O Paraná é rico em tradições folclóricas, assim como os demais estados brasileiros. Os costumes indígenas, podemos afirmar, são os mais antigos hábitos da terra e muitas influências legaram à nossa cultura. A língua portuguesa, por exemplo, de onde parte e retorna nosso mundo real e imaginário, recebeu inúmeras influências do tupi. Além disso, a imaginação do europeu, que aqui aportou na aurora da conquista, se redimensionou com os mitos e costumes indígenas. Por exemplo, em todo o Paraná, assim como em quase toda a América, o milho é parte integrante da culinária; a nossa pamonha, nosso bolo de milho ou o curau estão presentes em qualquer festa junina, ou festa de roça na época da colheita. Esse hábito herdamos dos índios e até hoje os guaranis ainda fazem o batismo do seu milho, confeccionando seus Mbojape, nossa pamonha ancestral.
No litoral, as tradições se encontram no cotidiano; em muitas localidades ainda se pratica o artesanato tradicional. Os potes de barro, os trançados, as pinturas com traços europeus e índios, podem ser encontrados em lugares recônditos das baías do litoral paranaense. Os “caiçaras” confeccionavam, até bem pouco tempo, as canoas de um pau só, com a árvore do guapuruvu, que, quase extinta, obriga a busca de outras soluções. O fandango, bailado tradicional do litoral, possui um aparato impressionante que envolve as comunidades em todo o seu processo. As violas, as rabecas, os tamancos são feitos pela comunidade; as danças, os cantos e modo de executar os instrumentos e bailar as modas são transmitidos espontaneamente; o fandango de um lugar traz sua marca, sua identidade própria, diferenciando-se de outros. É um arcabouço pertencente a uma comunidade, que identifica suas tradições, mentalidade e valores.
A professora Roselys Veloso Roderjan, musicista e grande pesquisadora da história e do folclore paranaense, realizou importante pesquisa, recolhendo junto a essas comunidades canções tradicionais do fandango, inclusive cifrando as letras para partituras, dando uma contribuição importante para a preservação da memória dessa nossa tradição.
As Folias de Reis ocorrem em quase todo o país. No norte e noroeste do Paraná são ainda uma tradição significativa. No processo de colonização do Paraná, migrou para o Estado com os paulistas e mineiros que colonizaram estas regiões. Assim como no fandango, os pontos de viola, os cantos, o conhecimento das alegorias são passados oralmente e intuitivamente de geração a geração. A memória dos velhos, dos cantadores, ou dos rezadores antigos, é o eixo principal da tradição: sem estes personagens a corrente se quebra e as tradições podem desaparecer. As bandeiras do divino são uma rica tradição ainda encontrada. Em Guaratuba celebra-se uma festa tradicional do divino, com duas bandeiras bem caracterizadas em procissão. As festas, rodas, danças ou terços de São Gonçalo do Amarante praticamente desapareceram – infelizmente – do Paraná (existe uma comemoração magnífica em Pernambuco, no município de Igarassu, localidade de Itapissuma). Santo que, em suas peregrinações no século XII, levava uma viola e unia o povo em torno dos seus cantos e em meio à roda de danças, São Gonçalo é, para os fiéis, detentor de grandes poderes.
As cavalhadas e as congadas são festas riquíssimas, de longa tradição. Guarapuava e Palmas realizavam suas cavalhadas. Na Lapa realiza-se uma congada de São Benedito; a festa que tem como principal elemento o simbolismo da coroação de um rei do Congo é realizada por ocasião da comemoração de São Benedito. As cavalhadas no Paraná, parece-nos, foram mais largamente praticadas pelo povo sertanejo no princípio do século XX. Estes, abandonados nos sertões do sul do Paraná e norte de Santa Catarina, pela república que nascia, promoveram uma das maiores revoluções camponesas da história do Brasil: a Guerra do Contestado (1912-1916). Liderados pelo monge João Maria praticavam a cavalhada, como forma de combate. Elementos medievais das cruzadas foram incorporados pelo Exército Encantado de São Sebastião, criado pelos revolucionários. Se as cavalhadas eram praticadas nos redutos dos camponeses, bem pode ser que tenham contribuído para a difusão e a permanência, até os dias de hoje, deste costume entre o povo da região de Palmas e Guarapuava.
Os imigrantes, radicados principalmente no sul, trouxeram manifestações próprias, incorporaram-nas ao nosso acervo popular. Tradições polonesas, alemãs, ucranianas, japonesas e tantas outras, somaram-se a essas manifestações antigas de origens índias, africanas, portuguesas e espanholas, tornando o Paraná moderno ainda mais complexo e rico.
