quarta-feira, 10 de julho de 2024

Recordando Velhas Canções (Conversa de Botequim)


Compositores: Noel Rosa e Vadico

Seu garçom faça o favor de me trazer depressa
Uma boa média que não seja requentada
Um pão bem quente com manteiga à beça
Um guardanapo      e um copo d'água bem gelada
Feche a porta da direita com muito cuidado
Que eu não estou disposto a ficar exposto ao sol
Vá perguntar ao seu freguês do lado
Qual foi o resultado do futebol

Se você ficar limpando a mesa
     Não me levanto nem pago a despesa
Vá pedir ao seu patrão                  
Uma caneta, um tinteiro,
Um envelope e um cartão,
Não se esqueça de me dar palitos 
E um cigarro pra espantar mosquitos 
Vá dizer ao charuteiro
Que me empreste umas revistas,
Um isqueiro e um cinzeiro

Seu garçom faça o favor de me trazer depressa...
Telefone ao menos uma vez
Para três quatro quatro três três três 
E ordene ao seu Osório
Que me mande um guarda-chuva
Aqui pro nosso escritório

Seu garçom me empresta algum dinheiro
Que eu deixei o meu com o  bicheiro,
Vá dizer ao seu gerente
Que pendure esta despesa
No cabide ali em frente

Seu garçom faça o favor de me trazer depressa
Uma boa média que não seja requentada
Um pão bem quente com manteiga à beça
Um guardanapo e um copo d'água bem gelada
Feche a porta da direita com muito cuidado
Que eu não estou disposto a ficar exposto ao sol
Vá perguntar ao seu freguês do lado
Qual foi o resultado do futebol
* * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * * *
A Crônica Musical do Cotidiano de Noel Rosa
A música "Conversa de Botequim" de Noel Rosa é uma crônica cantada que retrata o cotidiano dos botequins do Rio de Janeiro na década de 1930. A letra descreve um cliente fazendo uma série de pedidos ao garçom, que vão desde uma refeição simples até favores pessoais, como emprestar dinheiro e objetos. Através de uma narrativa humorística e irônica, Noel Rosa critica sutilmente a sociedade da época, expondo a malandragem e a esperteza do carioca comum.

Noel Rosa, conhecido por sua habilidade em compor sambas com letras inteligentes e cheias de duplo sentido, utiliza a figura do garçom como um ouvinte passivo para suas demandas, que são ao mesmo tempo triviais e absurdas. A música também reflete a informalidade das relações sociais nos botequins, onde tudo parece ser possível. Além disso, a canção destaca a cultura do futebol e do jogo do bicho, elementos fortemente enraizados no Rio de Janeiro daquela época.

"Conversa de Botequim" é uma obra que, além de entreter, serve como um documento histórico e cultural. Ela nos permite vislumbrar o estilo de vida e os hábitos dos cariocas nos anos 30, bem como a atmosfera dos botequins, que eram pontos de encontro e socialização importantes naquela sociedade.

Não existe em nossa música popular crônica mais espirituosa sobre uma cena do cotidiano que a realizada por Noel Rosa em "Conversa de Botequim". Localizada em um café, ambiente que o autor conhecia como ninguém, a crônica tem como personagem principal um freguês desabusado que, ao preço de uma simples média com pão e manteiga, acha-se no direito de agir como se estivesse em sua casa.

Assim, em ordens sucessivas, ele exige do garçom atendimento rápido e eficiente : "Seu garçom faça o favor / de me trazer depressa / uma boa média que não seja requentada/ um pão bem quente com manteiga à beça / um guardanapo / um copo d'água bem gelada..." -, que inclui ainda o fornecimento de "caneta, tinteiro, envelope, cartão, cigarro, isqueiro, cinzeiro, revistas, o resultado do futebol" e até "o empréstimo de algum dinheiro", pois deixara o seu com o bicheiro.

Tudo isso fiado, pois, para terminar, o sujeito ordena: "Vá dizer ao seu gerente / que pendure essa despesa / no cabide ali em frente". Completa esta obra-prima uma melodia sincopada de Vadico, que se casa com a letra de forma primorosa, como se as duas tivessem sido feitas ao mesmo tempo, por uma mesma pessoa. Noel Rosa é o melhor intérprete de "Conversa de Botequim", uma de suas composições mais gravadas. No seu jeito simples de cantar, ele "diz" a letra com a naturalidade com que um malandro daria todas aquelas ordens a um garçom de botequim.

Fontes:

segunda-feira, 8 de julho de 2024

A. A. de Assis (Jardim de Trovas) 50

 

Newton Sampaio (Desencanto de gente rústica)

Para quem viesse lá das bandas do Laranjinha, com destino à ponta da estrada de ferro, a fazendola de Seu Euzébio das Neves representava um verdadeiro achado naquela zona quase desabitada do sertão paranaense.

Depois de cavalgar horas e horas, suportando o inferno da soleira danada, e vencendo quilômetros e mais quilômetros sem encontrar sequer um ranchinho de caboclo, o viajante, por acostumado que fosse, não podia disfarçar nunca uma ruidosa manifestação de alegria ao ver repontar, no fundo azulado do Pico Agudo, o casarão branco onde morava o generoso Euzébio das Neves. E, pondo no “arre! Até que enfim!” usual todo o desabafo da cansativa, transpunha a porteira entoando mil “graças a Deus” à santa ideia do sertanejo pacato em estabelecer-se por aquelas alturas.

Muita razão tinham, na verdade, os caminhantes em desejar atingir, com tanto ardor, aquele ponto da estrada. Pois, a qualquer hora e em qualquer dia, a casa de Euzébio das Neves recebia a todos com a maior boa vontade, dispensando sempre uma cativante acolhida.

