quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Soares de Passos (Imitação do Islandês)

Um dia eu te dizia: – se roubada
Me fores, vem buscar-me – e tu não crias
Que eu pudesse abraçar-te inanimada,
Beijar teus olhos, tuas mãos já frias.

Mas eu não te amaria, se inconstante
Te pudesse esquecer na sepultura;
Desbotou-se o frescor de teu semblante,
Mas inda adoro tua imagem pura.

Apagou-se em teus lábios o ar da vida,
Mas um sopro imortal veio animar-te;
E tu inda és formosa, inda és querida
Ao que na terra começou a amar-te.

Não me deixes em mísero abandono;
Escuta ao longe, escuta a minha prece:
Quando uma noite a viração do outono
Gemer em nossas rochas, aparece!

E se a lua brilhar, se de passagem
Me estenderes a mão d'etérea alvura,
Eu surgirei por ver a tua imagem,
Por ouvir tua voz serena e pura.

Depois, anjo celeste, no meu seio
Repousa a fronte, aperta-me em teus braços;
Deixa que eu te acompanhe sem receio,
Desta existência desatando os laços.

Sobre a aurora do pólo arrebatados
Vamos, no seio d'imortais venturas,
Em nuvens d'ouro e púrpura embalados,
Cantar, sonhar, dormir nessas alturas.

Fonte:
Poesias de Soares de Passos. 1858 (1ª ed. em 1856). http://groups.google.com/group/digitalsource

Nenhum comentário: