"O trovador é o poeta que vaza sua inspiração em trovas. Possui qualidades específicas. Pode não ser capaz de realizar um poema grande mas deve ser capaz de fazer um grande poema ao compor apenas uma pequena quadrinha.
Nasceu trovador além de ter nascido poeta. São duas coisas distintas numa só. Todo trovador é poeta mas nem todo poeta é trovador."
Waldemar Pequeno é poeta e é trovador. A trova que abre este volume é de uma sutileza profunda de pensamento:
Nunca fales com desprezo
de um vaso por ser grosseiro.
Só Deus sabe se ao fazê-lo
não tremeu a mão do oleiro.
E que dizer da beleza singela desta confissão?
Muitos mundos visitei
levado por meu destino.
- Mas nunca mais encontrei
o meu mundo de menino.
Em compensação, este mundo que o poeta diz que não encontrou, vai-se fragmentando imperceptivelmente nas suas cantigas.
Ao lado da trova levemente filosófica, a trova lírica desponta, espontânea e fresca:
Não sei, das flores da vida,
as que sejam do teu gosto.
As do meu - ninguém duvida -
são as rosas do teu rosto.
Waldemar Pequeno possui todas as qualidades do poeta-trovador. Simplicidade, aquele sutil jogo de palavras que enriquece tanto a trova em sua estrutura íntima, a imaginação, o lirismo inato. E ainda, essa vivência, indispensável à obra de arte, que lhe dá seiva e cor, perfume e vida.
A sua trova no 4 é arrancada de seu âmago:
Não há fonte neste mundo,
rolando por entre escolhos
que tenha o choro tão fundo
como a fonte dos meus olhos.
E finalmente, esta flor de trova, para usar a sua própria sugestão. A trova no 5:
Uma rosa, em minha cova,
talvez brote deste amor,
como se fora uma trova
sob o feitio de flor.
Nada mais, nada menos. Precisão absoluta na imagem. Floração lírica de singela e sugestiva beleza!
Aí estão as 5 primeiras trovas. Daqui para frente, leitor amigo, você seguirá sozinho, o ameno e sugestivo roteiro da poesia de Waldemar Pequeno. E estou certo de que se emocionará muitas vezes. Parará algumas outras para se extasiar diante da paisagem descortinada; se deixará surpreso, encantado com o canot dos versos; se extasiará com as florezinhas das trovas salpicando de cravos o chão do caminho para a morada do poeta...
Waldemar Pequeno, (Waldemar Dinis Alves Pequeno) é fluminense, de Piraí. Nasceu a 23 de Outubro de 1892, filho do cearense Pio Alves Pequeno e da mineira Maria Isabel Alves Pequeno.
Sua família radicou-se em Minas. Primeiro em Muriaé, depois em Barbacena, onde Waldemar fez o curso, e onde surgiu a vocação literária. Formou-se depois pela Faculdade de Direito, em Belo Horizonte, colaborando nessa época em jornais e revistas de várias cidades do Estado.
Iniciou sua vida como Delegado de Polícia em Aimorés, "em plena mata virgem, à margem do rio Doce, fronteira com o Estado do Espírito Santo, lutando contra a jagunçagem e o caudilhismo!
Waldemar teve uma vida aventurosa. Militou ativamente na política, participou de armas na mão nas revoluções de 1930 e 1932. Foi Delegado de Polícia em Goiânia; criou gado. Mas as rimas e as preocupações literárias eram a sua vocação.
Reside atualmente em Belo Horizonte. Depois das lides revolucionárias, um acontecimento o faria reintegrar-se em suas atividades literárias. Aberto um Concurso de Contos pela Prefeitura de Belo Horizonte, saiu vencedor.
Reescreveu então suas poesias antigas, acrescentou novas páginas e publicou em 1953 o primeiro livro: "Poemas das Vozes Distantes." Em 54, lançou "Ouro de Cuieté e Outras Histórias", livro laureado pela Academia Brasileira de Letras com o Prêmio "Afonso Arinos" e também premiado pela Academia Mineira de Letras. Em 55, saiu "Campanha Educativa do Trânsito". De suas obras publicadas, confessa Waldemar Pequeno que a que lhe é mais cara ao coração é "Ouro do Cuieté", onde narra episódios de sua infância e de sua vida dramática às margens do Rio Doce.
Em elementos que gentilmente nos forneceu, a mim e ao Luiz Otávio, informa que "tem inéditos, além de um livro de trovas a ser publicado, outro de poesia, um de contos e crônicas, e a autobiografia sob o título de "Retorno ao País da Vida".
E mais as obras seguintes: 114 Soldados, 3 Cozinheiras... 12 Netos, em vésperas de 14..."
