Oliveira, Roza de. As Imagens do Ar nos Poemas de Tasso da Silveira. Curitiba: SEEC/Imprensa Oficial do Estado do Paraná, 2001.
O livro As Imagens do Ar nos Poemas de Tasso da Silveira foi elaborado a partir de uma dissertação de mestrado de Roza de Oliveira, na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). A autora faz uma interpretação da obra do poeta paranaense Tasso Azevedo da Silveira, que nasceu em Curitiba, em 1895. O poeta desenvolveu grande atividade intelectual aqui no Paraná, tendo fundado com Andrade Muricy, Oscar Martins Gomes e Lacerda Pinto, a revista " Fanal", em 1911 e mais tarde, em 1914, a revista "Atheneia". No Rio de Janeiro criou as revistas "América Latina", "Terra de Sol" e em 1927 a revista "Festa", que se tornou porta-voz do grupo espiritualista do modernismo brasileiro, por ele dirigido. Seu primeiro livro de versos, "Fio d’Água", foi publicado no Rio de Janeiro, em 1918.
Segundo Roza, foi extensa a atividade criativa de Tasso da Silveira "predominando aí sua produção poética, porém, com variações eventuais para o ensaio, a pregação cívica, a crítica, o ensino em cátedra de literatura, as conferências, os cursos de extensão, o teatro, as traduções de autores famosos, a colaboração na imprensa periódica, a polêmica, inclusive tendo participado de equipes de redação de alguns jornais".
A autora enumera: "A produção poética de Tasso da Silveira consta de 11 livros com 468 poemas, tendo sido alguns traduzidos para o francês, italiano, espanhol, alemão, inglês, húngaro e romeno; outros musicados por compositores de renome como Camargo Guarnieri, Lorenzo Fernandes e Brasílio Itiberê." A sua obra foi apreciada por um número considerável de críticos, como Mário de Andrade, Andrade Murici, Massaud Moisés, Mário da Silva Brito, Leodegário de Azevedo Filho, Alceu Amoroso Lima, e muitos outros.
A Tendência Espiritualista do Grupo Festa
Tasso da Silveira foi condutor e orientador do grupo da Revista "Festa", uma das vertentes do Modernismo Brasileiro. Em seu "espiritualismo", o grupo "Festa" faz a apologia de uma evolução literária mais moderada, que não se desligue das tradições brasileiras e que não se afaste do âmbito universal. Valorizou ainda o misticismo, discutindo temas filosóficos e espirituais, a exemplo dos simbolistas. Sentiu a necessidade de salientar na literatura a característica brasileira, preservando, no entanto, os elementos universalistas, particularmente a influência cristã. O poeta chama esta confluência de forças de "anseio de totalização", que traz para a arte as realidades humanas, transcendentais, materiais e espirituais.
Os 4 Elementos, segundo Gaston Bachelard
A autora se propõe a fazer uma análise da obra do poeta paranaense, seguindo a teoria dos 4 elementos: fogo, água, terra e ar, elaborada pelo filósofo francês Gaston Bachelard. Para ele, todas as imagens poéticas estão vinculadas a um elemento primordial, o que nos proporciona uma nova maneira de abordagem do discurso poético. Partindo da idéia que há um elemento predominante, o filósofo reflete sobre as características inerentes aos quatro elementos, que colocarão ordem no ilusório.
Para esta abordagem, foram escolhidos poemas relacionados ao fogo, à água, ao ar e à terra. Foi percebida na maioria destes versos a presença de dois ou mais elementos. A imaginação não se fixa num único elemento, como a água, porque para o poeta, há também o céu, a terra, o fogo. Mesmo que todos os elementos figurem nas imagens literárias, analisando a obra de um autor, nota-se a sua preferência por um deles. Tasso da Silveira comprovou ter escolhido o ar.
Segundo a autora "Tal princípio de ordenação das imagens desenvolve-se a partir:
de uma tendência psíquica implícita no elemento Ar que é a de se elevar, tendo como imagem arquetípica o sonho do vôo.
Do arquétipo aéreo – o Vento e sua ambivalência.
Da qualidade mais característica do Ar que é a de ser uma matéria sem matéria, isto é, imaterial."
Procura evidenciar que "o elemento Ar fornece ao sonhador a via para a atualização da viagem onírica na qual os termos leveza, ascensão, misticismo e, principalmente o silêncio, participam do lirismo de Tasso da Silveira numa espécie de comunicação com Deus."
O Fogo
O fogo, como realidade evidente, destaca-se como uma das mais repletas de sonho e de humanidade. Nós o encontramos na lareira, no fogão, na vida cotidiana, no brilho dos olhos, no nosso sangue, ilumina a inteligência, impulsiona a nossa vida com o calor dos nossos corpos. Em sua face metafísica, é muitas vezes encontrado no Novo Testamento em várias revelações de Deus.
Vejamos um trecho do poema de Tasso, A CRUZ:
"Das mãos do Senhor erguiam-se labaredas,
Dos pés do Senhor erguiam-se labaredas,
Dos flancos do Senhor erguiam-se labaredas
De dor..."
A Água
A água tende a aparecer nas imagens delicadas, suaves, límpidas, às vezes profundas, femininas, doces; mas também aparece quando a natureza se revolta, nas tempestades, nos cataclismas, no mar enfurecido. A água é bela tanto na suavidade, quanto na turbulência.
A seguir, vemos um trecho do poema FIO D’ÁGUA:
"Fio d’água humilde e brando,
da transparência dos cristais:
tão claro e límpido vais
cantarolando,
que deixas ver lá no fundo,
a areia fina alvejando..."
A Terra
Para Bachelard, a matéria está carregada de experiências positivas, a sua forma é evidente, a sua realidade é impossível de camuflar, porque é areia, húmus, limo, cascalho, rocha, metal, madeira, borracha, montanhas, cavernas, labirintos, raízes, serpentes, etc.
Vejamos a realidade como a viu Tasso em GÊNESE:
O pedreiro preparou a argamassa
E foi juntando pedra a pedra
E erguendo o muro.
Foi lentamente criando
A realidade concreta do muro alto.
Foi lentamente criando
Em gestos essenciais
E em silêncio
Perdido no infinito de si mesmo
Como um Deus!
O Ar
Com a âncora fixada na filosofia de Bachelard, Roza reconheceu o ar, fluido, móvel, leve, reinando nos cumes, nos picos, levando o nosso imaginário a divagar, suave, indistinto, a elevar-se, a desmaterializar-se. "O sonhador aéreo vive intensamente o desejo de se lançar para o alto, isto é, para a luz, para a pureza, para a espiritualidade, adequando-se a uma filosofia do total vir-a-ser..."
Vamos encontrar a leveza do ar no poema A DANÇA DE EROS VOLÚSIA:
O corpo frágil surgiu
De uma névoa longínqua,
Diáfano, leve, imaterial:
No ar sereno traçou um ritmo de encanto,
E tudo em torno
Se imaterializou.
O corpo frágil surgiu
De distâncias ignotas
E ao nosso olhar parado
Abriu-se como uma flor misteriosa
E os pés ágeis criaram
No chão
arabescos inéditos
asas de ave
bêbadas de infinito
debatendo-se tontas
no espaço azul.
Comunhão de idéias
A autora navega através da poesia de Tasso da Silveira, pelo mundo interior do artista, com grande segurança. Há uma grande comunhão de idéias entre o filósofo Gaston Bachelard, Roza de Oliveira e o poeta estudado, o que resultou neste trabalho de alta qualidade. Com sua sensibilidade, a autora conseguiu penetrar no mundo metafísico, astral, atemporal e sublime do artista, interpretando com maestria a filigrana de sua poesia.
