sábado, 10 de julho de 2010

Olga Agulhon (O Bezerrinho Malhado)

Ilustração de Neide Rocha Portugal
Isa havia completado cinco anos. Houve festa na Fazenda São Pedro, mas não ganhou, no dia, o presente que mais esperava dos pais, pois o que tinha pedido ainda estava para nascer. Queria, há muito, um bezerrinho só para ela.

Duas semanas depois, três vacas deram cria. Isa, quando viu os bezerrinhos, não teve dúvida. Encantou-se, de imediato, com o bezerrinho malhado, cria da Mimosa.

– É esse, papai! Que lindo o meu presente!

– Escolha outro, filha. Esse é macho, vai virar touro. Já temos muitos na fazenda; o suficiente para cobrir as vacas que temos; não pretendo ficar com ele.

– Mas, pai, ele…. É o meu presente… É esse que eu quero.

– As outras duas são novilhas. Escolha uma delas, e os bezerrinhos que ela tiver, quando ela crescer, também serão seus. Se escolher o malhadinho, não prometo que ficará com ele até adulto.

Mas Isa nem ouvia mais o pai. Estava a acariciar o bezerrinho. Ninguém a faria mudar de idéia.

Sua vida mudou. Tornou-se mais alegre. Na maior parte do tempo estava com o bezerrinho. No começo ele era arisco, mas logo se tornou dócil; parecia entender a menina, que chegava a fazê-lo de cavalinho.

O bichinho chegou a desgarrar-se da mãe, como se ela fosse menos importante que Isa. Ambos foram crescendo e a amizade entre eles era cada vez maior.

As coisas na fazenda também foram mudando. O pai de Isa estava mecanizando a terra para plantar soja e, para isso, estava acabando com o rebanho. Ficara apenas com umas poucas vacas de leite e escolhera o melhor touro.

Malhado crescera, já era touro e não havia mais lugar para ele na fazenda. O pai de Isa nem pensou que a filha, depois de tanto tempo, iria ligar. Vendeu-o, junto com os outros, para um leiloeiro.

Quando a menina chegou da escola, ficou desesperada. Chorou o resto do dia, mas os pais não lhe deram muita atenção. Acharam que passaria a sua dor.

Ao levantar-se, no dia seguinte, Isa continuou fazendo suas tarefas. Nos momentos em que estaria com Malhado, permanecia no quarto, tentando ler alguma coisa, mas não conseguia distrair os pensamentos. Foi ficando cada dia mais triste, comendo menos, até cair doente. Pegou uma forte gripe, a gripe piorou, virou pneumonia.

Já havia passado um mês da venda do Malhado, quando o pai de Isa viu-se obrigado a sair à procura dele. Buscou notícias por toda parte. Achou a pessoa que o havia comprado do leiloeiro.

O dono, um tal de Onofre, adquirira o animal para cobrir suas vacas, mas não teve sorte.

– Olha, moço, não sei o que tinha o touro! Parecia doente, às vezes até triste. Estava sempre isolado do resto do gado e não cobria as vacas. Nem umazinha. Assim, não servia, não senhor.

Homem prático e conhecedor de gado que era, o senhor Onofre não insistiu; comprou um bom reprodutor e vendeu Malhado para o frigorífico.

Desanimado e desorientado, o pai de Isa pensou, então, em procurar um substituto, outro touro bem parecido. Talvez Isa percebesse que não era o mesmo; afinal, já fazia muito tempo que ela não via o Malhado. Ficou dois dias fora de casa rodando a região e, enquanto isso, Isa piorava.

No terceiro dia, ele retornou com um touro em cima do caminhão.

– Que sorte, Marta! Comprei pelo dobro do preço, mas vai valer a pena. Achei um touro igualzinho ao Malhado. Nossa filha não perceberá nenhuma diferença. Ficará contente, ficará boa. Vá correndo buscá-la.

Dona Marta voltou com a filha no colo, pois a menina estava muito fraca para andar.

– Olhe, Isa, achamos os seu Malhado!

A menina virou a cabeça, sem forças, em direção ao touro. Seus olhos se entristeceram ainda mais. Não disse palavra alguma. Voltou a cabeça para o colo da mãe e deu mais um suspiro.

Fonte:
AGULHON, Olga. Germens da terra. Maringá: Midiograf, 2004.

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