sexta-feira, 13 de julho de 2018

Élton Carvalho (Jardim de Trovas)


A esperança, como a vaga,
insistente, não se cansa:
se uma esperança se apaga,
se acende nova esperança!

A mulher do cabra tem
apelido de “Jangada”
porque ela, às vezes, não vem,
ou volta.... de madrugada.

Angústia é mágoa, é desgosto
que transparece no olhar
e mostra o pranto no rosto
dos que não sabem chorar.

A proveta não gerou,
e um doutor meio zureta
fez exame e constatou:
menopausa... de proveta!

A sorte, como as rendeiras
sem seu labor persistente,
com suas mãos feiticeiras,
tece o Destino da gente...

A ventura, às vezes, mente:
promete que vem, insiste,
e marca encontro com a gente
na esquina que não existe!...

Coitadinha, está zureta
e anda triste por aí...
deu um grilo na proveta
e o bebê só faz cri-cri!

Conservando a imagem bela
de um amor que não se esquece,
a saudade é uma aquarela
que nem o tempo esmaece...

Dá-me outro inferno ao morrer,
mas não me curvo a Teus pés...
Se não me deixaste ver,
não quero ver quem Tu és!

De barro, Deus fez um homem,
da costela, uma mulher.
– E as sogras, que nos consomem,
fez de um espeto qualquer...

Deus, num requinte de zelos,
em milagroso improviso,
pôs a noite em teus cabelos,
e a aurora no teu sorriso.

Diz o velho, com ternura,
depois de um beijo que espoca:
– Meu bem, minha dentadura
não ficou na tua boca?

Doces visões do passado:
meu pai, irmãos, minha irmã e...
– e aquele jeito encantado
de tudo de minha mãe!

Do coreto pequenino,
da pracinha e o chafariz,
restam restos de um menino
que sonhava ser feliz...

Ele enrolava, enrolava,
e a enrolação era tanta
que, às vezes, quando falava
sentia um nó na garganta.

Em que infinito se esconde
esse Deus tão grande assim?
E minha fé me responde:
– Não se esconde. Mora em mim!

É triste vê-las, meninas,
restos de infância na face,
vendendo amor nas esquinas,
como se amor se comprasse...

Fazer biquíni ela sabe,
mas o próprio faz tão mini
que eu nem sei como é que cabe
tudo “aquilo” no biquíni...

Fui pescar com meu vizinho,
mas, logo que pus a vara,
veio um cavalo-marinho,
me deu um coice... na cara!

Fui ver a fonte falada
que jorra no pé do monte,
e, ao ver você debruçada,
vi tudo... e não vi a fonte!

Genro é minha distração,
que pena ter dez, somente.
Eu queria uma porção:
genro distrai tanto a gente...

Jamais estrelas persiga
quem não alcança a amplidão,
que o mérito da formiga
é achar migalhas no chão...

Levando a esperança ao mundo,
ao sair da Santa Sé,
tornou-se Paulo Segundo
o Peregrino da Fé!

Minha sogra não reclama
do bom trato que lhe dou.
Até de filho me chama
– Só não diz que filho eu sou.

Na hora da confusão
minha sogra é sempre assim:
nem sabe quem tem razão,
solta os cachorros em mim!

Não me agradeças, amigo,
porque te auxilio assim...
Apenas faço contigo
o que farias por mim!

Na solidão que me arrasa,
órfão de amor e carinho,
enchi de espelhos a casa
pra não me sentir sozinho.

Num cego, as palavras boas
calam bem mais do que em nós,
que o cego julga as pessoas
pelo que mostram na voz...

Num milagroso improviso,
com seu divino pincel,
Deus pintou o Paraíso
quando fez Vila Isabel!

Para fugir às rotinas,
na esperança de mudar,
cansei de dobrar esquinas
e dar no mesmo lugar.

Pelos abismos profundos,
nos confins da Terra imensa,
no mais distante dos mundos,
DEUS é a infinita presença!

Porque a verdade transpira
e nos mostra a realidade,
jamais o véu da mentira
esconde a luz da verdade!

Quem perdeu amor recente
e se ressente de amor,
se apega à cinza ainda quente,
porque sente algum calor...

Seguindo um rumo impreciso
que o nosso destino tece,
cada dia é um improviso
que a vida nos oferece.

Se há casa comercial
que engana o freguês à beça,
a drogaria é legal:
vende “drogas”, mas confessa!

Sentem os rudes e os sábios
– menos os pobres ateus
que a prece é a alma nos lábios
quando se fala com Deus.

Servir tem sido o meu fado:
já balizei tantas rotas
e, hoje, farol apagado,
sirvo de pouso às gaivotas...

Socorre, irmão, no caminho,
teu irmão que nada tem...
Não existe irmão sozinho:
todo irmão é irmão de alguém!

Solidão –a alma embotada
velando a própria agonia.
Uma cadeira ocupada
ao lado de outra vazia...

Só num trabalho fecundo,
semeando amor, poderemos
construir um novo mundo
melhor que o mundo que temos!

Subindo o morro, cansado,
quase pedindo socorro,
foi que eu vi porque é chamado
aquele troço de... MORRO!

Trocador... triste ironia,
não troca o que lhe convém:
se trocasse, então, iria
trocar a vida que tem...

Tu sempre estavas PREsente
e AUsente, querida, estás,
– UMA SÍLABA somente
que diferença que faz!

Vem, palhaço, sem tardança,
com teus trejeitos, teus chistes,
e acorda a alegre criança
que dorme nos homens tristes...

Zé, que faz a comida,
lava a roupa, se arrebenta,
diz: – Não aguento esta vida !
E a sogra, rindo, diz: – GUENTA...

Fonte:
União Brasileira de Trovadores Porto Alegre - RS. 
Trovas de Maria Nascimento Santos Carvalho e Élton Carvalho. 
Coleção Terra e Céu, vol. C. Porto Alegre/RS: Texto Certo, 2017.

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