quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Carlos Leite Ribeiro (Esta Juventude ...)


(lamentos dos mais velhos...)

Mais velhos, não direi, talvez os mais antigos – de acordo?

No nosso tempo não se via disto – uma frase que se ouve com certa frequência aos mais antigos. Agora, vimos os jovens sempre agarradinhos e aos beijinhos por todo o lado.

No nosso tempo, não se via “esta vergonha” não; tínhamos uma enorme ingenuidade quase a roçar a santidade. Nós quase não olhávamos para as jovens pois tínhamos grande pudor e éramos demasiadamente envergonhados e tímidos. No meu tempo nem tínhamos tentação de saber se as carnes da nossa moça eram rijas ou moles; se ela sabia beijar bem; nem sequer um encosto mais apertado. Nada disso. Éramos uma perfeição. Nos bailes, dançávamos afastados das moças pelo menos um palmo; no escurinho do cinema, ficávamos sempre com as mãos em posição de oração e nunca por nunca a fazer pesquisas por sítios proibidos; para mais, tínhamos sempre a mamã sentada a nosso lado. Nenhuma parte de nosso corpo reagia à aproximação ou quando estamos junto da nossa amada. Nos dias de chuva, nunca procurávamos a entrada de um edifício ou mesmo o vão de uma escada; nunca (o pior era quando esses espaços já estavam ocupados por outro casal).

Nunca por nunca invejámos e muito menos desejámos a namorada dos outros ou mulher casada; nunca!

Rapazes como nós, já não existem.

Um certo colega, o Mário, certa vez foi apanhado por uma vizinha a fazer algo que não “devia” com uma moça. A dita (cuja) vizinha, chamou-o a sua casa para lhe dar uma grande lição de moral e, ao mesmo tempo, dar-lhe umas lições de sexologia prática; no dizer desta senhora já viúva há muitos anos, as lições seriam vinte… Mas o Mário contou a situação aos amigos e, quando a vizinha marcou nova lição, aparecemos a sua porta cerca de dez amigos. Resultado: não passou da primeira lição. O que éramos capazes para perder a nossa ingenuidade para nos integrarmos no mundo dos já muito adultos!

Volto a repetir: rapazes como nós, já não existem…

Também é preciso não esquecer que namorávamos com a moça à janela, mesmo que morasse num 5º andar enquanto o rapaz ficava na rua. Não tínhamos hipóteses nenhumas … Embora há quem diga que nós tínhamos uma “engenharia deveras criativa”; mas isso são boatos!

O caso melhorou (só um pouco) quando apareceram as “lambretas” que só tinham dois lugares e a mamã tinha que ficar de fora. O pior era quando a tal mamã marcava que de dez em dez minutos tínhamos que passar à sua porta ou num local pré-combinado.

E quando apareceram os Volkswagens de três mudanças para a frente e uma para trás? Para “conduzir” era precisa certa “habilidade” pois senão saiam dentro do carro que dolorosos torcicolos.

Rapazes como nós, já não existem…

Em 2001, escrevi este apontamento “MOMENTOS MARCAM UMA ÉPOCA ...”

Há nomes que nos marcam para sempre, principalmente, quando se referem à nossa juventude. Para mim, o nome Nan, traz-me recordações da minha meninice.