Curitiba, outubro de 2001
Fonte:
http://www.utp.br/eletras/ea/eletras3/rese03.htm
O livro As Imagens do Ar nos Poemas de Tasso da Silveira foi elaborado a partir de uma dissertação de mestrado de Roza de Oliveira, na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). A autora faz uma interpretação da obra do poeta paranaense Tasso Azevedo da Silveira, que nasceu em Curitiba, em 1895. O poeta desenvolveu grande atividade intelectual aqui no Paraná, tendo fundado com Andrade Muricy, Oscar Martins Gomes e Lacerda Pinto, a revista " Fanal", em 1911 e mais tarde, em 1914, a revista "Atheneia". No Rio de Janeiro criou as revistas "América Latina", "Terra de Sol" e em 1927 a revista "Festa", que se tornou porta-voz do grupo espiritualista do modernismo brasileiro, por ele dirigido. Seu primeiro livro de versos, "Fio d’Água", foi publicado no Rio de Janeiro, em 1918.
Segundo Roza, foi extensa a atividade criativa de Tasso da Silveira "predominando aí sua produção poética, porém, com variações eventuais para o ensaio, a pregação cívica, a crítica, o ensino em cátedra de literatura, as conferências, os cursos de extensão, o teatro, as traduções de autores famosos, a colaboração na imprensa periódica, a polêmica, inclusive tendo participado de equipes de redação de alguns jornais".
A autora enumera: "A produção poética de Tasso da Silveira consta de 11 livros com 468 poemas, tendo sido alguns traduzidos para o francês, italiano, espanhol, alemão, inglês, húngaro e romeno; outros musicados por compositores de renome como Camargo Guarnieri, Lorenzo Fernandes e Brasílio Itiberê." A sua obra foi apreciada por um número considerável de críticos, como Mário de Andrade, Andrade Murici, Massaud Moisés, Mário da Silva Brito, Leodegário de Azevedo Filho, Alceu Amoroso Lima, e muitos outros.
A Tendência Espiritualista do Grupo Festa
Tasso da Silveira foi condutor e orientador do grupo da Revista "Festa", uma das vertentes do Modernismo Brasileiro. Em seu "espiritualismo", o grupo "Festa" faz a apologia de uma evolução literária mais moderada, que não se desligue das tradições brasileiras e que não se afaste do âmbito universal. Valorizou ainda o misticismo, discutindo temas filosóficos e espirituais, a exemplo dos simbolistas. Sentiu a necessidade de salientar na literatura a característica brasileira, preservando, no entanto, os elementos universalistas, particularmente a influência cristã. O poeta chama esta confluência de forças de "anseio de totalização", que traz para a arte as realidades humanas, transcendentais, materiais e espirituais.
Os 4 Elementos, segundo Gaston Bachelard
A autora se propõe a fazer uma análise da obra do poeta paranaense, seguindo a teoria dos 4 elementos: fogo, água, terra e ar, elaborada pelo filósofo francês Gaston Bachelard. Para ele, todas as imagens poéticas estão vinculadas a um elemento primordial, o que nos proporciona uma nova maneira de abordagem do discurso poético. Partindo da idéia que há um elemento predominante, o filósofo reflete sobre as características inerentes aos quatro elementos, que colocarão ordem no ilusório.
Para esta abordagem, foram escolhidos poemas relacionados ao fogo, à água, ao ar e à terra. Foi percebida na maioria destes versos a presença de dois ou mais elementos. A imaginação não se fixa num único elemento, como a água, porque para o poeta, há também o céu, a terra, o fogo. Mesmo que todos os elementos figurem nas imagens literárias, analisando a obra de um autor, nota-se a sua preferência por um deles. Tasso da Silveira comprovou ter escolhido o ar.
Segundo a autora "Tal princípio de ordenação das imagens desenvolve-se a partir:
de uma tendência psíquica implícita no elemento Ar que é a de se elevar, tendo como imagem arquetípica o sonho do vôo.
