terça-feira, 17 de abril de 2018

Filemon F. Martins (Poemas Escolhidos) II


CONTRASTE

Tu és feliz, a vida é um paraíso,
onde há paz, ventura em profusão,
e a graça singular do teu sorriso,
– símbolo da Beleza e Perfeição!

Mas eu sou infeliz, pois já diviso
na luz do teu olhar, ingratidão,
e sem querer eu sinto que preciso
esquecer-te e viver na solidão.

Julgara que tu fosses, ó querida,
meu segredo, meu sonho, minha vida,
minha eviterna e santa inspiração…

Mas tu és assassina do meu sonho,
vives feliz e eu vivo tão tristonho,
sentindo que esta vida é uma ilusão!

SEM FRONTEIRAS 

Viajo com as nuvens. Sou poeta. 
Gosto de dar vazão ao pensamento. 
Sou capaz de chegar ao firmamento 
e voltar para a terra como atleta. 

Na terra, pego a minha bicicleta, 
vou pedalando mesmo contra o vento, 
enquanto os versos nascem no acalento 
de uma paixão suave e não secreta. 

Não há fronteiras, pois o amor é brando, 
poetas são assim, vivem sonhando 
com um mundo feliz e mais humano. 

Não importa se a vida é muito breve, 
o amor é intenso e o fardo fica leve 
quando o perdão se torna soberano.

PREDESTINADO

Passo a passo, vivendo solitário,
– predestinado para o sofrimento,
vou subindo o meu íngreme calvário
sob o peso da mágoa e do tormento.

R como um sonhador,  no mundo vário,
procuro paz, amor, contentamento,
mas no meu tortuoso itinerário
só encontro amargura e fingimento.

E a esperança da vida vai passando,
e eu descrente de tudo vou ficando,
na solidão que o mundo me ofertou;

mas a poesia, doce companheira,
está sempre comigo a vida inteira,
dando-me a paz que a sorte me negou!

GARIMPANDO A FELICIDADE

Vou garimpando pela vida afora
a lição de Humildade que conforta
e traz ao coração a Luz da aurora,
mesmo que a crença já pareça morta.

De solo em solo, busco sem demora
o cascalho do Amor que aduba a horta.
Busco a pedra da Fé, que revigora
e prepara o caminho abrindo a porta.

Não quero, meu amigo, andar a esmo,
minha sorte depende de mim mesmo,
que a vida pode ser melhor assim.

E se meus passos forem tão errantes,
buscando joias, pedras, diamantes,
- não haverá felicidade em mim!

MEU VERSO

Meu verso vem do Nordeste, 
vem do roçado, vem do Sertão, 
vem das veredas lá do agreste, 
vem das cacimbas e dos grotões. 

Meu verso vem dos garimpos, 
das catras dos garimpeiros, 
da coragem dos vaqueiros 
vestidos no seu gibão, 
vem do sereno da noite 
do perfume do Sertão. 

Meu verso simples, sem medo, 
vem do sítio, do rochedo, 
vem do povo do Sertão, 
que com a luz do arrebol 
trabalha de sol a sol 
para ganhar o seu pão. 

Vem da Serra do Carranca 
onde a beleza não manca, 
e a onça faz sentinela. 
Da Serra da Mangabeira 
onde a Lua vem brejeira 
tecer a renda mais bela. 

Meu verso vem da goiaba, 
do puçá e da mangaba, 
da seriguela e do mamão. 
Da pinha e da acerola, 
da atemóia e graviola 
plantadas no roçadão. 

Nasceu na bela Umbaúba, 
Boa Vista, Bela Sombra, 
na Lagoa de Prudente, 
na Chiquita e no Vanique, 
onde há muito xique-xique 
e o sol parece mais quente. 

Brejões, Lagoa do Barro, 
Santo Antonio, Traçadal, 
Olho D´Água, Rio Verde, 
Baixa dos Marques, Coxim, 
Ibipetum, depois Pintada, 
onde passa a velha estrada, 
Zequinha e Lamarca morreram. 

Sodrelândia, Deus me Livre, 
Pé de Serra, Poço da Areia, 
Riacho das Telhas também. 
Poço do Cavalo, Matinha, 
Mata do Evaristo e Veríssimo, 
Olhodaguinha e Ipupiara. 

Meu verso nasceu no mato, 
não tem brilho, nem ornato, 
vem do Morro do Mocó, 
da Serra do Sincorá, 
vem do morro do Araçá, 
nasceu pobre e vive só...

Fontes: 
- Aparício Fernandes (organizador). Poetas do Brasil. 
Anuário de 1980. 3o volume. Rio de Janeiro: Folha Carioca, 1980.
- Filemon F. Martins. Anseios do coração. São Paulo: Scortecci, 2011

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