Cama fofa para pouso, se preciso, mesa farta de pitéus simples, mas cheios de sabor e de sustância, palestra agradável, tudo isso era ali encontrado e cedido despretensiosamente a quem passasse. 

Euzébio das Neves era mineiro de nascimento. E, vivendo embora, havia muitos anos, longe do Coroaci inesquecível, jamais perdera aquele jeito hospitaleiro que distingue, que faz estima ao povo das Alterosas.

Sua fama, por isso, corria de boca em boca, naquele pedaço do nordeste paranaense. E era mesmo um gosto a gente aportar à fazendola onde o Seu Euzébio fazia a vida engordando porcos, revolvendo a terra e passava os dias rodeado pelo carinho da mulher e dos filhos.

Num sábado que fora cheio de sol e fora cheio de serviço (o sol já ia mergulhando atrás do Pico Agudo, e o serviço, lá pelas cinco horas fora posto de banda) — num sábado como qualquer outro, a porteira da frente gemeu preguiçosa para deixar passar um cavalo resfolegante e um guapo cavaleiro.

O cavaleiro era Lauzinho, filho do compadre Cornélio. E o cavalo era zaino do mesmo compadre Cornélio. Esse Lauzinho não tinha mais que vinte e três anos. E acusavase, logo à primeira vista, com o tipo do rapagão nascido e criado no sertão. O mundo, para ele, não precisava ir além da ponta da linha de ferro em Barra Bonita (embora, já uma vez, tivesse praticado a violência de chegar até Tomazina, a cabeça da comarca), podia-se resumir na menina de Seu Euzébio — a Maria Rosa — por causa de quem, todo sábado, depois do meio-dia, punha uma roupa melhor, encilhava o zaino, e enveredava pelas estradas ásperas, sob o sol bárbaro.

Seu costume era pousar na fazendola do Euzébio, e só no domingo, de noitinha, retomar o caminho de casa, disposto às lidas da semana, e lavando no coração o alvoroço de uma grande saudade, e nos olhos a imagem sedutora da caboclinha querida.

Maria Rosa representava tudo para Lauzinho, que nunca se afeiçoara a outra moça, e, mesmo, não queria saber de outros amores. 

Uma vez que fora fazer compras em Barra Bonita, uma sirigaita qualquer, de vestidinho curto e beiços vermelhos, tentara, muito sinsinhora, namoricar o coitado do sertanejo. Lauzinho, porém, não quisera saber de histórias. E quando, no sábado seguinte, foi visitar a Maria Rosa, achou-a mais amorável que nunca, na pureza sem par de seus dezoito anos, e no encanto inigualável de sua timidez inata.

Tudo para Lauzinho se resumia em Maria Rosa. Por causa dela vivia a mourejar, de sol a sol, em um promissor pedaço de chão. Por causa dela vinha, toda semana, nem que chovesse canivete, até o casarão branco do Euzébio das Neves gozar algumas horas de convívio com a deusinha de seus sonhos rústicos. E Maria Rosa bem que merecia tudo isso. Seus olhos eram tão bonitos... E seu amor parecia tão grande, tão do fundo do coração...

Naquele sábado Lauzinho chegara mais cedo que de costume. O sol só mostrava um pedaço de sua rodela vermelha, e as primeiras sombras da noite iam avançando, já longas e invencíveis, a leste do Pico Agudo, como que abençoando a faina árdua dos sertanejos valorosos. Estivera percorrendo trechos do terreno de um compadre do pai e, em compensação, trazia no peito mais floridas esperanças de logo conseguir o necessário para o casamento.

Maria Rosa recebeu-o com os mesmos olhos de sempre. Lauzinho não fazia nada por mal. Em nada, portanto, havia razão de zanga.

Um dia, as portas do casarão branco abriram-se para receber um tal de Dr. Ernesto, um engenheiro que andava estudando a região.

O trato do velho Euzébio cativou-o. E como tivesse de permanecer algum tempo naquelas bandas, aceitou a hospitalidade que lhe era oferecida.

— Mas, senhor Euzébio. Creio que o vou cansar com tanta amolação. O meu serviço é um pouco demorado...

— Que nada, seu doutor! A casa de caboclo pobre é rica de bondade. Tudo aqui é seu. Faz de conta que o Dr. Ernesto é agora de minha familiagem. Depois... O que é mais uma concha de feijão na panela. Graças a Deus e a Nossa Senhora da Aparecida, as coisas vão melhorando...

— Fico-lhe muito grato, senhor Euzébio. Quando houver oportunidade, retribuirei seus favores.

— Nem é preciso, doutor. Nem é preciso.

O doutor não pôde ficar indiferente aos encantos caboclos de Maria Rosa. A sertanejinha, no atravessar dos seus dezoito anos banais, estava no auge da floração do sexo.

Beleza espontânea, beleza sem artifícios, beleza que surgira e se aprimorara aos raios de todos os sóis, à umidade de todas as chuvas, ao contato de todo o oxigênio puro do sertão, ao descanso de todas as noites longas e calmas, ao gozo de uma vida sem maiores sensações do que pular da cama às cinco, receber no dorso macio as águas da cachoeirinha, trabalhar numa coisa e noutra, esperar o sábado e a vinda do Lauzinho; beleza amiga da natureza e cheia de castidade, Maria Rosa não tinha conhecimentos das armas irresistíveis que possuía para incendiar o coração dos homens e prendê-los nas malhas das paixões perdidas. Por isso, não levava a mal os olhares do engenheiro quando, de manhãzinha, lhe servia o café. Por isso, não via nas gentilezas extremadas mais do que uma gratidão ao bom acolhimento do pai. 

