líquidos
os peixes
no vidro mole do mar
remotamente perto
a areia dos meus pés
no vidro moído da praia
e duas hipálages:
peixes não são líquidos
ou meus pés silício
mas carbono
e silêncio
moldados em sólidos macios
que solidez, porém
molda os insólitos vazios
de que os átomos são repletos
entre a nulidade do núcleo
e a distância astronômica
de sua névoa de elétrons?
mas se peixes não são líquidos
há, apesar dos vazios
solidez e, talvez, verdade
(se não a solidez da verdade
a verdade da solidez
dos peixes)
nada, entretanto, é sólido
por culpa, ou do capitalismo
("tudo se desmancha no ar...")
ou do dicionário
em que é sinônimo
(um outro nome) de maciço
e sólido não é isso:
pois um líquido
denso como o chumbo
derretendo
não parece menos
cheio de si mesmo
por outro lado
(ou pelo mesmo: de fora
para dentro)
não há sólidos
que não sejam penetráveis
por alguma radiação
(os transparentes são
transpassáveis pela luz:
sólida nudez)
raios
nas pequenas noites vazias
dos átomos
porém uma pedra
é impenetrável
por outra pedra
pelas fortes correntes
elétricas entre
as nuvens de elétrons
uma rede
de pesca talvez contenha
um bom modelo bidimensional:
a rede é um entrelaço
de nós e de fios
entre os nós
como os peixes
de átomos
e interações entre eles
uma linha
transversal a transpassa
como as ondas
eletromagnéticas
a água
e os peixes
duas redes abertas
uma sobre
a outra
não são, porém, permeáveis
apesar de feitas
na maior parte de vazios:
redes
não são penetráveis
por redes
a solidez
se impenetrabilidade mútua
entre redes íntegras
é um fato
palpável como um peixe
ou seja, uma verdade:
existe a solidez
apesar dos vazios
que a preenchem
daí ser prenhe
de sentido
falar em solidez, em peixes
e na impenetrabilidade
mas não na inexistência
da verdade
deus
diria um pescador
de homens e de sua dor
rede vazia
se não de pescarias
de si mesma
eu replicaria
não fora para ouvidos
de mercadejador:
cerrados
nós górdios que se cortam e
se desfazem
ou não se cortam e
se desfazem
em finas linhas finitas
a rede
a verdade
a impenetrabilidade
Fonte:
DOLHNIKOFF, Luis. Sobre Sisifo. Ateliê Editorial, 2007.
os peixes
no vidro mole do mar
remotamente perto
a areia dos meus pés
no vidro moído da praia
e duas hipálages:
peixes não são líquidos
ou meus pés silício
mas carbono
e silêncio
moldados em sólidos macios
que solidez, porém
molda os insólitos vazios
de que os átomos são repletos
entre a nulidade do núcleo
e a distância astronômica
de sua névoa de elétrons?
mas se peixes não são líquidos
há, apesar dos vazios
solidez e, talvez, verdade
(se não a solidez da verdade
a verdade da solidez
dos peixes)
nada, entretanto, é sólido
por culpa, ou do capitalismo
("tudo se desmancha no ar...")
ou do dicionário
em que é sinônimo
(um outro nome) de maciço
e sólido não é isso:
pois um líquido
denso como o chumbo
derretendo
não parece menos
cheio de si mesmo
por outro lado
(ou pelo mesmo: de fora
para dentro)
não há sólidos
que não sejam penetráveis
por alguma radiação
(os transparentes são
transpassáveis pela luz:
sólida nudez)
raios
nas pequenas noites vazias
dos átomos
porém uma pedra
é impenetrável
por outra pedra
pelas fortes correntes
elétricas entre
as nuvens de elétrons
uma rede
de pesca talvez contenha
um bom modelo bidimensional:
a rede é um entrelaço
de nós e de fios
entre os nós
como os peixes
de átomos
e interações entre eles
uma linha
transversal a transpassa
como as ondas
eletromagnéticas
a água
e os peixes
duas redes abertas
uma sobre
a outra
não são, porém, permeáveis
apesar de feitas
na maior parte de vazios:
redes
não são penetráveis
por redes
a solidez
se impenetrabilidade mútua
entre redes íntegras
é um fato
palpável como um peixe
ou seja, uma verdade:
existe a solidez
apesar dos vazios
que a preenchem
daí ser prenhe
de sentido
falar em solidez, em peixes
e na impenetrabilidade
mas não na inexistência
da verdade
deus
diria um pescador
de homens e de sua dor
rede vazia
se não de pescarias
de si mesma
eu replicaria
não fora para ouvidos
de mercadejador:
cerrados
nós górdios que se cortam e
se desfazem
ou não se cortam e
se desfazem
em finas linhas finitas
a rede
a verdade
a impenetrabilidade
Fonte:
DOLHNIKOFF, Luis. Sobre Sisifo. Ateliê Editorial, 2007.
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