quarta-feira, 11 de julho de 2018

Cecim Calixto (Cajado de Sonetos) 1


ANTENAS DE FLORES

Bendita a chuva que o jardim viceja
Na venturança de regar as flores.
A minha lida no rimar enseja
Brindar o ramo que produz olores.

A borboleta no agapanto adeja
E beija as rosas de infinitas cores;
Ao lado seu, o colibri bafeja
O florilégio - seu vergel de amores.

Mas o arquiteto que cuidou da planta,
Ante a beleza se comove e canta
O belo canto que a natura ordena:

"Crescei mimosas e a exalar perfumes,
Em liberdade, sem querer betumes,
Porque sois vós minha florida antena."

GÊMEAS PAIXÕES

Passou tristonho pela minha tenda,
Na palidez do rosto o amargo pranto.
Fez-me sentir toda emoção da lenda
Do cancioneiro em seu choroso canto.

Seguindo o vate pela mesma senda,
Fui encontra-lo em meu sombral recanto
Beijando a terra, a rabiscar legenda,
Sobre o sepulcro carcomido e santo.

Ambos choramos pelo amor perdido,
Com emoção e o coração dorido
Pela saudade que jamais se esquece.

E eu volto sempre àquela cova rude,
Porque minha alma, em solidão, alude
Ouvir lamento igual a minha prece.

CONSELHO AMIGO

A natureza castigando está
E o plantador sem ter razão lastima;
Pois ele pensa que plantando dá
Sem o respeito à decisão de cima.

Tem que aprender as condições e já...
O plantador que a sua terra estima,
Não há colheita que se mostre má
Quando a floresta a natureza anima.

Refiz a mata do ribeiro ativo
E de abundância felizmente vivo
Pelas colheitas que o galpão revela.

Eu planto fava que até sol resiste
E a pouca chuva não a deixa triste
Pois faço tudo para o agrado dela.

TELEFONE INGRATO

Quase destruo o telefone mudo,
Velho caduco que jamais me fala.
Ele bem sabe - de aflição acudo -
Ouvir a voz que o coração regala.

Esperto não usa o tom agudo,
Quando me vê transfere toda escala.
O baixo tom é o seu tenaz escudo,
Mais a esperteza da vilã cabala.

Como viver neste cruel negrume
Quando demonstra sobre mim ciúme,
De forma vil e que jamais me apraza.

Um jeito existe e bem assim não brigo:
Eu vou traze-la a residir comigo
E coloca-lo no porão de casa.

Fonte:
Cecim Calixto. Flores do meu cajado: sonetos. 
Curitiba: Juruá Editora, 2015.

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