Insone no leito fofo, o Dr. Ernesto revolvia-se, nervoso:

— Diabo de garota dinamite. E vá um pobre diabo ficar à vontade perto de um abismo destes.

No entanto, era preciso respeitar a casa do velho mineiro. Era preciso.

Certa vez — a vida gosta mesmo de jejuar com a gente, — certa vez, o engenheiro se viu a sós com Maria Rosa. O fogo do sol que lhe escaldara o sangue durante o dia, no meio do mato, deixara fagulhas nas veias. E disse da paixão que lhe andava no peito. E disse das seduções daquelas carnes magníficas. E disse da quebradeira que punha n’alma aquele olhar indefinível...

Maria Rosa, vermelhinha, vermelhinha, libertou as mãos e saiu correndo para o quarto, com o coração aos pulos. Viu-se em frente ao espelho de moldura feia que havia perto da cama da mãe. E só então começou a notar as linhas de seu corpo. E só então o sexo lhe bradou barbaramente do fundo das entranhas.

Quando Lauzinho apeou do cavalo, deu logo de frente com aquele rapaz de terno de casimira, bonito e passadinho, mal pôde disfarçar o enfado. Tinha um rancor invencível aos moços da cidade. Ainda mais no casarão branco do Seu Euzébio das Neves. Durante o domingo, causaram-lhe um aborrecimento imenso as maneiras gentis do doutor. E, pela primeira vez, voltou profundamente triste, montado no zaino do compadre Cornélio, e dentro da noite linda que as estrelas tornavam admirável com seu piscar malicioso.

No sábado seguinte, Lauzinho empurrou a porteira preguiçosa lá pelas quatro horas, quando o sol ainda estava impiedoso. Desencilhou o zaino, passou as costas da mão pela testa salpicada de suor, e ficou esperando a Maria Rosa, que ainda estava no córrego.

Quando chegou, ela lhe deu um cumprimento muito diverso do que ele estava acostumado a receber. A moçoila pareceu-lhe diferente, sem aquele olhar que demonstrava um amor muito sincero, muito do fundo do coração.

— Uai! Maria Rosa. Você parece que não ‘tava com saudade da gente...’

— Saudade? Como não? É que nem todo o dia tem pão quente. Não é toda a vez que eu posso estar aí, mostrando os dentes procê...

O engenheiro vinha chegando. Maria Rosa correu para dentro. E voltou depois com um vestido bonito, com o cabelo muito penteadinho, e até (pareceu a Lauzinho), e até de pintura no rosto.
O domingo foi insuportável. O moço sertanejo tinha ímpetos de esganar o tal Doutor Ernesto. Pois ele é que viera deixar indiferente a Maria Rosa, a deusinha de seus sonhos rústicos.

Ferido em seus brios, Lauzinho amarfanhou no coração o desejo de ser feliz um dia. E a sua despedida foi a coisa mais seca deste mundo. Tanto que saiu mais cedo do que de costume.

Quando a porteira gemeu preguiçosamente para deixar passar, pela última vez, um cavalo e um cavaleiro (o cavalo era o zaino do compadre Cornélio e o cavaleiro era o filho do mesmo compadre Cornélio) — o sol só mostrava um pedaço da rodela vermelha. E as primeiras sombras da noite iam avançando já, longas e invencíveis, a leste do Pico Agudo, como que amortalhando o desencanto que punha luto no coração do Lauzinho.

E o cavalo e o cavaleiro enveredaram pela estrada deserta, que leva pras bandas do Laranjinha, enquanto, lá no céu, as estrelas punham malícia no jeito de piscar...

Fonte> Newton Sampaio. Ficções. Secretaria de Estado da Cultura: Biblioteca Pública do Paraná, 2014. Disponível em Domínio Público.

Recordando Velhas Canções (A jangada voltou só)


Compositor: Dorival Caymmi

A jangada saiu
Com Chico Ferreira e Bento
A jangada voltou só
Com certeza foi lá fora, 
algum pé de vento
A jangada voltou só...

Chico era o boi do rancho
Nas festa de Natá
Chico era o boi do rancho
Nas festa de Natá
Não se ensaiava o rancho
Sem com Chico se contá
E agora que não tem Chico
Que graça é que pode ter
Se Chico foi na jangada...
E a jangada voltou só... 
a jangada saiu
Com Chico Ferreira e Bento
A jangada voltou só
Com certeza foi lá fora, 
algum pé de vento
A jangada voltou só...

Bento cantando modas 
Muita figura fez
Bento tinha bom peito
E pra cantar não tinha vez
Bento cantando modas 
Muita figura fez
Bento tinha bom peito
E pra cantar não tinha vez

As moça de Jaguaripe
Choraram de fazê dó
Seu Bento foi na jangada
E a jangada voltou só
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A Tragédia do Mar em 'A Jangada Voltou Só' de Dorival Caymmi
A música 'A Jangada Voltou Só', de Dorival Caymmi, é uma narrativa poética e melancólica que retrata a tragédia de pescadores que não retornam do mar. A letra começa descrevendo a partida da jangada com Chico Ferreira e Bento, dois personagens que simbolizam a vida e a cultura local. A repetição da frase 'A jangada voltou só' enfatiza a tragédia e a perda, sugerindo que algo terrível aconteceu durante a viagem.

