– Olá, amigo.
– Antes que você me pergunte, lhe direi que demorei a contatar e a escrever sobre você porque tive que aguardar os momentos em que seus maravilhosos raios não fritassem meu cérebro, e que assim, pudéssemos conversar durante mais tempo.
Prossegui, dizendo:
– Adoraria poder dar-lhe um afetuoso abraço, mas você há de entender a impossibilidade.
Rimos dessa minha bobagem.
– Posso garantir que estou feliz por essa oportunidade de nos falarmos.
Ele disse que não poderia ter deixado de notar-me porque todos os dias me via sintetizando a vitamina D e a minha excentricidade, que tomando sol, conversava animadamente com plantas e animais.
– Sem dúvidas, seus raios ajudaram-me a passar incólume pela pandemia, mas não compreendo o porquê de considerar-me excêntrico.
E continuei:
– Só faço papel típico de um escritor.
Rimos e emendei:
– A respeito de conversar com animais, em minha defesa, vou lhe contar. As formigas, certo dia, vieram pedir-me uma orientação sobre questões trabalhistas. Elas eram obrigadas a cumprir uma carga horária de 7 dias na semana, sem folga nem adicional de fim de semana. Orientei-as a fazerem um pacífico protesto e ajudei a confeccionarem as faixas para a passeata.
“Elas ganharam a causa e todos os domingos vêm comemorar aqui comigo fazendo piquenique.
“Em relação às aves, elas sempre me pedem informação do local das árvores frutíferas aqui do condomínio. Também fiquei amigo de um simpático casal de urubus, embora nunca tenha podido orientá-los sobre o local onde havia os pútridos alimentos, mas elogio o trabalho deles na limpeza do planeta e digo que o voo que realizam é o mais bonito de todas as aves. O casal retribui realizando lindas acrobacias aéreas para que eu aprecie.”
Continuei explicando:
– As plantas e as árvores, sentindo-se solitárias e não podendo se locomover, agradecem pela boa conversa. Na ocasião, informo como são as árvores e plantas de outros lugares no planeta.
Concluí, então:
– Seria isso suficiente para você me classificar como excêntrico?
Gargalhou e nada comentou a respeito.
Eu disse que havia outros assuntos a tratar e dúvidas do tamanho dele. Ainda sorrindo, disse que os cientistas do planeta em que eu habitava, teimavam em classificá-lo como estrela anã.
– Não penso assim, já estudei muito sobre você, meu amigo, grandão, afinal, são 5 bilhões de anos desde a sua formação.
– Sim, na unidade de tempo que vocês humanos criaram. Aliás, Chronos enlouquece quando ouve essa contagem de vocês.
– Sim, eu estive com Chronos em outro momento. Mas saiba que quando nasci, esta bobagem cronológica já existia há tempos.
Sorri também acompanhando-o. Pensei em brincar, chamando-o de poeira cósmica incandescente, mas não achei oportuno.
Ele prosseguiu, agora com um tom de seriedade:
– Vocês sabem o que estão fazendo ao planeta?
Envergonhado, respondi:
– Eu tenho noção e faço minha parte para que isto não aconteça, mas sei que é insignificante perante os abusos dos que se julgam humanos.
– Fico triste ao ver essa destruição toda e já antevejo minha solidão após a eliminação da raça de vocês. Como eu disse em momento também, divirto-me assistindo as patacoadas de vocês no dia a dia. Literalmente, pois à noite não as vejo.
Riu prolongadamente da própria piada e continuou:
– Levarei milhões de anos para ajudar a formar novos seres vivos. E esse intervalo de tempo será monótono e solitário demais para mim. Nesse momento, algumas nuvens, provavelmente constituídas de melancolia, formaram-se entre nós e decidimos adiar nossa amigável conversa.
Voltei para casa com uma enorme e persistente inquietação em minha alma.
Arthur Thomaz. Leves contos ao léu: imponderáveis. Volume 3. Santos/SP: Bueno Editora, 2022. Enviado pelo autor
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