, ninguém mais queria
As saudades todas eram despejadas
As saudades todas eram esquecidas.
Como eram tão doces aqueles velhos tempos,
Velhos tempos quando eu voltava pra casa..
CECÍLIA MARIA DE LUCA S. DE NORONHA (Belo Horizonte / MG)
Intimidade
Quem é esta menina que não reconheço?
Quem é esta menina que me desafia, querendo dançar, saltar, correr?
Ela me encara e me escancara e ri....ri despudoradamente.
De repente, mostra a língua para quem não gosta,
Faz birra e chora desconsoladamente...
Esta menina me desalenta. Louca, me enlouquece.
Canta, sua voz desafinada me entristece.
Cria e suas criações me exasperam.
Sonha e seus sonhos me desesperam.
Ah, menina, que não percebe minha senilidade!
Eu não a reconheço e ela não reconhece sua inutilidade.
Peço-lhe que vá embora, ela insiste em ficar.
Digo-lhe que tudo se acabou, ela insiste em recomeçar.
Quem é esta menina que sempre me alcança e que eu não consigo alcançar?
Sigo ridícula e impotente com esta menina solta dentro de mim.
Menina persistente...não se cansa de esperar.
Criança teimosa...não acredita no meu fim. Enfim!....
Afinal, quem é esta menina que me vira pelo avesso?
Eu não mais a conheço, eu não a reconheço.
Quero me lembrar, mas não tem jeito...
Quem é? Esquece. Esqueço.
DANIELLI RODRIGUES (Londrina / PR)
Patativa do Assaré
Dentre o cultivo de terras
surge o poeta do Ceará
de seus envolventes repentes
o maravilhoso desafio do improviso
o casamento da poesia e da música
o delicioso canto de criação de versos.
Ó ave Patativa
que beleza de canto, de poesia
de fineza, de melodia
de uma oralidade marcante
cheia de significações e sensações.
Entre a voz e a entonação
as pausas
entre o ritmo e o pigarro
a expressão
com perfeição sua ironia, veemência e hesitação.
De sonetos clássicos
à décima e a sextilha nordestina
ora linguagem culta
ora linguagem do dia a dia
emerge a poesia matuta.
Antônio Gonçalves da Silva
agricultor, improvisador
compositor, cantor
poeta popular
nossa ave brasileira.
GRACIANA MENESES (Fortaleza / CE)
Simpatia
Sentimento sincero
Fruto do coração,
Trocas de olhares
Pela magia da atração.
Simpatia é como ramos
Unidos, que aos poucos
Vão se entrelaçando
Pelas chamas da emoção.
Simpatia é um dom singelo
Fluente do nosso coração,
E nos proporciona conforto,
Bem estar e boa emoção.
Simpatia é pura afinidade,
É um toque de admiração
Que nos causa confiança
Pela sua própria reação.
Simpatia é quase amor,
Um envolvimento natural,
Cumplicidade, boas energias
Geradoras, é troca de atenção.
TERESA CRISTINA CERQUEIRA DE SOUSA (Piracuruca / PI)
A maçã
A menina tinha um lápis.
Um lápis cor de sangue.
Apenas um lápis na hora do recreio.
Mal se consegue ouvir o som do lápis no chão.
Eis, ali, num dia comum, súbito, uma maçã.
Uma maçã que logo amadurece.
Apenas uma maçã na calçada do pátio.
Ah, menina, você não pode comer essa maçã!
Fonte:
Câmara Brasileira dos Jovens Escritores. "Brasilidades / vol.3" - Edição Especial - Maio de 2012.
Câmara Brasileira dos Jovens Escritores. "Brasilidades / vol.3" - Edição Especial - Maio de 2012.
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