Durante todo o ano ocorrem festas populares e celebrações sacras em todo o Estado. A maioria dessas celebrações homenageia santos ou santas padroeiras dos municípios, outras são antigas tradições praticadas por devotos, ou manifestações populares muito ricas, nas quais a arte popular e a religião se misturam ao longo do tempo. Grande parte é oriunda de antigas tradições, herdadas da Europa medieval; várias celebrações e festejos praticados no Brasil ocorriam, ou ainda ocorrem, também em Portugal, ou na Península Ibérica, demonstrando as influências culturais que possuímos da colonização portuguesa e espanhola.
Nas festas populares encontramos raramente as antigas manifestações folclóricas paranaenses: as cavalhadas ainda são praticadas, porém já desfiguradas de suas características originais; o fandango do litoral, com todos os costumes que o envolvem, ainda ocorre, porém somente em algumas localidades das baías de nosso litoral.
Estado com grande diversidade cultural, o Paraná recebeu também imigrantes de diversas partes do mundo e migrantes de inúmeros outros estados do Brasil. Deste modo, existe uma grande variedade de festas regionais, que são heranças da história local e, muitas vezes, devido a estas características singulares de ocupação e colonização, somente se apresentam naquela região. Em Siqueira Campos, por exemplo, ocorre há mais de setenta anos a festa do Senhor Bom Jesus da Cana Verde, em honra a quem foi edificado um santuário com a vinda da imagem do santo, provavelmente de Minas Gerais. A região recebeu no início do século XX um grande número de migrantes mineiros, que estabeleceram um dos primeiros núcleos coloniais do norte pioneiro, então denominado Colônia Mineira.
Celebrações como as festas de São Benedito, santo negro protetor dos escravos, são encontradas em vários municípios. Em alguns municípios que margeiam rios, como o Paraná e o Iguaçu, se realiza a festa de Nossa Senhora dos Navegantes, celebração muito popular no Brasil, ocorrendo também na região norte e no sul do país. As celebrações de Folia de Reis, que contam a história da visita dos três reis magos à manjedoura de Jesus Cristo recém-nascido, são realizadas em muitos municípios; em alguns deles ocorrendo, inclusive, concursos para premiar as melhores folias. As folias, muito comuns em todo o país, também foram trazidas por paulistas e mineiros para o Paraná.
Em Antonio Olinto, tem-se a romaria de Nossa Senhora dos Corais, inclusive com missa dita em ucraniano. Os ucranianos são um dos mais significativos grupos de imigrantes que aportaram nestas terras, no início do século XX. A festa para a Virgem de Caacupê, em Guaíra, de origem paraguaia, homenageia a santa com procissões e, inclusive, missa em língua guarani. Os índios guaranis, por seu turno, ainda realizam seu ritual vespertino da Casa de Reza, talvez uma das mais antigas celebrações religiosas do Paraná, já que os guaranis, autóctones habitantes da terra, conviveram com as reduções jesuíticas há mais de quatrocentos anos.
Nos Campos Gerais, região de influência tropeira, grande parte das tradições são heranças desse ciclo econômico e cultural, um dos mais importantes ocorridos nas regiões meridionais do Brasil. Em Piraí do Sul, homenageia-se o senhor Menino Deus, festa que remonta a esses tempos do tropeirismo e cuja imagem original, estima-se, tenha sido trazida no século XVIII por tropeiros das ruínas das missões jesuíticas de Sete Povos, no Rio Grande do Sul, para a primeira capela surgida em Piraí do Sul, então local de passagem das tropas.
Inúmeras tradições populares, porém, estão em vias de desaparecer ou desapareceram no Paraná, como as festas de São Gonçalo, o Boi de Mamão, o Pau-de-Fita etc. As Folias de Reis são um bom exemplo desse fenômeno; outrora comuns em quase todo o Brasil – não diferentemente no Paraná – são hoje pequenas reminiscências praticadas pelos antigos em alguns municípios, com o singelo desinteresse das gerações mais novas. Os novos tempos se impõem, as tradições tendem a se transformar e, algumas vezes, infelizmente, são esquecidas e abandonadas.
... as flores que nunca morrem,
são essas que em ti se movem.
Árvore do Mundo, Carlos Nejar
Quem vai podar o homem dos sonhos, das suas ilusões, da imaginação fértil e livre que constrói os básicos sentidos para o mundo e a vida. Isso, até hoje, não pode, e não deve ser contido. Os símbolos e a linguagem (outro símbolo) planam soltos. Vêm, de onde ninguém sabe. E são eles que identificam uma sociedade, um povo, dando-lhe uma identidade singular, onde quer que ele esteja.