Dorival Caymmi, conhecido por suas canções que exaltam a vida dos pescadores e a cultura baiana, utiliza essa música para abordar a imprevisibilidade e os perigos do mar. A menção a 'algum pé de vento' indica que uma tempestade ou um evento climático adverso pode ter sido a causa do desaparecimento dos pescadores. A música também destaca a importância de Chico e Bento na comunidade, mencionando suas contribuições nas festas e na vida social, o que torna a perda ainda mais dolorosa para os habitantes de Jaguaripe.

A canção é uma homenagem àqueles que vivem do mar e enfrentam seus perigos diariamente. A tristeza e o luto são palpáveis na letra, especialmente quando se menciona que as moças de Jaguaripe choraram pela perda de Bento. A música é um retrato fiel da realidade de muitas comunidades pesqueiras, onde a ausência de um ente querido é uma constante lembrança dos riscos associados à profissão. Caymmi, com sua habilidade lírica, consegue transmitir a dor e a saudade de forma profunda e comovente, fazendo com que o ouvinte sinta a tragédia como se fosse parte da comunidade retratada na canção. (https://www.letras.mus.br/dorival-caymmi/45572/)

domingo, 7 de julho de 2024

Vanice Zimerman (Tela de versos) 40

 

Laé de Souza (Carnaval, nunca mais)

De uns tempos para cá, vinha me recusando a aceitar o carnaval como festa de gente. Gente de bem, quero dizer.

Se no dia-a-dia já está uma esculhambação, imaginem então se no carnaval a coisa não vai ficar como o diabo gosta, plagiando o discutido anúncio da cerveja. Qual o indivíduo que aguenta tanta insinuação e estímulo ao apetite sexual sem se revoltar? Difícil encontrar um programa de televisão que não tenha uma dançarina quase pelada. Coisa horrível.

Foi por tudo isso e apontando o porquê, que no carnaval do ano passado, falei para a minha mulher que queria isolamento. Claro que ela reclamou. Disse que tinha planejado viajarmos para o litoral, como todos os anos. Que tinha combinado com amigos de irmos para o clube, reservado mesa. Quando expliquei que o isolamento, era isolamento mesmo, isto é, eu iria ficar sozinho, longe de todo mundo e só em orações, ela se assustou. Minha mulher, é assim, só pensa em festa, diversão, Ela me sugeriu que fossemos para a praia e eu ficasse no quarto dos fundos rezando. 

Veja se tem cabimento. Quem consegue se concentrar e pensar em Deus, sabendo que lá fora rola bebida e cantoria. Não ia dar certo. O que eu queria, mesmo, era ficar longe de tudo e todos, sem uma viva alma, só eu e Deus. 

"Comprei mantimentos e, amanhã cedo, vou tomar um ônibus qualquer, descer no meio da estrada e entrar no meio do mato, Andar até achar um lugar adequado para me purificar", falei, querendo encerrar o assunto.

Não é que a mulher veio com conversas, de que era bobagem e exagero? Pois bem, precisei arrastá-la para um canto e abrir o jogo: "Tu lembra daquele meu caso com aquela fulana? Pois é, tu me perdoou, mas eu não. Preciso me penitenciar e vai ser agora." 

Ela chamou a minha sogra, achando que era mais uma recaída de loucura. E sempre assim. Quando a gente quer pensar alto, se dedicar ao espírito, acham que a gente endoideceu.

Minha sogra veio. Vocês devem saber muito bem como são as sogras. Cochichou que eu estava querendo aprontar alguma. Ameaçou me prender no quarto e me obrigar a fazer a oração lá, durante o tempo que quisesse.

Claro que não aguentei e ameacei: "Se alguém tocar a mão em mim, perco a cabeça." Peguei minha Bíblia, coloquei na sacola, me benzi e falei: 'Afasta tentação." 

Viram que estava muito contrito e que não tinha jeito. De manhã cedinho catei minhas coisas e fui embora.

Na quarta, por volta do meio dia, cheguei assonorentado. Minha mulher me serviu um café e perguntou se eu tinha rezado muito. "Demais", respondi.

"Leu a Bíblia?" perguntou interessada. 

"Li e reli", falei. 

Ela retirou a Bíblia da minha sacola, me entregou nas mãos, pedindo que eu lesse um salmo. Tentei abrir e qual nada. Uma folha colada na outra, como se fosse um bloco só. Me veio no pensamento o diabo de um lado e minha sogra do outro, os dois rindo a valer. Só podia ser coisa dos dois. Por mais que eu dissesse que cerca de meia hora atrás eu estava folheando o santo livro, minha mulher não quis acreditar.

Saiba, amigo, que os mais fervorosos são expostos a maiores provações. Se em dias normais o diabo já faz das suas, imagine no carnaval. Portanto, tenho comigo que carnaval é o dia em que ele mais apronta.

Ontem minha sogra perguntou se eu iria me isolar de novo. 

Respondi seco: "No carnaval, nunca mais.

Enquanto entrava no quarto, ouvi-a dando uma risadinha sarcástica,

Fonte: Laé de Souza. Acredite se quiser. SP: Ecoarte, 2000. Enviado pelo autor.

