quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Erasmo Pilotto: o Educador Paranaense


artigo de Denise Grein Santos

Se você sorri quando digo uma coisa sagrada, eu não me irrito, passa a ser um problema saber como fazer você chorar diante das coisas sagradas.
Graal

As palavras são do próprio Erasmo e praticamente resumem sua vida. A de um professor imerso na missão de educar, consciente de sua ação, vendo cada aluno em sua individualidade, destacando os aspectos a serem desenvolvidos.

Os que tiveram o privilégio de tê-lo como professor perceberam logo o caráter incomum do Mestre e sua dedicação constante. Ele comentou, certa vez, que após um dia de aula costumava, à noite, meditar e avaliar o trabalho do dia, detendo-se em cada aluno, questionando-se como contribuir para seu desenvolvimento. Para ele a educação era integral. Não se restringia a conteúdos programáticos e horários escolares, abrangia tudo que se referisse à formação do homem.

Uma de suas ex-alunas, Aliete Pina de Oliveira, tentando defini-lo disse: "Erasmo é inteiro; porta o discernimento do filósofo puro, a sensibilidade do artista, a humanidade do bom, o serviço do cidadão prestante e a alegria de criar e conduzir um adolescente. E, como, estes, é capaz de sonhar e maravilhar-se".

É essa inteireza que o faz procurado diariamente por professores de diversos níveis, artistas, músicos, estudiosos de todas as áreas. A todos atende, ouve, ajuda. Discorre sobre o assunto solicitado. Apresenta os pressupostos básicos, a fundamentação teórica, aprofunda o tema, critica, anota e emite sugestões práticas. Implícita à informação, há uma pedagogia subjacente a de melhor entender o outro.

A pessoa sai com uma orientação sólida e bem estruturada e ele retorna aos estudos que generosamente abandonara para auxiliar quem o procurara.

Quando se fala de sua imensa biblioteca, que ocupa 75% de sua casa, conta que leu tudo. Tudo lido, meditado e comentado. O quadro-negro registra alguns tópicos dessa reflexão constante. Pensamentos de Goethe, Nietzche, Tolstoi, Tagore, Schiller, Spinoza, ou de outro pensador em estudo no momento, juntamente com os livros espalhados pelo chão, são evidências de aprimoramento permanente.

Aos dezesseis anos decidiu ser professor. Opção séria e aprofundada. Empenhou-se na tarefa e a praticou a vida inteira, tendo presente o ideal de Spinoza e Goethe definido no misto de alegria e perfeição. Eis a síntese de Erasmo: tudo por inteiro, com perfeição, imerso no sentido puro da alegria.

Palmilhemos sua vida e iremos encontrar sempre essas qualidades. Primeiro, professor de classe. Lecionou na Escola Normal de Paranaguá, no Grupo Escolar Professor Brandão, na Escola de Professores de Curitiba; como "Assistente Técnico" sua participação foi marcante. Pregou a escola viva e conseguiu fazer com que os alunos vivessem a escola, desenvolvendo neles o gosto pelas artes, poesia e música. É a época áurea da Escola de Professores. Seu espírito de liderança contagiou os colegas que se entusiasmaram pelo ato de educar. Conquanto não se falasse em educação para superdotados ele já há exercia há quarenta anos. Dispôs-se a despertar em cada aluno o que tivesse de seu, a levá-lo a estruturar "seu plano pessoal de vida, a liberdade de escolha, a vida inventada" (Obras). Incentivou a criatividade de seus discípulos, preparando-os para levar aos bairros operários espetáculos de alto nível, ampliando a função da escola, colocando-a a serviço da comunidade.

Entretanto sua ação não pára aí. Funda o Instituto Pestalozzi, a Associação de Estudos Pedagógicos, onde edita excelente revista, com sugestões para o enriquecimento da prática educacional. Participou da criação da Escola de Música e Belas Artes do Paraná e do Salão Paranaense. Secretário de Educação e Cultura percorreu o estado propondo soluções diversificadas e compatíveis com a realidade de cada situação.

Foi co-fundador de "Joaquim", revista mensal de artes, dedicado ao homem, mais especificamente "a todos os joaquins do Brasil". Aí igualmente valoriza o talento local, entrevistando e enaltecendo o trabalho dos artistas paranaenses.

Na plenitude de seu trabalho cabe por em relevo a manifestação de seu pensamento eclético e profundo contido em seus artigos e observações sobre o ensino no Paraná, na criação de um método de alfabetização para suprir a escassa escolaridade das professoras de escolas isoladas e na mais alta filosofia educacional, exposta nos minuciosos e notáveis estudos sobre diversos pensadores em sua estreita correlação com a educação. Além disso, escreveu sobre Turin, de Bona, Emiliano e Mallarmé, evidenciando sua preocupação de vincular a vida à arte e à educação.

Por sua inteireza é o grande educador paranaense. Rousseau, Montaigne, Pestalozzi e outros não alcançaram, em vida, a justa valorização. Erasmo também. Embora reverenciado em nossos círculos intelectuais não teve, ainda, bem como sua obra, a divulgação e o reconhecimento que merece. É inegável que ele próprio, por seu modo de vida, contribui para isso. Não obstante sempre pronto a receber e ajudar quem o procura mostra-se avesso às homenagens e honrarias. Recusa, sistematicamente, convites, esquivando-se de comparecer a eventos culturais que visam promovê-lo. Prefere a privacidade de sua casa, com seus livros, suas telas e sua música.

Orgulhoso de sua origem, escolheu dedicar sua vida, ação e obra à terra natal, com o sentido da perfeição definido por Goethe e por ele praticado: "se queres atingir o infinito, busca o finito em todas as suas direções".
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Artigo publicado na Gazeta do Povo - 24/ 05/ 1989 - 9a p.

Fontes:
http://www.artes.ufpr.br/erasmopilotto/depoimentos.htm
Foto = http:// www.ieppepoficial.kit.net/erasmopilotto.htm

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