Os mitos e as lendas são fenômenos da psique, dos dados individuais e coletivos, da trajetória épica, trágica ou cômica, dos seres humanos. Através dos mitos e das lendas pode-se penetrar nos meandros psicológicos dos homens, investigar seus desejos e suas leituras da terra e de si mesmos; o que é, num certo sentido, conhecer a própria história. Só que em uma visão mais ampla do que a análise fatual. É uma tarefa árdua tentar divisar nas mitologias seus possíveis adventos fatuais. Mitos de criação do mundo, com seus heróis épicos em luta com a natureza e os deuses, são comuns nas sociedades antigas.
Essas histórias estão recheadas de eventos naturais catastróficos e monstros transumanos, contra os quais os heróis e heroínas se põem em luta bravia, para redimir a sociedade, de uma falta, uma culpa, ou um desvio impensado das conveniências divinas. Muitos desses eventos parecem ter sido ocorrências físicas, ou geológicas, reais. Mas, como o homem podia explicar o inexplicável? Os rituais de nascimento, morte e de passagens, as viagens fantásticas, são procedimentos necessários de expiação, busca da paz, da superação, da transposição para uma nova posição individual e social; são caminhos para o apaziguamento da alma. E, assim, os mitos e as lendas se fizeram e se fazem.
Como para a poesia está o poema. Ou seja, a antiga discussão entre forma e conteúdo. Sendo o poema a forma, as vestes da poesia, que se vela muito mais além e guarda os sentidos mais próprios. Muitas vezes está a lenda para o mito. O mito é fundante, mais profundo, uma matriz originária; as lendas e contos populares contam os mitos, de diversas maneiras, sendo que esses relatos vão se metamorfoseando, conforme o tempo passa, a natureza e a sociedade mudam.
O tempo e a imaginação popular se encarregam de rebuscá-los, continuamente. Como uma pintura que jamais é finalizada, interminável; pois, a cada dia o artista, ou os artistas, lhe altera as cores, os tons, as formas. E assim infinitamente.
As lendas e os contos populares, porém, estão libertos. Não estão presos ao destino de serem cantores dos mitos. Soltos, criam suas próprias histórias. Sua base fundamental é a oralidade. A fala do povo. É na conversa do povo, nos sotaques, feitos e jeitos, na produção artística e no trabalho, nos acontecimentos que "ninguém" viu, mas ouviu dizer, que os contos florescem. Férteis, sólidas crenças e crendices, pois bem arraigados na liberta imaginação.
Fonte:
SEEC – Paraná da Gente
No litoral, as tradições se encontram no cotidiano; em muitas localidades ainda se pratica o artesanato tradicional. Os potes de barro, os trançados, as pinturas com traços europeus e índios, podem ser encontrados em lugares recônditos das baías do litoral paranaense. Os “caiçaras” confeccionavam, até bem pouco tempo, as canoas de um pau só, com a árvore do guapuruvu, que, quase extinta, obriga a busca de outras soluções. O fandango, bailado tradicional do litoral, possui um aparato impressionante que envolve as comunidades em todo o seu processo. As violas, as rabecas, os tamancos são feitos pela comunidade; as danças, os cantos e modo de executar os instrumentos e bailar as modas são transmitidos espontaneamente; o fandango de um lugar traz sua marca, sua identidade própria, diferenciando-se de outros. É um arcabouço pertencente a uma comunidade, que identifica suas tradições, mentalidade e valores.
A professora Roselys Veloso Roderjan, musicista e grande pesquisadora da história e do folclore paranaense, realizou importante pesquisa, recolhendo junto a essas comunidades canções tradicionais do fandango, inclusive cifrando as letras para partituras, dando uma contribuição importante para a preservação da memória dessa nossa tradição.
As Folias de Reis ocorrem em quase todo o país. No norte e noroeste do Paraná são ainda uma tradição significativa. No processo de colonização do Paraná, migrou para o Estado com os paulistas e mineiros que colonizaram estas regiões. Assim como no fandango, os pontos de viola, os cantos, o conhecimento das alegorias são passados oralmente e intuitivamente de geração a geração. A memória dos velhos, dos cantadores, ou dos rezadores antigos, é o eixo principal da tradição: sem estes personagens a corrente se quebra e as tradições podem desaparecer. As bandeiras do divino são uma rica tradição ainda encontrada. Em Guaratuba celebra-se uma festa tradicional do divino, com duas bandeiras bem caracterizadas em procissão. As festas, rodas, danças ou terços de São Gonçalo do Amarante praticamente desapareceram – infelizmente – do Paraná (existe uma comemoração magnífica em Pernambuco, no município de Igarassu, localidade de Itapissuma). Santo que, em suas peregrinações no século XII, levava uma viola e unia o povo em torno dos seus cantos e em meio à roda de danças, São Gonçalo é, para os fiéis, detentor de grandes poderes.
