sábado, 25 de setembro de 2010

Roberto Pinheiro Acruche (Livro de Poesias)


A SAUDADE

Saudade... Qual é a sua cor?
Por que estou sentindo-a
tão junto a mim e não consigo vê-la?
Não me atormente ainda mais
com este silêncio,
além desta dor que me rasga o peito.

Porque você não aparece
e desvenda logo esse mistério?
Você sabe onde me encontrar!

Vou estar nos mesmos lugares,
sentado na areia olhando o mar
ou nos mesmos bares
consumindo a noite.

E se acaso não me encontrares
pergunte pra solidão...
Somente ela saberá dizer
o meu paradeiro.
Mas não demore mais;
faça antes da tristeza
me levar por inteiro!...

ARCA DOS SONHOS

As horas passam
e eu me curvo diante
do tempo
que também passa... Que passa!...
E eu preso na arca dos sonhos,
fantasiando a vida.
Quando acordar
desta aspiração
liberto do devaneio,
quem sabe ainda haverá tempo
para realizar os sonhos?
E se não houver tempo
e se não realizar meus sonhos,
valeu à pena ter sonhado!

ESPERA

Estou a sua espera,
carregado de desejos,
de uma nostalgia que enlouquece,
que explode dentro de mim,
que me faz lembrar do seu cheiro,
da sua boca sufocando-me de beijos,
dos seus gemidos,
da sua entrega louca,
desvairada e sem pudor.
--

LUZ DA VIDA

Em qualquer lugar que estiver nesta terra, há alguém com um olhar fixo, afetuoso, mágico direcionado para você...
Com um olhar puro, especial, muito especial, de um coração que só pulsa o amor...
Um olhar de alguém que é justo, com a inspiração de amar de modo pleno sem ajuizamentos, sem distinção.
Este olhar brilha mais que a luz do sol, tem a dimensão maior que o das estrelas de primeira grandeza, tem um alcance infinito.
Este olhar rompe os dias, vara as noites é a luz da vida.
Qualquer que seja o momento, em qualquer situação: de amor, paz, união ou perdão... Este olhar está reto, preciso em sua direção.
---

VIOLEIRO APAIXONADO

Sob a luz de um lampião
colocado sobre uma mesa
de madeira nobre,
porém pequena,
onde também tinha um ramo de flor,
ouvia cantigas de amor
de um violeiro solitário
exaltando sua paixão.
Sentado num banquinho humilde
que ficava no canto da sala,
dedilhava sua viola
sonorizando a noite
escura lá fora
onde os pirilampos
faziam refletir sua luminosidade
num pisca-pisca ritmado
como se acompanhasse a melodia
do violeiro apaixonado
que não tirava da imaginação
a sua cabocla
a mais bonita daquela região.
Morena de olhos negros,
cabelos longos, caídos pelos ombros,
corpo fascinante,
cheiroso como a flor do campo;
lábios sedutores...
O solitário violeiro morria de amores;
sonhava abraçar aquela trigueira
rolar com ela na esteira
esbanjar todo o anseio
tocar em seus seios
fazê-la sentir no peito
todo o efeito
que jorrava de seu coração.
A moreninha linda e faceira,
lá distante,
em seu casebre
não escutava
quando o violeiro cantava
e a viola chorava
com os versos entoados:
“Vem morena, vem agora,
não resisto à solidão!
Eu canto e a viola chora
vem me dar seu coração...”
“Vem morena, não demora,
vem me dar seu coração
eu canto e a viola chora
não resisto a solidão.”

MEU ESPELHO

Meu espelho, revelador!...
Arca de memórias,
juiz implacável do presente,
profeta mudo do futuro,
confessionário e principal consultor.
Sorrindo diante de ti
relembro os meus dias de infância
gesticulando e fazendo caretas...
Na vaidade da adolescência e juventude
extraindo acnes, penteando os cabelos,
raspando os primeiros fios de barba
experimentando roupas...
Quanto desvelo com a aparência!
Tudo sem perceber as transformações naturais
provocadas pela maturidade,
fator imposto pela idade,
pelo tempo, senhor de cada momento,
fosse ele, alegre, feliz, triste ou sofrido.
Agora, diante de ti,
mesmo estando a sorrir
estou subordinado às mutações...
Uma ruga que antes não existia,
hoje habita e marca a minha fisionomia...
Os cabelos longos, fortes, cheios,
que exigiam tantos cuidados,
apenas uns poucos ainda existem,
presentemente esbranquiçados
e jogados um tanto para os lados.
No entanto, o que mais me revela e me assusta,
não é a modificação irreversível, progressiva e bruta,
não são os momentos felizes ou tristes do passado;
nem o que fiz de certo ou errado;
não são os tempos perdidos, desiludidos...
Não são os ideais que não puderam ser alcançados;
ainda que me deixem entristecido.
Muito menos, por tanto haver me empenhado
e me obrigado a compromissos...
Nada disso!
Mesmo que tenham me abalado, também não são
as paixões e os amores fracassados...
Não é o futuro das minhas obras e conquistas;
não é a aparência de um homem cansado
desestabilizado, desalinhado,
vivido, sofrido,
nem sempre barbeado... Definhando!...
O que verdadeiramente me revela e me assusta
é o presente!... Esse presente
sem prorrogação, motivação,
sem meios de recuperação
para a efetivação de tantos sonhos
que ainda vivo sonhando.

Fontes:
– O Autor
http://robertoacruche.blogspot.com
Imagem = montagem por José Feldman

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