Um passeio nas vans que circulam de bar em bar
Bares do Itaim, Jardins e Pinheiros andam oferecendo um serviço exclusivo para bebuns. É uma van que os leva até em casa. Trata-se, com o perdão de um trocadilho, de um pinga-pinga de pinguços. As vans circulam de bar em bar. arrebanhando os etílicos, durante a madrugada.
Desde que o novo Código de Trânsito entrou em vigor, a polícia anda rondando perto dos bares, bafômetro a postos, em busca de motoristas infratores. Com as vans, os bares garantem faturamento. Os clientes podem mergulhar nos copos, sem depois arriscar a pele no asfalto. Serviços semelhantes já existem na Europa, nos Estados Unidos e no Japão. Raramente tomo umas e outras. Soube, entretanto. que o clima nas vans é animadérrimo. Imaginem seis bêbados indo para casa. A van estaciona para pegar o sétimo, em novo bar. Descem os seis primeiros.
E aí, que tal a saideira?
Dá-lhe! O inocente que saiu para tomar um ou dois uísques entra na animação. Acorda embaixo do balcão de uma padaria. Também são freqüentes os tipos belicosos e as discussões capazes de resolver o problema do futebol brasileiro.
Eu já disse que o Ronaldinho...
Ah, nego vem falar do Ronaldinho! Não vem! Nãããão veeeeem!
O Ronaldinho? O Ronaldínho?
Sóbrio por necessidade profissional. o motorista tenta aplacar os animos.
-Ô, pessoal, o Ronaldinho joga um bolão.
Os seis se unem.
- Cala a boca!
O coitado silencia. Abre a janela. É obrigado a dirigir a madrugada toda de vidro abaixado. Até o ar está impregnado. Se respirar mais fundo, fica de fogo.
Mais uma parada, entra um rapaz. Tomou só um ou dois goles.
- Eu sozinho. Lembrei da van. Que negócio é esse de ir para casa tão cedo?
Novo tropel. No veículo. fica só um, desmaiado, lá no fundo. Os outros descem, atrás de nova rodada. A van é ideal para fazer amizades. Há quem chegue até mais longe.
A senhora não está bêbada! - desconfia o motorista.
Ela afina a voz, bambeia as pernas.
- Estou bebinha, sim!
Consegue entrar. Aperta-se entre todos. Examina um por um, com o olhar esperto. Um está bêbado demais. Outro, passado da idade. O terceiro, sim, serve! Tem perfil de executivo. Ela afia as garras. Ele nem desconfia., quando descem no mesmo prédio. Sobem juntos no elevador, aterrissam no mesmo andar. Começa a ficar cabreiro quando, após várias tentativas, consegue botar a chave na porta e percebe que ela o espera. Não há tempo para perguntas. Ela entra depressa, vai até o bar e prepara dois uísques. Ele cai duro no sofá. Consegue erguer uma das pestanas meia hora depois.
Quem é você? - pergunta, trêmulo.
Você me convidou para um uísque! - ela retruca, revoltada.
O executivo vasculha o cérebro. Não consegue lembrar. Mas deve ter convidado. Senão, por que ela estaria em sua sala? Bebe mais uma dose para acordar e desmaia. Na semana seguinte, ela já está falando em casamento. Ele continua não se lembrando de nada.
Também existem alpinistas sociais. Como o sujeito que mora na periferia. Quer chegar em casa de carro. A maior parte dos bares adota limites mínimos de consumo, para dar direito a carona. Ele bebe o mínimo. Depois, exige que o levem para a casa. O motorista quase cai nas barrancas do Tietê para chegar até lá. O falso bebum desce alegremente. Os amigos, admirados.
-Tu tá por cima. hein, malandro? Chegando em casa de chofer!
Sorri, vitorioso. Sai mais barato do que táxi. O bêbado desmemoriado é uma tragédia.
O senhor não se lembra do endereço?
Eu aaaaaaaaaacho que é virando aquela rua...
Toca a vasculhar quarteirões.
Certo tipo de bebum não vai de van. É o imprevidente, que saiu de casa em seu próprio carro. O bar oferece o motorista. que dirige para o cliente. Mas bêbado detesta terminar a noite sozinho.
Soooobe aí. Veeeem tomar uma comigo.
Sinto muito. A van do bar vem me pegar em meia hora, esquiva-se o motorista.
Soooobe só meia hooora.
O chofer acaba mais bêbado do que o cliente. Quando a van chega, está cantando na sarjeta. Há quem possa se espantar com a idéia. É uma medida civilizada. Com este calor, poucos resistem a um chope, ou a dois, a três, quatro... Ficam a salvo pedestres e postes!
Fonte:
Revista VEJA. São Paulo. 11 de março 1998.