As cavalhadas e as congadas são festas riquíssimas, de longa tradição. Guarapuava e Palmas realizavam suas cavalhadas. Na Lapa realiza-se uma congada de São Benedito; a festa que tem como principal elemento o simbolismo da coroação de um rei do Congo é realizada por ocasião da comemoração de São Benedito. As cavalhadas no Paraná, parece-nos, foram mais largamente praticadas pelo povo sertanejo no princípio do século XX. Estes, abandonados nos sertões do sul do Paraná e norte de Santa Catarina, pela república que nascia, promoveram uma das maiores revoluções camponesas da história do Brasil: a Guerra do Contestado (1912-1916). Liderados pelo monge João Maria praticavam a cavalhada, como forma de combate. Elementos medievais das cruzadas foram incorporados pelo Exército Encantado de São Sebastião, criado pelos revolucionários. Se as cavalhadas eram praticadas nos redutos dos camponeses, bem pode ser que tenham contribuído para a difusão e a permanência, até os dias de hoje, deste costume entre o povo da região de Palmas e Guarapuava.
Os imigrantes, radicados principalmente no sul, trouxeram manifestações próprias, incorporaram-nas ao nosso acervo popular. Tradições polonesas, alemãs, ucranianas, japonesas e tantas outras, somaram-se a essas manifestações antigas de origens índias, africanas, portuguesas e espanholas, tornando o Paraná moderno ainda mais complexo e rico.
Durante todo o ano ocorrem festas populares e celebrações sacras em todo o Estado. A maioria dessas celebrações homenageia santos ou santas padroeiras dos municípios, outras são antigas tradições praticadas por devotos, ou manifestações populares muito ricas, nas quais a arte popular e a religião se misturam ao longo do tempo. Grande parte é oriunda de antigas tradições, herdadas da Europa medieval; várias celebrações e festejos praticados no Brasil ocorriam, ou ainda ocorrem, também em Portugal, ou na Península Ibérica, demonstrando as influências culturais que possuímos da colonização portuguesa e espanhola.
Nas festas populares encontramos raramente as antigas manifestações folclóricas paranaenses: as cavalhadas ainda são praticadas, porém já desfiguradas de suas características originais; o fandango do litoral, com todos os costumes que o envolvem, ainda ocorre, porém somente em algumas localidades das baías de nosso litoral.
Estado com grande diversidade cultural, o Paraná recebeu também imigrantes de diversas partes do mundo e migrantes de inúmeros outros estados do Brasil. Deste modo, existe uma grande variedade de festas regionais, que são heranças da história local e, muitas vezes, devido a estas características singulares de ocupação e colonização, somente se apresentam naquela região. Em Siqueira Campos, por exemplo, ocorre há mais de setenta anos a festa do Senhor Bom Jesus da Cana Verde, em honra a quem foi edificado um santuário com a vinda da imagem do santo, provavelmente de Minas Gerais. A região recebeu no início do século XX um grande número de migrantes mineiros, que estabeleceram um dos primeiros núcleos coloniais do norte pioneiro, então denominado Colônia Mineira.
Celebrações como as festas de São Benedito, santo negro protetor dos escravos, são encontradas em vários municípios. Em alguns municípios que margeiam rios, como o Paraná e o Iguaçu, se realiza a festa de Nossa Senhora dos Navegantes, celebração muito popular no Brasil, ocorrendo também na região norte e no sul do país. As celebrações de Folia de Reis, que contam a história da visita dos três reis magos à manjedoura de Jesus Cristo recém-nascido, são realizadas em muitos municípios; em alguns deles ocorrendo, inclusive, concursos para premiar as melhores folias. As folias, muito comuns em todo o país, também foram trazidas por paulistas e mineiros para o Paraná.
