domingo, 6 de junho de 2010

Rubenio Marcelo (Poemas Ao Sabor das Ondas )

Canoa Quebrada (Aracati/CE)
LUZ DA SABEDORIA
(ou "Soneto de reflexão")

As maiores virtudes, incontestes,
são a nobre humildade e a calmaria.
Quem as tem, demonstra sabedoria,
pois segue a lição do Mestre dos mestres.

Assim são os jograis do dia-a-dia,
À mercê das cidades e agrestes,
sublimando as oferendas celestes
e criando essências de primazia...

Quanta luz tem um cego na esquina
tocando uma rebeca peregrina,
espargindo arte pura em seu mister...

E quanta escuridão possui o ser
que se julga sapiente, mas sem ver
que há saberes que só Deus nos ensina.

A CRUZ DE UM ADEUS

(Soneto Inglês)

Já é madrugada. Eu estou pela rua...
Na trilha dourada dos olhos da lua.
No meu desvario, na minha tristeza,
Ainda aprecio os dons da Natureza.
E assim, sem destino, tal qual vaga-lume,
Aos entes sagrados faço meus queixumes.
Ao longe, o clarão dos astros em prumo...
E o meu coração errante, sem rumo.
A brisa vadia soprando com jeito...
E uma agonia tomando meu peito.
Estrelas cadentes brincando no céu...
E eu, decadente, pervagando ao léu.

Cometas pulsando pertinho de Deus...
E eu carregando a tal cruz de um adeus!

TRIBUTO POÉTICO
*Para o amigo, médico e sonetista
Herculano Alencar, poeta piauiense residente atualmente em São Paulo.

Qual Cronin, João Guimarães e Scliar,
Que trouxeram o pendor da Medicina
E o mesclaram com a arte genuína,
Assim é nosso Herculano Alencar.

Escritor de inspiração singular,
É mestre da cultura cordelina;
Mas também do Soneto tem a mina,
Sendo, enfim, erudito e popular.

Seu estilo é autêntico, sem arranjos;
Seu mister relembra Augusto dos Anjos,
Pelo verso forte que traz em si.

Menestrel - orgulho do Piauí,
Trovador de estilo soberano:
Assim é o nosso bardo Herculano!

AOS MENESTRÉIS CANTA(DORES)
*Para Geraldo Amâncio, Daudeth Bandeira e José Dantas

Airosos, cheios de brio,
versando horas a fio,
Esgrimindo em desafio,
duelam os dois contendores...
Eivados de alegoria,
embolam-se em desvario,
Com sestros de Artilharia
e estro de Cantadores.
Impávidos guardiões
de sublimações em flamas!
Feitores de encantações!
Plácidos guerreadores!
Jograis de almas ufanas
que rimam fazendo famas
E brilham ostentando as chamas
dos seus gênios criadores.
Seus desenvoltos repentes,
garridos, cheios de manha,
Articulam-se, ferventes,
em compassos viajores...
Qual par de gladiadores,
engalfinham-se na sanha,
Replicam sagas estranhas
e aventuras multicores...

... E com o dom das entranhas,
alardeando furores
E proferindo façanhas,
abraçam-se os dois sonhadores!

SONHOS DA BEIRA DO MAR

Tocando meus dedos nas cordas plangentes
Do meu violão, antigo companheiro,
Relembro o meu vulto-menino fagueiro,
Brincando nas praias de areias ardentes...

Saudosos instantes, distantes, ausentes,
Que me inquietam e me deixam sem jeito;
Machucam, maltratam, martelam meu peito,
Torturam minh’alma com rijos tridentes.

É só nostalgia, cilícios medonhos,
Que hoje acompanham o meu caminhar;
E nessa agonia, meu ser-avatar

Palmilha, sem lar, caminhos tristonhos;
Cantando elegias que às vezes componho,
Lembrando meus sonhos da beira do mar!

MEU SONETO DO EXÍLIO

Não esqueço as toadas, cantigas tão belas
Que fiz só pra ela (e a noite levou...);
E a brisa marinha que testemunhou
Nós dois bem juntinhos, fitando as estrelas...

Não esqueço as manhãs branqueadas de velas,
Fantásticas telas – beleza sem par –
Balouçando, aos ventos, num lindo bailar,
Seduzindo as ondas, vencendo as procelas...

Recordo a tardinha, dia, mês e ano,
Em que eu abracei meu destino cigano
E, em meio a geenas, fui peregrinar...

Hoje, estou vagando (cerviz combalida)
Lembrando os enlevos reais da minha vida
Que, um dia, ficaram na beira do mar.

GRAAL DAS METÁFORAS

Nestas cálidas tardes peregrinas,
Se estiveres já sem inspiração,
Ante espelhas da desfiguração.
Que perverte a céu das tuas retinas ...

Se estas haras infaustas de rotinas
Demudarem teu ser, tua alegria;
E se vires fugir a primazia,
Devida - deste mundo. - à avareza ...

Vem saciar tua sede de beleza
Nas sagradas águas da poesia! ...

Na devir deste cetro venerando,
Um clarão logo exclui as ignotos.
Na rota das indômitos pilotos,
Os mistérios azuis vão rebrotando ...

O graal das metáforas vai doirando
Os brasões da Verbo, com sutileza;
E a Arte, esta divina alquimia,
Vai transfazendo sanha em realeza.

Nas sagradas águas da poesia,
Vem saciar tua sede de beleza! ...

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