Recordando Velhas Canções (Luar do Sertão)


Compositor: Catulo da Paixão Cearense

Ah, que saudade
Do luar da minha terra
Lá na serra branquejando
Folhas secas pelo chão
Este luar cá da cidade tão escuro
Não tem aquela saudade
Do luar lá do sertão

Não há, oh gente, oh não
Luar como este do sertão
Não há, oh gente, oh não
Luar como este do sertão

A lua nasce
Por detrás da verde mata
Mais parece um sol de prata
Prateando a escuridão
E a gente pega na viola que ponteia
E a canção é a lua cheia
A nos nascer no coração

Não há, oh gente, oh não
Luar como este do sertão
Não há, oh gente, oh não
Luar como este do sertão

A gente fria
Desta terra sem poesia
Não se importa com esta lua
Nem faz caso do luar
Enquanto a onça
Lá na verde da capoeira
Leva uma hora inteira
Vendo a lua derivar

Não há, oh gente, oh não
Luar como este do sertão
Não há, oh gente, oh não
Luar como este do sertão

Coisa mais bela
Neste mundo não existe
Do que ouvir-se um galo triste
No sertão se faz luar
Parece até que alma da lua
É que descansa escondida na garganta
Desse galo a soluçar

Não há, oh gente, oh não
Luar como este do sertão
Não há, oh gente, oh não
Luar como este do sertão

Ai quem me dera
Que eu morresse lá na serra
Abraçado à minha terra
E dormindo de uma vez
Ser enterrado numa cova pequenina
Onde à tarde a sururina
Chora a sua viuvez

Não há, oh gente, oh não
Luar como este do sertão
Não há, oh gente, oh não
Luar como este do sertão
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Saudades do Luar Sertanejo 
A música 'Luar do Sertão', composta por Catulo da Paixão Cearense, é uma expressão lírica da nostalgia e do amor profundo pelas raízes sertanejas do autor. Através de sua poesia, Catulo evoca a beleza e a simplicidade do sertão, contrastando-a com a vida na cidade, que ele percebe como carente de poesia e beleza natural.

O refrão 'Não há, oh gente, oh não, Luar como este do sertão' serve como um estribilho que reforça a ideia central da música: a incomparabilidade do luar no sertão em relação a qualquer outro lugar. Essa repetição não apenas enfatiza a saudade sentida pelo poeta, mas também celebra as características únicas do sertão, como a lua que nasce por detrás da mata e o som melancólico de um galo ao luar. A descrição sensorial rica transforma a paisagem sertaneja em um personagem vivo na letra da música.

Além disso, a música toca em temas de morte e eternidade, especialmente no último verso onde o autor expressa o desejo de morrer no sertão, abraçado à sua terra. Isso reflete não apenas um desejo de retorno às origens, mas também uma busca por paz final na terra que ele tanto ama. Através dessa música, Catulo da Paixão Cearense não apenas compartilha sua saudade, mas também imortaliza a cultura e o ambiente do sertão brasileiro em sua obra.

A toada "Luar do Sertão" é um dos maiores sucessos de nossa música popular em todos os tempos. Fácil de cantar, está na memória de cada brasileiro, até dos que não se interessam por música. Como a maioria das canções que fazem apologia da vida campestre, encanta principalmente pela ingenuidade dos versos e simplicidade da melodia. Embora tenha defendido com veemência pela vida afora sua condição de autor único de "Luar do Sertão", Catulo da Paixão Cearense deve ser apenas o autor da letra.

A melodia seria de João Pernambuco ou, mais provavelmente, de um anônimo, tratando-se assim de um tema folclórico - o côco "É do Maitá" ou "Meu Engenho é do Humaitá" -, recolhido e modificado pelo violonista. Este côco integrava seu repertório e teria sido por ele transmitido a Catulo, como tantos outros temas. Pelo menos, isso é o que se deduz dos depoimentos de personalidades como Heitor Villa-Lobos, Mozart de Araújo, Sílvio Salema e Benjamin de Oliveira, publicados por Almirante no livro No tempo de Noel Rosa.

Há ainda a favor da versão do aproveitamento de tema popular, uma declaração do próprio Catulo (em entrevista a Joel Silveira) que diz: "Compus o Luar do Sertão ouvindo uma melodia antiga (...) cujo estribilho era assim: 'É do Maitá! É do Maitá"'. A propósito, conta o historiador Ary Vasconcelos (em Panorama da música popular brasileira na belle époque) que teve a oportunidade de ouvir "Luperce Miranda tocar ao bandolim duas versões do 'É do Maitá': a original e 'outra modificada por João Pernambuco', esta realmente muito parecida com Luar do sertão".

Homem humilde, quase analfabeto, sem muita noção do que representavam os direitos de uma música célebre, João Pernambuco teve dois defensores ilustres - Heitor Villa-Lobos e Henrique Foreis Domingues, o Almirante - que, se não conseguiram o reconhecimento judicial de sua condição de autor de Luar do Sertão, pelo menos deram credibilidade à reivindicação. Ainda do mesmo Almirante foi a iniciativa de tornar o Luar do Sertão prefixo musical da Rádio Nacional do Rio de Janeiro, a partir de 1939.

Fontes:

sábado, 6 de julho de 2024

José Feldman (Analecto de Trivões) 33

 

Arthur Thomaz (Surpresos)

As cenas a seguir transcorrem em um pequeno restaurante no centro de uma capital brasileira.

Ruth, Celso, Roberta e Aleixo, em uma mesa no canto do recinto, surpresos, sem terem a mínima noção de como vieram parar ali.

No sentido de que nossos milhares de leitores não se percam no enredo, vamos explanar quem são as quatro atônitas personagens.

Ruth, cuja família aristocrática iniciou seu declínio financeiro e social na queda do Império, era concursada na Secretaria de Segurança, no cargo de policial datiloscopista.

Celso, médico urologista, considerado excêntrico pelos seus colegas no hospital, era um tanto sonhador, e nas horas vagas, um inventor.

Roberta, uma bela mulher, formada em Psicologia, mas que optara pela maternidade, passando os dias a bronzear-se nas piscinas do luxuoso condomínio em que vivia.

Aleixo, por sua vez, era desembargador de algum alto tribunal de justiça.

Surpresos, sem atinarem por qual razão estavam ali sentados, sem sequer se conhecerem, permaneciam calados, entreolhando-se.

