(Reconto a história ao estilo de Millôr Fernandes, segundo a ótica do sapo).
E aí, desesperado no meio da tempestade e da inundação, o escorpião pediu socorro ao sapo:
_ Ó amigão anfíbio, sapo-rei da natureza, me acuda, me leve para o outro lado do rio.
O sapo olhou meio desconfiado, mas não iria deixar o pobre vivente morrer ali daquele jeito:
_ Tudo bem, vamos lá, suba aí na minha garupa e se agarre bem.
E lá foram ambos na travessia daquele quase dilúvio ( ou seria Delúbio?). O escorpião não se cansava de elogiar o benfeitor:
_ Sabe, observando bem, até que esse rajado lhe cai muito bem.
_ Croac, deixa disso, escorpião.
_ É verdade. E essa boca, então, combina perfeitamente com o formato do corpo...
_ Agradecido, croac, agradecido, mas preste atenção na correnteza, não vá se soltar.
_ Mais do que isso, amigo do peito e das costas. Nunca tinha observado direito, mas até a sua voz é maviosa e musical.
_ Jura? Depois da minha sapa, você é o primeiro que me diz isso.
_ Tá vendo? Falta aos demais espírito crítico, senso estético e bom gosto.
_ Puxa, mas que surpresa mais agradável. Você é mesmo gente fina. Eu sempre tive uma impressão não muito favorável sobre os escorpiões, a fama não é boa.
_ Que bobagem, é tudo lenda, fofoca.
_ Ó dileto aracnídeo, nada como uma situação crítica como essa para a gente descobrir as virtudes dos seres vivos, quem é mesmo de confiança.
_ Verdade verdadeira, meu bom-samaritano, minha versão caridosa da barca de Caronte. Você até parece o São Cristóvão, ajudando o semelhante a atravessar a correnteza.
O sapo ficou ainda mais inflado de orgulho. Emocionado, confidenciou:
_ Olha, escorpião, você, bacana assim, se for passear na praia, vão pensar que se trata de um siri ou caranguejo com um toque diferente. Nem perceberão o seu ferrão que, aliás, diga-se de passagem, é muito estiloso.
_ Obrigado, ó, batráquio anuro, quanta gentileza de sua parte. Eternamente grato por ter me salvado.
Já chegando a outra margem, o sapo teve uma súbita curiosidade:
_ Me diga aí, escorpião, posso saber qual é o seu signo?
Antes mesmo de responder e de apear do salvador, o escorpião finca o seu ferrão nas costas do sapo, que tomba e olha desesperado para ele:
_ Seu maldito, serpente do mal, tomara que caia numa CPI... Eu salvo a tua vida, te trato como um ser respeitável, e você me envenena, me mata...
E o escorpião, sem qualquer complexo de culpa:
_ Me desculpe, querido sapo, eu sei de tudo isso, mas não posso fazer nada. Essa é a minha natureza.
Já agonizante, o sapo ainda pediu para que o escorpião se aproximasse porque queria fazer um último pedido. O escorpião inocentemente chegou perto e recebeu um jato de mijo nos olhos, ficando cego na hora.
O sapo então sorriu e morreu.
(Moral. Fazer o bem sem olhar a quem é algo divino. Mas uma vingancinha na hora certa também traz felicidade).
E aí, desesperado no meio da tempestade e da inundação, o escorpião pediu socorro ao sapo:
_ Ó amigão anfíbio, sapo-rei da natureza, me acuda, me leve para o outro lado do rio.
O sapo olhou meio desconfiado, mas não iria deixar o pobre vivente morrer ali daquele jeito:
_ Tudo bem, vamos lá, suba aí na minha garupa e se agarre bem.
E lá foram ambos na travessia daquele quase dilúvio ( ou seria Delúbio?). O escorpião não se cansava de elogiar o benfeitor:
_ Sabe, observando bem, até que esse rajado lhe cai muito bem.
_ Croac, deixa disso, escorpião.
_ É verdade. E essa boca, então, combina perfeitamente com o formato do corpo...
_ Agradecido, croac, agradecido, mas preste atenção na correnteza, não vá se soltar.
_ Mais do que isso, amigo do peito e das costas. Nunca tinha observado direito, mas até a sua voz é maviosa e musical.
_ Jura? Depois da minha sapa, você é o primeiro que me diz isso.
_ Tá vendo? Falta aos demais espírito crítico, senso estético e bom gosto.
_ Puxa, mas que surpresa mais agradável. Você é mesmo gente fina. Eu sempre tive uma impressão não muito favorável sobre os escorpiões, a fama não é boa.
_ Que bobagem, é tudo lenda, fofoca.
_ Ó dileto aracnídeo, nada como uma situação crítica como essa para a gente descobrir as virtudes dos seres vivos, quem é mesmo de confiança.
_ Verdade verdadeira, meu bom-samaritano, minha versão caridosa da barca de Caronte. Você até parece o São Cristóvão, ajudando o semelhante a atravessar a correnteza.
O sapo ficou ainda mais inflado de orgulho. Emocionado, confidenciou:
_ Olha, escorpião, você, bacana assim, se for passear na praia, vão pensar que se trata de um siri ou caranguejo com um toque diferente. Nem perceberão o seu ferrão que, aliás, diga-se de passagem, é muito estiloso.
_ Obrigado, ó, batráquio anuro, quanta gentileza de sua parte. Eternamente grato por ter me salvado.
Já chegando a outra margem, o sapo teve uma súbita curiosidade:
_ Me diga aí, escorpião, posso saber qual é o seu signo?
Antes mesmo de responder e de apear do salvador, o escorpião finca o seu ferrão nas costas do sapo, que tomba e olha desesperado para ele:
_ Seu maldito, serpente do mal, tomara que caia numa CPI... Eu salvo a tua vida, te trato como um ser respeitável, e você me envenena, me mata...
E o escorpião, sem qualquer complexo de culpa:
_ Me desculpe, querido sapo, eu sei de tudo isso, mas não posso fazer nada. Essa é a minha natureza.
Já agonizante, o sapo ainda pediu para que o escorpião se aproximasse porque queria fazer um último pedido. O escorpião inocentemente chegou perto e recebeu um jato de mijo nos olhos, ficando cego na hora.
O sapo então sorriu e morreu.
(Moral. Fazer o bem sem olhar a quem é algo divino. Mas uma vingancinha na hora certa também traz felicidade).
Fonte:
Nenhum comentário:
Postar um comentário