Dor
Não tenho mal nenhum, senhora minha,
como se fosse puro, imaculado,
como se fosse um anjo, um serafim,
como se fosse deus, imune à dor.
Eu nada sinto, dor nenhuma tenho,
quer na cabeça, quer no amargo peito.
Não tenho mal nenhum, senhora minha,
perfeitamente são me sinto e puro.
Se existe mal em mim, se existe dor,
é a de morrer tão cedo, a pleno sol,
envelhecer como qualquer mortal.
E a dor maior, minha senhora bela,
é dentro d'alma, bem profunda e aguda,
a dor chamada angústia, a dor de ser.
Possessão
Nada é meu,
nem a vida,
que é minha.
SÍSIFO
Para Cátia Silva
O meu destino é semelhante àquele
imposto ao legendário rei coríntio,
que carregava ao ombro para o monte
pedra que despencava em avalancha.
Buscava novamente a rocha bruta,
subia o monte e, mal chegava ao cimo,
de suas mãos sangradas escapava
o mineral, que ao solo retornava.
E assim jamais o seu suplício ao fim
chegava, mesmo exausto, quase morto.
O meu suplício é semelhante ao dele
- a cada “não” que tu me dizes, subo
minha montanha, carregando pedras,
que se desprendem de meus ombros, rolam
ladeira abaixo, e volto a ti, pedinte.
E tu de novo dizes “não”, sorrindo.
Apanho minha rocha, subo o monte.
Se conseguir chegar ao cimo e lá
deitar a pedra, ao chão fincá-la, o “sim”
de ti terei; porém fui condenado
a carregar meu fardo vida afora
e vê-lo escorregar pelas escarpas.
E quando quase morto me encontrar,
sabendo, embora, que somente “não”
a mim dirás, ainda assim direi:
“Melhor este suplício, a ser feliz
longe dos olhos teus, vizinho à morte”.
SONETO CREPUSCULAR
Para Francisco Carvalho
Nos campos de meu pai antigamente
as chuvas inundavam meus pensares
e do pomar do céu pingavam frutos.
Ventos ninavam aves repousadas
nas árvores vigias de seu sono,
sentinelas da luz crepuscular.
As ovelhas baliam suas crias,
os vaga-lumes alumbravam tudo
e a solidão das vacas nos currais.
Duendes se assustavam co’os trovões.
Na escuridão dos quartos o perfume
do amor gemente à sombra dos lençóis.
Invernos que de mim se evaporaram
nos campos de meu pai antigamente.
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Fonte:Não tenho mal nenhum, senhora minha,
como se fosse puro, imaculado,
como se fosse um anjo, um serafim,
como se fosse deus, imune à dor.
Eu nada sinto, dor nenhuma tenho,
quer na cabeça, quer no amargo peito.
Não tenho mal nenhum, senhora minha,
perfeitamente são me sinto e puro.
Se existe mal em mim, se existe dor,
é a de morrer tão cedo, a pleno sol,
envelhecer como qualquer mortal.
E a dor maior, minha senhora bela,
é dentro d'alma, bem profunda e aguda,
a dor chamada angústia, a dor de ser.
Possessão
Nada é meu,
nem a vida,
que é minha.
SÍSIFO
Para Cátia Silva
O meu destino é semelhante àquele
imposto ao legendário rei coríntio,
que carregava ao ombro para o monte
pedra que despencava em avalancha.
Buscava novamente a rocha bruta,
subia o monte e, mal chegava ao cimo,
de suas mãos sangradas escapava
o mineral, que ao solo retornava.
E assim jamais o seu suplício ao fim
chegava, mesmo exausto, quase morto.
O meu suplício é semelhante ao dele
- a cada “não” que tu me dizes, subo
minha montanha, carregando pedras,
que se desprendem de meus ombros, rolam
ladeira abaixo, e volto a ti, pedinte.
E tu de novo dizes “não”, sorrindo.
Apanho minha rocha, subo o monte.
Se conseguir chegar ao cimo e lá
deitar a pedra, ao chão fincá-la, o “sim”
de ti terei; porém fui condenado
a carregar meu fardo vida afora
e vê-lo escorregar pelas escarpas.
E quando quase morto me encontrar,
sabendo, embora, que somente “não”
a mim dirás, ainda assim direi:
“Melhor este suplício, a ser feliz
longe dos olhos teus, vizinho à morte”.
SONETO CREPUSCULAR
Para Francisco Carvalho
Nos campos de meu pai antigamente
as chuvas inundavam meus pensares
e do pomar do céu pingavam frutos.
Ventos ninavam aves repousadas
nas árvores vigias de seu sono,
sentinelas da luz crepuscular.
As ovelhas baliam suas crias,
os vaga-lumes alumbravam tudo
e a solidão das vacas nos currais.
Duendes se assustavam co’os trovões.
Na escuridão dos quartos o perfume
do amor gemente à sombra dos lençóis.
Invernos que de mim se evaporaram
nos campos de meu pai antigamente.
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Jornal de Poesia.
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