Waldemar Pequeno viveu praticamente a sua vida no interior, no sertão. E quando me refiro a interior aí, quero dizer a vida nas pequenas cidades, nas pequenas vilas. Suas trovas, por isto, fixam muitas vezes os aspectos pacatos da vida interiorana, sua paisagem, seus costumes. Em algumas de suas quadras, há toda essa filosofia simplória do homem em seu pequeno mundo, realmente muito mais humano que o das grandes cidades, asfixiantes. Daí sua aspiração:
Quem me dera, solitário,
habitar naquele morro,
apenas com meu canário
meu cavalo, meu cachorro.
Eis o seu ideal:
Uma casinha na mata
uma espingarda e meu cão,
meu amor à espera, e o fogo
sempre aceso no fogão.
No morro ou na mata, seu anseio é por tranqüilidade. E' o sonho da casinha pequenina, a casa do caboclo, onde um é pouco, dois é bom, três é demais. Demais, é o modo de dizer, porque o amor multiplica e os filhos fazem da casa do caboclo uma verdadeira creche...
Não foi à toa que escrevi estas redondilhas, no meu "Festa de Imagens", sobre a "Matemática da Vida": "Matemática esquisita que das suas sempre faz... Ao final de nove meses somando dois, - multiplica, e ao invés de dois, às vezes: são três, são quatro, e até mais..."
E tudo começa afinal, com aquelas "duas coisas" que o poeta diz que bastam para a sua felicidade:
Duas coisas neste mundo
bastam para o meu agrado:
- pito de fumo de rolo,
mulher cosendo ao meu lado.
A poesia de Waldemar Pequeno recolheu a paisagem e o meio, nos seus versos. Quem conhece o Brasil por dentro, viaja com o poeta em seus versos, sentindo uma imensa alegria em descortinar o seu mundo.
A inclusão de seu nome ao lado de nomes como Belmiro Braga, Adelmar Tavares, Lilinha Fernandes, Baptista Nunes, é um simples ato de justiça à sua obra, aos seus versos, às suas trovas.
Aí estão rápidos traços da personalidade literária do trovador que não leva apenas o bandolim a tiracolo, para tecer madrigais à vida e à amada, mas que, de mosquete em punho, tem enfrentado o mundo e os homens...
J. G. DE ARAUJO JORGE Rio, XI/1960
Nasceu trovador além de ter nascido poeta. São duas coisas distintas numa só. Todo trovador é poeta mas nem todo poeta é trovador."
Waldemar Pequeno é poeta e é trovador. A trova que abre este volume é de uma sutileza profunda de pensamento:
Nunca fales com desprezo
de um vaso por ser grosseiro.
Só Deus sabe se ao fazê-lo
não tremeu a mão do oleiro.
E que dizer da beleza singela desta confissão?
Muitos mundos visitei
levado por meu destino.
- Mas nunca mais encontrei
o meu mundo de menino.
Em compensação, este mundo que o poeta diz que não encontrou, vai-se fragmentando imperceptivelmente nas suas cantigas.
Ao lado da trova levemente filosófica, a trova lírica desponta, espontânea e fresca:
Não sei, das flores da vida,
as que sejam do teu gosto.
As do meu - ninguém duvida -
são as rosas do teu rosto.
Waldemar Pequeno possui todas as qualidades do poeta-trovador. Simplicidade, aquele sutil jogo de palavras que enriquece tanto a trova em sua estrutura íntima, a imaginação, o lirismo inato. E ainda, essa vivência, indispensável à obra de arte, que lhe dá seiva e cor, perfume e vida.
A sua trova no 4 é arrancada de seu âmago:
Não há fonte neste mundo,
rolando por entre escolhos
que tenha o choro tão fundo
como a fonte dos meus olhos.
E finalmente, esta flor de trova, para usar a sua própria sugestão. A trova no 5:
Uma rosa, em minha cova,
talvez brote deste amor,
como se fora uma trova
sob o feitio de flor.
Nada mais, nada menos. Precisão absoluta na imagem. Floração lírica de singela e sugestiva beleza!
Aí estão as 5 primeiras trovas. Daqui para frente, leitor amigo, você seguirá sozinho, o ameno e sugestivo roteiro da poesia de Waldemar Pequeno. E estou certo de que se emocionará muitas vezes. Parará algumas outras para se extasiar diante da paisagem descortinada; se deixará surpreso, encantado com o canot dos versos; se extasiará com as florezinhas das trovas salpicando de cravos o chão do caminho para a morada do poeta...
Waldemar Pequeno, (Waldemar Dinis Alves Pequeno) é fluminense, de Piraí. Nasceu a 23 de Outubro de 1892, filho do cearense Pio Alves Pequeno e da mineira Maria Isabel Alves Pequeno.
