terça-feira, 31 de julho de 2018

Olivaldo Júnior (Sobre um velho escritor)

(Para 25 de julho: Dia do Escritor)

Homem, velho e inevitável, impensável, irremediavelmente sozinho. Sim, era um velho escritor. Alguém a quem o Tempo, a Vida ou Deus tocou e concedeu a capacidade de enxergar e de escrever o que via, sem se importar se as visões eram reais ou não. Afinal, o que é que é mesmo realidade? Não sei, pois acredito que a vida é dentro. Vivemos alguns poucos anos e, como se fosse apertado um botão, desligam-nos do corpo e aterrissamos em outro lugar. Será que podemos pensar que a tal realidade é mesmo algo para se levar a sério? Não, um velho escritor também não poderia acreditar nisso. E, de fato, não acreditava mesmo. Era livre.

Liberdade. Eis um substantivo abstrato que o velho escritor sempre quis concreto. Assim, ao fim da vida, a cada dia mais perto do voo para o cerne do azul, o velho escritor se questionava se a liberdade a que tanto almejara lhe tinha sido conquistada em algum momento da vida. Pensou, meditou, repensou e, num átimo, numa espécie de vislumbre, de um só golpe, viu que nunca havia sido livre e que nenhum homem poderia jamais ser livre de verdade.

A verdade. Será que o velho escritor tinha encontrado a verdade? Para além da verdade cristã e de qualquer outra verdade filosófico-religiosa, nosso amigo descobriu que a verdade é sempre relativa a algum fato que a contradiz. E o peso de um e de outro podem sempre variar. Dessa forma, recolheu-se à significância de sua própria verdade e descreveu o mundo conforme os olhos da peregrina essência que o animava. Foram textos e mais textos sobre a estrada.

Sobre a estrada, diria que lhe fora até suave demais. Jamais tivera uma doença grave. Conhecera o amor, mesmo que mal ou nunca correspondido. Não, não tivera nenhum filho, nem plantara nenhuma árvore. Mas escrevera livros, lançara folhas dentre as folhas já lançadas e que permeiam a penumbra das bibliotecas, o sem-fim dos sebos, dos sites e dos blogs da internet, sua casa mais profícua ultimamente. Aliás, ultimamente, comunicava-se bastante por e-mail, via web, sem rostos familiares, só palavras com as quais se relacionava como se as conhecesse melhor do que as pessoas que encontrava todo dia pela rua. Rua... Qual seria mesmo a Rua dos Cataventos que o mestre Quintana cantou e que tanto o comovera? Era escritor.

Fonte: O Autor

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