BERIMBAU
Os aguapés dos aguaçais
Nos igapós dos Japurás
Bolem, bolem, bolem.
Chama o saci: - Si si si si!
- Ui ui ui ui ui! uiva a iara
Nos aguaçais dos igapós
Dos Japurás e dos Purus.
A mameluca é uma maluca.
Saiu sozinha da maloca -
O boto bate - bite bite...
Quem ofendeu a mameluca?
- Foi o boto!
O Cussaruím bota quebrantos.
Nos aguaçais os aguapés
- Cruz, canhoto! -
Bolem... Peraus dos Japurás
De assombramentos e de
espantos!...
DEBUSSY
Para cá, para lá...
Para cá, para lá...
Um novelozinho de linha...
Para cá, para lá...
Para cá, para lá...
Oscila no ar pela mão de uma
criança
(Vem e vai...)
Que delicadamente e quase
adormecer o balança
- Psio... -
Para cá, para lá...
Para cá e...
- O novelozinho caiu.
O MENINO DOENTE
O menino dorme.
Para que o menino
Durma sossegado,
Sentada a seu lado
A mãezinha canta:
- "Dodói, vai-te embora!"
"Deixa o meu filhinho."
"Dorme... dorme... meu..."
Morta de fadiga,
Ela adormeceu.
Então, no ombro dela,
Um vulto de santa,
Na mesma cantiga,
Na mesma voz dela,
Se debruça e canta:
- "Dorme, meu amor."
"Dorme, meu benzinho..."
E o menino dorme.
NA RUA DO SABÃO
Cai cai balão
Cai cai balão
Na Rua do Sabão!
O que custou arranjar aquele
balãozinho de papel!
Quem fez foi o filho da
lavadeira.
Um que trabalha na composição
do jornal e tosse muito.
Comprou o papel de seda,
cortou-o com amor, compôs os
gomos oblongos...
Depois ajustou o morrão de pez
ao bocal de arame.
Ei-lo agora que sobe - pequena
coisa tocante na escuridão do
céu.
Levou tempo para criar fôlego.
Bambeava, tremia todo e mudava
de cor.
A molecada da Rua do Sabão
Gritava com maldade:
Cai cai balão!
¨
Subitamente, porém, entesou,
enfunou-se e arrancou das
mãos que o tenteavam.
E foi subindo...
para longe...
serenamente...
Como se o enchesse o soprinho
tísico do José.
Cai cai balão!
A molecada salteou-o com
atiradeiras
assobios
apupos
pedradas.
Cai cai balão!
Um senhor advertiu que os
balões são proibidos pelas
posturas municipais.
¨
Ele foi subindo...
muito serenamente...
para muito longe...
Não caiu na Rua do Sabão.
Caiu muito longe... Caiu no
mar - nas águas puras do
mar alto.
BALÕEZINHOS
Na feira-livre do arrabaldezinho
Um homem loquaz apregoa
balõezinhos de cor:
- "O melhor divertimento para as
crianças!"
Em redor dele há um ajuntamento
de menininhos pobres,
Fitando com olhos muito redondos
os grandes balõezinhos muito
redondos.
No entanto a feira burburinha.
Vão chegando as burguesinhas
pobres,
E as criadas das burguesinhas
ricas,
E mulheres do povo, e as
lavadeiras da redondeza.
Nas bancas de peixe,
Nas barraquinhas de cereais,
Junto às cestas de hortaliças
O tostão é regateado com
acrimônia.
Os meninos pobres não vêem as
ervilhas tenras,
Os tomatinhos vermelhos,
Nem as frutas,
Nem nada.
Sente-se bem que para eles ali
na feira os balõezinhos de cor
são a única mercadoria útil e
verdadeiramente indispensável.
O vendedor infatigável apregoa:
- "O melhor divertimento para
as crianças!"
E em torno do homem loquaz os
menininhos pobres fazem um
círculo inamovível de desejo
e espanto.
PENSÃO FAMILIAR
Jardim da pensãozinha burguesa.
Gatos espaçados ao sol.
A tiririca sitia os canteiros
chatos.
O sol acaba de crestar as
boninas que murcharam.
Os girassóis
amarelos!
resistem.
E as dálias, rechonchudas,
plebéias, dominicais.
Um gatinho faz pipi.
Com gestos de garçom de
“restaurant-Palace”
Encobre cuidadosamente a
mijadinha.
Sai vibrando com elegância a
patinha direita:
- É a única criatura fina na
pensãozinha burguesa.
PORQUINHO-DA-ÍNDIA
Quando eu tinha seis anos
Ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração me dava.
Porque o bichinho só queria
estar debaixo do fogão!
Levava ele pra sala
Pra os lugares mais bonitos
mais limpinhos
Ele não gostava;
Queria era estar debaixo do
fogão.
Não fazia caso nenhum das
minhas ternurinhas...
- O meu porquinho-da-índia foi
a minha primeira namorada.
Fonte:
Meus primeiros versos, - Rio de Janeiro : Nova Fronteira, 2001 (Literatura em minha casa). Volume 4 (Cecília Meireles; Manuel Bandeira ; Roseana Murray)
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