Aleixo, acostumado a falar em tribunais, tentou iniciar uma aproximação, logo rechaçada por Roberta, irritada por estar perdendo tempo de bronzeamento em sua piscina.

Mais alguns minutos de silêncio, quando Ruth, já pensando na cena de ciúme de seu marido, ao descobrir que ela não estava na repartição, assumiu o controle da situação, colocando sua arma sobre a mesa e ordenando que todos se apresentassem imediatamente.

Celso, pouco acostumado a ver armas, lívido, balbuciou seu nome e profissão.

Aleixo citou artigos dos códigos penais relativos à exibição de armas em público, sendo ignorado por Ruth, que ainda mandou-o sentar e apresentar-se logo.

Em seguida, Roberta mostrou, trêmula, seus documentos apontando sua condição de psicóloga e socialite, ouvindo deboches dos presentes.

Celso, em determinado momento, timidamente, arriscou-se a aventar a hipótese de estarem mortos.

Ruth, “delicadamente”, deu-lhe um tremendo beliscão. O grito de dor serviu de resposta à tola manifestação do rapaz.

Roberta foi até a janela do recinto, e ao olhar para fora, deparou-se com um tenebroso vazio.

Celso, cada vez mais lívido, tirou do bolso uma caixa de remédios tarja preta, que costumava tomar nas horas de pânico e ofereceu a cada um, o que prontamente foi aceito por todos.

Aleixo foi até o telefone no balcão e ligou para sua assessora. As palavras estranhamente perdiam-se no ar, nunca chegando à interlocutora.

Celso, por ser um inventor e cultuar hábitos exóticos, lembrou que ensinara sua secretária do consultório a ler sinais de fumaça, como os indígenas americanos. Propôs ao grupo fazer uma fogueira nos fundos do restaurante para enviar os sinais. Porém, ao tocar na maçaneta, ela transformou-se em gelatina. Voltou à mesa desalentado.

Ruth, por sua vez, lembrou das aulas que recebera na infância de seu tio-avô Zetho, Vice-Almirante da Armada Brasileira, e radioamador, que, pacientemente, lhe ensinara o Código Morse. Foi até a parede e tentou enviar uma mensagem, mas a parede amolecia ao toque de seus dedos, sem produzir nenhum som. Irritada, voltou à mesa e disparou um tiro para o alto, a fim de recuperar o controle da situação.

Do buraco causado pelo projétil no teto, começaram a cair, incessantemente, pétalas de rosas, que cobriram o grupo, e que por isso tiveram que mudar de mesa, para não serem soterrados.

Roberta, timidamente, sugeriu que tentassem sair pela porta principal.

Diante da obviedade da ideia, todos, ordeiramente, foram até ela, abriram e encontraram um salão idêntico ao que estavam.

Foram até a porta desse recinto e abriram. Novamente depararam-se com outro salão, idêntico ao que estavam.

E a seguir, outro, outro e outro…

Fonte: Arthur Thomaz. Leves contos ao léu: insondáveis. 1. ed. Santos/SP: Bueno Editora, 2024. Enviado pelo autor 

Recordando Velhas Canções (Risque)


Compositor: Ary Barroso

Risque …
meu nome do seu caderno
Pois não suporto o inferno
Do nosso amor fracassado

Deixe ...
que eu siga novos caminhos
Em busca de outros carinhos
Matemos nosso passado

Mas, se um dia, talvez, 
a saudade apertar
Não se perturbe, afogue a saudade
Nos copos de um bar

Creia...
toda a quimera se escoa
Como a brancura da espuma
Que se desmancha na areia
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = =  = = = = = = = = = = 

Despedidas e Recomeços
A música 'Risque', composta pelo renomado Ary Barroso, aborda temas profundos de despedida, desilusão amorosa e a busca por renovação emocional. Através de uma letra poética e carregada de emoção, o compositor expressa o desejo de encerrar um capítulo doloroso de sua vida amorosa, pedindo que seu nome seja removido do caderno da amada, simbolizando o fim de uma relação.

O uso da metáfora 'não suporto o inferno do nosso amor fracassado' intensifica a dor e o sofrimento causados pelo amor que não deu certo, destacando o tormento emocional vivido pelo eu lírico. A canção segue com o desejo de seguir novos caminhos e buscar novos carinhos, indicando uma tentativa de cura e de seguir em frente, apesar das memórias do passado que ainda podem ressurgir.

A parte final da música traz uma reflexão sobre a efemeridade dos sentimentos e das situações, comparando-os à espuma que se desmancha na areia. Ary Barroso usa essa imagem para sugerir que, assim como a espuma, os sentimentos intensos e até mesmo a saudade eventualmente se dissipam, permitindo que a vida continue. A recomendação para afogar a saudade em copos de um bar revela uma abordagem um tanto melancólica de lidar com a dor, típica de muitas canções de desamor.

Foi talvez para mostrar que sabia fazer samba-de-fossa tão bem quanto os especialistas - e, de quebra, faturar em cima da moda do momento que Ary Barroso compôs "Risque". Compôs e se deu bem, pois a música, lançada por Aurora Miranda em 52, firmou-se como um dos grandes sucessos do ano seguinte, na voz de Linda Batista.

Na realidade, porém, "Risque" não chega a alcançar o nível das melhores obras de Ary, limitando-se a repetir lugares comuns do gênero ( o "Inferno do amor fracassado", a "Saudade afogada nos copos de um bar"...), sobre uma melodia também comum. Muito mais interessante, pelo menos do ponto de vista melódico, é um outro samba-de-fossa de sua autoria, "Folha morta", lançado à mesma época com menor repercussão.