Do arquétipo aéreo – o Vento e sua ambivalência.
Da qualidade mais característica do Ar que é a de ser uma matéria sem matéria, isto é, imaterial."
Procura evidenciar que "o elemento Ar fornece ao sonhador a via para a atualização da viagem onírica na qual os termos leveza, ascensão, misticismo e, principalmente o silêncio, participam do lirismo de Tasso da Silveira numa espécie de comunicação com Deus."
O Fogo
O fogo, como realidade evidente, destaca-se como uma das mais repletas de sonho e de humanidade. Nós o encontramos na lareira, no fogão, na vida cotidiana, no brilho dos olhos, no nosso sangue, ilumina a inteligência, impulsiona a nossa vida com o calor dos nossos corpos. Em sua face metafísica, é muitas vezes encontrado no Novo Testamento em várias revelações de Deus.
Vejamos um trecho do poema de Tasso, A CRUZ:
"Das mãos do Senhor erguiam-se labaredas,
Dos pés do Senhor erguiam-se labaredas,
Dos flancos do Senhor erguiam-se labaredas
De dor..."
A Água
A água tende a aparecer nas imagens delicadas, suaves, límpidas, às vezes profundas, femininas, doces; mas também aparece quando a natureza se revolta, nas tempestades, nos cataclismas, no mar enfurecido. A água é bela tanto na suavidade, quanto na turbulência.
A seguir, vemos um trecho do poema FIO D’ÁGUA:
"Fio d’água humilde e brando,
da transparência dos cristais:
tão claro e límpido vais
cantarolando,
que deixas ver lá no fundo,
a areia fina alvejando..."
A Terra
Para Bachelard, a matéria está carregada de experiências positivas, a sua forma é evidente, a sua realidade é impossível de camuflar, porque é areia, húmus, limo, cascalho, rocha, metal, madeira, borracha, montanhas, cavernas, labirintos, raízes, serpentes, etc.
Vejamos a realidade como a viu Tasso em GÊNESE:
O pedreiro preparou a argamassa
E foi juntando pedra a pedra
E erguendo o muro.
Foi lentamente criando
A realidade concreta do muro alto.
Foi lentamente criando
Em gestos essenciais
E em silêncio
Perdido no infinito de si mesmo
Como um Deus!
O Ar
Com a âncora fixada na filosofia de Bachelard, Roza reconheceu o ar, fluido, móvel, leve, reinando nos cumes, nos picos, levando o nosso imaginário a divagar, suave, indistinto, a elevar-se, a desmaterializar-se. "O sonhador aéreo vive intensamente o desejo de se lançar para o alto, isto é, para a luz, para a pureza, para a espiritualidade, adequando-se a uma filosofia do total vir-a-ser..."
Vamos encontrar a leveza do ar no poema A DANÇA DE EROS VOLÚSIA:
O corpo frágil surgiu
De uma névoa longínqua,
Diáfano, leve, imaterial:
No ar sereno traçou um ritmo de encanto,
E tudo em torno
Se imaterializou.
O corpo frágil surgiu
De distâncias ignotas
E ao nosso olhar parado
Abriu-se como uma flor misteriosa
E os pés ágeis criaram
No chão
arabescos inéditos
asas de ave
bêbadas de infinito
debatendo-se tontas
no espaço azul.
Comunhão de idéias
A autora navega através da poesia de Tasso da Silveira, pelo mundo interior do artista, com grande segurança. Há uma grande comunhão de idéias entre o filósofo Gaston Bachelard, Roza de Oliveira e o poeta estudado, o que resultou neste trabalho de alta qualidade. Com sua sensibilidade, a autora conseguiu penetrar no mundo metafísico, astral, atemporal e sublime do artista, interpretando com maestria a filigrana de sua poesia.
Curitiba, outubro de 2001
Fonte:
http://www.utp.br/eletras/ea/eletras3/rese03.htm
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