Sua família radicou-se em Minas. Primeiro em Muriaé, depois em Barbacena, onde Waldemar fez o curso, e onde surgiu a vocação literária. Formou-se depois pela Faculdade de Direito, em Belo Horizonte, colaborando nessa época em jornais e revistas de várias cidades do Estado.
Iniciou sua vida como Delegado de Polícia em Aimorés, "em plena mata virgem, à margem do rio Doce, fronteira com o Estado do Espírito Santo, lutando contra a jagunçagem e o caudilhismo!
Waldemar teve uma vida aventurosa. Militou ativamente na política, participou de armas na mão nas revoluções de 1930 e 1932. Foi Delegado de Polícia em Goiânia; criou gado. Mas as rimas e as preocupações literárias eram a sua vocação.
Reside atualmente em Belo Horizonte. Depois das lides revolucionárias, um acontecimento o faria reintegrar-se em suas atividades literárias. Aberto um Concurso de Contos pela Prefeitura de Belo Horizonte, saiu vencedor.
Reescreveu então suas poesias antigas, acrescentou novas páginas e publicou em 1953 o primeiro livro: "Poemas das Vozes Distantes." Em 54, lançou "Ouro de Cuieté e Outras Histórias", livro laureado pela Academia Brasileira de Letras com o Prêmio "Afonso Arinos" e também premiado pela Academia Mineira de Letras. Em 55, saiu "Campanha Educativa do Trânsito". De suas obras publicadas, confessa Waldemar Pequeno que a que lhe é mais cara ao coração é "Ouro do Cuieté", onde narra episódios de sua infância e de sua vida dramática às margens do Rio Doce.
Em elementos que gentilmente nos forneceu, a mim e ao Luiz Otávio, informa que "tem inéditos, além de um livro de trovas a ser publicado, outro de poesia, um de contos e crônicas, e a autobiografia sob o título de "Retorno ao País da Vida".
E mais as obras seguintes: 114 Soldados, 3 Cozinheiras... 12 Netos, em vésperas de 14..."
Waldemar Pequeno viveu praticamente a sua vida no interior, no sertão. E quando me refiro a interior aí, quero dizer a vida nas pequenas cidades, nas pequenas vilas. Suas trovas, por isto, fixam muitas vezes os aspectos pacatos da vida interiorana, sua paisagem, seus costumes. Em algumas de suas quadras, há toda essa filosofia simplória do homem em seu pequeno mundo, realmente muito mais humano que o das grandes cidades, asfixiantes. Daí sua aspiração:
Quem me dera, solitário,
habitar naquele morro,
apenas com meu canário
meu cavalo, meu cachorro.
Eis o seu ideal:
Uma casinha na mata
uma espingarda e meu cão,
meu amor à espera, e o fogo
sempre aceso no fogão.
No morro ou na mata, seu anseio é por tranqüilidade. E' o sonho da casinha pequenina, a casa do caboclo, onde um é pouco, dois é bom, três é demais. Demais, é o modo de dizer, porque o amor multiplica e os filhos fazem da casa do caboclo uma verdadeira creche...
Não foi à toa que escrevi estas redondilhas, no meu "Festa de Imagens", sobre a "Matemática da Vida": "Matemática esquisita que das suas sempre faz... Ao final de nove meses somando dois, - multiplica, e ao invés de dois, às vezes: são três, são quatro, e até mais..."
E tudo começa afinal, com aquelas "duas coisas" que o poeta diz que bastam para a sua felicidade:
Duas coisas neste mundo
bastam para o meu agrado:
- pito de fumo de rolo,
mulher cosendo ao meu lado.
A poesia de Waldemar Pequeno recolheu a paisagem e o meio, nos seus versos. Quem conhece o Brasil por dentro, viaja com o poeta em seus versos, sentindo uma imensa alegria em descortinar o seu mundo.
A inclusão de seu nome ao lado de nomes como Belmiro Braga, Adelmar Tavares, Lilinha Fernandes, Baptista Nunes, é um simples ato de justiça à sua obra, aos seus versos, às suas trovas.
Aí estão rápidos traços da personalidade literária do trovador que não leva apenas o bandolim a tiracolo, para tecer madrigais à vida e à amada, mas que, de mosquete em punho, tem enfrentado o mundo e os homens...
J. G. DE ARAUJO JORGE Rio, XI/1960
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Fontes:
OTÁVIO, Luiz e JORGE, J. G. de Araujo. 100 trovas de Waldemar Pequeno. Editora Vecchi, 1959. Coleção Trovadores Brasileiros.
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