Ganhei um convite para uma noite de seresta neste carnaval. Olhei para ele com certo desinteresse, e disse para mim mesma: “não sei se vou participar, estou desanimada para este evento...” Agradeci, guardei-o em um dos departamentos da minha bolsa. Nela tem de tudo, bolsa de mulher é assim, todo mundo conhece.
O dia passou, fiz mil e uma coisas, mas principalmente dei prioridade à leitura; estou lendo um livro interessantíssimo. Devo policiar-me para não me deixar envolver demais e respeitar o horário para dormir o suficiente, pois o amanhã espera por mim. Será um dia bem recheado.
Sexta-feira, dia do baile seresteiro. Abro a bolsa, tiro o convite e coloco-o bem à vista na estante. Sigo o meu ritual de todas as manhãs, café e oferecimento do dia. Saio cedo de casa com a minha preciosa bolsinha branca, na qual carrego a Sagrada Comunhão para ser levada em domicílio aos doentes da paróquia. Hoje, dia especial, primeira sexta-feira do mês. Para quem tem Fé é dia de indulgência, dia para pedir misericórdia ao Sagrado Coração de Jesus.
Terminada a celebração da Santa Missa, lentamente subo os degraus do altar e o ministro extraordinário, depois de cumprimentar-me, pergunta: "Quantas"? Eu respondo com um leve sorriso: "Cinco, Sr. Lino, obrigada e um bom dia". - Ele, com muita calma coloca as hóstias consagradas na minha pequena "teca" dourada contando-as com muita atenção.
Devagar, com compostura, saio da igreja levando no colo o meu sagrado tesouro, louvando o SS. Sacramento com o coração. Ciente da grande responsabilidade a qual fui chamada. Sou eu por inteiro, presente naquilo que estou praticando. Executo esta tarefa com muito amor. Começo assim meu roteiro espiritual.
Em cada casa que visito são as mesmas orações pelo doente que me espera com devoção. Procuro sempre criar um clima de conforto, esperança e coragem, pois estou à frente do mistério da doença talvez devida ao envelhecimento.
No desenrolar das horas, caiu a tarde. O convite na estante espera por uma resposta. Ainda estou na dúvida, mas afinal decido pelo sim. Vou acordar aquela outra Elisa, um pouco adormecida, mas alegre e descontraída. Abro o guarda-roupa, e já invento minha fantasia: vai ser discreto, conjunto preto, é só jogar uma blusa bem florida por cima dele. Pronto! Chegando lá ponho o colar florido de carnaval… Olho-me no espelho: ficou bom, aliás, ótimo!
Assim, envolvida pela alegria contagiante das colegas, caio no samba e marchinhas antigas. Pulo, brinco alegremente, nem vejo o tempo passar.
Volto para casa cansada e feliz. Olho-me no espelho e converso comigo mesma: Amém! O meu dia passou. Valeu a pena... A alegria alivia as tensões, sinto-me leve e feliz. Afinal nada mudou. Continuo sendo eu mesma. Os diferentes papéis que a vida me oferece não mudam o meu interior, o meu jeito de ser.
Este é meu "auto-retrato". Afinal é muito bom ser autêntica em cada circunstância.
Fonte:
Elisa Alderani. Flores do meu jardim – Fiori del mio giardino. Edição bilingue. Ribeirão Preto/SP: Legis Summa, 2008.
Livro enviado pela autora.
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