Seu garçom faça o favor de me trazer depressa
Uma boa média que não seja requentada
Um pão bem quente com manteiga à beça
Um guardanapo e um copo d'água bem gelada
Feche a porta da direita com muito cuidado
Que eu não estou disposto a ficar exposto ao sol
Vá perguntar ao seu freguês do lado
Qual foi o resultado do futebol
Se você ficar limpando a mesa
Não me levanto nem pago a despesa
Vá pedir ao seu patrão
Uma caneta, um tinteiro,
Um envelope e um cartão,
Não se esqueça de me dar palitos
E um cigarro pra espantar mosquitos
Vá dizer ao charuteiro
Que me empreste umas revistas,
Um isqueiro e um cinzeiro
Seu garçom faça o favor de me trazer depressa...
Telefone ao menos uma vez
Para três quatro quatro três três três
E ordene ao seu Osório
Que me mande um guarda-chuva
Aqui pro nosso escritório
Seu garçom me empresta algum dinheiro
Que eu deixei o meu com o bicheiro,
Vá dizer ao seu gerente
Que pendure esta despesa
No cabide ali em frente
Seu garçom faça o favor de me trazer depressa
Uma boa média que não seja requentada
Um pão bem quente com manteiga à beça
Um guardanapo e um copo d'água bem gelada
Feche a porta da direita com muito cuidado
Que eu não estou disposto a ficar exposto ao sol
Vá perguntar ao seu freguês do lado
Qual foi o resultado do futebol
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A Crônica Musical do Cotidiano de Noel Rosa
A música "Conversa de Botequim" de Noel Rosa é uma crônica cantada que retrata o cotidiano dos botequins do Rio de Janeiro na década de 1930. A letra descreve um cliente fazendo uma série de pedidos ao garçom, que vão desde uma refeição simples até favores pessoais, como emprestar dinheiro e objetos. Através de uma narrativa humorística e irônica, Noel Rosa critica sutilmente a sociedade da época, expondo a malandragem e a esperteza do carioca comum.
Noel Rosa, conhecido por sua habilidade em compor sambas com letras inteligentes e cheias de duplo sentido, utiliza a figura do garçom como um ouvinte passivo para suas demandas, que são ao mesmo tempo triviais e absurdas. A música também reflete a informalidade das relações sociais nos botequins, onde tudo parece ser possível. Além disso, a canção destaca a cultura do futebol e do jogo do bicho, elementos fortemente enraizados no Rio de Janeiro daquela época.
"Conversa de Botequim" é uma obra que, além de entreter, serve como um documento histórico e cultural. Ela nos permite vislumbrar o estilo de vida e os hábitos dos cariocas nos anos 30, bem como a atmosfera dos botequins, que eram pontos de encontro e socialização importantes naquela sociedade.
Não existe em nossa música popular crônica mais espirituosa sobre uma cena do cotidiano que a realizada por Noel Rosa em "Conversa de Botequim". Localizada em um café, ambiente que o autor conhecia como ninguém, a crônica tem como personagem principal um freguês desabusado que, ao preço de uma simples média com pão e manteiga, acha-se no direito de agir como se estivesse em sua casa.
Assim, em ordens sucessivas, ele exige do garçom atendimento rápido e eficiente : "Seu garçom faça o favor / de me trazer depressa / uma boa média que não seja requentada/ um pão bem quente com manteiga à beça / um guardanapo / um copo d'água bem gelada..." -, que inclui ainda o fornecimento de "caneta, tinteiro, envelope, cartão, cigarro, isqueiro, cinzeiro, revistas, o resultado do futebol" e até "o empréstimo de algum dinheiro", pois deixara o seu com o bicheiro.
Tudo isso fiado, pois, para terminar, o sujeito ordena: "Vá dizer ao seu gerente / que pendure essa despesa / no cabide ali em frente". Completa esta obra-prima uma melodia sincopada de Vadico, que se casa com a letra de forma primorosa, como se as duas tivessem sido feitas ao mesmo tempo, por uma mesma pessoa. Noel Rosa é o melhor intérprete de "Conversa de Botequim", uma de suas composições mais gravadas. No seu jeito simples de cantar, ele "diz" a letra com a naturalidade com que um malandro daria todas aquelas ordens a um garçom de botequim.
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