— As coisas não são o que são, mas também não são o que não são — disse o professor suíço ao estudante brasileiro.
— Então, que são as coisas? — inquiriu o estudante.
— As coisas simplesmente não.
— Sem verbo?
— Claro que sem verbo. O verbo não é coisa.
— E que quer dizer coisas não?
— Quer dizer o não das coisas, se você for suficientemente atilado para percebê-lo.
— Então as coisas não têm um sim?
— O sim das coisas é o não. E o não é sem coisa. Portanto, coisa e não são a mesma coisa, ou o mesmo não.
O professor tirou do bolso uma não barra de chocolate e comeu um pedacinho, sem oferecer outro ao aluno, porque o chocolate era não.
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DIÁLOGO FINAL
— É tudo que tem a me dizer? — perguntou ele.
— É. — respondeu ela.
— Você disse tão pouco.
— Disse o que tinha para dizer.
— Sempre se pode dizer mais alguma coisa.
— Que coisa?
— Sei lá. Alguma coisa.
— Você queria que eu repetisse?
— Não. Queria outra coisa.
— Que coisa é outra coisa?
— Não sei. Você que devia saber.
— Por que eu devia saber o que você não sabe?
— Qualquer pessoa sabe mais alguma coisa que outro não sabe.
— Eu só sei o que eu sei.
— Então não vai mesmo me dizer mais nada?
— Mais nada.
— Se você quisesse…
— Quisesse o quê?
— Dizer o que você não tem para me dizer. Dizer o que não sabe, o que eu queria ouvir de você. Em amor é o que há de mais importante: o que a gente não sabe.
— Mas tudo acabou entre nós.
— Pois isso é o mais importante de tudo: o que acabou. Você não me diz mais nada sobre o que acabou? Seria uma forma de continuarmos.
Fonte:
Carlos Drummond de Andrade. Contos plausíveis. Publicado em 1981.
Carlos Drummond de Andrade. Contos plausíveis. Publicado em 1981.
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