Teria uns dez anos, morava num rés-do-chão de um prédio da Pascoal de Melo (Estefânia – Lisboa), e no último andar, por sinal o 4º, morava a Nan, uma moça que na altura teria uns 16 ou dezassete anos. A mãe da moça, de nome Sen, viúva de um obscuro subchefe de uma repartição da função pública, era uma figura muito castiça: Muito magra, não muito alta, sempre vestida de preto e, fosse em que estação do ano fosse, andava sempre de sombrinha. Quando aqui em Portugal passou a telenovela “Tieta do Agreste” (que eu parodiei para a radiodifusão), logo me lembrei da D. Sen, que a vi retratada na “Charifú” desta novela. A Nan era filha única e sua mãe a defendia de todos e quaisquer “Moinhos de Vento” (eram como as mamães tratavam os rapazes). Se a moça lhe ia fazer algum recado (compra) perto de casa, logo a mãe se empoleirava na varanda começando logo a berrar assim que ela saía do prédio: “Nan ! não te demores, olha que eu estou aqui à tua espera !” ; ou “Nan ! estás a demorar muito ! Que estás para aí a fazer ?...”. Se nas traseiras da casa, a moça estava a estender a roupa na varanda, lá estava sua mãe ralhando comigo:

- “Olha lá menino, estás a olhar para as pernas da Nan ... etc ...”.

Recordo-me uma vez minha tia dizer em voz alta para ela ouvir bem:

- “Carlitos, não olhes para cima !Podes estar a cobiçar umas pernas que não valem nada ... “.

Claro que a opinião era de minha tia, porque a minha, embora não me recorde bem, talvez fosse uma “bela panorâmica” !

Mas voltando à Nan, andava num colégio de feiras, onde a mamã a ia levar e trazer. Recordo-me de um carnaval no Clube Estefânia, em que a D. Sen quando notava (?) que o par da filha a estava a agarrar “demais”, levantava-se e o ia afastar do corpo da filha. De tantas vezes que repetiu, que se tornou um escândalo hilariante. Nessa altura, um D. Juan da época, virou-se para a D. Sen, perguntando-lhe:

- “Olhe lá minha senhora, é católica ?”. A senhora olhando-o de frente, replicou-lhe:
- “Sou sim, seu desavergonhado !.

Então o “malandreco” respondeu-lhe perante a hilaridade de todos:

- “Então vá com Deus e deixe sossegada a sua filha!”.

Era assim a vida da Nan ...

Meses depois, a pequena, não se sabendo muito bem porquê, apareceu grávida. É verdade !. Já na gravidez avançada, tanto a mãe como ela, juravam a pés juntos que não sabiam com “aquilo tinha acontecido”. Algumas vizinha, (daquelas mais aconselhadas), aconselharam a D. Sen a ir a uma senhora de grande virtude, que morava na Horta das Tripas (Casal de Santa Luzia – Rua D. Estefânia) para que ela expulsasse o “Mafarrico” do corpo da moça, porque tal só podia ter sido “obra do diabo”. Outras menos “cultas” diziam que tinha era sido “obra e graça do Espírito Santo”...

Fosse como fosse nasceu um bebé que teve como nome Francisco (o Chiquinho).

Muito mais tarde, já a D. Sen tinha entregado a alma a Deus e o corpo à terra fria, a Nan confessou que “talvez fosse obra de um ajudante de limpa-chaminés”. Na altura, existiam em Lisboa o “limpa-chaminés” que subiam aos telhados, ponham uma corda muito comprida dentro das chaminés e tiravam a “ferrugem”; pelo menos faziam muito lixo. Normalmente quem tinha a chave da porta que dava para o telhado era o locatário do último andar. Assim, um dia, a Nan foi abrir a porta ao ajudante de limpa-chaminés, enquanto o mestre ficava junto às chaminés das cozinhas, segurando a corda, o ajudante abanava - a no telhado.
Ainda segundo o relato da Nan “foi tudo muito rápido”. Nós podemos acrescentar: Rápido e Eficiente! Ficámos sem saber se teria sido no abrir da porta, ou, ao abanar da corda. Mas isso também não interessa.

Claro que a moça teve depois vários namorados.

Enquanto estes esperavam pela dama, havia sempre um “malandreco” a avisá-lo:

- “Não cuspas para cima que ela pode engravidar ...”.
E assim, o nome de Nan, ficou sempre gravado na minha memória ...

(von Trina - Março 2001)

Fonte:
Colaboração do Autor.

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