Bares do Itaim, Jardins e Pinheiros andam oferecendo um serviço exclusivo para bebuns. É uma van que os leva até em casa. Trata-se, com o perdão de um trocadilho, de um pinga-pinga de pinguços. As vans circulam de bar em bar. arrebanhando os etílicos, durante a madrugada.
Desde que o novo Código de Trânsito entrou em vigor, a polícia anda rondando perto dos bares, bafômetro a postos, em busca de motoristas infratores. Com as vans, os bares garantem faturamento. Os clientes podem mergulhar nos copos, sem depois arriscar a pele no asfalto. Serviços semelhantes já existem na Europa, nos Estados Unidos e no Japão. Raramente tomo umas e outras. Soube, entretanto. que o clima nas vans é animadérrimo. Imaginem seis bêbados indo para casa. A van estaciona para pegar o sétimo, em novo bar. Descem os seis primeiros.
E aí, que tal a saideira?
Dá-lhe! O inocente que saiu para tomar um ou dois uísques entra na animação. Acorda embaixo do balcão de uma padaria. Também são freqüentes os tipos belicosos e as discussões capazes de resolver o problema do futebol brasileiro.
Eu já disse que o Ronaldinho...
Ah, nego vem falar do Ronaldinho! Não vem! Nãããão veeeeem!
O Ronaldinho? O Ronaldínho?
Sóbrio por necessidade profissional. o motorista tenta aplacar os animos.
-Ô, pessoal, o Ronaldinho joga um bolão.
Os seis se unem.
- Cala a boca!
O coitado silencia. Abre a janela. É obrigado a dirigir a madrugada toda de vidro abaixado. Até o ar está impregnado. Se respirar mais fundo, fica de fogo.
Mais uma parada, entra um rapaz. Tomou só um ou dois goles.
- Eu sozinho. Lembrei da van. Que negócio é esse de ir para casa tão cedo?
Novo tropel. No veículo. fica só um, desmaiado, lá no fundo. Os outros descem, atrás de nova rodada. A van é ideal para fazer amizades. Há quem chegue até mais longe.
A senhora não está bêbada! - desconfia o motorista.
Ela afina a voz, bambeia as pernas.
- Estou bebinha, sim!
Consegue entrar. Aperta-se entre todos. Examina um por um, com o olhar esperto. Um está bêbado demais. Outro, passado da idade. O terceiro, sim, serve! Tem perfil de executivo. Ela afia as garras. Ele nem desconfia., quando descem no mesmo prédio. Sobem juntos no elevador, aterrissam no mesmo andar. Começa a ficar cabreiro quando, após várias tentativas, consegue botar a chave na porta e percebe que ela o espera. Não há tempo para perguntas. Ela entra depressa, vai até o bar e prepara dois uísques. Ele cai duro no sofá. Consegue erguer uma das pestanas meia hora depois.
Quem é você? - pergunta, trêmulo.
Você me convidou para um uísque! - ela retruca, revoltada.
O executivo vasculha o cérebro. Não consegue lembrar. Mas deve ter convidado. Senão, por que ela estaria em sua sala? Bebe mais uma dose para acordar e desmaia. Na semana seguinte, ela já está falando em casamento. Ele continua não se lembrando de nada.
Também existem alpinistas sociais. Como o sujeito que mora na periferia. Quer chegar em casa de carro. A maior parte dos bares adota limites mínimos de consumo, para dar direito a carona. Ele bebe o mínimo. Depois, exige que o levem para a casa. O motorista quase cai nas barrancas do Tietê para chegar até lá. O falso bebum desce alegremente. Os amigos, admirados.
-Tu tá por cima. hein, malandro? Chegando em casa de chofer!
Sorri, vitorioso. Sai mais barato do que táxi. O bêbado desmemoriado é uma tragédia.
O senhor não se lembra do endereço?
Eu aaaaaaaaaacho que é virando aquela rua...
Toca a vasculhar quarteirões.
Certo tipo de bebum não vai de van. É o imprevidente, que saiu de casa em seu próprio carro. O bar oferece o motorista. que dirige para o cliente. Mas bêbado detesta terminar a noite sozinho.
Soooobe aí. Veeeem tomar uma comigo.
Sinto muito. A van do bar vem me pegar em meia hora, esquiva-se o motorista.
Soooobe só meia hooora.
O chofer acaba mais bêbado do que o cliente. Quando a van chega, está cantando na sarjeta. Há quem possa se espantar com a idéia. É uma medida civilizada. Com este calor, poucos resistem a um chope, ou a dois, a três, quatro... Ficam a salvo pedestres e postes!
Fonte:
Revista VEJA. São Paulo. 11 de março 1998.
Nenhum comentário:
Postar um comentário