Fontes:

sexta-feira, 5 de julho de 2024

Therezinha Diguez Brisolla (Trov’ Humor) 33

 

Aparecido Raimundo de Souza (Como fiquei depois que você partiu)

CORRIA NO FIRMAMENTO um começo de tarde calmo de domingo. Olhei o relógio. Meio dia e quarenta. Eu me achava sentado num dos bancos da praça em frente ao prédio da prefeitura. Uma amenidade tranquila dessas que parecem carregar o peso da saudade e, em igual ensejo, o fardo da solidão, tudo assim, ao mesmo tempo, numa espécie de voragem sem precedentes. Mesmo instante, eu me indaguei: viria algo de bom para se comprazer com a felicidade?  

Apesar das horas, quase uma da tarde de um domingo abonançado, o silêncio em volta de tudo se fazia ensurdecedor: nenhuma pessoa passando ao largo, nenhum bando de moleques correndo atrás de uma bola, nenhum acontecimento marcante. Apenas o eco retumbante das lembranças. Foi nesse momento que me perguntei, assim do nada. Como foi que eu fiquei depois que você me deixou? Essa pergunta passou a ecoar em minha mente como um látego martirizante. 

Me lembrei da última vez em que nos vimos. Seus olhos brilhavam como um céu muito azul. Seu sorriso me dava a impressão de ser como um raio de sol que, de pronto, surgiu para aquecer meu coração despedaçado. E você, altiva, dona de si, caminhava com a leveza de uma pluma. Seguia a passos comedidos, como se dançasse ao som mavioso de uma música que ouvíamos no tempo em que éramos felizes. Do nada, me veio à cabeça uma ideia meio abestalhada, ou inteiramente despropositada e marota. 

Me perguntei, de chofre, como seria ser você? E o pior de tudo... veja que loucura! Me imaginei literalmente em seu lugar, tomando seu banho, depois me maquiando de frente para o espelho do quarto. Em seguida vestindo as suas roupas, calçando seus sapatos, olhando o mundo ao redor através dos seus sentidos. Seria tão otimista quanto você é? Teria as mesmas esperanças, os mesmos desejos, os medos e receios iguais

Afinal, que sensação acordar todas as manhãs com a sua mente, com seus pensamentos tresloucados borbulhando? Talvez, meu Deus, talvez eu me surpreendesse ou não, com a simplicidade das coisas que você sempre valorizou. E o que você agregava em reconhecer importante? O sorriso de um estranho, um bom dia de uma amiga, o cheiro da terra molhada pela chuva, o gosto de um café quente feito na hora... nós dois na mesa, as mãos dadas, saboreando o almoço caseiro, da mesa posta. 

Oxalá eu me apaixonasse pelas mesmas músicas que você, ou chorasse de tristeza quando algumas cenas românticas em nossos momentos assistindo televisão e comendo pipoca com refrigerante me lembrassem de coisas bobas e corriqueiras que em outros tempos me fizeram feliz? Também ao contrário, certamente haveriam os momentos difíceis e insuportáveis, notadamente nas noites em que você se pegava sozinha, abandonada, mesmo rodeada por pessoas amigas... nossa empregada, seus pais... será que aquele pranto invadiria meu rosto como uma chuva de lágrimas amargas? 

O dia em que as incertezas viessem me assombrar... eu tentaria como você, pôr fim à existência? Meu Pai Eterno, será que eu me perguntaria se estava no caminho certo ou deveria procurar um atalho para alcançar outros destinos? Mesmo norte, eu sentiria as suas angústias, as suas alegrias, ou me perderia em um mar proceloso de dúvidas? Se de repente voltasse a ser eu novamente, num estalo, num estampido, como o espocar de um tiro disparado por uma arma ao acaso de alguém sem direção assassinando um infeliz na esquina da rua de nossa casa? 

Enfim, se me pegasse, como agora, sentado no banco da praça, em frente ao prédio da prefeitura, observando o mundo passar, a vida girando como um peão... nessa pequena troca ligeira de personalidade eu teria aprendido com você algo de aproveitável? Por outro lado, guardado um pouco da sua coragem, da sua Fé no futuro, na vida?  Por outro prisma, só para moldar o meu “faz de conta” questionaria se teria entendido um pouco mais sobre o que significa o ser humano, ou se, de fato, eu me veria um bocadinho, ou um tantinho assim como você, mais humano? Com todas essas indagações aflorando, voltei a olhar para o alto. 

Acredite. O céu estava do mesmo jeito. Quieto, calmo, na dele, talvez me vigiando, sei lá. Responda-me. Eu agradeceria por ter cruzado com você? Afinal de contas, creio piamente, somos todos – eu e você - somos todos um pouco de nós dois. Nessa troca meio que vertiginosa e esquisita, ou dito de forma mais clara, fugaz... nessa troca de personalidade e experiências momentâneas eu encontraria o que tanto busco depois que você partiu? 

O mais importante, o que, aliás, me intriga, o que me mata aos poucos, o que me consome a carne, os ossos, a alma, o coração: eu me depararia ou entenderia a verdadeira e real, ou, ainda, a nostálgica e imorredoura essência da vida?!  Não sei as respostas. É exatamente isso que me faz um ser desprezível. Um desgraçado sem o vislumbre mavioso de um porvir menos chato e odioso. 

Fonte: Texto enviado pelo autor

Recordando Velhas Canções (Cabecinha no ombro)


Compositor: Paulo Borges

Encosta a sua cabecinha no meu ombro e chora...
E conta logo suas mágoas todas para mim
Quem chora no meu ombro eu juro que não vai embora
Que não vai embora
Que não vai embora

Quem chora no meu ombro eu juro que não vai embora
Que não vai embora
Porque gosta de mim...