Em Antonio Olinto, tem-se a romaria de Nossa Senhora dos Corais, inclusive com missa dita em ucraniano. Os ucranianos são um dos mais significativos grupos de imigrantes que aportaram nestas terras, no início do século XX. A festa para a Virgem de Caacupê, em Guaíra, de origem paraguaia, homenageia a santa com procissões e, inclusive, missa em língua guarani. Os índios guaranis, por seu turno, ainda realizam seu ritual vespertino da Casa de Reza, talvez uma das mais antigas celebrações religiosas do Paraná, já que os guaranis, autóctones habitantes da terra, conviveram com as reduções jesuíticas há mais de quatrocentos anos.
Nos Campos Gerais, região de influência tropeira, grande parte das tradições são heranças desse ciclo econômico e cultural, um dos mais importantes ocorridos nas regiões meridionais do Brasil. Em Piraí do Sul, homenageia-se o senhor Menino Deus, festa que remonta a esses tempos do tropeirismo e cuja imagem original, estima-se, tenha sido trazida no século XVIII por tropeiros das ruínas das missões jesuíticas de Sete Povos, no Rio Grande do Sul, para a primeira capela surgida em Piraí do Sul, então local de passagem das tropas.
Inúmeras tradições populares, porém, estão em vias de desaparecer ou desapareceram no Paraná, como as festas de São Gonçalo, o Boi de Mamão, o Pau-de-Fita etc. As Folias de Reis são um bom exemplo desse fenômeno; outrora comuns em quase todo o Brasil – não diferentemente no Paraná – são hoje pequenas reminiscências praticadas pelos antigos em alguns municípios, com o singelo desinteresse das gerações mais novas. Os novos tempos se impõem, as tradições tendem a se transformar e, algumas vezes, infelizmente, são esquecidas e abandonadas.
... as flores que nunca morrem,
são essas que em ti se movem.
Árvore do Mundo, Carlos Nejar
Quem vai podar o homem dos sonhos, das suas ilusões, da imaginação fértil e livre que constrói os básicos sentidos para o mundo e a vida. Isso, até hoje, não pode, e não deve ser contido. Os símbolos e a linguagem (outro símbolo) planam soltos. Vêm, de onde ninguém sabe. E são eles que identificam uma sociedade, um povo, dando-lhe uma identidade singular, onde quer que ele esteja.
Os mitos e as lendas são fenômenos da psique, dos dados individuais e coletivos, da trajetória épica, trágica ou cômica, dos seres humanos. Através dos mitos e das lendas pode-se penetrar nos meandros psicológicos dos homens, investigar seus desejos e suas leituras da terra e de si mesmos; o que é, num certo sentido, conhecer a própria história. Só que em uma visão mais ampla do que a análise fatual. É uma tarefa árdua tentar divisar nas mitologias seus possíveis adventos fatuais. Mitos de criação do mundo, com seus heróis épicos em luta com a natureza e os deuses, são comuns nas sociedades antigas.
Essas histórias estão recheadas de eventos naturais catastróficos e monstros transumanos, contra os quais os heróis e heroínas se põem em luta bravia, para redimir a sociedade, de uma falta, uma culpa, ou um desvio impensado das conveniências divinas. Muitos desses eventos parecem ter sido ocorrências físicas, ou geológicas, reais. Mas, como o homem podia explicar o inexplicável? Os rituais de nascimento, morte e de passagens, as viagens fantásticas, são procedimentos necessários de expiação, busca da paz, da superação, da transposição para uma nova posição individual e social; são caminhos para o apaziguamento da alma. E, assim, os mitos e as lendas se fizeram e se fazem.
Como para a poesia está o poema. Ou seja, a antiga discussão entre forma e conteúdo. Sendo o poema a forma, as vestes da poesia, que se vela muito mais além e guarda os sentidos mais próprios. Muitas vezes está a lenda para o mito. O mito é fundante, mais profundo, uma matriz originária; as lendas e contos populares contam os mitos, de diversas maneiras, sendo que esses relatos vão se metamorfoseando, conforme o tempo passa, a natureza e a sociedade mudam.
O tempo e a imaginação popular se encarregam de rebuscá-los, continuamente. Como uma pintura que jamais é finalizada, interminável; pois, a cada dia o artista, ou os artistas, lhe altera as cores, os tons, as formas. E assim infinitamente.
As lendas e os contos populares, porém, estão libertos. Não estão presos ao destino de serem cantores dos mitos. Soltos, criam suas próprias histórias. Sua base fundamental é a oralidade. A fala do povo. É na conversa do povo, nos sotaques, feitos e jeitos, na produção artística e no trabalho, nos acontecimentos que "ninguém" viu, mas ouviu dizer, que os contos florescem. Férteis, sólidas crenças e crendices, pois bem arraigados na liberta imaginação.
Fonte:
SEEC – Paraná da Gente
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