Amor, eu quero os seus carinhos, porquê, eu vivo tão sozinho
Não sei se a saudade fica ou se ela vai embora
Se ela vai embora
Se ela vai embora...
Não sei se a saudade fica ou se ela vai embora
Se ela vai embora
Se ela vai embora...

Encosta a sua cabecinha no meu ombro e chora
E conta logo suas mágoas todas para mim

Quem chora no meu ombro eu juro que não vai embora
Que não vai embora
Que não vai embora

Quem chora no meu ombro eu juro que não vai embora
No meu ombro chora,
Porque gosta de mim…
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O Aconchego do Ombro Amigo na Voz de Almir Sater
A música "Cabecinha No Ombro", é uma canção que evoca sentimentos de conforto, apoio e a necessidade humana de compartilhar as dores e as mágoas. A letra sugere um momento de intimidade e consolo, onde uma pessoa oferece seu ombro para que outra possa chorar e desabafar suas tristezas. A repetição da garantia de que quem chora no ombro do eu lírico não irá embora reforça a promessa de fidelidade e a presença constante em momentos difíceis.

Almir Sater, conhecido por sua habilidade com a viola caipira e por suas composições que frequentemente exploram temas rurais e sentimentais, aqui apresenta uma música que fala diretamente ao coração. A canção pode ser interpretada como uma metáfora para o apoio emocional que todos precisam em algum momento da vida, sugerindo que a partilha de sentimentos pode fortalecer laços e aliviar a solidão. A referência à saudade, um sentimento profundamente enraizado na cultura brasileira, adiciona uma camada de melancolia à música, ao mesmo tempo que oferece uma esperança de alívio através da conexão com o outro.

A simplicidade da composição e a repetição dos versos contribuem para a sensação de acolhimento e segurança que a música transmite. A mensagem é clara: a importância de estar lá para alguém, oferecendo um ombro para chorar e um ouvido para escutar, criando um refúgio seguro contra as adversidades da vida. "Cabecinha No Ombro" é um lembrete de que a presença e o carinho podem ser remédios poderosos para a alma.

Apenas um verso pitoresco (“Encosta a tua cabecinha no meu ombro e chora”), cantado sobre uma melodia simples, de fácil memorização, pode às vezes despertar a atenção e a simpatia do público. Isso aconteceu a “Cabecinha no Ombro”, sucesso em 1958, quando recebeu 14 gravações, inclusive três em castelhano, e em 1992, quando foi relançada na trilha sonora da telenovela “Pedra Sobre Pedra”.

O curioso é que classificada como rasqueado, um gênero sertanejo, “Cabecinha no Ombro” tem como autor um citadino, o carioca Paulo Borges, irmão do fundador do conjunto Anjos do Inferno, Oto Borges.

Fontes:

Arthur Thomaz (Lançamento do livro “Leves Romances ao Léu: Pedro Centauro”, em Campinas/SP)

 

Em 13 de julho (sábado), a partir das 12h, o escritor Arthur Thomaz lançará a obra “Leves Romances ao Léu: Pedro Centauro” no Napses Habilitação Intensiva, em Campinas, no interior de São Paulo, pela Bueno Editora.

É um romance que valoriza não somente um personagem, mas a vida no campo e as sutilezas do cotidiano e de sua gente, um povo trabalhador, hospitaleiro e gentil. 

O enredo destaca a generosidade de Pedro Porteira, o trio de amigos universitários e a simplicidade de Clarice. 

Local 
O Napses Habilitação Intensiva está situado na R. Antônio Iório, 134, na Vila Laércio Teixeira, em Campinas.

Fonte: Texto enviado pelo autor 

quinta-feira, 4 de julho de 2024

Varal de Trovas n. 605

 

Silmar Bohrer (Croniquinha) 116

Na língua grega "filosofia" significava "amor pela sabedoria", Era o estudo das questões humanas , existenciais , do conhecimento, e também da linguagem e das coisas do universo. 

Aprecio falar de filosofia, aprecio os filósofos e seus ensinamentos. Se somos seres pensantes, nada mais natural esse envolvimento . Somos os únicos animais que têm o "-sofos" , essa capacidade de raciocínio . 

Gostar de filosofia é compactuar com seus ensinamentos ou não, mas muita gente tem ideias arredias quando se diz que devemos ler seguidamente algum filósofo. Na verdade damos pouca atenção aos filósofos. Ou nenhuma. Se nos voltarmos para o nosso nós, o EU pessoal, vamos descobrir tanta coisa útil e importante através do pensamento . 

"A filosofia não é apenas um conjunto de ideias encadernado em livro , mas um modo de vida". (Caio Musônio Rufo, 25 - 95 d.C.) 

A filosofia está presente no dia a dia, compartilhada na fala e nos meios de comunicação - usada livremente, se transforma conhecimento racional e puro que engrandece o ser humano. 

Immanuel Kant (1724 - 1804) dizia que "não se ensina filosofia, ensina-se a filosofar". Em verdade,  temos a capacidade de autoaprender a filosofar, a leitura está aí disponível há séculos nos pensares de tantos cultivadores da sabedoria, os filósofos. 

Costumo dizer que uma mente sem pensar enferruja seus neurônios e nesta inércia nos tornamos indefesos, brutos, menores. E se "a filosofia é o melhor remédio para a mente" (Cícero, 106 - 43 a.C.), sigamos filosofando, cada um à sua  maneira e ao seu estilo. 
Fonte: Texto enviado pelo autor